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ECLI:PT:STJ:2020:233.12.7TBMIR.C1.S1

Relator: Maria da Graça Trigo

Descritores: Liquidação; Liquidação ulterior dos danos; Pedido genérico; Ónus da prova; Ónus de alegação; Dano; Equidade

Processo: 233/12.7TBMIR.C1.S1

Data do Acordão: 07/05/2020

Votação: Unanimidade

Texto Integral: S

Meio Processual: Revista

Decisão: Negadas as revistas

Indicações eventuais: Transitado em julgado

Área Temática: 2ª Secção (Cível)

Sumário

I - Dispondo o art. 556.º, n.º 1, al. b), do CPC que é permitido formular pedidos genéricos Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil, admite-se como consequência que a condenação em quantia a liquidar nos termos do art. 609.º, n.º 2, do mesmo Código, poderá ter lugar tanto nos casos em que é deduzido um pedido genérico não subsequentemente liquidado (...) como naqueles em que o pedido se apresenta determinado, mas os factos constitutivos da liquidação da obrigação não são provados.
II - Na base de uma interpretação lata do n.º 2 do art. 609.º do CPC, actualmente dominante na jurisprudência do STJ, segundo a qual, provada a realidade de um dano, a eventual insuficiência da prova de elementos relevantes para o quantificar, ainda que por fracasso da actividade probatória do lesado, não impede a utilização do mecanismo da condenação genérica, afigura-se estar a ideia, extraída do regime do art. 569.º do CC (conjugado com o do art. 556.º, n.º 1, al. b), segunda parte, do CPC) segundo a qual não impende sobre o lesado o ónus de avançar logo com todos os elementos necessários para especificar cabalmente o dano sofrido; sendo-lhe facultada a possibilidade de formular um pedido genérico, não deverá ser afectado negativamente pela opção de ter avançado com um pedido específico, cujos elementos factuais não logrou, porém, demonstrar inteiramente. 
III - Contudo, para não se distorcerem as regras gerais de distribuição do ónus da prova consagradas no CC, com o inerente efeito cominatório do art. 414.º do CPC, a possibilidade de condenação em quantia a liquidar pressupõe, necessariamente, que o lesado conseguiu demonstrar tanto a existência como o “núcleo essencial” do dano em causa.
IV - Há, por outro lado, um limite evidente: se, na acção, a respeito de certo dano invocado, são julgados não provados determinados factos relevantes para a sua delimitação e quantificação, tal decisão negativa, por força do respeito pelo caso julgado formal, terá de ser respeitada no incidente de liquidação, não sendo obviamente admissível que, no âmbito de um mesmo processo, certo facto seja sucessivamente considerado como provado e não provado.
V - As condicionantes, assim enunciadas, à orientação jurisprudencial dominante, correspondente à interpretação referida nos pontos I e II, conduzem a que, na resolução dos casos concretos, se circunscrevam afinal as consequências práticas entre a adopção da interpretação lata ou restrita do n.º 2 do art. 609.º do CPC.
VI - No caso dos autos – tendo as rés sido consideradas responsáveis pelo cumprimento defeituoso de “contrato de construção com chave na mão” de uma unidade de piscicultura – não merece censura o entendimento do tribunal a quo segundo o qual será possível, em sede de incidente de liquidação, apurar o valor a indemnizar pelo consumo extraordinário de oxigénio, designadamente com recurso à produção de prova pericial; e segundo o qual, ainda que não seja possível apurá-lo com exactidão, será possível fazê-lo em termos mais aproximados, o que permitirá uma decisão mais justa.
VII - Tampouco merece censura a decisão da Relação que revogou o segmento da sentença que julgou improcedente o pedido indemnizatório pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período compreendido entre Maio de 2009 e Maio de 2010, substituindo esse segmento pela decisão de condenação dos réus no que se vier a liquidar.
VIII - Sendo também de manter a decisão que revogou a condenação dos réus a pagar à autora a quantia de € 1 550 000,00, a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora entre Abril de 2009 e Maio de 2010, substituindo-a por decisão a condenar no que se vier a liquidar.
 

Decisão Texto Parcial

Não disponível.

Decisão Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

 

1. Acuinova – Actividades Piscícolas S.A. instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra:

1. Acupm – Agrupamento Construtor de uma Unidade de Piscicultura de Mira, ACE;

2. Impulso Industrial Alternativo, S.A.;

3. Mapfre Seguros Gerais, S.A.;

4. Arch Insurance Company (Europe), Ltd, Sucursal em Espanha,

Pedindo a condenação dos RR. no pagamento da quantia de € 15 001 743,61 (quinze milhões mil setecentos e quarenta e três euros e sessenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em síntese, o seguinte:

 - A A. é uma sociedade comercial que tem como actividade social a exploração da aquicultura e outras actividades piscícolas, pesca, acondicionamento e transformação industrial, importação e exportação de peixe capturado ou produzido em aquicultura;

- Em 23 de Agosto de 2007, como dono da obra, celebrou com as sociedades Somague- Engenharia, S.A., Monte Adriano – Engenharia e Construção S.A., e Sacyr S.A.U, como empreiteiras, um contrato denominado “contrato de construção com chave na mão”, com vista à construção de um estabelecimento de piscicultura na localidade da …, que foi objecto de cinco aditamentos;

- As sociedades empreiteiras constituíram entre si um agrupamento complementar de empresas, o 1.º R., a quem cederam a posição contratual no contrato de construção, transmitindo-se para ele todos os direitos e deveres emergentes do contrato de construção;

- A 2ª R. é a autora do projecto de engenharia e construção relativo ao estabelecimento de piscicultura que constituiu a obra a cuja execução se dirigiu o contrato de empreitada;

- Além de projectista, a 2.ª R. foi ainda incumbida da fiscalização da execução dos trabalhos;

- Nos dias 11 e 12 de Abril de 2009 ocorreu na unidade de aquicultura da A. um incidente consistente na entrada massiva de areias e lodos misturados com algas procedentes do fundo do mar através do emissário de captação n.º 1;

- A entrada de areias e lodos ocorreu devido a uma falha na junção entre os tubos 1 e 2 dos tubos de betão do sistema de captação n.º 1, falha que radicou em factos imputáveis aos dois primeiros RR., designadamente inadequação da reparação feita, em Outubro de 2008, ao troço de betão do sistema de captação n.º 1, concepção e planificação deficientes da obra e sobredragagem e outros erros de construção;

- A entrada massiva de areias e lodos na unidade de aquicultura da A. causou-lhe danos elevadíssimos, consistentes na morte de um elevado número de pregados, perdas de benefícios em consequência da não comercialização dos peixes mortos e da não inclusão na quantidade que estava prevista de peixes jovens no processo produtivo e em custos com limpeza, reparação, monitorização e operação com os tanques no período de Abril de 2009 a Maio de 2010;      

- O 1º R. está obrigado a indemnizar os danos sofridos pela A. por ter cumprido defeituosamente o contrato de empreitada;

- A 2ª R. está obrigada a indemnizar os danos, em primeiro lugar, por ter elaborado o projecto de execução da obra com defeitos e erros de concepção e, em segundo lugar, por ter fiscalizado de modo deficiente a execução da obra;

- A R. Mapfre - Seguros Gerais, S.A. está obrigada a indemnizar os danos porque celebrou com o 1.º R. um contrato de seguro de obras, tendo como objecto a empreitada de construção de uma unidade aquícola para engorda e processamento de pregado em … – …, e nele são segurados o 1.º R., como empreiteiro, e todos os empreiteiros e subempreiteiros que intervenham de forma directa na execução física da obra segurada e cujo orçamento esteja incluído no valor seguro, e a A., na qualidade de dona da obra;

- A sua obrigação de indemnização deriva ainda do facto de ser a seguradora líder da Somague – Engenharia, S.A. e das empresas do grupo Sacyr Vallehermoso, garantindo o respectivo contrato de seguro o risco de responsabilidade civil profissional e, por declaração de 12 de Novembro de 2007, fez constar expressamente, quanto a este seguro, que se considerava segurada na respectiva apólice o 1.º R., na qualidade de empreiteiro da obra projecto de execução aquícola de engorda de pregado, e como segurada adicional a A., na qualidade de dona da obra;

- A 4ª R., Arch Insurance Company, é responsável pelos danos com fundamento em contrato de seguro celebrado com a 2ª R., que cobre os danos resultantes do acidente em causa nos autos.

Os RR. contestaram a acção.

A defesa do Acupm – Agrupamento Construtor de uma Unidade de Piscicultura de Mira, ACE consistiu, em síntese, na impugnação das causas do incidente de Abril de 2009 (entrada massiva de areia e logos na instalação da A.) e na atribuição da responsabilidade da ocorrência à A., como dona da obra, e à 2.ª R., como projectista e fiscalizadora, assim como na impugnação dos danos alegados.

A R. Mapfre Seguros Gerais, S.A. alegou na sua defesa que nenhuma responsabilidade podia ser assacada ao seu segurado (o R. Acupm) porque este efectuou as obras de construção do emissário em conformidade com o projecto aprovado e nos melhores termos técnicos e profissionais. Quanto aos danos alegados, impugnou-os.

As RR. Impulso Industrial Alternativo, S.A. e Arch – Insurance Company (Europe), Ltd. alegaram na sua defesa que os danos, cuja indemnização é reclamada, tiveram origem em factos imputáveis à própria A. e ao R. Acupm. Impugnaram os danos alegados.

A A. respondeu.

