I - A ampliação da matéria de facto pelo STJ, nos termos dos arts. 682.º, n.º 2, e 674.º, n.º 4, ambos do CPC, justifica-se apenas nas situações em que não tenham sido valorados factos essenciais e não já quando estejam em causa factos que não relevam para a decisão da causa.
II - Circunscrevendo-se a atividade de valoração das declarações de parte e dos depoimentos das testemunhas no âmbito da livre apreciação da prova e não se depreendendo, no confronto entre a fundamentação do tribunal da 1.ª Instância e a do tribunal da Relação, que, na apreciação dos pontos de facto impugnados, este tribunal tenha infringido qualquer norma legal probatória expressa que exija certa espécie de prova para os factos em causa ou que fixe a força de determinado meio de prova, nem se descortinando que a apreciação do tribunal da Relação colida com qualquer elemento concreto e específico resultante da imediação do juiz da 1.ª instância, arredada fica a possibilidade de formulação, por parte do STJ, de quaisquer juízos de valor acerca da livre convicção formada pelo tribunal da Relação.
III - Enfermando o acórdão recorrido da nulidade prevista na al. d) do n.º 1 do art. 615.º, por omissão de pronúncia do tribunal da Relação sobre questões que devia apreciar e cuja apreciação lhe foi suscitada no âmbito do recurso de apelação, fazendo parte do respetivo objeto, e atenta a inaplicabilidade do preceituado no art. 665.º, n.º 2, face ao disposto no art. 679.º, todos do CPC, impõe-se revogar, nesta parte, o acórdão recorrido e determinar a remessa dos autos ao tribunal da Relação para que nele sejam apreciadas, em primeira mão, as questões omitidas, incluindo aquelas cujo conhecimento julgou prejudicado.
Não disponível.
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
2ª SECÇÃO CÍVEL
I. Relatório
1. AA instaurou contra BB e Mapfre Seguros Gerais, S.A. a presente ação, pedindo a condenação das rés a pagarem-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 54.330,00, acrescida do valor reclamado à autora no processo executivo fiscal que corre termos sob o nº 42/07.5B… no Tribunal Administrativo e Fiscal de …, a liquidar posteriormente, sendo devidos juros de mora legais desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
Alegou, para tanto e em síntese, que a autora figura como opoente no processo executivo fiscal que corre termos sob o nº 42/07.5B… no Tribunal Administrativo e Fiscal de … .
Porque este processo está pendente há 7 anos, sem que tenha sido proferida qualquer decisão e porque a ré BB intitulou-se como especialista em direito administrativo e assegurou à autora que o processo se resolveria rapidamente, acordou com esta ré que a mesma assumiria o seu patrocínio naquele processo.
Para tanto, entregou à ré BB o processo, contendo todos os elementos existentes até à data e um cheque no valor da provisão solicitada de € 1.850,00, mas esta ré nada mais fez do que juntar àquele processo o substabelecimento a seu favor, facto que levou a autora a contratar os servições de um outro advogado, que, apesar das diligências efetuadas, não conseguiu obter dela qualquer resposta nem a entrega do processo.
A ré BB prestou informações falsas à autora e não praticou qualquer ato em defesa e salvaguarda dos seus interesses e direito, o que, para além de acarretar-lhe danos de natureza patrimonial, deixou-a preocupada, ansiosa, frustrada e enganada, sendo a ré Mapfre Seguros Gerais, S.A responsável pelo ressarcimento de todos os danos causados pela aquela ré à autora, ao abrigo do contrato de seguro celebrado entre ela e a Ordem dos Advogados Portugueses.
2. A ré “Mapfre Seguros Gerais, S.A.” contestou, impugnando os factos alegados pela autora e sustentando, em síntese, que os factos e circunstâncias que poderiam vir a gerar reclamação, eram do conhecimento da ré advogada em data anterior a 01.01.2014, pelo que o sinistro encontra-se excluído da cobertura da invocada apólice.
Concluiu pela improcedência da ação.
3. A ré BB, contestou, impugnando os factos alegados pela autora e sustentando, em síntese, que da quantia entregue, a título de provisão, pela autora há que descontar a quantia de € 500,00 a título de honorários e despesa.
Concluiu pela sua absolvição do pedido.
4. A autora requereu a intervenção principal provocada de “Arch Insurance Company (Europe) Ltd” e de “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, o que foi admitido.
5. A interveniente “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, contestou, excecionando a sua ilegitimidade passiva, posto que, nos termos do Ponto 10 das Condições Particulares do contrato de seguro celebrado com a Ordem dos Advogados, a apólice de seguro vigorou apenas pelo período de 24 meses, com data de início de 01.01.2012 e vencimento a 01.01.2014. Pugnou ainda pela sua absolvição do pedido.
6. A interveniente “Arch Insurance Company (Europe), Ltd”, pugnou também pela sua absolvição do pedido, sustentando, para tanto e em síntese, que as apólices de seguro celebradas entre a interveniente e a Ordem dos Advogados vigoraram apenas até 31.12.2011.
7. Realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual julgou-se improcedente a exceção dilatória da ilegitimidade passiva da interveniente “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.” , foi fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.
8. Após audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que:
a) condenou a ré, BB, a pagar à autora a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data de citação da 1ª ré até efetivo e integral pagamento;
b) condenou a ré, BB, a restituir à autora a quantia de € 1.850,00, deduzida da quantia que vier a apurar-se ser devida a título de despesas e honorários;
c) condenou a ré, BB, a pagar à autora a quantia que vier a apurar-se em posterior incidente de liquidação, a título de indemnização, correspondente ao montante de honorários e despesas pagos pela autora ao Exmo. Sr. Dr. CC até ao montante de € 980,00;
d) condenou a ré, BB, a pagar à autora a quantia de € 2.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
e) absolveu a ré, BB, do demais peticionado pela autora;
f) absolveu a ré, “Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e as intervenientes, Arch Insurance Company (Europe) Ltd e “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, dos pedidos formulados pela autora.
9. Inconformada com esta sentença, na parte em que a condenou no pagamento à autora da quantia de € 10.000,00, a título de indemnização pelo dano de perda de chance, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação da 1.ª ré até efetivo e integral pagamento’’, dela apelou a ré BB para o Tribunal da Relação de Lisboa.
10. A autora contra alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
11. Igualmente inconformada, no que respeita à decisão de facto, ao quantum fixado a título de indemnização a favor da recorrente, quer por perda de chance, quer por danos morais, e quanto à absolvição da ré, Mapfre Seguros Gerais, S.A.”, e das intervenientes, Arch Insurance Company (Europe) Ltd e “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, e intervenientes/recorridas dos pedidos formulados, dela apelou a autora para o Tribunal da Relação de Lisboa.
12. A Seguradoras Unidas, S.A, interveniente principal, contra alegou, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela autora.
E, para a hipótese de assim não ser entendido, requereu, nos termos do art. 636, nº1 do CPC, a ampliação do âmbito do recurso, excecionando a sua ilegitimidade passiva e sustentando, por um lado, que, tendo a apólice subscrita pela recorrida como limite de indemnização o capital total de € 150.000,00 por reclamação e anuidade, tendo sido fixada uma franquia no montante global de € 5.000,00 por sinistro e sendo esta franquia da responsabilidade da segurada, 1ª ré, sempre teria a mesma de ser deduzida do eventual valor a indemnizar.
E, por outro lado, que a ré segurada teve conhecimento prévio dos factos que lhe são imputados e nunca os comunicou à ora recorrido, pelo que, constituindo tal comunicação requisito prévio à assunção, pela seguradora recorrida, de qualquer obrigação decorrente da Apólice 0002…9, deve manter-se a sua absolvição do pedido.
13. A ré “Mapfre Seguros Gerais, S.A.”, contra alegou, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela autora.
E, para a hipótese de assim não ser entendido, requereu, nos termos do art. 636, nº1 do CPC, a ampliação do âmbito do recurso, sustentando inexistirem nos autos qualquer facto provado de onde se possa extrair a existência de qualquer dano sofrido pela autora, nomeadamente a título de perda de chance.
14. A interveniente Arch Insurance Company (Europe), Ldt, contra alegou, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela autora.
E, para a hipótese de assim não ser entendido, requereu, nos termos do art. 636, nº1 do CPC, a ampliação do âmbito do recurso, sustentando inexistirem nos autos qualquer facto provado de onde se possa extrair a existência de qualquer dano sofrido pela autora, nomeadamente a título de perda de chance.
15. A autora contra alegou, pugnando pela improcedência dos recursos subsidiários interpostos pela ré segurado e pelas seguradoras intervenientes.
16. Pelo Senhor Desembargador Relator, foi proferida, ao abrigo do disposto no art. 656º do CPC, decisão sumária que revogou a sentença recorrida, absolvendo todos os demandados dos pedidos formulados pela autora.
17. Inconformada com esta decisão, a autora dela reclamou para a conferência, na sequência do que, em 08.11.2018, o Tribunal da Relação proferiu acórdão que, com um voto de vencimento, julgou procedente a apelação de BB e improcedente a apelação de AA, e, em consequência, revogou a sentença recorrida na parte em que condenou a ré, BB, a pagar à autora a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data de citação da 1ª ré até efetivo e integral pagamento.
Mais decidiu não apreciar os recursos subsidiários, mantendo «os restantes capítulos b) a f) da sentença».
18. Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
I. Vem o presente recurso, oportunamente interposto como revista, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou improcedente o recurso interposto pela ora Recorrente e julgou procedente a apelação interposta pela R. BB, e, em consequência, revogou o capítulo a) da sentença proferida em 1ª Instância, absolvendo 1ª ré do pedido (pagamento de € 10.000,00 à ora Recorrente), mais decidindo não apreciar os recursos subsidiários e em manter os restantes capítulos b) a f) da sentença.
II. Nos termos da sentença proferida na 1ª Instância a acção foi julgada parcialmente procedente, e em consequência,
a) Condenada a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação da 1ª R. até efectivo e integral pagamento;
b) Condenada a 1ª Ré a restituir à Autora a quantia de € 1.850,00, deduzida da quantia que vier a apurar-se ser devida a título de despesas e honorários;
c) Condenada a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia que vier a apurar-se em posterior incidente de liquidação, a título de indemnização, correspondente ao montante de honorários e despesas pagos pela autora ao Exmo. Sr. Dr. CC até ao montante de € 980,00;
d) Condenada a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 2.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento;
e) Absolvida a 1ª R. do demais peticionado pela Autora;
f) Absolvida a 2ª Ré e as intervenientes dos pedidos formulados pela Autora.