O processo prosseguiu os seus termos e, com data de 15 de Maio de 2018, foi proferida sentença que decidiu:

“1. Condenar o réu ACUPM – Agrupamento Construtor de uma Unidade de Piscicultura em Mira, a pagar à autora a quantia de € 2 187 309,98 (dois milhões cento e oitenta e sete mil e trezentos e nove euros e noventa e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até ao efectivo e integral pagamento;

2. Condenar a ré Impulso Industrial Alternativo a pagar à autora a quantia de € 385 995,88 (trezentos e oitenta e cinco mil novecentos e noventa e cinco euros e oitenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até ao efectivo e integral pagamento;

3. Condenar a ré Mapfre a suportar a quantia referida em 1) deduzida da franquia de € 6 000 (seis mil euros);

4. Condenar a ré Arch Insurance a suportar a quantia referida em 2) deduzida da franquia de 10%, € 38 599,59 (trinta e oito mil quinhentos e noventa e nove euros e cinquenta e nove cêntimos);

5. Absolver a ré do demais peticionado;

6. Absolver as rés do pedido de condenação como litigantes de má-fé.”

 

Interpôs a A. recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, pedindo a alteração da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

Interpuseram recursos subordinados o R. Acupm, ACE e os RR. Arch Insurance Company (Europe), Ltd. e Impulso Industrial Alternativo, S.A., impugnando também a matéria de facto e pedindo a reapreciação da decisão de direito.

Por acórdão de 10 de Julho de 2019 foi proferida a seguinte decisão:

“Julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pela autora e, em consequência:

1.         Revoga-se o segmento da sentença que condenou os réus a pagar à autora a quantia de catorze mil oitocentos e sessenta e nove euros e quarenta e oito cêntimos [€ 14 869,48], a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio, e substitui-se o mesmo por decisão a condenar os réus no pagamento à autora no que se vier a liquidar, com dedução, em relação às rés Mapfre e Arch, das franquias contratuais;

2.         Revoga-se o segmento da sentença que julgou improcedente o pedido de condenação dos réus no pagamento à autora de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, e substitui-se o mesmo por decisão a condenar os réus no que se vier a liquidar;   

3.         Revoga-se o segmento da sentença que condenou os réus no pagamento à autora da quantia de um milhão e quinhentos e cinquenta mil euros [€ 1 550 000,00], a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora de Abril de 2009 a maio de 2010, e substitui-se o mesmo por decisão a condenar os réus no que se vier a liquidar;   

4.         Mantém-se a parte restante da decisão recorrida.

Julgam-se improcedentes os recursos interpostos pelo réu Acupm, a que aderiu Mapfre Seguros Gerais, S.A., e pelas rés Impulso Industrial Alternativo S.A. e Arch Insurance Company (Europe) LTD, Sucursal em Espanha.

*

Responsabilidade pelas custas:

Visto o disposto na 1.ª parte do n.º 1 do artigo 527.º do CPC e o n.º 2 do mesmo preceito e o facto de autora ter ficado vencida, em parte, no recurso e de os réus terem ficado vencidos nos recursos que interpuseram, condenam-se os recorrentes nas custas dos recursos nos seguintes termos:

1.         As custas do recurso interposto pela autora ficam a cargo da autora e dos recorridos, na proporção de 50% para aquela e de 50% para estes;

2.         As custas do recurso interposto pelo réu Acupm – Agrupamento Construtor de Uma Unidade de Piscicultura em Mira, ACE, ficam a cargo do recorrente;

3.         As custas do recurso interposto pelas rés Impulso Industrial e Arch Insurance ficam a cargo dos recorrentes.

Quanto às custas da acção, elas serão suportadas pela autora e pelos réus na seguinte proporção:

1.         85%, para a autora;

2.         15%, para os réus.”

 

2. Vem o R. Acupm, ACE interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:

“A) O presente recurso de revista vem interposto dos segmentos do Acórdão notificado, que alterou a sentença proferida pelo Tribunal da Comarca de …, que a seguir se referem:

a) Quando julgou improcedente o pedido de condenação dos réus no pagamento à recorrida ACUINOVA de uma indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período de maio de 2009 a maio de 2010, e, em consequência, condenou o recorrente e os demais réus a pagar uma indemnização àquele título em importância que se vier a liquidar; e

b) Quando condenou os réus no pagamento à autora da quantia de um milhão e quinhentos e cinquenta mil euros (€ 1 550 000,00), a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora de abril de 2009 a maio de 2010, e, em consequência, condenou o recorrente e demais réus a pagar uma indemnização àquele título em importância que se vier a liquidar.

B) No que diz respeito, aos supostos danos causados com a perda de uma margem de comercialização não realizada devido a uma putativa mortalidade excessiva de peixes durante os meses de abril de 2009 a maio de 2010, deve o Acórdão recorrido ser revogado e mantida a sentença proferida em 1.ª Instância, que absolveu o ora recorrente e os demais réus desse pedido.

C) Com efeito, o ter sido considerado provado, que a mortalidade ocorrida durante os meses de abril de 2009 a maio de 2010 seria superior àquela que acontece “naquele tipo de instalação aquícola”, quando a funcionar em velocidade de cruzeiro, não impõe que se considere que a recorrida ACUINOVA tenha sofrido um dano efectivo por uma mortalidade excessiva durante aquele período, pois esta só poderia provar-se através da comparação, se houvesse, com um histórico de mortalidades da própria instalação suficientemente credível, que mostrasse que essas mortalidades reais na instalação da recorrida ACUINOVA eram inferiores àquelas que se verificaram durante aquele período.

D) É do conhecimento comum que só se podem aplicar mortalidades estandardizadas a unidades de piscicultura que estão maduras e não a unidades que estão a arrancar, como era o caso da instalação da recorrida ACUINOVA, para mais, quando durante uma parte daquele período a adução de água à instalação foi feita através de uma captação provisória, por se ter querido antecipar a exploração, apesar de saber-se que não estavam reunidas todas as condições para o poder fazer.

E) A recorrida ACUINOVA não logrou, como lhe competia nos termos do art.º 342.º, n.º 1 do CC, provar nos vertentes autos a existência daquele dano, nem a matéria provada no Acórdão recorrido permitia ao Venerando Tribunal da Relação de Coimbra concluir pela sua existência, havendo, nessa medida, uma certa contradição entre a fundamentação de facto e a decisão, que consubstancia um manifesto erro de julgamento.

F) Acresce que ainda que tivesse havido uma mortalidade excessiva suscetível de fundar a possibilidade da existência de um dano para a recorrida ACUINOVA, no que não se concede, a verdade é que a recorrida ACUINOVA também não teria logrado provar esse dano, como resulta do elenco dos factos provados e não provados do Acórdão recorrido.

G) Por outro lado, aquela falta de prova não pode ser suprida pelo facultar de uma nova oportunidade à recorrida ACUINOVA, para tentar provar o dano que não conseguiu provar no processo, devendo essa falta de prova resolver-se contra ela, como bem fez a sentença proferida em 1.ª Instância, que, por isso, deve ser mantida.

H) No que diz respeito, à perda da margem de comercialização relativamente aos peixes que deveriam ter entrado na instalação no período que foi de abril de 2009 a maio de 2010, em montante a liquidar, deve, também, o Acórdão recorrido ser revogado e mantida a sentença proferida em 1.ª Instância, quando decidiu, face ao constante dos autos e à prova documental e testemunhal produzidas, determinar o montante dessa indemnização, com recurso ao n.º 3 do art.º 566.º do CC.

I) Só deve ser remetido para liquidação o cálculo de uma indemnização que não seja possível calcular, à data da produção da sentença em 1.ª Instância, e se considere que apesar disso é possível fixar, exatamente, essa indemnização no momento da liquidação em execução de sentença.

J) Quando não exista essa elevada probabilidade e se preveja, desde logo, a hipótese de em sede de liquidação se ter de lançar mão do n.º 3 do art.º 566.º do CC, como acontece no Acórdão recorrido, impõe-se às instâncias que determinem o montante da indemnização com recurso à equidade e que não se relegue a sua determinação para liquidação em execução de sentença.

K) O Acórdão recorrido, ao remeter para liquidação o cálculo deste dano e uma vez que não se vê como será possível isso acontecer, mesmo no âmbito de uma perícia que viesse a ser determinada pelo tribunal, incorreu na prática de um ato inútil proibido pelo art.º 130.º do CPC.

L) Por fim, o recurso à equidade também se imporia, por a recorrida ACUINOVA não ter logrado provar os danos que articulou ter sofrido a este título e não dever ser-lhe facultada uma nova oportunidade de fazer essa prova, sob pena de violação do princípio da igualdade previsto no art.º 4.º do CPC e violação do n.º 2 do art.º 609.º do CPC e art.º 566.º n.º 3 do CC.

M) Deste modo, deve ser revogado o Douto Acórdão recorrido neste segmento decisório e mantida a decisão da 1.ª Instância, que fixou o montante da indemnização deste dano, com recurso ao n.º 3 do art.º 566.º do CC, remetendo-se os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, para que este se pronuncie sobre o juízo de equidade feito pelo Tribunal de 1.ª Instância.”

 

A A. contra-alegou, concluindo nos seguintes termos:

“I. A censura dirigida pelo Recorrente ACUPM ao segmento decisório que condenou os Réus em indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, no que se vier a liquidar, assenta em alegações perfeitamente estranhas    à decisão de facto, meras afirmações indemonstradas e indemonstráveis que não constam da factualidade provada.

II. Cabe ter presente que é alheio, em geral, ao âmbito da revista, nos termos dos arts. 674.º, n.º 3 e 682.º, n.º 2 do CPC, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa.

III. Dado que está dado como provado que o acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe (facto provado n.º 82) foi determinado pelo facto de em 11 e 12 de Abril de 2009, na unidade de aquicultura da Autora sita na Praia de Mira, terem entrado massivamente areias e lodos misturados com algas procedentes do fundo do mar através do emissário de captação n.º 1 (facto provado n.º 47), o que derivou da ocorrência da falha na junção entre os tubos 1 e 2 da conduta de betão do sistema de captação nº 1 que se deveu à execução dos trabalhos de dragagem, com sobredragagem da zona onde foi colocada a caixa pantalon associada ao tipo de dragagem efectuada, por sucção, bem como um insuficiente controlo de tais trabalhos, e, posteriormente, pela inadequação da reparação feita em Outubro de 2008 ao troço de betão do sistema de captação nº 1 (factos provados n.ºs 53 e 55), é manifesta a correcção da condenação dos Réus, conforme decidido no segmento decisório n.º 2 do dispositivo do douto acórdão recorrido, na indemnização pelo prejuízo assim suportado pela Autora com esta mortalidade anormal adveniente do incidente objecto dos autos, cuja quantificação deve ter lugar em liquidação posterior.

IV. Ao contrário do que pretende o Recorrente, por força do n.º 2 do art. 609.º do CPC, quando o Tribunal verificar a existência de um dano, mas não dispuser de dados que possibilitem a sua quantificação, pode e deve relegar para liquidação posterior a fixação do seu montante de modo a que o Autor/credor possa proceder à fixação do quantitativo do crédito de que é titular perante o Réu/devedor.

V. O douto acórdão recorrido, ao ter substituído, no segmento decisório a condenação dos réus, por força de juízo de equidade, no pagamento à autora da quantia € 1 550 000,00, a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora de Abril de 2009 a Maio de 2010, pela condenação dos réus no que se vier a liquidar, respeitou integralmente o disposto no n.º 2 do artigo 609.º do CPC e no n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil, pois quando ainda é possível, como sucede in casu, fixar no incidente de liquidação a quantidade da condenação aplica-se o n.º 2 do artigo 609.º do CPC.

VI. Com efeito, como judiciosamente se observou no douto acórdão recorrido a propósito deste segmento decisório, “é possível, em sede de liquidação, apurar, com recurso designadamente à produção de prova pericial, estes elementos ou alguns deles, ou, pelo menos apurá-los, em termos aproximados, o que permitirá, em último caso, um julgamento mais equitativo do que aquele que é possível neste momento, ao abrigo do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil. Observe-se que a prova produzida pela autora para demonstrar os prejuízos ora em causa consistiu em documentos e testemunhas, quando, segundo o n.º 4 do artigo 360.º do CPC, é lícita ao juiz ordenar a produção de outras provas, designadamente a produção de prova pericial”.

Termina pedindo que o recurso seja julgado improcedente, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido.

 

Os RR. Arch Insurance, Ltd. e Impulso, S.A. interpuseram também recurso de revista, concluindo nos termos seguintes:

“1. O objecto do presente Recurso de Revista são os segmentos da sentença que o Tribunal da Relação de Coimbra revogou em sentido desfavorável às ora Recorrentes, a saber:

a. Revogação do “ segmento da sentença que condenou os réus a pagar à autora a quantia de catorze mil oitocentos e sessenta e nove euros e quarenta e oito cêntimos [€ 14 869,48], a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio” e substituição do mesmo “por decisão a condenar os réus no pagamento à autora no que se vier a liquidar, com dedução, em relação às rés Mapfre e Arch, das franquias contratuais;”

b. Revogação do “ segmento da sentença que julgou improcedente o pedido de condenação dos réus no pagamento à autora de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010” e substituição do mesmo “por decisão a condenar os réus no que se vier a liquidar”; e,

c. Revogação do “ segmento da sentença que condenou os réus no pagamento à autora da quantia de um milhão e quinhentos e cinquenta mil euros [€ 1 550 000,00], a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora de Abril de 2009 a maio de 2010” e substituição do mesmo por “decisão a condenar os réus no que se vier a liquidar”.

2. Sendo que, pelo Tribunal de Primeira Instância, para efeitos de determinação do quantitativo dos danos, foi decidido não proceder a uma liquidação posterior, nos termos do artigo 609.º, n.º 2 do CPC, por considerar que nunca seria possível quantificar os mesmos, especialmente tendo em consideração a abundante produção de prova já realizada, cujo ónus da prova incumbia à Autora (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil – doravante CC).

3. Pelo que, se relativamente a alguns danos, designadamente os gastos com o consumo extraordinário de oxigénio (no valor de € 14.869,48), face à prova produzida, o Tribunal de Primeira Instância considerou provado um determinado valor exacto (condenação em quantia certa), já quanto ao dano resultante da margem de comercialização não realizada com os peixes que não entraram no processo produtivo, por não ser possível averiguar o valor exacto dos danos, fixou equitativamente (aplicação do artigo 566.º, n.º 3 do CC), dentro dos limites que considerou provado, um determinado valor de indemnização.

4. No que concerne à margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, o Tribunal de Primeira Instância considerou que não ficaram demonstrados os números alegados, uma vez que, segundo a nossa leitura da sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, considerou que não haveria nexo causal (artigo 563.º do CC) ou, pelo menos, haveria exclusão da indemnização por culpa do lesado (a Autora), nos termos do previsto no n.º 1 do artigo 570.º do CC.

5. As oras Recorrentes consideram que, ao decidir do modo supra mencionado, o Douto Tribunal da Relação (salvo o devido respeito) violou a lei substantiva ao aplicar incorrectamente e/ou equivocadamente o regime legal previsto no Código Civil, nomeadamente os artigos 342.º n.º1, 483.º, 562.º, 563.º, 564.º, 566.º n.º 2 e 3, e 570.º n.º 1, e bem assim aplicou erradamente a lei do processo, designadamente os artigos 414.º e 609.º n.º 2 do CPC.

6. O Tribunal de Primeira Instância, face à prova produzida, fixou um valor para os gastos com o consumo extraordinário de oxigénio (€ 14.869,48), não lhe sendo exigível que, face à falta de prova quanto à quantificação desses alegados prejuízos, cujo ónus impendia sobre a Autora (artigo 342.º n.º1 do CC), condenasse no que viesse a ser liquidado.

7. Em sentido contrário, no entender do Tribunal da Relação quando não existe uma quantia apurada ao certo, mas conhecem-se os limites mínimos (resultante da prova produzida) e máximos (o peticionado pela Autora), deverá a mesma ser apurada em sede de liquidação para produção de prova adicional, designadamente prova pericial.

8. O Tribunal de Primeira Instância, ao contrário do que afirma o Tribunal da Relação na sua fundamentação, não fixou o valor dos gastos ao abrigo de um juízo de equidade nos termos do artigo 566.º n.º 3 do CC.

9. O que na realidade sucedeu e resulta claro da Sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância é que face à abundante e exaustiva produção de prova realizada em sede de Audiência de Julgamento, a Autora apenas logrou provar parte dos gastos que alegadamente teve com o consumo extraordinário de oxigénio, não assistindo assim qualquer razão para condenar as ora Recorrentes no que se vier a liquidar (mantendo-se, assim, ainda e indefinidamente em aberto o valor da condenação que poderá vir a recair sobre as ora Recorrentes).

10. É manifesto que no presente caso não estamos perante danos que estivessem dependentes de cálculos a efectuar ou perante danos que ainda não tivessem cessado.

11. Com efeito, como o ónus da prova do dano incumbe ao lesado - já que se trata de um pressuposto da obrigação de indemnizar (artigo 342.º, n.º 1 e 483.º do CC) - está fora do alcance da norma prevista no n.º 2 do artigo 609.º do CPC o presente caso, uma vez que uma eventual inexistência de elementos para fixar a quantidade procede do insucesso da actividade probatória do interessado (in casu, da aqui Autora).

12. Ademais, nos termos do previsto no artigo 414.º do CPC, havendo dúvida quanto ao valor total dos gastos com o consumo de oxigénio extraordinário, deverá considerar-se provado apenas o valor sobre o qual não há dúvida (conforme decidiu o Tribunal de Primeira Instância), resolvendo-se assim contra a Autora o remanescente do valor peticionado.

13. Sem conceder, sempre se dirá que, ainda que assim não se entendesse (o que por mero raciocínio lógico e à cautela de patrocínio se admite), nunca poderá a decisão, in casu, ser relegada para momento ulterior, nomeadamente para incidente de liquidação de sentença.

14. Com efeito, uma decisão que relegue para liquidação posterior, terá que necessariamente concluir que existe a possibilidade séria e credível de produzir-se prova no âmbito da liquidação.

15. O que não sucede in casu atenta a possibilidade de imediata quantificação do valor do dano, de molde a evitar uma demora excessiva e a prática de actos inúteis, sendo manifestamente insuficiente afirmar (como afirmou o Venerando Tribunal da Relação), de modo singelo, que sempre será possível produzir prova pericial.

16. Nestes termos, justifica-se a revogação do Acórdão recorrido relativamente à indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio por incorrecta aplicação dos artigos 342.º n.º 1 e 483.º do CC e dos artigos 414.º e 609.º n.º 2 do CPC.

17. Relativamente à margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que não ficaram demonstrados os danos que as oras Recorrentes teriam causado à Autora em virtude da mortalidade superior ao normal.

18. Resulta evidente da sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, que este último, para além de ter entendido que não havia prova suficiente para determinar qual a mortalidade acima da normal causada pelo sinistro sub judice, entendeu também (e bem) que tal mortalidade foi resultado da opção da Autora de colocar os peixes numa instalação provisória enquanto decorriam trabalhos de construção.

19. Pelo que, a razão da improcedência não foi apenas a impossibilidade de determinação de um valor exacto, mas também e sobretudo o facto de inexistir nexo de causalidade (artigo 563.º do CC) com o sinistro sub judice, atenta a decisão exclusiva da Autora de manter em funcionamento a exploração, ciente dos riscos acrescidos da mesma.

20. O próprio director geral da Autora e coordenador da obra à época – testemunha AA – afirmou que a antecipação da entrada dos peixes (antes de estar terminada a construção) foi uma decisão errada da Administração da Autora face aos riscos elevados subjacentes a tal decisão, uma vez que a taxa de mortalidade previsível enquanto decorriam os trabalhos de construção seria sempre muito maior do que numa situação normal (superior a 30%) pois seria impossível ter a água completamente limpa, o que era essencial para ter uma taxa de mortalidade reduzida (5%).