III. A aqui Recorrente interpôs recurso da referida sentença, impugnando parcialmente a decisão sobre a matéria de facto, cingindo-se o objecto do recurso aos segmentos a), d), e) e f) do dispositivo.
IV. Por seu turno, igualmente a 1ª R./Recorrida interpôs recurso da sentença da 1ª Instância, sem impugnar a matéria de facto, cingindo-se o objecto do seu recurso exclusivamente quanto à sua condenação a pagar à Autora a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, cfr. al. a) do dispositivo.
V. Interpuseram igualmente a 2ª R. e as Intervenientes recursos subordinados, mas, por não terem sido apreciados no Acórdão ora colocado em crise, não relevam neste momento.
VI. Após reclamação para a conferência, ao abrigo do disposto no art. 652º, nº 3 do CPC, foi proferido Acórdão pelo Tribunal a quo, segundo o qual foi julgada procedente a apelação da R. BB e improcedente a apelação de AA, e, em consequência, revogado o capítulo a) da sentença de 21.04.2017, absolvendo-se a 1ª R. do pedido, mais se decidindo manter os restantes capítulos b) a f) da sentença e não apreciar os recursos subsidiários.
VII. Contudo, o Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia, nos termos da al. d) do nº 1 do art. 615º do CPC, o que se invoca, tudo com as legais consequências.
VIII. Por outro lado, no Aresto recorrido, alegadamente foi apreciada a apelação interposta pela Recorrente AA e a apelação da 1ª R. BB.
IX. Sucede que, percorrendo o Acórdão agora colocado em crise, constata-se que da apelação interposta pela aqui Recorrente, foi apenas e só apreciada a impugnação da matéria de facto.
X. Mas, a Recorrente, na sua apelação, reclamou ainda a apreciação dos segmentos a), d), e) e f) do dispositivo da sentença de 1ª Instância.
XI. Perante a procedência da apelação da 1ª R./Recorrida, cujo objecto se cingia exclusivamente ao capítulo a) da sentença, ficou prejudicada a apreciação dos fundamentos invocados pela Recorrente neste segmento.
XII. A 1ª R./Recorrida, na apelação que mereceu acolhimento pelo Tribunal a quo, não impugnou ou questionou qualquer outro segmento da decisão da 1ª Instância, a sua procedência não prejudicava, nem obstava à apreciação dos demais themas decidendum do recurso interposto pela Recorrente, ou seja, das alíneas d), e) e f) do dispositivo da sentença.
XIII. Cuja sindicância pelo Tribunal a quo se impunha.
XIV. Pelo que, o Tribunal a quo deixou de pronunciar-se sobre questões que tinha o dever de conhecer e decidir, donde decorre a invocada nulidade do Acórdão recorrido, por omissão de pronúncia, o que se invoca, tudo com as legais consequências.
Sem conceder,
XV. A sindicância do correcto ou incorrecto uso dos poderes do Tribunal da 2ª Instância, no que concerne à alteração ou modificação da matéria de facto, fazendo-se assim a avaliação se o Tribunal da Relação, ao efectuar a dita apreciação, se conformou, ou não, com a lei, constitui verdadeira questão de direito e por isso da competência desse Colendo Supremo Tribunal de Justiça, cuja apreciação se reclama.
XVI. Invocou a Recorrente na sua apelação que, além dos factos julgados como provados na sentença, existiam ainda outros factos que deveriam ter sido dados como provados, porque essenciais para a boa decisão da causa e justa composição do litígio.
XVII. A Recorrente invocou os factos patentes nos arts. 10º, 11º, 24º, 26º, 34º, 67º, 91º, 94º, 95º, 96º, 97º, 101º, 110º a 28º, 148º, 149º, 150º, 153º, 154º, 156º a 161º, 180º, 209º, 210º, 215º, 216º, 217º, 218º, 220º, 221º e 228º da sua p.i.
XVIII. E sobre tais incidiu prova bastante, na exacta medida de os mesmos serem considerados provados, o que se requereu na apelação.
XIX. A prova de tais factos deriva quer da prova testemunhal produzida em sede de julgamento, em particular os depoimentos prestados pelas testemunhas DD, EE, FF e Dr. CC, M. Il. Advogado, quer do próprio depoimento de parte da 1ª R., ora Recorrida, e ainda das declarações de parte da Recorrente, tendo-se transcrito na apelação os excertos tidos por pertinentes, cumprindo assim a Recorrente o disposto no art. 640º do CPC,
XX. Quer ainda da prova documental, porque não impugnados e até corroborados pela prova produzida em sede de audiência final, o documento juntos com a p.i. sob o número 9, bem como a certidão judicial, emitida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de …, referente ao proc. nº 42/07.5B…, da 1ª Unidade Orgânica, junta aos autos através de requerimento apresentado em juízo no dia 20.02.2017, cuja junção foi admitida na sessão de audiência final realizada no dia 13.03.2017, cfr. respectiva acta.
XXI. Nos presentes autos está em causa a responsabilidade da 1ª R./Recorrida, enquanto advogada e no cumprimento de mandato judicial, é inequívoco que assume importância e relevância para a boa decisão da causa, que se tratam de factos juridicamente relevantes, quer o comportamento da 1ª R./Recorrida, quer a forma como a Recorrente se sentiu, quer o que sucedeu durante todo o tempo que subsistiu o mandato.
XXII. Assim, porque relevante, porque demonstrado quer pela prova testemunhal enunciada, declarações de parte e depoimento de parte, quer pela prova documental referida, requereu a Recorrente na sua apelação que fossem aditados à matéria de facto provado os seguintes:
a) A A. muito estranha e sente-se preocupada pela demora que se verifica no processo identificado em 1) até à presente data, o que desabafa com os seus familiares e amigos, por força do depoimento das testemunhas DD, EE, FF e Dr. CC, depoimento de parte da 1ª R., ora Recorrida e próprias declarações de parte da A., aqui Recorrente, cfr. transcrição da apelação
b) A 1ª R. assegurou à A. que o processo se resolveria rapidamente, e que face ao seu conhecimento especializado, experiência profissional e contactos, não se tratava de uma questão muito complexa, e, por isso, a A. acreditou na 1ª R. e sentiu confiança na mesma, por força do depoimento das testemunhas DD e FF, depoimento de parte da 1ª R., ora Recorrida e próprias declarações de parte da A., aqui Recorrente, cfr. transcrição patente na apelação.
c) O único requerimento que a 1ª R. juntou ao processo identificado em 1), em representação da A., corresponde ao requerimento de junção do estabelecimento, apresentado em juízo, pessoalmente, no dia 20.05.2011,
d) No período em que a 1ª R. foi advogada da A., o processo identificado em 1) não teve qualquer desenvolvimento, ambos por força das declarações da testemunha Dr. CC, as declarações de parte da Recorrente, depoimento de parte da 1ª R./Recorrida, e da certidão junta com o requerimento de 20.02.2017.
e) A 1ª R. afirmou à A., cfr. factos 6), 7) e 8), ter praticado actos e diligências que não levou a cabo, como apresentação de requerimentos a pedir a confiança do processo, como a própria consulta do processo e confiança do mesmo, como análise pormenorizada do mesmo, pelo que a 1ª R. prestou informações falsas à A., por força dos factos provados sob os números 6), 7) e 8), declarações da testemunha Dr. CC, declarações de parte da Recorrente e o depoimento de parte da 1ª R./Recorrida.
f) A manutenção do processo físico entregue pela A. à 1ª R., na posse desta, porque o mesmo contém os documentos mencionados sob os números 22), 23) e 24), prejudica e compromete o sucesso da pretensão da A. no processo identificado em 1), pois a sua junção não é possível, e tais documentos são aptos a demonstrar a inexistência da dívida da A. para com a CGD, e servem de contraprova a factos invocados na contestação à oposição,
g) O que causa à A. um forte sentimento de incerteza e receio, ambos por força das declarações prestadas pelas testemunhas DD, EE, declarações de parte da Recorrente e depoimento de parte da 1ª R./Recorrida, art. 412º do CPC e regras de experiência comum.
h) Caso a oposição à execução fiscal identificada em 1) venha a ser julgada improcedente, a A. perderá o imóvel que se encontra penhorado, cfr. facto 2), que constitui a casa de morada de família, onde a A. reside com o seu filho, FF;
i) A A. está desempregada desde Outubro de 1996, vive com dificuldades financeiras, dependendo da ajuda de amigos e familiares para sobreviver;
j) A A. não tem condições financeiras para pagar a dívida reclamada no processo identificado em 1),
k) O montante pago pela A. à 1ª R., mencionado em 5) e 21), foi emprestado àquela pela amiga DD, todos por força das declarações das testemunhas DD, EE, FF, declarações de parte da Recorrente e documento nº 9 junto com a p.i.
l) A A., em consequência do comportamento da 1ª R., sente-se incrédula com a falta de zelo e diligência desta, desapontada, frustrada, zangada, com um forte sentimento de injustiça, abalada na sua convicção e confiança nos profissionais do foro, de quem esperava um comportamento exemplar, e sente-se defraudada nas suas expectativas, por força das declarações das testemunhas DD, EE, FF, Dr. CC e declarações de parte da Recorrente, bem como art. 412º do CPC e regras de experiência comum.
XXIII. Por fim, ainda no que tange à matéria de facto importaria ainda alterar a redacção dos patentes sob os números 25) e 29), que se crê padecerem de manifesto lapso, ou, não sendo o caso, insuficientemente considerados.
XXIV. Com efeito, e porque expressamente referido pela Recorrente, e não infirmado por qualquer outro meio de prova, deve ser alterada a redacção do facto sob o nº 25, o qual deve passar a ter a seguinte redacção, o que se requer:
25) A autora não ficou na sua posse com qualquer cópia dos elementos referidos em 22), 23) e 24).
XXV. Como resultou da prova produzida e como a M.ª Juiz da 1ª Instância formou a sua convicção, a Recorrente entregou o processo físico à 1ª R./ Recorrida, com os elementos descritos nos números 22) a 24) e não reservou para si qualquer cópia, de nenhum deles, incluindo a documentação para ser entregue posteriormente em sede de audiência final no processo judicial por uma questão de estratégia,
XXVI. Ademais, no que tange ao facto sob o nº 29), resultou da audiência final, cfr. depoimento de parte da 1ª R./Recorrida e declarações de parte da Recorrente, que, até ao final da discussão da causa nestes autos, aquela não entregou o processo físico, não respondeu, nem prestou contas.
XXVII. Assim, e porque ao Tribunal é lícito tomar em consideração todas as provas produzidas, cfr. art. 413º do CPC, e porque assim resultou provado, deveria ser alterada a redacção do facto sob o nº 29, o qual deve passar a ter a seguinte redacção, o que se requereu:
29) Até ao fim da discussão da causa nestes autos, a 1ª Ré não respondeu, não entregou o processo físico nem prestou contas do valor de € 1.850,00.
XXVIII. E, em consequência, os factos considerados como não provados pela sentença, sob as alíneas A), C), D) e E) deveriam ser eliminados da factualidade não provada, o que se requereu, (porque integrados na matéria de facto provada).
XXIX. Não obstante os argumentos usados pela Recorrente na sua apelação, e a indicação dos meios de prova que impunham a alteração da decisão sobre a matéria de facto nos termos requeridos, o Tribunal a quo não os atendeu.
XXX. O Tribunal a quo, além de fundamentar, salvo melhor opinião, de forma deficiente a sua decisão neste domínio, interpretou e aplicou incorrectamente o disposto nos arts. 5º, 412º, 413º e 607º, nºs 4 e 5, todos do CPC e arts. 342º, 344º, 346º, 349º, 352º, 353º, 358º, 363º, nº 3 e 364º, todos do Código Civil.
XXXI. O Tribunal a quo não teve em consideração os factos a aditar à matéria de facto julgada provada, os quais se revelam essenciais, juridicamente relevantes e relevantes para a boa decisão da causa.
XXXII. Mais, o Tribunal a quo não justifica, sequer minimamente, de que forma e porque razão, atento o thema decidendum, os factos cujo aditamento a Recorrente requereu não se revelavam essenciais.
XXXIII. Ao assim não considerar, violou o Tribunal a quo os poderes de cognição que sobre si impendem, desentendendo as normas legais imperativas e cuja aplicação se impunha.
XXXIV. Assim, o Tribunal da Relação de Lisboa usou incorrectamente dos seus poderes quanto à alteração ou modificação da decisão sobre a matéria de facto, não se conformando com a lei, cuja avaliação constitui matéria de direito, e nessa medida, reclama-se a competente sindicância deste Supremo Tribunal de Justiça, tudo com as legais consequências.
Sem prescindir,
XXXV. Não pode a Recorrente conformar-se com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, na medida em que os danos sofridos pela Recorrente, por força da conduta da 1ª R./Recorrida são extensos, graves e dignos de tutela jurídica, crendo, por isso, que o quantum a atribuir a título de indemnização deverá ser superior.
XXXVI. É inequívoca a responsabilidade da 1ª R/Recorrida perante a Recorrente,
XXXVII. Assim como é inequívoco que os danos invocados, demonstrados e provados pela Recorrente não se cingem ao instituto da perda de chance, que, em rigor e na verdade, se verifica e sustenta, também, por esta via, a indemnização reclamada pela Recorrente.
XXXVIII. A Recorrente não invocou como único dano não poder ver a sua causa julgada em tempo breve.
XXXIX. A 1.ª R./Recorrida nada fez em cumprimento do mandato conferido pela Recorrente.
XL. A 1ª R./Recorrida informou a Recorrente que a questão era fácil de resolver, que tinha conhecimentos, que iria pedir uma audiência ao Juiz, que ia apresentar uma queixa-crime.
XLI. A 1ª R./Recorrida prestou informações à Recorrente, alegando ter praticado diligências e actos, em nome e representação da desta, que na realidade não fez.
XLII. A 1ª R./Recorrida limitou-se, única e exclusivamente, a juntar ao processo para o qual foi mandata, substabelecimento a seu favor.
XLIII. A 1ª R./Recorrida solicitou € 1.850,00 a título de provisão, para juntar um substabelecimento ao processo.
XLIV. A 1ª R./Recorrida raramente atendia as chamadas da Recorrente e não as retornava.
XLV. A 1ª R./Recorrida não respondeu às cartas dirigidas pela Recorrente e pelo Dr. CC.
XLVI. A 1ª R./Recorrida, até hoje, não entregou à Recorrente o processo físico que lhe foi entregue quando assumiu o patrocínio, mantendo na sua posse informação e documentação no âmbito de um assunto que já não lhe está confiado.
XLVII. Mesmo em sede de depoimento de parte, a 1ª R./Recorrida continuou a insistir em mentiras, alegando ter praticado actos, que, como se provou, não ocorreram.
XLVIII. É a própria 1ª R./Recorrida, quem, em sede de depoimento de parte, afirma categoricamente que, até pelos conhecimentos que tem, que afirmou à Recorrente que iria acelerar o processo e que até o fez – embora se tenha provado que tal não sucedeu, bem pelo contrário!
XLIX. É certo que a 1ª R./Recorrida não tinha o poder nem estava na sua disponibilidade proceder ao agendamento de qualquer diligência judicial,
L. Mas era obrigação da 1ªR./Recorrida, enquanto mandatária constituída pela Recorrente, que praticasse actos que pudessem levar ao agendamento do julgamento.
LI. Era exigível que a 1ª R./Recorrida praticasse actos adequados à defesa e salvaguarda dos interesses e direitos da Recorrente.
LII. O que não sucedeu.
LIII. Até porque, como é facto notório, o decurso do tempo é manifestamente prejudicial à Recorrente, porquanto, pelo menos, implica o vencimento de mais juros sobre a pretensa dívida que lhe imputada no pleito judicial em causa.
LIV. Mas mais, provou-se ainda uma possibilidade real de êxito, e ainda a sua frustração, por força da conduta da 1ª. R./Recorrida, cfr. factos julgados provados, sob os nºs 15), 20) 21) 22) 23), 24) 25), 26), 27) e 29).
LV. Perante um documento que fazia menção de uma dívida de valor inferior à reclamada no processo em causa, apenas se pode concluir por uma manifesta possibilidade (e até, arrisca-se a afirmar, certeza) real de êxito que se frustrou – pois a 1ª. R./Recorrida permanece com tal documento na sua posse.
LVI. O que se exige é uma séria e real possibilidade, ou seja, precisamente um juízo de probabilidade razoável de sucesso, de “chance” de ganho razoável, perante os factos sub judice.
LVII. Aliás, tratando-se o mandato forense de uma obrigação de meios e não de resultados, também não fará sentido impor a demonstração, sem margem para dúvidas, de ganho ou perda de acção.
LVIII. O que é forçoso concluir – considerando apenas, no limite – que um documento da própria credora, in casu, CGD, atestando uma dívida inferior à reclamada permite, com segurança, afirmar existir, por banda da Recorrente, uma séria e real probabilidade de êxito.
LIX. A conduta da 1ª R./Recorrida enquadra-se efectivamente, também, no instituto da perda de chance ou oportunidade, tendo a Recorrente logrado provar os factos constitutivos de tal direito.
LX. Neste sentido, vejam-se os Acórdãos desse Supremo Tribunal de Justiça, de 14.03.2013, 30.04.2015 e 30.03.2017, disponíveis em www.dgsi.pt.
LXI. Ao contrário do patente no Acórdão recorrido há inequívoco, evidente e despudorado incumprimento do mandato forense.
LXII. Não estamos perante uma conduta da 1ª R./Recorrida que simplesmente “não primou por grande profissionalismo e respeito para quem tinha uma ação em Tribunal.”
LXIII. A Recorrente não se limitou a invocar como único dano a circunstância de não poder ver a sua causa julgada em tempo breve.
LXIV. A 1ªR./Recorrida violou os deveres que, enquanto advogada e mandatária, tinha para com a Recorrente, quer porque afirmou ter praticado diligências que não levou a cabo, quer porque acometida do dever de patrocínio nada fez para acautelar os direitos e interesses da Recorrente, não consultou o processo, não definiu uma estratégia e não a comunicou à Recorrente, quer porque a 1ª R./Recorrida não respondeu aos pedidos da Recorrente, nem a informava sobre o assunto que lhe estava confiado, quer porque, até hoje, a 1ª R./Recorrida mantém na sua posse o processo físico que lhe foi entregue, o qual contém documentação essencial à defesa da Recorrente no pleito em causa, (o que a 1ª R./Recorrida não ignora, cfr. depoimento de parte), quer porque a 1ª R./Recorrida mantém na sua posse provisão em numerário que lhe foi entregue pela Recorrente, sem que tenha praticado actos e procedido à restituição devida.
LXV. A circunstância da 1ª R./Recorrida, até hoje, manter na sua posse o processo físico, com os documentos que a Recorrente não reservou qualquer cópia para si, assume uma gravidade extrema, pois deixa a Recorrente numa posição muito vulnerável, já que, tal documentação é necessária para a prova dos factos invocados pela Recorrente e sem a mesma, fica esta necessariamente prejudicada e numa posição processual melindrosa.
LXVI. Não está em causa a resolução do processo e em particular que a 1ª R./Recorrida conseguisse que a penhora fosse levantada e o processo executivo fiscal extinto, mas sim, que a 1ª R./Recorrida, enquanto advogada mandatada pela Recorrente para o processo em causa, praticasse, como afirmou que faria, todos os actos aptos e necessários a que tal resultado fosse alcançado.
LXVII.O processo confiado à 1ª R./Recorrida é de suma importância para a vida da Recorrente, na medida em que a sua casa de morada de família está penhorada à ordem do mesmo, e a improcedência da oposição à execução fiscal implicará a perda desse único seu bem.
LXVIII. O comportamento da 1ª R./Recorrida causa, até hoje, danos patrimoniais e não patrimoniais na Recorrente, que são dignos de protecção jurídica.
LXIX. A conduta da 1ª R./Recorrida é inadmissível e deve ser sancionada de forma exemplar.
LXX. É por demais inequívoco que houve incumprimento do mandato notificado nos autos, com culpa assacável à 1ª R./Recorrida.