21. Entendemos que o que resulta da decisão do Tribunal de Primeira Instância é que as ora Recorrentes não podem ser responsabilizadas pelos prejuízos decorrentes da mortalidade acima do normal por inexistência de nexo de causalidade, nos termos do artigo 563.º do CC, entre a conduta dos Réus e os aludidos danos.

22. Ainda assim, sem prescindir, sempre se dirá que, mesmo que se entendesse que o douto Tribunal de Primeira Instância excluiu a indemnização dos supra referidos danos em virtude de um facto culposo da Autora (por existir concorrência de culpas na produção ou agravamento dos danos), este último (facto culposo da A.), de facto, ocorreu (aplicação do artigo 570.º do CC), uma vez que, conforme referimos anteriormente, foi a Autora que, ciente dos elevados riscos, decidiu continuar a introduzir peixes numa instalação provisória com a obra a decorrer.

23. De acordo com a teoria da causalidade adequada, o acidente sub judice, não é idóneo para provocar os danos relativos à alegada mortalidade adicional no período de Maio de 2009 a Maio de 2010.

24. Nessa medida, mal andou o Tribunal da Relação ao revogar o segmento da sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância que julgou totalmente improcedente o pedido de condenação das ora Recorrentes no pagamento à Autora de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal no período de Maio de 2009 a Maio de 2010.

25. Acresce que o Tribunal da Relação substituiu o supra referido segmento por decisão a condenar os Réus no que se vier a liquidar ulteriormente, o que, conforme referido, afigura-se (salvo o devido respeito) manifestamente incorrecto e/ou falacioso, uma vez que uma eventual inexistência de elementos para fixar determinado quantum indemnizatório, resulta apenas do insucesso da actividade probatória do interessado (in casu, da aqui Autora ACUINOVA), atento o disposto no artigo 342.º, nº 1 e 483.º do CC e no artigo 414.º do CPC – resolvendo-se a falta de prova contra a Autora.

26. Face ao exposto, salvo o devido respeito, ao decidir do modo como decidiu, violou o Venerando Tribunal da Relação as normas legais previstas nos artigos 342.º n.º 1, 483.º, 562.º, 563.º, 564.º, 566.º n.º 2 e 570.º n.º 1, e bem assim aplicou erradamente os artigos 414.º e 609.º n.º 2 do CPC, não se encontrando, de facto, demonstrado nos autos a ocorrência de qualquer (pretenso) dano para a Autora decorrente da margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal no período de Maio de 2009 a Maio de 2010.

27. Quanto à indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes que não entraram no processo produtivo, concluiu igualmente o Venerando Tribunal da Relação que se justifica procedera uma liquidação posterior (ao abrigo do n.º 2 do artigo 609º do CPC), o que tendo presente os pressupostos da condenação ilíquida no sentido por nós defendido e já explicitado anteriormente, não assiste razão (salvo o devido respeito) ao Venerando Tribunal da Relação.

28. O que significa que, apenas dentro dos limites do que se deu como provado é que se deverá decidir qual o valor da margem de comercialização não realizada com os peixes que não entraram no processo produtivo, não devendo ser relegada a fixação de tal valor para liquidação posterior.

29. Ademais, o valor da condenação (com recurso à equidade) relativamente ao dano agora em análise (€ 1.550.000,00) é manifestamente excessivo face à escassa prova produzida e à elevada taxa de mortalidade por a exploração ter sido iniciada numa instalação provisória enquanto decorriam trabalhos de construção, devendo assim esta decisão ser substituída pela total absolvição das ora Recorrentes relativamente a estes (pretensos) danos, ou caso assim não se entenda (o que por mera cautela de patrocínio se equaciona), ser a mesma substituída por valor substancialmente inferior, cumprindo desse modo com o estatuído nos artigos 562.º, 563.º, 566.º n.º 2 e nº 3, e 570.º n.º 1 do CC.

30. De facto, face à previsível taxa de mortalidade dos peixes muito superior à normal, resultante do carácter provisório das instalações e do facto de que decorriam nessas instalações obras de construção, redunda que os custos de exploração não são absorvidos pelas vendas, e nessa medida, resulta um prejuízo que, seja por inexistência de nexo com o sinistro sub judice (artigo 563.º do CC) ou por exclusão da indemnização por culpa do lesado (artigo 570º nº 1 do CC), não poderá tal pretenso prejuízo ser imputável às ora Recorrentes, mas sim à decisão exclusiva da Autora de introdução de peixes numa instalação provisória enquanto decorriam trabalhos de construção.

31. Assim, no que respeita à perda de oportunidade de introdução de peixes no ciclo produtivo entre Abril de 2009 e Maio de 2010, deverá ser excluída a indemnização dos danos de lucro cessante, ou pelo menos, reduzido o seu valor, atendendo à previsível elevada taxa de mortalidade – o que não foi tido em consideração no juízo equitativo do Tribunal de Primeira Instância que apurou o lucro cessante.

32. Sem prescindir, e ainda que assim não se entenda, o que não se admite mas apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que, mesmo não se adoptando a posição defendida pelas ora Recorrentes, mas sim uma posição lata que aceita a liquidação posterior nos casos em que a falta de quantificação se deve ao insucesso da actividade probatória do demandante, atentas as circunstâncias do presente caso, não deverá ser relegada a liquidação para momento ulterior.

33. Da sentença resulta evidente que o Tribunal de Primeira Instância (acertadamente) entendeu que não existia a possibilidade séria e credível (atentos vários factores melhor descritos na sentença) de produzir-se prova no âmbito da liquidação, razão pela qual recorreu a um juízo de equidade, única forma de evitar a demora excessiva e inútil.

34. Acresce que, a prova produzida no presente processo, foi abundante e exaustiva, pelo menos no que toca à quantificação dos alegados danos sofridos pela Autora, pelo que, salvo o devido respeito que é muito, não poderá o entendimento do Douto Acórdão do Tribunal da Relação proceder, uma vez que não se impunha, atentas as circunstâncias do caso concreto, relegar para liquidação posterior a quantificação dos alegados prejuízos.

35. Ao decidir do modo como decidiu, violou o Venerando Tribunal da Relação as normas legais previstas nos artigos 342.º n.º 1, 483.º, 562.º, 563.º, 566.º n.º 2 e n.º 3, e 570º n.º 1 do CC, e bem assim aplicou erradamente os artigos 414.º e 609.º n.º 2 do CPC, devendo as ora Recorrentes ser absolvidas relativamente à condenação de pagamento à Autora do dano de lucro cessante, ou subsidiariamente, ser o juízo equitativo do Tribunal de Primeira Instância [ser] substituído por outro de valor substancialmente inferior, dentro dos limites do que se teve como provado.

36. Nessa medida, por tudo quanto se encontra exposto, e ressalvado o devido respeito que é muito, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, sendo o Douto Acórdão proferido nos autos revogado, e bem assim, a indemnização referente à margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora de Abril de 2009 a Maio de 2010 ser excluída, ou pelo menos, ser substancialmente reduzida, o que desde já se alega e requer para todos os efeitos legais”.

 

A A. contra-alegou, concluindo:

“I. No que concerne ao segmento decisório relativo aos gastos com consumo extraordinário de oxigénio, em que o douto acórdão da Relação revogou o segmento da sentença que condenou os Réus a pagar à autora a quantia de “pelo menos” € 14 869,48, a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio, e substituiu-o por decisão a condenar os Réus no pagamento à autora no que se vier a liquidar, com dedução, em relação às rés Mapfre e Arch, das franquias contratuais, observa-se, primeiramente, que ambas as instâncias, de modo concordante, julgaram que é devida pelos Réus uma indemnização à Autora pelos gastos suportados com o consumo extraordinário de oxigénio, o que inteiramente se justifica tendo presente a factualidade provada de que a “11 e 12 de Abril de 2009, na unidade de aquicultura da Autora sita na Praia de Mira, entraram massivamente areias e lodos misturados com algas procedentes do fundo do mar através do emissário de captação n.º 1 (UU)” (facto provado n.º 47 no douto acórdão recorrido), o que “derivou da abertura da junta entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do emissário de captação nº 1 (AAA)” (facto provado n.º 53 no douto acórdão recorrido), sendo que a “ocorrência da falha na junção entre os tubos 1 e 2 da conduta de betão do sistema de captação nº 1 deveu-se à execução dos trabalhos de dragagem, com sobredragagem da zona onde foi colocada a caixa pantalon associada ao tipo de dragagem efectuada, por sucção, bem como um insuficiente controlo de tais trabalhos, e, posteriormente, pela inadequação da reparação feita em Outubro de 2008 ao troço de betão do sistema de captação nº 1 (CCC)” (facto provado n.º 55).

II. Ao alterar a decisão de facto quanto aos gastos com consumo extraordinário de oxigénio resultantes do incidente dos autos que a 1.º Instância fixou em “pelo menos de €14.869,48” (cfr. alínea SSSS da sentença) julgando provado que se verificou “um consumo extraordinário de oxigénio não apurado ao certo, mas não inferior a € 14 869,48 nem superior a € 117 490,50” (facto provado n.º 96 no douto acórdão), o douto acórdão da Relação de Coimbra não infringiu, em momento algum, os arts. 342.º, n.º 1 e 483.º do Cód. Civil e o art. 414.º do CPC.

III. Com efeito, desde logo no que concerne ao art. 483.º do Cód. Civil, não se trata, nos presentes autos, de responsabilidade delitual ou extra-contratual, mas de responsabilidade contratual, nos termos dos arts. 798.º e 799.º, n.º 1 do Cód. Civil por incumprimento do contrato de prestação de serviços de fiscalização por parte da Recorrente IMPULSO (bem como do contrato de empreitada pelo Réu ACUPM).

IV. Por seu lado, relativamente à pretensa infracção do art. 342.º, n.º 1 do Cód. Civil e do art. 414.º do CPC, em que as Recorrentes pretendem suscitar a violação das regras do ónus da prova, não só não é concretizado minimamente em relação ao douto acórdão recorrido em que se traduziu a infracção das regras do ónus da prova quanto aos factos constitutivos do direito alegado ou à dúvida sobre a realidade de um facto, mas sobretudo não cabe confundir afirmações sobre a distribuição do ónus da prova com o juízo probatório de demonstração de uma certa factualidade, sendo certo, justamente, que foi dado como provado que: “Devido às tarefas levadas a cabo em acções de reparação da tubagem de captação 1 e da limpeza dos lodos/areias que se iam acumulando nos elementos hidráulicos e nos tanques da unidade de aquicultura, a autora teve que realizar diversos cortes de abastecimento de água, o que levou à necessidade de utilizar o sistema de oxigénio de emergência, com vista à sobrevivência dos peixes” e que “Tal sistema de oxigénio funciona mediante injecção de oxigénio individualmente em cada tanque, sendo este método menos eficiente que o sistema de funcionamento normal, que é a injecção desse oxigénio no poço de oxigenação, verificando-se, por isso, um consumo extraordinário de oxigénio não apurado ao certo, mas não inferior a € 14.869,48 nem superior a € 117 490,50” (factos provados n.ºs 95 e 96 do douto acórdão).

V. No que concerne ao segmento decisório do douto acórdão recorrido, pelo qual os Réus foram condenados no que se vier a liquidar quanto à indemnização pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, inexiste qualquer violação das normas legais previstas nos artigos 342.º n.º 1, 483.º, 562.º, 563.º, 564.º, 566.º n.º 2 e 570.º n.º 1 do Cód. Civil e nos artigos 414.º e 609.º n.º 2 do CPC.

VI. Desde logo, no que concerne à pretensa violação dos arts. 342.º, n.º 1 do Cód. Civil e 414.º do CPC trata-se, ainda e sempre, da mesma confusão, acima aludida, entre o efectivo juízo probatório pelo qual se deram positivamente como provados certos factos e afirmações abstratas sobre ónus da prova.

VII. Com efeito, foi dado como provado pelo douto acórdão recorrido que: “Para além da morte imediata de peixes, o referido em 47 (UU) [A 11 e 12 de Abril de 2009, na unidade de aquicultura da Autora sita na Praia de Mira, entraram massivamente areias e lodos misturados com algas procedentes do fundo do mar através do emissário de captação n.º 1] veio a determinar um acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe” (facto provado n.º 82), que: “A mortalidade dos pregados considerada normal para este tipo de instalação aquícola corresponde a 5% ao ano” (facto provado n.º 83), que: “Quanto aos peixes perdidos entre Maio de 2009 e Maio de 2010, o valor por calibre, variava, entre € 2,10 e € 2,30 por peixe (facto provado n.º 89) e que: “Com a morte dos peixes, a autora perdeu, de igual modo, resultado operacional em 2010 e 2011, que não foi realizado relativamente à mercadoria em stock, afectada, sendo que o preço unitário médio de venda para os anos 2010 e 2011 estava estimado em € 6,00/kg (facto provado n.º 90).

VIII. Estando, deste modo, dado como provado no n.º 82 que o acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe foi determinado pelo facto de em 11 e 12 de Abril de 2009, na unidade de aquicultura da Autora sita na Praia de Mira, terem entrado massivamente areias e lodos misturados com algas procedentes do fundo do mar através do emissário de captação n.º 1, o que derivou da ocorrência da falha na junção entre os tubos 1 e 2 da conduta de betão do sistema de captação nº 1 que se deveu à execução dos trabalhos de dragagem, com sobredragagem da zona onde foi colocada a caixa pantalon associada ao tipo de dragagem efectuada, por sucção, bem como um insuficiente controlo de tais trabalhos, e, posteriormente, pela inadequação da reparação feita em Outubro de 2008 ao troço de betão do sistema de captação nº 1 (factos provados n.ºs 53 e 55) é manifesta a verificação naturalística e jurídica do nexo de causalidade entre o incidente de entrada massiva de areias e lodos resultantes da abertura da junta entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do emissário de captação n.º 1 da Unidade de Aquicultura da Autora e a mortalidade anormal de pregados ocorrida entre Maio de 2009 a Maio de 2010, em termos de causa efectiva e adequada, o que implica a obrigação de indemnizar dos Réus dos prejuízos correspondentes, em conformidade com os arts. 562.º, 563.º, 564.º, 566.º n.º 2 do Cód. Civil, que foram, assim, devidamente aplicados no caso.

IX. Carece, por outro lado, de qualquer fundamento a alegação, relativamente à qual, aliás, ocorre dupla conforme entre as decisões das instâncias, de uma pretensa culpa do lesado nos termos do art. 570.º do Cód. Civil pelo facto de a Autora ter colocado peixes numa instalação provisória enquanto decorriam trabalhos de construção, já que foi dado como não provado sob o n.º 68 dos factos não provados: “Que a entrada massiva de areias e lodos em Abril de 2009 tivesse origem também no facto de estar em funcionamento uma solução provisória de toma de água”, o que implica, como se observa correctamente no douto acórdão recorrido, que “no que diz respeito à questão da culpa ou do grau de culpa na produção do evento lesivo (entrada massiva de areias na unidade de aquicultura da autora) e à questão da extensão dos danos indemnizáveis” “não se provaram as alegações de facto que sustentavam a imputação à autora de culpa na ocorrência da entrada de areias na sua unidade de aquicultura”.

X. A pretensão, colocada em sede de censura ao segmento decisório relativo à indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3 312 376 peixes que não entraram no processo produtivo da autora de Abril de 2009 a Maio de 2010, de que o valor da condenação (com recurso à equidade) relativamente ao dano agora em análise (€1.550.000,00) é manifestamente excessivo, é completamente alheia ao próprio teor do acórdão recorrido que condenou em quantia a liquidar, pelo que deve ser liminarmente rejeitada, a que acresce que a condenação na indemnização do prejuízo em causa mostra-se conformemente decidida por ambas as instâncias, apenas se divergindo quanto à condenação em liquidação posterior.

XI. Ao determinar em todos os segmentos decisórios impugnados a condenação dos Réus no pagamento à Autora de quantia a liquidar posteriormente, o douto acórdão recorrido procedeu à correcta aplicação do n.º 2 do art. 609.º do CPC.

XII. O art. 609.º, n.º 2 do CPC constitui, com efeito, o mecanismo processual dirigido a concretizar a situação em que o Tribunal, na apreciação da causa, julga demonstrada a existência do direito, designadamente o direito à indemnização pelos prejuízos incorridos pelo lesado em consequência da actuação ilícita do lesante, mas não pode proferir decisão específica por não se ter logrado alcançar o objecto ou a quantidade em que se corporiza o direito reconhecido e deve ser aplicado, em atenção ao disposto no n.º 3 do art. 566.º do CPC, sempre que exista a possibilidade de determinação do valor exacto dos danos, o que se verifica in casu conforme explicitado no douto acórdão da Relação de Coimbra recorrido.”

Termina pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.

 

3. Vem provado o seguinte (mantêm-se a numeração e a redacção da Relação; entre parêntesis figuram as letras correspondentes segundo a discriminação feita na sentença):

 

Factos provados:

1. A autora é uma sociedade comercial anónima que possui como objecto social a exploração da aquicultura e outras actividades piscícolas, pesca, acondicionamento e transformação industrial, importação e exportação de peixe capturado ou produzido em aquicultura (A).

2. A ré ACUPM – Agrupamento Construtor de uma Unidade de Piscicultura em Mira, ACE (doravante designado como 1ª ré) é um agrupamento complementar constituído pelas seguintes três sociedades: “Somague – Engenharia, S.A”, como sede social em “…”, Rua …, …, …, com o NIPC 5…00; “Monte Adriano – Engenharia e Construção, S.A”, com sede social na Rua …, nº …, …, com o NIPC 5…08; SACYR, S.A.U. com sede social no …, 83-85, …, Espanha, com o CIF A7…2, registada no Registro Mercantil de Madrid Tomo …, Folio, 1…4, Hoja M-28..3 (B).

3. Foi requerido o registo da constituição do referido agrupamento complementar de empresas pela Ap. n.º 8 de 19/10/2007 [C].

4. Em 23 de Agosto de 2007, a autora celebrou com as sociedades mencionadas em 2) supra, um acordo denominado “contrato de construção”, com vista à construção de um estabelecimento de piscicultura sito na …, como decorre de documento n.º 3 junto com a petição inicial cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (D).

5. Em sede do aludido acordo foram feitos consignar, para além do mais, os seguintes dizeres: “ (…) O dono da obra é uma sociedade que pretende construir na localidade da …, Portugal, um estabelecimento de piscicultura (…), nos termos do projecto de engenharia elaborado por Impulso Industrial Alternativo, S.A com data de Julho de 2007 (Considerando A daquele acordo). (…) “SAYCR/SOMAGUE/MONTEADRIANO apresentaram uma proposta no concurso privado lançado pelo dono da obra para a execução da obra referida (…). A proposta apresentada por SAYCR/SOMAGUE/MONTEADRIANO (o “empreiteiro”) foi seleccionada pelo dono da obra para a construção da obra.” (Considerando B); “(…) a dona da obra expressamente autoriza e as empreiteiras desde já se comprometem a constituir entre si, até 30 de Setembro de 2007, um agrupamento complementar de empresas (…), para o qual serão transferidos todos os direitos e obrigações assumidos pelas empreiteiras no presente contrato.” (cláusula vigésima sexta, sexto parágrafo) (E).