LXXI. Pelo que, é de facto devida indemnização à Recorrente, pelo comportamento da 1ª R./Recorrida, e em montante superior a € 10.000,00.
LXXII. Pelo exposto, evidente nos autos, e porque está em causa uma pretensa dívida, de € 26.060,06 (à data de 06.11.1997, cfr. doc. nº 2-A junto com a p.i.) e um processo no qual está penhorada a casa de morada de família da Recorrente, o quantum a atribuir a título de indemnização deverá ser de montante nunca inferior a € 40.000,00, o que se requer.
LXXIII. Por outro lado, quanto à indemnização por danos não patrimoniais, face à conduta da 1ª R./Recorrida e às repercussões na esfera jurídica da Recorrente, nos termos supra explanados, e que, qualquer pessoa, colocada nas mesmas circunstâncias, sentiria, afigura-se adequada quantia nunca inferior a € 10.000,00, a título de indemnização por danos morais, o que se requer.
LXXIV. Por último, o Tribunal a quo, manteve a absolvição das 2ª R. e das Intervenientes dos pedidos contra elas formulados, com base na exclusão da cobertura do seguro.
LXXV. Contudo, a responsabilidade da 2ª R. e as Intervenientes resulta precisamente do contrato de seguro celebrado, que é obrigatório e cujas cláusulas, não são, oponíveis à Recorrente.
LXXVI. Neste domínio, veja-se o Acórdão desse Supremo Tribunal de Justiça, de 14.12.2016, disponível em www.dgsi.pt.
LXXVII. Entende-se por reclamação qualquer procedimento judicial ou administrativo iniciado contra qualquer segurado, ou contra o segurador, quer por exercício de acção directa, quer por exercício de direito de regresso, como suposto responsável de um dano abrangido pelas coberturas da apólice, cfr. nº 12 da Cláusula Primeira da apólice sub judice.
LXXVIII. De acordo com o disposto no art. 7º das condições gerais da apólice em causa, o tomador do seguro ou o segurado deverão comunicar, tão cedo quanto possível qualquer reclamação contra qualquer segurado, intenção de exigir responsabilidade a qualquer segurado e qualquer circunstância ou incidente que possa razoavelmente esperar-se vir a resultar em eventual responsabilidade.
LXXIX. Não impõe a aludida apólice qualquer prazo para tal comunicação.
LXXX.E, sem prejuízo, quer a participação disciplinar apresentada junto da Ordem dos Advogados Portugueses contra a 1ª R./Recorrida, quer a presente acção judicial, intentada quer contra aquela, quer contra a R. Mapfre, ocorreram durante o período de vigência da referida apólice, respectivamente em 27.02.2014 e 04.08.2014, ocorrendo as respectivas citações nesse mesmo ano.
LXXXI. Nessa medida, a reclamação foi apresentada durante o período de vigência da apólice de seguro nº 6…8 celebrada entre a Ordem dos Advogados Portugueses e a R. Mapfre, sendo a mesma, por isso, válida e ao abrigo da qual a 2ª R./Recorrida tem responsabilidade.
LXXXII. Assim, salvo o devido respeito, incorreu a douta sentença recorrida na violação e/ou incorrecta interpretação e aplicação do disposto nos arts. 342º, 344º, 346º, 349º, 352º, 353º, 358º, 363º, nº 3, 364º, 443º, nº 1, 494º, 496º, nº 1, 566º, nº 3 e 798º, todos do Código Civil, art. 104º, nº 1 do Estatuto da Ordem dos Advogados, art. 101º, nº 4 do DL nº 72/2008, de 16 de Abril, Código Deontológico dos Advogados da União Europeia, Lei 15/2005, de 26 de Janeiro, e arts. 5º, 412º, 413º, 607º, nº 4 e 5, e 662º, todos do CPC.
LXXXIII. Impõe-se, por tudo o supra exposto a revogação parcial do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, nos segmentos a), d), e) e f), e, consequentemente, condenadas as RR//Recorridas no pagamento à Recorrente de quantia nunca inferior a € 40.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento e no pagamento de quantia nunca inferior a € 10.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, tudo com as legais consequências»
Termos em que requer seja parcialmente revogado o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, nos segmentos a), d), e) e f), e, consequentemente, condenadas as rés recorridas no pagamento à recorrente de quantia nunca inferior a € 40.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento e no pagamento de quantia nunca inferior a € 10.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, mantendo-se o decidido nos capítulos b) e c), tudo com as legais consequências.
19. A ré, Mafre-Seguros Gerais, S.A. respondeu, concluindo as suas contra-alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
« 1. Por não concordar com as decisões proferidas pelo Tribunal de Primeira Instância e pelo Tribunal da Relação de Lisboa, vem a Recorrente interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento no alegado erro de interpretação de matéria de facto; na errada redação de alguns factos dados como provados; no facto de o quantum indemnizatório ser insuficiente face aos alegados danos sofridos pela Reclamante; e, ainda, por considerar que existe lugar à responsabilidade da Recorrida Mapfre.
2. Em consequência, pretende a Recorrente que sejam dados como provados factos sobre os quais, alegadamente, incidiu prova bastante; que seja alterada a redação de alguns factos provados; que seja alterado o quantum indemnizatório, condenando a Ré advogada e a Mapfre em quantia superior e; na atribuição de responsabilidade à seguradora Mapfre.
3. Conforme é consabido, apenas em situações manifestamente residuais poderá ser o Supremo Tribunal de Justiça ser chamado a reapreciar a matéria de facto julgada e considerada assente em sede de decisão proferida pelas instâncias, nomeadamente após a reapreciação operada pelo Tribunal da Relação;
4. Sendo, em regra, e conforme decorre claramente da norma legal constante do artigo 674.º, n.º 3 (segunda parte) do CPC, vedado à nossa Suprema Instância Jurisdicional a reapreciação da prova, e bem assim a sindicância dos factos materiais da causa anteriormente fixados, salvo quando se verifique uma violação e/ou ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência de determinado facto, ou que fixe a força de determinado meio de prova;
5. Os fundamentos alegados pela Recorrente que presumivelmente serviriam de base para a reapreciação da matéria de facto e alteração da mesma, não poderão ser considerados por não se enquadrarem em nenhuma das previsões legais contidas no artigo 674.º/1 do CPC;
6. De facto, a alegação de que deveriam ter sido considerados provados determinados factos por, alegadamente, sobre eles ter incidido prova bastante (nomeadamente prova testemunhal e documental), não é suscetível de ser reconduzida à alínea a) do artigo 674.º/1 do CPC;
7. Sendo certo ainda que, a mera consideração por parte da Recorrente de que determinados factos deveriam ser considerados como provados por, alegadamente, existir prova sobre os mesmos, não é passível de constituir um erro na apreciação da prova;
8. De facto, existindo no nosso ordenamento jurídico o princípio da livre apreciação da prova, não poderá existir censura à aplicação do referido princípio apenas e só porque da livre apreciação não resultou um entendimento coincidente com o da aqui Recorrente;
9. A censura apenas poderia resultar se de um facto onde fosse exigida, a título de exemplo, prova plena, o Juiz se ficasse pela livre apreciação da prova;
10. Sendo que, por força do princípio da livre apreciação da prova os factos poderão ser livremente apreciados desde que, conforme exposto, não violem disposições expressas ou a força probatória prevista para o caso concreto;
11. Não tendo existido qualquer violação, não poderá a Recorrente recorrer da matéria de facto, não podendo tal ser admitido.
12. Por outro lado, não tendo a Recorrente logrado demonstrar a existência de qualquer dano, nem a título de perda de chance (muito menos séria, real e credível), andou bem o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa em revogar a decisão anteriormente proferida pelo Tribunal de Primeira Instância – a qual, salvo o devido respeito, não considerou devidamente o instituto da perda de chance – proferindo decisão de absolvição da 1ª Ré quanto ao pagamento à Recorrente de indemnização a esse título;
13. Nos termos dos artigos 562.º, 563.º e 564.º do CC, só se poderá ressarcir a chance perdida quando a existência de chance puder ser provada;
14. Com efeito, se fosse outra a solução, criar-se-ia o caso de todos os alegados danos e chances que se afirmam ter sido perdidas, levarem à sua ressarcibilidade, o que não se poderá admitir, sob pena de ser possível a obtenção, por via da responsabilização civil de um advogado, e com base na doutrina da “perda de chance”, de um benefício patrimonial superior àquele que se teria obtido por via do “curso normal das coisas”;
15. Encontrando-se o processo parado e a aguardar a marcação da audiência de julgamento em momento prévio à constituição da Ré advogada como mandatária no processo (conforme facto provado n.º 20), não poderá ser afirmada a existência de qualquer omissão e/ou falta de diligência imputável à Ré advogada, não tendo igualmente a sua atuação profissional sido suscetível de gerar qualquer dano reclamado pela Recorrente;
16. Não poderá, in casu, ser afirmada a existência de qualquer (pretensa) perda de chance na medida em que além de a celeridade do prosseguimento dos autos, nomeadamente pela marcação de audiência de julgamento, não se encontrar na disponibilidade da 1.ª Ré, também não se poderá afirmar ter a A. perdido (em decorrência da atuação profissional posta em crise nos autos) qualquer chance e/ou oportunidade, passível de gerar um qualquer direito indemnizatório;
17. Assim, não tendo a Autora logrado provar que, se não fossem as alegadas condutas da Segurada sairia, com toda a certeza, vencedora na ação e, consequentemente, que a possibilidade de procedência da pretensão da Autora se ficou a dever à frustração da perda de chance, não se poderá ter como preenchido o conceito de perda de chance e a sua consequente indemnização.
18. Por outro lado, e no que respeita à pretensa responsabilidade da ora Recorrida, por via do contrato de seguro n.º 6…8 celebrado com a Ordem dos Advogados, sempre se dirá que, salvo melhor e douta opinião em contrário, atendendo à matéria de facto julgada provada nos autos, nunca poderá a ora Recorrida Mapfre responder pelos (pretensos) danos e/ou prejuízos reclamados nos autos pela Autora.
19. Na verdade, da matéria de facto julgada provada nos autos, resulta evidente que a Ré advogada, à data de início do período seguro da apólice n.º 6…8, garantida pela ora Recorrida, tinha perfeito e efetivo conhecimento da possibilidade de vir a ser responsabilizada pela Autora, em decorrência da atuação profissional posta em crise nos autos.
20. Podendo, assim, a Ré advogada razoavelmente prever, em data anterior ao início de vigência dos referidos contratos de seguro, que a sua atuação profissional no âmbito do patrocínio forense assumido perante a Autora poderia (ainda que em tese) gerar uma reclamação passível de acionar as coberturas e garantias na apólice de seguro de responsabilidade civil profissional, não podendo desconhecer e/ou desconsiderar a existência de tal risco;
21. Ora, de facto, e tal como resultou efetivamente demonstrado nos autos, nos termos da alínea a) do artigo 3.º das Condições Especiais da apólice 6…8, ficam expressamente excluídas da cobertura da apólice as Reclamações “por qualquer facto ou circunstância conhecidos do SEGURADO à data de início do período seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação”.
22. Efetivamente, o que releva para efeitos de aplicação da referida cláusula de delimitação de cobertura, é o facto e/ou circunstância que, sendo razoavelmente conhecido do segurado à data de início do período seguro, possa razoavelmente vir gerar uma reclamação.
23. Assim, prevendo, de facto, a apólice n.º 6…8 a retroatividade ilimitada quanto à data de ocorrência dos factos, encontra-se, contudo, a abrangência (ou não) de tais factos nas coberturas contratuais, delimitada pela data da tomada de consciência pelo segurado da possibilidade/razoabilidade de tais factos poderem conduzir à sua responsabilização civil.
24. De facto, a referida cláusula contratual, pese embora se encontre inserida num capítulo da apólice de seguro dedicado às exclusões, sendo assim impropriamente designada de “exclusão de pré-conhecimento”, assume a natureza de disposição delimitadora do objeto da apólice;
25. Nomeadamente por ser clarificadora da disposição de retroatividade temporal, limitando-se o seu âmbito de cobertura aos factos geradores de responsabilidade civil que, tendo sido cometidos em data anterior ao termo do período de vigência da apólice, sejam desconhecidos do segurado em data anterior ao início do período de vigência dessa mesma apólice.
26. Ora, de facto, das disposições legais constantes dos artigos 100.º e 101.º da LCS (DL 72/2008 de 16 de Abril), resulta limitar-se o seu âmbito de aplicação ao incumprimento da obrigação a cargo do segurado de participação de sinistro na vigência do contrato de seguro, âmbito esse que, como se tem por manifesto, não engloba a exclusão prevista na alínea a) do artigo 3.º das condições da apólice, a qual regula os “sinistros” conhecidos pelo segurado em data anterior ao início do período seguro;
27. Não impondo ao segurado (como em face do seu objeto não poderia impor), qualquer ónus de participação do sinistro.
28. Na verdade, a exclusão do sinistro da cobertura da apólice, nos termos previstos na alínea a) do artigo 3.º das condições particulares da apólice n.º 6…8, não resulta de qualquer relação e/ou incumprimento por parte do segurado, de deveres contratualmente estabelecidos.
29. De facto, como se tem por inequívoco, não poderá a exclusão em causa ser reconduzida a um incumprimento de uma obrigação (quer por parte do segurado, quer pelo tomador de seguro), quando o facto consubstanciador da exclusão é prévio à própria fonte das obrigações assumidas pelas partes, in casu, à própria celebração do contrato de seguro.
30. Assim, e como se tem por manifesto, o conhecimento por parte da seguradora de qualquer ato ou omissão do segurado, que este, em data anterior ao início de vigência do contrato, saiba ser potencialmente gerador de danos, não poderá deixar de ser determinante para a aferição do âmbito de cobertura da apólice.
31. Sendo, por razões evidentes, expressamente excluídos aqueles atos ou omissões já conhecidos pelos segurados, à data de início do período seguro;
32. O que, aliás, tem pleno respaldo no regime jurídico do contrato de seguro, nomeadamente no artigo 24.º, n.º 1 do DL 72/2008 de 16 de Abril;
33. De modo que, não sendo aplicável à “exclusão” prevista na alínea a) do artigo 3.º das condições particulares da apólice, o previsto no n.º 4 do artigo 101.º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, bem como a inoponibilidade do incumprimento das obrigações assumidas pelas partes ao terceiro é, novamente com o devido respeito, irrelevante para a sua aplicação a pretensa natureza obrigatória do contrato de seguro, sendo, consequentemente, despiciendas as considerações vertidas na douta sentença recorrida sobre esta matéria.
34. Nessa medida, e por tudo quanto se encontra exposto, sendo inequívoco que a Ré advogada, em data anterior a 01-01-2014, tem conhecimento dos factos e circunstância passíveis, ainda que em tese, de gerar a sua responsabilização civil perante a Autora (ou, no limite, uma reclamação, nos termos previstos na apólice de seguro garantida pela Ordem dos Advogados), sempre será de concluir (salvo o devido respeito por douta opinião em contrário) pela impossibilidade de responsabilização da seguradora, ora Recorrida, pelos danos presumivelmente decorrentes da atuação profissional da Ré advogada no âmbito do patrocínio assumido perante a Autora, nomeadamente por aplicação da cláusula contratual prevista no artigo 3.º, alínea a) das condições especiais da apólice, e bem assim do n.º2 do artigo 44.º da Lei do Contrato de Seguro (DL 72/2008 de 16 de Abril).
35. Deste modo, inexistindo lugar ao preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil previstos nos artigos483.º, 562.º, 563.ºe 564.º do CC, e consequente indemnização por ausência de dano, sendo ainda aplicável ao presente caso a exclusão de pré-conhecimento prevista no artigo 3.º, alínea a) da apólice, deverão improceder todas as conclusões da ora Recorrente, não merecendo o Douto Acórdão recorrido de qualquer censura, devendo ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se, na íntegra, a douta decisão recorrida».
20. A interveniente, Seguradoras Unidas, S.A., respondeu, concluindo as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
« a. Prevenindo-se a hipótese – que não se considera nem se aceita – de que o Recurso apresentado pela Recorrente tenha procedência e seja revogado o Acórdão recorrido, e na remota hipótese de recair qualquer responsabilidade perante a ora Recorrida, expõe-se o seguinte, na sequência da sua defesa;
b. A Recorrida nunca teve conhecimento dos factos constantes dos articulados da presente demanda e nem estes factos nem outros em momento algum, foram participados à Recorrida;
c. No ano de 2014, a responsabilidade civil profissional dos Advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados não se encontra transferida para a ora Recorrida pois a apólice em vigor e aplicável ao sinistro em questão é a subscrita pela Seguradora MAPFRE SEGUROS GERAIS, S.A.;
d. Assim, à Responsabilidade Civil Profissional emergente de actos e omissões imputados aos Advogados à data da primeira reclamação, portanto, em momento posterior às 00:00h do dia 01.01.2014, não se encontram cobertos pela Apólice contratada com a ora Recorrida, aos presentes autos, encontrando-se a mesma excluída;
e. A Recorrida é apenas e tão só responsável, na qualidade de Seguradora, para todas as Reclamações que lhe sejam primeiramente apresentadas durante o período de vigência da sua Apólice n.º 0002…9, o que não sucedeu no caso em apreço;
f. Face ao exposto, deverá manter-se a absolvição da Recorrida de acordo com o já determinado pela Douta Sentença proferida;
g. Sem conceder, a apólice subscrita pela Recorrida, tem como limite de indemnização o capital total de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros) por reclamação e anuidade, sendo este o limite máximo de capital indemnizável, tendo sido fixada uma franquia no montante global de € 5.000,00 (cinco mil euros) por sinistro, franquia essa que não é imputável à ora Recorrida e é da responsabilidade da Segurada 1ª Ré sendo deduzida de um eventual valor a indemnizar;
h. No caso em apreço, os factos em causa nunca foram reclamados à ora Recorrida, pelo que, tendo a Ré conhecimento prévio dos factos que lhe são imputados, e, nunca tendo comunicado os mesmos, e a possível responsabilização, decorrente do exercício das suas profissões de Advogada, nos termos em que se encontrava obrigada pelo contrato de Seguro aqui em questão e que constitui requisito prévio à assumpção, pela Seguradora Recorrida, de qualquer obrigação decorrente da Apólice 0002…9 devendo manter-se a absolvição do pedido».
Termos em que requer seja negado provimento ao recurso, mantendo-se o acórdão recorrido.
21. A autora respondeu, apresentando as seguintes conclusões, que se transcrevem:
« I. As Recorridas MAPFRE SEGUROS GERAIS, SA e SEGURADORAS UNIDAS, SA, sob a égide do disposto no art. 636º do CPC, requereram a ampliação do recurso, apenas e só no que concerne à sua responsabilidade, alegando para tanto a exclusão da cobertura da apólice do seguro ao caso sub judice.
II. Contudo, os recursos ampliados apresentados por MAPFRE SEGUROS GERAIS, SA e SEGURADORAS UNIDAS, SA devem ser rejeitados, por inadmissibilidade legal e ausência de fundamento, o que se requer.
III. Contudo, à cautela, caso assim não se entenda – o que não se concede – remete a Recorrente para as suas alegações de recurso de revista, cujo teor dá aqui por integralmente reproduzido, para todos os efeitos legais, por uma questão de economia processual.
IV. Em consequência, caso se conclua pela respectiva admissibilidade, deve ser negado provimento aos recursos ampliados apresentados por MAPFRE SEGUROS GERAIS, SA e SEGURADORAS UNIDAS».
16. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
***
II. Delimitação do objeto do recurso
Como é sabido, o objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do C. P. Civil, só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa[1].
Assim, a esta luz, as questões a decidir consistem em saber:
1ª- se houve errado uso pelo Tribunal da Relação dos poderes conferidos no art. 662º, nº 2 do CPC.
2ª- o acórdão recorrido padece da nulidade prevista no art. 615º, nº1, al. d) do CPC, por omissão de pronúncia;
B - da admissibilidade da ampliação dos recursos requerida pela ré Mapfre Seguros Gerais, SA e da interveniente, Seguradoras Unidas, SA, sob a égide do disposto no art. 636º do CPC.