6. De documento n.º 4 junto com o articulado de petição inicial foram feitos consignar os seguintes dizeres: ”Declaração de Constituição de Agrupamento Complementar de Empresas” – “adjudicatárias do contrato de empreitada de projecto de ejecución acuícola de engorde de rodaballo em … (Portugal) – Infraestructura de Toma e vertido y Sistema de Captación y Instalaciones Productivas”: declaram que constituirão entre si um agrupamento complementar de empresas, que terá por objecto a execução da supra referida empreitada, ao qual cederão a posição contratual que para elas decorre do referido contrato, mediante autorização prévia do Dono da Obra.” (F).

7. As sociedades SOMAGUE – ENGENHARIA, S.A.; MONTE ADRIANO - ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO, S.A. e SACYR, S.A.U. cederam à ré ACUPM, ACE, a sua posição contratual no acordo referido em D) supra (G).

8. Tal agrupamento complementar de empresas possui como objecto social a melhoria das condições de exercício e de resultados das actividades económicas das empresas agrupadas através da realização, em conjunto, dos trabalhos, serviços e fornecimentos necessários à execução do Contrato de Construção de uma Unidade de Piscicultura na …, Distrito de Coimbra, tal como definido no respectivo contrato e documentos que dele fazem parte integrante, bem como quaisquer outros trabalhos, serviços e fornecimentos para os quais o agrupamento seja solicitado e respeitam directa ou indirectamente ao supra referido objecto, podendo ter como fim acessório a realização e a partilha de lucros (H).

9. A ré Impulso Industrial Alternativo, S.A (doravante designada por Impulso) elaborou o projecto de engenharia, denominado “Projecto de execução Aquícola de Engorda de Pregado em …” e datado de Julho de 2007, relativo à construção do estabelecimento de piscicultura sito em …, cuja execução era o objecto visado com a celebração do acordo aludido em 4), como decorre de Anexo I ao referido acordo (junto como doc. Nº 3 com a petição inicial cujo teor se dá por inteiramente reproduzido), e foi concretizado com base no contrato datado de 11.01.2007 (I).

10. Na sequência desse projecto, a ré Impulso e a autora ficavam adstritas ao convencionado nos exactos termos que decorrem do teor de documento N.º 5 junto com o articulado de petição inicial, de cujo âmbito decorre, a propósito do conteúdo do convencionado, para além do mais, que “os trabalhos de assistência técnica relativos ao presente contrato consistem na realização, primeiro, da adaptação dos anteprojectos modificados para 7.000t e depois do projecto de execução necessário para a realização das obras e construção das instalações correspondentes (…). O projecto de Execução e os Projectos da especialidade necessários para a solicitação das licenças, realização das obras e construção das instalações correspondentes e também para a posterior solicitação de propostas de construção e instalações necessárias.(…).” (J).

11. Esse projecto previa a fixação de dois emissários submarinos de captação de água com 2875 metros de comprimento, constituídos, cada um, por um lanço de 1.500 metros em betão armado, colocado por cravação com tuneladora, que, por sua vez, através de uma peça de ligação designada por peça pantalon, conecta com dois lanços paralelos de polietileno de alta densidade (PEAD) colocados em vala, por afundamento controlado, que completam os emissários de captação (K).

12. Tal projecto previa também a cravação de dois emissários de retorno com 1350 metros de comprimento, totalmente construídos em betão armado e previa a deslocação de 10,8 m3 de água em cada conjunto de emissários de captação/retorno (L).

13. De acordo com o disposto na cláusula sétima do acordo junto como Doc. Nº 3, “a fiscalização levará a cabo a direcção e o controlo da execução das obras e dos trabalhos e estará a cargo do arquitecto autor do projecto de engenharia Sr. Engenheiro BB (…) e dos profissionais para o efeito nomeados”, sendo que aquela fiscalização passava pela “verificação, controlo e garantia da qualidade da obra especificamente Aquícola mediante as análises correspondentes do controlo de medições, estudos e propostas para o procedimento de fundeado e controlo da sua execução para certificar a longo prazo, a qualidade da obra executada oculta.” (M).

14. A ré Impulso ficou, assim, adstrita à fiscalização da execução dos trabalhos, como decorre de documentos n.º 5 e nº6, juntos com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, tendo indicado como responsáveis máximos pela fiscalização da execução da obra BB e CC e em cujo âmbito ficou consignado que “ a Impulso seguirá portanto para a garantia da qualidade das obras executadas, a seguinte ordem de sequências: a) Definição Detalhada das unidades de obra a controlar; b) elaboração do procedimento de controlo com a especificação da metodologia a seguir, os testes e controlos necessários, os critérios de validação e rejeição bem como os recursos externos adicionais a contratar se for o caso. c) Activação dos meios necessários para o seguimento dos procedimentos. d) Detecção e resolução de não conformidades. e) Elaboração do Relatório Final de Validação”, podendo a ré Impulso proceder à contratação de peritos nacionais e internacionais para análise estrutural do encanamento de polietileno durante a fase de fundeado e para análise da qualidade dos encanamentos de cravação (N).

15. A ré “MAPFRE – SEGUROS GERAIS, S.A” (doravante designada por Mapfre) celebrou com a ré ACUPM um acordo denominado “contrato de seguro de obras” a que corresponde a apólice 34…02, aí constando como tomador do seguro aquela ACUPM e como segurado a autora ACUINOVA (O).

16. No âmbito das respectivas condições particulares ali definidas, esse acordo tem como objecto a “empreitada de construção de uma unidade aquícola para engorda e processamento de pregado em …-…”, nele sendo seguradas as seguintes entidades: ACUPM – Agrupamento Construtor de uma Unidade de Piscicultura em Mira, ACE, como empreiteiro e todos os empreiteiros e subempreiteiros que intervenham de forma directa na execução da obra segurada e cujo orçamento esteja incluído no valor seguro; ACUINOVA Actividades Piscícolas, S.A, na qualidade de dono da obra, como decorre de documento nº7, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (P).

17. A ré Mapfre é seguradora leader de SOMAGUE – Engenharia, S.A. e das empresas do grupo Sacyr Vallehermoso, no contrato de seguro titulado pela apólice n.º 60…59 (Q).

18. Por declaração de 12.11.2007, a ré Mapfre fez constar o que se segue, a propósito da apólice 6000591100159: “que se considera segurada na citada apólice a ACUPM – Agrupamento de Construção de Uma unidade de Piscicultura em Mira, ACE, constituído pelas empresas Somague Engenharia, S.A (70%), Sacyr, S.A.U. (10%) e Monte Adriano Engenharia e Construção S.A. (20%), nomeadamente na sua qualidade de empreiteiro da obra “Projecto de Execução Aquícola de Engorda de Pregado em …”, iniciada em 12.11.2007, com prazo de execução de 31 meses, no valor de 103.434.577,18 Euros (100%). (…) Considera-se como Segurado Adicional e em conformidade com as condições da apólice AQUINOVA – Actividades Piscícolas, S.A na qualidade de Dono de Obra.” (decorre de documento nº9 junto com a petição inicial) (R).

19. O contrato de seguro referido em 15 [O] supra teve o seu início em 01 de Março de 2007 e vencimento a 28 de Fevereiro de 2008, com sucessivas renovações (S).

20. A ré ARCH Insurance Company (Europe) Ltd (doravante designada por ARCH) firmou com a ré Impulso um acordo denominado “contrato de seguro de responsabilidade civil profissional” a que corresponde a apólice nº DP/01…9/08/Z, em cujo âmbito a ré Impulso figura como tomadora do seguro e segurada, como decorre de documento nº 10 e de ponto 8 de documento n.º 6, juntos com a petição inicial, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido (T).

21. Do âmbito do referido documento n.º 10 e de documento n.º 11 (este junto com a petição inicial, cujo teor se dá também por inteiramente reproduzido), a apólice referida em T) prevê como âmbito de cobertura a responsabilidade civil profissional do tomador do seguro pela actividade de elaboração de projectos de investimento, projectos I+D+I, estudos de mercado, planos de viabilidade, planos de negócios, planos de formação e projectos de consultoria ambiental, desenho e realização de projectos técnicos construtivos e arquitectónicos, direcção facultativa e assistência mineira e industrial (U).

22. Mais admite a referida apólice a cobertura de riscos por sinistros relativos aos trabalhos de projecto e de fiscalização da obra para a empresa Pescanova (V).

23. A autora é membro do grupo empresarial PESCANOVA, tendo sido constituída para a exploração da unidade de aquicultura de … (W).

24. O acordo referido em 4 (D) supra recebeu os seguintes aditamentos: «um primeiro aditamento em 30 de Setembro de 2008 – conforme documento nº13 que se dá aqui por inteiramente reproduzido; «um segundo aditamento em 30 de Novembro de 2008 – conforme documento nº 14 que se dá aqui por inteiramente reproduzido; um terceiro aditamento em 22 de Abril de 2009 – conforme documento nº 15 que se dá aqui por inteiramente reproduzido; um quarto aditamento em 27 de Outubro de 2010 – conforme documento nº 16 que se dá aqui por inteiramente reproduzido; um quinto aditamento em 19 de Abril de 2012 – conforme documento nº 17 que se dá aqui por inteiramente reproduzido (X).

25. A unidade de aquicultura localizada na … é a maior unidade do mundo de cultivo e produção de peixes planos (peixes de corpo achatado e alongado), ocupando uma superfície total de 57 hectares, que inclui 178 tanques de cultivo para engorda de pregado com uma superfície de 160.224 m2 (Y).

26. Trata-se de uma unidade de aquicultura baseada na captação de água de mar, a cerca de 3 Km do litoral (Z).

27. Tal unidade está dividida em dois módulos de produção autónomos, ou seja, duas unidades de engorda do pregado, conhecidos como Fase I e Fase II, os quais possuem sistemas hidráulicos independentes para captação de água, os emissários de captação 1 e 2 e os emissários de retorno 1 e 2 (AA).

28. Cada módulo compreende uma zona de pré engorda, onde os juvenis (alevins), com um peso médio de 8 a 10 grs, são estabulados pelo período de 4 a 6 meses, sendo que, após este período de estabulação, quando os peixes atingem o peso aproximado de 100 grs, são transferidos para a zona de engorda onde alcançam o tamanho comercial, que varia entre 1 Kg e 2Kg (BB).

29. Esta unidade de aquicultura funciona em sistema aberto, sendo a água bombeada a partir de dois poços (CC).

30. Tais poços comunicam com um sistema de tubagens, pelo qual se procede à captação de água do mar a cerca de 2.500 metros da costa, por forma a que, com o sistema de tubagens instituído, a água bombeada seja de excelente qualidade, com características oceânicas e sem matéria detrítica em suspensão (DD).

31. Cada captação é constituída por um túnel, conduta ou tubagem em betão, com uma extensão de 1500m, com diâmetro interior de 3 metros, por dois tubos ou condutas em PEAD (polietileno de alta densidade), com extensão de cerca de 1350m, como diâmetro exterior de 2 metros, paralelos, próximos um do outro e colocados em vala, tubos em PEAD que dispõem na respectiva extremidade de um conjunto de tubos verticais com grelhas, ditos risers, por onde ocorre a tomada de água, que chega por vasos comunicantes aos poços de captação onde vai ser bombeada (EE).

32. O primeiro troço de tubos de betão que compõem os emissários de captação são tubos de betão armado pré-fabricados, com diâmetro interior de 3 m, paredes de 0,40 m e comprimento de 4 metros, com juntas tipo macho/fêmea, que foram empurradas à medida de que se fazia a escavação pelo processo de empuxo ou cravação (pipe-jacking) (FF).

33. A união dos dois tubos de PEAD à tubagem em betão é feita por intermédio de uma caixa de união – caixa pantalon – que no caso da captação n.º 1, é pré-fabricada em betão armado (GG).

34. A união da caixa pantalon quer à tubagem principal em betão quer aos tubos de PEAD é realizada por peças telescópicas em poliéster reforçado com fibra de vidro (PRFV), cujo objectivo é permitir pequenos ajustamentos de comprimento, dada a dificuldade em concretizar com precisão absoluta a instalação e ligação directa da caixa pantalon entre a tubagem de betão e os tubos em PEAD (HH).

35. A caixa pantalon dispõe de três saídas flangeadas de modo a assegurar a ligação entre a tubagem em betão e a tubagem em PEAD, a saber: uma saída DN 3000 do lado do túnel, que liga a uma peça telescópica intermédia em poliéster reforçado com fibra de vidro (PRFV), que liga em seguida o tubo de betão do túnel; duas saídas DN 2000, que ligam a duas peças telescópicas, também em PRFV, flangeadas nas extremidades e que ligam de seguida aos tubos de PEAD (II).

36. Assim, o sistema de captação nº 1 é composto por seis elementos, que se encontram ordenados de terra para o mar na seguinte sequência: a) Poço de captação; b) Troço de conduta (tubagem) de betão; c) Peças em PRFV; d) Caixa de derivação (caixa pantalon); e) Peças em PRFV; f) Duas Condutas de PEAD (JJ).

37. A ré Impulso elaborou relatório datado de 21 de Julho de 2009, denominado “relatório sobre a situação da Unidade de produção de rodovalho, em consequência da afectação por entrada massiva de elementos não desejados, devido à defeituosa construção do sistema de captação”, onde fez constar, para além do mais: “A informação transmitida ao Dono da Obra e à Fiscalização da Obra por parte da Entidade Executante foi claramente insuficiente na altura, uma vez que só ao dia de hoje, se conseguiu saber com exactidão o verdadeiro alcance do deslocamento acontecido em Outubro e o das operações de correcção efectuadas posteriormente. (…) é importante referir aqui que a informação fornecida pelo Empreiteiro no momento do deslocamento de Outubro, acerca do alcance do defeito e da efectividade dos trabalhos de reparação foi claramente distorcida e insuficiente pois não permitiu um correcto seguimento do estado desta junta, e praticamente eliminou a gravidade do problema dando-o por resolvido com carácter definitivo, quando a realidade dos factos demonstrou que a junta não se encontrava correctamente executada.” – como decorre de documento n.º 24, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (KK).

38. A Universidade … elaborou relatório, em Julho de 2009, denominado “Projecto Aquícola de Engorda de Pregado em … . Entrada de areias para o circuito hidráulico e tanques de engorda”, onde fez constar, para além do mais, que “(…) a entrada de sedimentos para o circuito hidráulico de abastecimento se deveu à recorrente falha de reparação efectuada para a colmatação da fenda existente entre os dois últimos tubos do túnel do betão.”, como decorre de documento n.º 26 junto com a petição inicial cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (LL).

39. Em acta de trabalhos marítimos n.º 29, que se juntou como n.º 27 da petição inicial, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido, foi feito constar, para além do mais que “Impulso refere que em Outubro de 2008, aquando da detecção da abertura na junta entre os tubos 1 e 2 de pipe-jacking, a informação que recebeu era de que os tubos tinham recuperado praticamente a sua posição inicial e ficado a junta a cerca de 2 cm da sua posição inicial, não tendo a informação de que existia uma abertura grande, pois nesse caso teria continuado a seguir o assunto de perto.” (MM)

40. Em relatório técnico denominado “Identificação das causas da ocorrência de elevada turbidez nas captações de água do mar em …”, elaborado pelo Professor Catedrático DD, do Instituto Superior Técnico, datado de Abril de 2010, foi feito constar, para além do mais: “Relativamente ao modo como esta peça (caixa pantalon) deveria ser instalada, para ligação ao túnel de betão e às tubagens de PEAD pertencentes aos emissários de captação, preconizou-se a execução de uma grande escavação abaixo da geratriz inferior da tubagem de betão do túnel, a qual teria deixado o 1º tubo desapoiado. Não tendo sido acautelados, em projecto, os cuidados a ter nesta escavação (contenção por estacas pranchas, reforço dos primeiros troços de betão, enrocamento basal, minimização do tempo de trabalho na zona pantalon, etc), isso provocou, ao que tudo indica, a separação entre os dois primeiros tubos de betão.”. Mais resulta desse relatório que “o troço litoral em estudo inclui o sistema lagunar de Aveiro, cuja dinâmica é muito influenciada pela deriva litoral e actividade das ondas. (…) Em qualquer dos casos, os requisitos máximos de caudal de água salgada necessária devem ser cuidadosamente calculados para projectar adequadamente o sistema de produção. Ampliações futuras e actividades de manutenção sistemática constituem aspectos relevantes que também devem ser tomados em devida consideração. Se estes aspectos não forem devidamente incorporados na fase do projecto, podem gerar perigos potenciais. (…) no caso concreto de captações materializadas por tubagens dispostas ao longo de zonas de praias arenosas com inclinação suave, o projecto e a construção de tais tomadas de água salgada devem ser baseados em estudos pormenorizados sobre o transporte subaquático de sedimentos na região, o que, por sua vez, depende da natureza e granulometria desses sedimentos.(…)”. (junto como documento n.º 31 com a petição inicial cujo teor se dá por inteiramente reproduzido) (NN).

41. De parecer técnico elaborado por “Consulmar”, denominado “Avaria na Captação de água do mar nº 1 da unidade de aquicultura de …”, com data de 11 de Maio de 2010, foi feito constar, para além do mais, o seguinte: “Considerando que a dragagem necessária para a executar a “cama” de assentamento da caixa gera um talude que estabiliza com uma pendente de 1/5 (valor também considerado no projecto), tendo em conta a cota de assentamento da caixa e a distância desta ao extremo do último tubo de betão, verifica-se que a execução da dragagem descobre a quase totalidade do tubo 1 e grande parte do tubo 2, originando inclusivamente infra-escavação sob o tubo 1, situação potencialmente geradora de instabilidade no troço final da tubagem de betão. – Ora, tendo em conta que os trabalhos de dragagem decorrem próximo da cota – 20,00ZH (em média a cerca de 22 metros de profundidade), em difíceis condições de controlo de execução; que não se encontram definidas no caderno de encargos tolerâncias de dragagem horizontais ou verticais e que seria previsível que o período de tempo entre a execução da dragagem para colocação da caixa e o posterior aterro pudesse ser grande; acrescido do facto de o último tubo poder desde logo estar infra-escavado ou pouco suportado; entende-se que a estabilização deste tubo, assim como dos outros imediatamente adjacentes, deveria ter sido acautelada em fase de projecto, prevenindo possíveis acções de torção ou tracção. Não foi considerada a hipótese de a secção final do tubo poder ficar em consola, apesar de esta ser bastante provável devido à possível infra-escavação motivada pela dragagem.” (como decorre de documento nº 32 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido) (OO).

42. Em Parecer do Professor EE – Professor Coordenador do ISEL – foi feito constar a seguinte menção: “Tendo em conta apenas as obras do sistema de tomada de água da EAM (Estação Aquícola da Acuinova de Mira), considera-se que a elaboração do projecto foi feita sem que se conhecessem, com profundidade suficiente, as condições naturais. Para mostrar é suficiente notar que: - Em nenhum ponto do texto do projecto se fala na existência de lodos, indicando-se sempre a denominação areias quando se fala em sedimentos. No entanto, a maior parte do material sedimentar que entrou para as instalações no incidente de Abril de 2009 eram lodos. – Em nenhum ponto do texto do projecto quando se fala da qualidade da água se indica a possibilidade de ocorrência de turbidez elevada, ou da possibilidade de ocorrência de sedimentos em suspensão com concentrações elevadas. O projecto é omisso relativamente às condições de turbidez da água encontradas pelo empreiteiro no decorrer dos trabalhos. (…) (como decorre de documento nº 16 junto com a contestação apresentada pela ré ACUPM, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (PP).

43. As soluções técnicas do projecto de engenharia e construção da unidade de aquicultura de … foram criadas e desenvolvidas pela Ré Impulso (QQ).