***
III. Fundamentação
3.1. Fundamentação de facto
Foram dados como provados os seguintes factos:
1) A autora figura como oponente no processo executivo fiscal que corre termos sob o nº 42/07.5B…, na Unidade Orgânica I do Tribunal Administrativo e Fiscal de …, correspondente aos autos de oposição à execução fiscal nº 3…1/97/70…97, que corre termos da … Repartição de Finanças …, no âmbito do qual é imputada à ora autora uma dívida à “CGD, S.A.”, no valor de € 26.060,06, decorrente do contrato de mútuo celebrado com a autora e o seu falecido marido em 19.06.1981, no valor de PTE: 1.900.000$00.
2) No âmbito da execução referida em 1) encontra-se penhorada a fração autónoma designada pela letra “I”, correspondente ao 2º andar letra A do prédio urbano sito na Praceta …, nº …, freguesia da …, …, descrito na 2ª Conservatória do Registo sob o nº 4…6/19…0 e inscrita na respetiva matriz predial com o artigo 492, encontrando-se tal penhora registada no dia 17.10.1997, correspondendo à Ap. 05, de 06.11.1997.
3) A oposição judicial foi entregue na … Repartição de Finanças da … no dia 24.11.2006 e deu entrada no Tribunal Administrativo de … no dia 10.01.2007.
4) No âmbito do processo identificado em 1), a autora foi representada, quer no domínio da ação executiva quer nos autos de oposição por vários advogados, entre eles o Dr. GG, que procedeu à elaboração da oposição à execução, e desde 22.11.2007 pela Sr.ª Dr.ª HH.
5) O cheque no valor de € 1.850,00 entregue pela autora à 1ª ré foi apresentado a pagamento e descontado em conformidade.
6) No dia 08.07.2011, a 1ª ré enviou à autora a seguinte sms: Boa tarde Dª AA. Ainda estou a aguardar o despacho do Juiz, mas os Tribunais vão fechar agora no dia 15, o que vai remeter para setembro. O que até poderá ser benéfico uma vez que o Juiz vai mudar e o novo deverá despachar tudo até ao final do ano. Envio sms porque estou em formação. Assim que receba alguma notificação telefono imediatamente. Cumpri. BB”.
7) No dia 18.04.2012, a 1ª ré enviou à autora a seguinte sms: Senhora D. AA. Estou em … mas o desgraçado do Juiz ainda não me deu o processo confiado, vamos ver se amanhã tenho mais sorte. 1 bjs para a senhora. BB”
8) No dia 24.04.2012 a 1ª ré enviou à autora a seguinte sms: Boa tarde D. AA. Retirei tudo o que era importante do processo e que a colega não tinha. Estou a fazer nova análise pormenorizada para ver a melhor estratégia a adotar, uma vez que até agora nenhuma foi capaz de demover o Tribunal de continuar a enfiar a cabeça na areia. Logo que tenha novidades telefono-lhe. 1 bjs para a senhora. BB”.
9) No dia 03.10.2013 a autora revogou a procuração outorgada a favor da 1ª ré e apresentou, em 07.10.2013, nova procuração outorgada a favor do Sr. Dr. CC.
10) A 2ª ré e a Ordem dos Advogados de Portugal celebraram contrato de seguro de responsabilidade civil profissional titulado pela apólice nº 6…8, cuja cópia consta a fls. 73/77, as “Condições Particulares” a fls. 76/94 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, tendo como beneficiários “os advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados que exerçam a atividade em prática individual ou societária, por dolo, erro, omissão ou negligência profissional” e com período de vigência das 0,00 horas de 01.01.2014 às 0,00 de 01.01.2015.
11) A autora enviou à 1ª ré, para a morada do seu escritório, a carta cuja cópia consta a fls. 21vº dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, onde consta, para além do mais, “(…). Em 31.01.2013, remeti-lhe carta pedindo, além do mais que na circunstância é exigível, que passasse um substabelecimento sem reserva a favor do seu colega Senhor Dr. CC, e que fizesse chegar além do processo uma síntese informativa. Apesar do tempo já decorrido V.Exª não responde. (…). Isto sem prejuízo de promover o sancionamento a todos os níveis do seu inqualificável, mas histórico, comportamento. (…)”.
12) A carta referida em 11) foi enviada com aviso de receção que, em 01.04.2013, foi assinado por II.
13) A Interveniente “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.” e a Ordem dos Advogados de Portugal celebraram contrato de seguro de responsabilidade civil profissional titulado pela apólice nº 0002…9, com período de vigência de 24 meses, com data de início de 01.01.2012 às 0,00 horas e vencimento às 0,00 horas de 01.01.2014”.
14) A interveniente “Arch Insurance Company (Europe), Ltd” e a Ordem dos Advogados de Portugal celebraram contrato de seguro de responsabilidade civil profissional titulado pela apólice nº DP/01…8/11/C e nº DP/0…16/11/C, cujas “Condições Particulares” constam a fls. 288/311 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, com período de vigência de 01.01.2011 a 31.12.2011.
15) A 1ª ré não entregou o processo físico à autora.
16) A 1ª ré, até à data da apresentação da contestação, não havia apresentado nota de honorários e despesas à autora.
17) Por sugestão de uma amiga, a autora reuniu com a 1ª ré, em abril de 2011 e no escritório desta, a fim de indagar a disponibilidade da mesma para assumir o seu patrocínio na ação identificada em 1).
18) A 1ª ré aceitou assumir o patrocínio da autora, tendo referido que a autora teria que lhe outorgar substabelecimento sem reserva, entregar o processo físico que se encontrava no escritório do anterior advogado, bem como, para efeitos de provisão inicial a título de honorários e despesas, o pagamento da quantia de € 1.850,00.
19) A 1ª ré também entregou à autora o seu cartão de visita, fazendo menção que deveria contactá-la para o número de telefone ali constante.
20) À data da entrega do substabelecimento e do processo físico à 1ª ré, o pleito judicial em causa aguardava marcação de audiência final.
21) A autora, em 15.04.2011, entregou à 1ª ré o substabelecimento sem reserva a favor da mesma, o processo físico e um cheque no valor de € 1.850,00.
22) O processo físico entregue pela autora à 1ª ré continha os seguintes elementos: articulados apresentados àquela data no referido processo judicial; despachos e notificações recebidas até àquela data; correspondência, quer via postal, quer via fax, trocada entre a autora, e ainda com o seu falecido marido, e os advogados que os foram representando sucessivamente; correspondência trocada entre os vários advogados que representaram a autora e o seu falecido marido e os mandatários da “CGD, S.A.”; missivas enviadas pelo falecido marido da autora à “CGD, S.A.”; missivas enviadas pela “CGD, S.A.” ao falecido marido da autora; queixa ao Banco de Portugal sobre a “CGD, S.A.”, respetiva resposta do BdP e da “CGD”; vária documentação obtida pelos anteriores advogados, nomeadamente certidões emitidas pela … Repartição de Finanças …;
23) Da documentação referida em 22), fazia parte um documento da “CGD” fazendo menção a um valor de dívida inferior ao peticionado no processo fiscal.
24) Encontrava-se no processo físico entregue à 1ª ré documentação para ser entregue posteriormente em sede de audiência final ao processo judicial por uma questão de estratégia.
25) A autora não ficou na sua posse com qualquer cópia dos elementos referidos em 22) e 23).
26) A 1ª ré, naquele dia 15.04.2011, informou a autora de que iria pedir uma audiência ao Juiz do processo e que, eventualmente, poderia preparar uma ação crime conexa com o objeto do processo administrativo.
27) Posteriormente a 15.04.2011, a autora tentou diversas vezes contactar telefonicamente a 1ª ré e esta não atendia o telefone, com exceção das sms referidas 6), 7) e 8) e de um telefonema atendido em que referiu à autora que já tinha feito requerimentos ao Juiz devido à morosidade do processo.
28) A partir do mês de junho de 2012, e por ter constatado que nada havia sido efetuado no processo judicial, a autora e o seu advogado solicitaram à 1ª ré, por escrito e telefonicamente e por diversas vezes, a entrega do processo.
29) Até à data da apresentação da contestação a 1ª ré não respondeu, não entregou o processo físico nem prestou contas do valor de € 1.850,00.
30) Em consequência da atitude da 1ª ré, autora teve que recorrer ao Sr. Dr. CC, advogado, a quem entregou quantia que não foi possível apurar a título de honorários e despesas.
31) Em consequência da atitude da 1ª ré, a autora propôs a presente ação e terá que pagar à advogada a quem outorgou procuração nos presentes autos quantia que não foi possível apurar a título de despesas e honorários.
32) A autora, em consequência do comportamento da 1ª ré, sente-se enganada e irritada.
33) A ausência de respostas por parte da 1ª ré deixou a autora preocupada, ansiosa e receosa.
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Factos não provados:
A) A 1ª ré, intitulando-se especialista de direito, assegurou à autora que o processo se resolveria rapidamente porque, em face ao seu conhecimento especializado e experiência profissional, não se tratava de uma questão complexa;
B) O processo físico entregue pela autora à 1ª ré continha os seguintes elementos: todos os documentos originais, correspondência com informações essenciais nomeadamente sobre o desenvolvimento do contrato de mútuo, do sucedido na 1ª execução instaurada pela … Repartição de Finanças …, pelo mesmo crédito da CGD, S.A. e respetivos documentos; missivas enviadas pela “CGD, S.A.” ao falecido marido da autora com informação, distinta em cada momento, sobre o valor da dívida àqueles imputada;
C) A documentação foi prestada pela “CGD” e pela “… Repartição de Finanças” servia de contraprova a factos invocados na contestação à oposição;
D) A documentação referida em G) e H) era apta a demonstrar a inexistência de dívida da autora para com a “CGD” e, como tal, a sua ausência no processo judicial compromete o sucesso da pretensão da autora, obrigando a autora a pagar à “CGD” a quantia de € 26.060,06, acrescida de juros de mora;
E) Para proceder ao pagamento referido em D) a autora terá que perder a sua casa de habitação;
F) A 1ª ré deslocou-se ao Tribunal por diversas vezes na tentativa de consultar e conseguir obter uma audiência com o Juiz titular, tendo sempre obtido informação que os autos se encontravam no gabinete do Juiz a aguardar despacho;
G) À 1ª ré não foi entregue a carta referida em 11) e 12).
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3.2. Fundamentação de direito
Conforme já se deixou dito, o objeto do presente recurso prende-se com as questões de saber:
1ª- se houve incorreto uso pelo Tribunal da Relação dos poderes conferidos no art. 662º, nº 2 do CPC.
2ª- se o acórdão recorrido padece da nulidade prevista no art. 615º, nº1, al. d) do CPC, por omissão de pronúncia;
3º- da admissibilidade e do mérito da ampliação do objeto do recurso requerida, subsidiariamente, pela ré Mapfre Seguros Gerais, SA e pela interveniente principal Seguradoras Unidas, SA.
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3.2.1. Quanto à primeira das questões supra enunciadas, insurge-se a autora contra o acórdão recorrido por ter indeferido a ampliação da decisão sobre a matéria de facto relativamente aos factos por ela alegados nos artigos 10º, 11º, 24º, 26º, 34º, 67º, 91º, 94º, 95º, 96º, 97º, 101º, 110º a 128º, 148º, 149º, 150º, 153º, 154º, 156º a 161º, 180º, 209º, 210º, 215º, 216º, 217º, 218º, 220º, 221º e 228º da sua petição inicial, com o consequente aditamento à matéria de facto dada como provada, dos seguintes factos:
a) A A. muito estranha e sente-se preocupada pela demora que se verifica no processo identificado em 1) até à presente data, o que desabafa com os seus familiares e amigos - , por força do depoimento das testemunhas DD, EE, FF e Dr. CC, depoimento de parte da 1ª R., ora Recorrida e próprias declarações de parte da A., aqui Recorrente - cfr. transcrição da apelação;
b) A 1ª R. assegurou à A. que o processo se resolveria rapidamente, e que face ao seu conhecimento especializado, experiência profissional e contactos, não se tratava de uma questão muito complexa, e, por isso, a A. acreditou na 1ª R. e sentiu confiança na mesma - , por força do depoimento das testemunhas DD e FF, depoimento de parte da 1ª R., ora Recorrida e próprias declarações de parte da A., aqui Recorrente - cfr. transcrição patente na apelação.
c) O único requerimento que a 1ª R. juntou ao processo identificado em 1), em representação da A., corresponde ao requerimento de junção do estabelecimento, apresentado em juízo, pessoalmente, no dia 20.05.2011,
d) No período em que a 1ª R. foi advogada da A., o processo identificado em 1) não teve qualquer desenvolvimento - , ambos por força das declarações da testemunha Dr. CC, as declarações de parte da Recorrente, depoimento de parte da 1ª R./Recorrida, e da certidão junta com o requerimento de 20.02.2017.
e) A 1ª R. afirmou à A., cfr. factos 6), 7) e 8), ter praticado actos e diligências que não levou a cabo, como apresentação de requerimentos a pedir a confiança do processo, como a própria consulta do processo e confiança do mesmo, como análise pormenorizada do mesmo, pelo que a 1ª R. prestou informações falsas à A.- , por força dos factos provados sob os números 6), 7) e 8), declarações da testemunha Dr. CC, declarações de parte da Recorrente e o depoimento de parte da 1ª R./Recorrida.
f) A manutenção do processo físico entregue pela A. à 1ª R., na posse desta, porque o mesmo contém os documentos mencionados sob os números 22), 23) e 24), prejudica e compromete o sucesso da pretensão da A. no processo identificado em 1), pois a sua junção não é possível, e tais documentos são aptos a demonstrar a inexistência da dívida da A. para com a CGD, e servem de contraprova a factos invocados na contestação à oposição,
g) O que causa à A. um forte sentimento de incerteza e receio - , ambos por força das declarações prestadas pelas testemunhas DD, EE, declarações de parte da Recorrente e depoimento de parte da 1ª R./Recorrida, art. 412º do CPC e regras de experiência comum.
h) Caso a oposição à execução fiscal identificada em 1) venha a ser julgada improcedente, a A. perderá o imóvel que se encontra penhorado, cfr. facto 2), que constitui a casa de morada de família, onde a A. reside com o seu filho, FF;
i) A A. está desempregada desde Outubro de 1996, vive com dificuldades financeiras, dependendo da ajuda de amigos e familiares para sobreviver;
j) A A. não tem condições financeiras para pagar a dívida reclamada no processo identificado em 1),
k) O montante pago pela A. à 1ª R., mencionado em 5) e 21), foi emprestado àquela pela amiga DD - , todos por força das declarações das testemunhas DD, EE, FF, declarações de parte da Recorrente e documento nº 9 junto com a p.i.
l) A A., em consequência do comportamento da 1ª R., sente-se incrédula com a falta de zelo e diligência desta, desapontada, frustrada, zangada, com um forte sentimento de injustiça, abalada na sua convicção e confiança nos profissionais do foro, de quem esperava um comportamento exemplar, e sente-se defraudada nas suas expectativas - , por força das declarações das testemunhas DD, EE, FF, Dr. CC e declarações de parte da Recorrente, bem como art. 412º do CPC e regras de experiência comum.
Mais sustenta que, ao não admitir a requerida ampliação da matéria de facto e ao não atender à pretensão formulada pela apelante, em sede de recurso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, no sentido de ser alterada a redação dos nºs 25 e 29 dos factos dados como provados pelo Tribunal de 1ª Instância e da factualidade vertida nas alíneas A), C), D) e E) ser eliminada dos factos dados como não provados pelo Tribunal de 1ª Instância e passar a integrar os factos provados, o Tribunal da Relação usou incorretamente os seus poderes quanto à modificação da decisão sobre a matéria de facto.
Daí persistir na ampliação da matéria de facto nos termos propostos e na alteração da decisão da matéria de facto quanto aos factos dados como provados nos nºs 25 e 29, que, segundo ela, devem passar a ter a seguinte redação:
25) A autora não ficou na sua posse com qualquer cópia dos elementos referidos em 22), 23) e 24).,
Isto porque, como resultou da prova produzida e como resultou da convicção formada pela M.ª Juíza da 1ª Instância, a recorrente entregou o processo físico à 1ª ré/ recorrida, com os elementos descritos nos números 22) a 24) e não reservou para si qualquer cópia, de nenhum deles, incluindo a documentação para ser entregue posteriormente em sede de audiência final no processo judicial por uma questão de estratégia.
29) Até ao fim da discussão da causa nestes autos, a 1ª Ré não respondeu, não entregou o processo físico nem prestou contas do valor de € 1.850,00.
Isto porque é o que resulta do depoimento de parte da ré BB e das declarações de parte da autora.
Que dizer ?
Desde logo que, consabido que a ampliação da matéria de facto, nos termos do citado art. 662º, nº 2, al. c) e nº 3, só se justifica nas situações em que não tenham sido valorados factos essenciais, a tarefa que se nos impõe é a de indagar se a factualidade alegada pela autora nos artigos 10º, 11º, 24º, 26º, 34º, 67º, 91º, 94º, 95º, 96º, 97º, 101º, 110º a 128º, 148º, 149º, 150º, 153º, 154º, 156º a 161º, 180º, 209º, 210º, 215º, 216º, 217º, 218º, 220º, 221º e 228º da sua petição inicial reveste, ou não, essa natureza.
E a este respeito a nossa resposta não pode deixar de ser negativa, pois os factos alegados nos arts 10º, 11º, 91º, 148º, 149º, 150º, 153º, 154º e 156º a 161º, 180º, 209º, 210º, 215º, 216º, 217º, 218º, 220º, 221º e 228º não se revestem de qualquer interesse para a decisão da causa; os factos alegados nos arts. 24º e 26º, já foram objeto de apreciação, constando dos factos dados como não provados sob a alínea A); os factos alegados no art. 34º, já foram objeto de apreciação, a eles se referindo os factos dados como provados no nº 22 e os factos considerados como não provados e constantes da alínea B); os factos alegados nos arts. 67º e 101º da petição inicial, não têm qualquer interesse para a decisão da causa, ante os factos dados como provados no nº 28; os factos alegados nos arts. 94º, 95º, 96º e 97º não têm qualquer interesse para a decisão da causa, pois não se concretizam os atos nem as diligências que a ré advogada afirmou ter praticado; os factos alegados nos arts. 110º a 128º constam já dos factos dados como não provados sob as alíneas C), D) e E).
Por outro lado, quanto à pretendida eliminação dos factos dados como não provados sob as alíneas A), C), D) e E), com a consequente integração na matéria de facto dada como provada, e à requerida alteração da redação dada aos nºs 25 e 29º dos factos dados como provados, importa ter em conta, por um lado, que, no que concerne à reapreciação da decisão de facto, incumbe ao Tribunal da Relação formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em 1.ª instância e objeto de impugnação, de acordo com as provas produzidas constantes dos autos e à luz do critério da sua livre e prudente convicção, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC, em ordem a verificar a ocorrência de erro de julgamento.
E que, nesta matéria, cabe apenas ao Tribunal de revista ajuizar se o Tribunal da Relação, no desempenho daquela sua função, observou, quer a disciplina processual a que aludem os arts. 640º e 662º, nº 1, quer o método de análise crítica da prova prescrito no art. 607º, nº 4, aplicável por força o disposto no art. 663º, nº 2, todos do CPC, sem imiscuir-se na valoração da prova feita pelo Tribunal da Relação, segundo o critério da sua livre e prudente convicção.
De salientar ainda que não compete ao Tribunal de revista sindicar o erro na livre apreciação das provas, salvo quando, nos termos do artigo 674.º, n.º 3, do CPC, a utilização desse critério de valoração ofenda uma disposição legal expressa que exija espécie de prova diferente para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova, ou ainda quando aquela apreciação ostente juízo de presunção judicial revelador de manifesta ilogicidade.
No caso em apreço, o Tribunal de 1ª instância considerou provados os factos supra descritos no nº 25 « com fundamento nas declarações de parte da autora e no depoimento da testemunha JJ (…)» e no nº 29 « com fundamento no depoimento de parte da 1ª ré (…) ».
E considerou não provados os factos descritos sob a alínea:
A) « por não ter sido apresentada prova convincente, sendo que a única prova apresentada foram as declarações de parte da autora e esta apenas referiu que a 1ª ré lhe referiu que trabalhava em todo o tipo de processos» ;
C) « com fundamento nos seguintes elementos: depoimento de parte da 1ª ré (…) ; depoimento da testemunha DD (…); depoimento da testemunha EE (…); depoimento da testemunha JJ (…); declarações de parte da autora (…)».
D) « por não ter sido apresentada prova inequívoca sobre o teor do referido documento e os reflexos que o mesmo poderia ter no despacho do processo judicial pendente no Tribunal administrativo».
E) «por não ter sido apresentada prova convincente sobre a situação económica da autora, nomeadamente documental, desconhecendo o Tribunal se poderia obter, nomeadamente, ajuda financeira familiar ou bancária. A prova apresentada limitou-se a afirmações efetuadas pelas testemunhas amigas e familiares da autora e pela própria autora que, desacompanhadas de outros elementos de prova se mostraram insuficientes para que o Tribunal considerasse provado o referido facto».
Por sua vez, em sede de apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, decidiu o Tribunal da Relação inexistir fundamento para alterar tal decisão, não se vislumbrando existir, relativamente aos factos dados como provados nos nºs 25 e 29º, o lapso invocado pela autora/apelante.
Assim sendo e porque a atividade de valoração das declarações de parte da autora e da 1ª ré e da prova testemunhal inscreve-se no âmbito da livre da prova pelo Tribunal da Relação (cfr. art. 466º, nº 3 do CPC e art. 396º do C. Civil) e ainda porque, no caso vertente e no confronto entre a fundamentação do Tribunal da 1.ª Instância e a do Tribunal da Relação, não se depreende que, na apreciação do pontos de facto acima em referência, o Tribunal a quo tenha infringido qualquer norma legal probatória expressa que exija certa espécie de prova para os factos em causa ou que fixe a força de determinado meio de prova, nem se descortina que a apreciação do Tribunal a quo colida com qualquer elemento concreto e específico resultante da imediação do juiz da 1.ª instância, arredada fica a possibilidade de formulação, por parte do STJ, de quaisquer juízos de valor acerca da livre convicção formada pelo Tribunal da Relação.
Termos em que improcedem todas as razões da recorrente.
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3.2.2. Sustenta a recorrente padecer o acórdão recorrido da nulidade prevista no art. 615º, nº1, al. d) do CPC, por, não obstante ter, em sede de recurso de apelação, pugnado pela apreciação dos segmentos a), d), e) e f) do dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, o Tribunal da Relação, não conheceu dessas questões, sendo certo que a procedência da apelação interposta pela ré BB não prejudicava o seu conhecimento.
Segundo a alínea d) do n.º1 do citado artigo 615º do CPC, aplicável aos acórdãos da Relação por via da norma remissiva do n.º 1 do art.º 666.º do mesmo Código, é nula a decisão «quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
Este vício, conforme jurisprudência unânime, traduz-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever prescrito no n.º 2 do art. 608º do CPC (aplicável aos acórdãos da Relação por força do disposto no nº 2 do art. 663º do mesmo diploma) e que é, por um lado, o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras.
E, por outro lado, o dever de ocupar-se tão somente das questões suscitadas pelas partes e/ou daquelas que a lei lhe impuser o conhecimento oficioso.
Assim, como vem sendo entendimento pacífico, tanto doutrinária como jurisprudencialmente, para tal efeito relevam apenas as questões que diretamente contendam com a substanciação da causa de pedir, pedido e exceções que hajam sido deduzidas pelas partes ou que devam ser suscitadas oficiosamente[2].
Particularmente, na fase de recurso, constituem ainda questões solvendas, as que delimitam o objeto daquele e que se traduzem, quer nos invocados erros de direito na determinação, interpretação e aplicação das normas que constituem fundamento jurídico da decisão, nos termos do disposto no art.º 639.º, n.º 2, do CPC, quer, em sede de impugnação da decisão de facto, na especificação dos pontos de facto tidos por incorretamente julgados e que cumpre ao impugnante indicar nos termos do art.º 640.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código.
Dos elementos constantes dos autos, verifica-se que:
i) A sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condenou a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização por dano decorrente de perda de chance, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação da 1ª R. até efetivo e integral pagamento;
b) Condenou a 1ª Ré a restituir à Autora a quantia de € 1.850,00, deduzida da quantia que vier a apurar-se ser devida a título de despesas e honorários;
c) Condenou a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia que vier a apurar-se em posterior incidente de liquidação, a título de indemnização, correspondente ao montante de honorários e despesas pagos pela autora ao Exmo. Sr. Dr. CC até ao montante de € 980,00;
d) Condenou a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 2.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;
e) Absolveu a 1ª R. do demais peticionado pela Autora;
f) Absolveu a 2ª Ré e as intervenientes dos pedidos formulados pela Autora.
ii) Inconformada com esta decisão, no que concerne apenas ao segmento constante da alínea a), ou seja, na parte em que a condenou no pagamento à autora de € 10.000,00 a título de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação da 1.ª ré até efetivo e integral pagamento’’, dela apelou a ré BB para o Tribunal da Relação de Lisboa.
iii) Igualmente inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, no que respeita à decisão de facto e aos segmentos decisórios constantes das alíneas a) [quanto ao quantum fixado a título de indemnização pelo dano de perda de chance, pugnando pela fixação do montante de € 40.000,00 ], d) [quanto ao quantum fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais, pugnando pela fixação do montante de € 10.000,00], e) [ quanto à absolvição da ré BB dos demais peticionado pela autora] e f) [quanto à absolvição da ré, Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e das intervenientes, Arch Insurance Company (Europe) Ltd e “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, dos pedidos formulados pela autora], dela apelou a autora para o Tribunal da Relação de Lisboa.
iv) A ré “Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e as intervenientes principais, Seguradoras Unidas, S.A e Arch Insurance Company (Europe), Ldt, requereram, subsidiariamente e nos termos do disposto no art. 636º, nº1 do CPC, a ampliação do objeto do recurso.
v) Em 08.11.2018, o Tribunal da Relação proferiu acórdão que, embora, considerando que « a atuação da Senhora Advogada BB, conforme decorre da matéria de facto (Factos nº 27 a 29) para com a sua constituinte não primou por grande profissionalismo e respeito para quem tinha uma ação em Tribunal», entendeu que «isso não quadra a figura da perda de chance» e, consequentemente, julgou procedente a apelação da ré BB e improcedente a apelação de AA e revogou a sentença recorrida na parte em que condenou a ré, BB, a pagar à autora a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização pelo dano de perda de chance, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data de citação da 1ª ré até efetivo e integral pagamento.
Mais decidiu não apreciar os recursos subsidiários, mantendo «os restantes capítulos b) a f) da sentença».
Ora, o que resulta deste quadro factual, com bastante clareza e evidência, é que, relativamente ao recurso de apelação interposto pela autora, o Tribunal da Relação apenas apreciou da questão da indemnização devida à autora, a título de perda de chance [correspondente à alínea a) do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância], omitindo qualquer pronúncia sobre as demais questões suscitadas pela autora no seu recurso de apelação, ou seja, quanto ao montante da indemnização arbitrada à autora, a título de danos não patrimoniais [correspondente à alínea d) do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância], quanto à absolvição da ré BB dos demais peticionado pela autora [correspondente à alínea e) do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância], quanto à absolvição da ré, Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e das intervenientes, Arch Insurance Company (Europe) Ltd e “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, dos pedidos formulados pela autora [correspondente à alínea f) do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância].
E sendo assim, forçoso é concluir pela verificação do alegado vício de omissão de pronúncia, pois não sofre dúvida ter o Tribunal da Relação deixado de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar e cuja apreciação lhe foi suscitada pela autora no âmbito do recurso de apelação, fazendo parte do respetivo objeto.
Deste modo, assente que o acórdão recorrido, enferma, nesta parte, do vício de omissão de pronúncia previsto na alínea d) do nº1 do art. 615º, nº1 e atenta a inaplicabilidade do preceituado no art. 665º, nº 2, face ao disposto no art. 679º, todos do CPC, impõe-se, revogar, nesta parte, o acórdão recorrido e determinar a remessa dos autos ao Tribunal da Relação para que nele sejam apreciadas, em primeira mão, as questões omitidas[3], incluindo as questões que foram objeto da ampliação do recurso de apelação requerida pela ré “Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e pelas intervenientes principais, Seguradoras Unidas, S.A e Arch Insurance Company (Europe), Ldt e cujo conhecimento foi considerado prejudicado pelo acórdão recorrido.
Daí que, procedendo, nesta parte o recursão de revista interposto pela autora, fica prejudicado o conhecimento, no âmbito do presente recurso de revista, das questões quer da inadmissibilidade da ampliação do objeto do recurso, requerida, a título subsidiário, pela ré “Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e pela interveniente principal, Seguradoras Unidas, S.A, suscitada pela autora, quer do respetivo mérito.
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IV – Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal em julgar parcialmente procedente o recurso de revista interposto pela autora e determinar a remessa dos autos ao Tribunal da Relação de Lisboa, para este:
a) Apreciar, em primeira mão, as questões omitidas, ou seja, quanto ao montante da indemnização arbitrada à autora, a título de danos não patrimoniais [correspondente à alínea d) do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância], quanto à absolvição da ré BB dos demais peticionado pela autora [correspondente à alínea e) do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância], incluindo as questões que foram objeto da ampliação do recurso de apelação requerida pela ré “Mapfre Seguros Gerais, S.A.” e pelas intervenientes principais, Seguradoras Unidas, S.A e Arch Insurance Company (Europe), Ldt e cujo conhecimento foi considerado prejudicado pelo acórdão recorrido.
b) Julgar em conformidade.
Custas a final.
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Supremo Tribunal de Justiça, 6 de fevereiro de 2020
Maria Rosa Oliveira Tching (Relatora)
Catarina Serra
José Manuel Bernardo Domingos
[1] Vide Acórdãos do STJ de 21-10-93 e de 12-1-95, in CJ. STJ, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19, respetivamente.
[2] Neste sentido, Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, in “Código de Processo Civil Anotado”, 2º volume, pág. 646 e, entre muitos outros, o Acórdão do STJ de 11.02.2015 (proc. nº 1099/11) in Sumários, 2015, pág. 67.
[3] Neste sentido, cfr. Abrantes Geraldes, in, “ Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª edição, 2018, págs. 425 a 427, Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 11/15 e Acórdão do STJ, de 04.04.2017 (processo nº 5371/15) , acessível in wwwdgsi.pt/stj.