44. A ré Impulso, como entidade encarregue da fiscalização da execução dos trabalhos, tinha que proceder à verificação e controlo das obras executadas em comparação com o projecto técnico, o que compreendia a verificação dos aspectos geométricos e construtivos, o controlo económico das obras e o controlo do seguimento dos prazos de execução globais por tranches (RR).

45. A obra realizada pela ré ACUPM, na qualidade de empreiteira, e projectada, dirigida e fiscalizada pela Ré Impulso, constitui uma unidade de aquicultura, especialmente dedicada ao cultivo do pregado (Psetta maxima), em regime intensivo, com vista a uma produção anual de 7000 toneladas de pregado (SS).

46. A caixa pantalon no caso da captação n.º 1 é afundada no local onde a cota é de cerca de 8 metros de profundidade (TT).

47. A 11 e 12 de Abril de 2009, na unidade de aquicultura da Autora sita na …, entraram massivamente areias e lodos misturados com algas procedentes do fundo do mar através do emissário de captação n.º 1 (UU).

48. Sendo que o material sólido que entrou na unidade de aquicultura depositou-se em todos os órgãos hidráulicos de instalação, incluindo os tanques de cultivo (VV).

49. A entrada referida em 47 e 48 [UU) e VV)] implicou a morte de centenas de milhares de peixes e afectou o funcionamento normal da unidade de aquicultura, dado ter obrigado à interrupção da alimentação de água aos tanques de engorda e pré-engorda (WW).

50. Realizadas inspecções, com mergulhadores, ao sistema de captação n.º 1, foi detectado o seguinte: 1 – a existência de um cone invertido no fundo marítimo resultante de uma cratera de sucção sobre a união entre os tubos de cravação 1 e 2 (último e penúltimo tubos) da tubagem em betão; 2 – a existência de uma abertura na parte superior da união entre os mencionados tubos 1 e 2; 3 – a deslocação de geosacos (sacos de areia) que estavam a tapar a união entre os tubos 1 e 2; 4 – a tela sobreposta sobre a união dos tubos 1 e 2 encontrava-se rasgada e deslocada (XX).

51. Na sequência de inspecções realizadas pela ré Impulso em 17 e 18 de Abril de 2009 ao sistema de captação n.º 1, constatou-se a existência de um cone pronunciado do material em direcção à parte inferior, com uma abertura indevida do tubo de cerca de 12 cm e 2,5 m de largura (YY).

52. Verificando-se assim que os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do emissário de captação nº1 não se encontravam devidamente unidos e encaixados, existindo uma abertura na zona da respectiva junta (ZZ).

53. O aludido em 47 (UU) derivou da abertura da junta entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do emissário de captação nº1 (AAA).

54. A separação entre aqueles tubos 1 e 2 da tubagem de betão do emissário de captação nº 1 provocou a aspiração de toda a areia e lodo situada na parte superior da tubagem, bem como do material novo que o mar deslocou para a zona, o qual entrou no tubo e, por arrastamento da água, se depositou nos restantes elementos hidráulicos da unidade de aquicultura (BBB).

55. A ocorrência da falha na junção entre os tubos 1 e 2 da conduta de betão do sistema de captação nº 1 deveu-se à execução dos trabalhos de dragagem, com sobredragagem da zona onde foi colocada a caixa pantalon associada ao tipo de dragagem efectuada, por sucção, bem como um insuficiente controlo de tais trabalhos, e, posteriormente, pela inadequação da reparação feita em Outubro de 2008 ao troço de betão do sistema de captação nº 1 (CCC).

56. A ré ACUPM, em Outubro de 2008, tomou conhecimento da existência de uma abertura entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do sistema de captação nº 1, abertura que, segundo o projecto de execução, não deveria existir (DDD).

57. No decurso dos trabalhos de preparação para colocação da caixa de ligação – caixa pantalon – que tiveram lugar em Outubro de 2008, os quais incluíram dragagens de fundo e colocação de uma cércea metálica para instalação dessa caixa de ligação, a ré ACUPM detectou o deslocamento do tubo 1 e uma abertura na parte de cima da ligação entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do sistema de captação nº 1, o que foi consignado por aquela ré em Nota Técnica anexa a carta de 13 de Maio de 2009 (EEE).

58. No decurso da realização dos trabalhos que tiveram lugar em Outubro de 2008, e perante a ruptura de ligação entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do sistema de captação nº 1, na acta de trabalhos marítimos nº 4 de 23 de Outubro de 2008 a ré ACUPM aduziu a seguinte menção: “Assim que o mar permita fundeia-se a peça, pretendendo-se que esta operação facilite também a recuperação do tubo de pipe-jacking à sua posição original” (FFF).

59. Perante o ocorrido em Outubro de 2008, quanto ao deslocamento do tubo 1 e desencaixe do tubo 2, a ré ACUPM procurou, ainda em Outubro de 2008, proceder à reparação e realinhamento dos tubos de betão, tendo, procedido a um arranjo que se traduziu em utilizar quatro varões dywidag para aperto dos tubos e sacos de geotêxtil e big-bags com areia para cobertura da abertura (GGG).

60. A ré ACUPM fez constar em Nota Técnica anexa a carta de 13 de Maio de 2009 que “ (…) Remanescendo uma pequena abertura, por impossibilidade de a anular completamente por acção dos varões, a zona foi exteriormente tapada com tela armada de borracha apertada superiormente contra tubo pelos varões dywidag e cobertura de sacos de geotêxtil e big bags com areia, cobrindo-a até ao nível do fundo, lateralmente ao tubo de betão. Os tubos ficaram desde então interligados pelo conjunto dos varões dywidag, prendendo superiormente a tela, impedindo a movimentação dos tubos e garantindo a sua posição relativa” (HHH).

61. Após os trabalhos verificados em Outubro de 2008, a ré ACUPM não efectuou qualquer inspecção ao local por forma a avaliar da fiabilidade dos trabalhos executados e implantados nessa data (III).

62. A ré Impulso não efectuou inspecção ao local por forma a avaliar da fiabilidade dos trabalhos executados e implantados nessa data (JJJ).

63. Em Outubro de 2008, a ré ACUPM comunicou à ré Impulso a situação de afastamento do tubo nº 1 em relação ao tubo nº 2, e poucos dias depois, a ré ACUPM comunicou à ré Impulso que a abertura entre as juntas do tubo estava minimizada (KKK).

64. Apenas em Novembro de 2008 a ré Impulso enviou um mergulhador para observar a zona, o qual, devido a muita turbidez na água, nada viu (LLL).

65. Após essa data, a ré Impulso não determinou a repetição da operação de fiscalização ou de observação dos trabalhos em curso (MMM).

66. A caixa pantalon era mais baixa que a base das tubagens de betão, razão pela qual, para se montar devidamente a caixa tornava-se necessário escavar até à rasante exterior, inferior, da tubagem de betão (NNN).

67. A caixa de união – pantalon – em forma prismática e com ligações PRFV que foi instalada no sistema de captação n.º 1 constituiu uma solução distinta do projecto de execução da ré Impulso, que foi desenhada e adoptada pela ré ACUPM, já que no projecto original se previa uma caixa de forma cilíndrica e peças telescópicas em aço inox e com as juntas com aperto feito por borracha (OOO).

68. Após o referido de 56 a 58 [DDD) a FFF)], a ré ACUPM procedeu à descida da caixa pantalon, a qual ficou mais baixa do que o previsto, devido a dragagens excessivas (PPP).

69. De seguida, a ré ACUPM realizou a montagem da peça em PRFV DN 3000 na ponta do tubo de betão nº 1 reposicionado e tentou realizar a sua ligação à caixa recorrendo à sua rotação (QQQ).

70. Após o evento ocorrido em Abril de 2009, a ré ACUPM realizou alguns procedimentos com vista a solucionar o colapso ocorrido na união entre os tubos 1 e 2, procedimentos que consistiram em: 1 - na selagem da zona afectada da união entre os tubos 1 e 2 de betão armado da captação nº 1 com recurso a chapas de aço coladas com resinas (em Maio de 2009); 2 - na união dos tubos 1 e 2 com manga de goma com o diâmetro interior do tubo e com um comprimento de 3 metros (em Outubro de 2009); 3 - na colocação de uma nova junta AMEX reforçada com 12 anéis de aço e uma manga mais forte (em Março de 2010), procedimentos esses que não permitiram assegurar em definitivo a resolução do problema existente quanto à junção daqueles tubos 1 e 2 da tubagem de betão do emissário de captação nº 1 (SSS)).

71. A reparação definitiva da zona afectada da conduta de betão do sistema de captação n.º 1 só ocorreu com a adopção da solução de colocação de chapas aparafusadas feitas à medida e seladas com resina, que foi implementada em Abril de 2010 (TTT).

72. Por escrito onde consta a data de 19 de Abril de 2010, a ré Impulso confirmou a adequação desta última solução, embora com declaração de desconformidade quanto à data de finalização das obras, que entendia estarem concluídas em 26/6/2009 (UUU).

73. Na sequência do referido em 71 [TTT) procedeu-se à limpeza da tubagem, do poço e do canal de captação n.º 1, o que se concluiu em Maio de 2010 (VVV).

74. A entrada massiva de areias e lodos misturados com algas na unidade de aquicultura através do emissário de captação nº 1 ocorreu em quantidades que ultrapassaram em muito a capacidade dos canais de desarenagem (WWW).

75. Os lodos e as areias encheram completamente o canal de distribuição da água e os tanques, pelo que os peixes ficaram enterrados em areia (XXX).

76. Assim, o aumento de turbidez da água - relacionada com o aumento de quantidade de sólidos em suspensão, designadamente partículas minerais (como argilas) e orgânicas de origem detrítica - e a areia que entrou nos tanques, determinaram a morte dos peixes, o que ocorreu com o evento referido em UU), dada a colmatação que essas partículas provocam nas brânquias dos peixes, impedindo o transporte de oxigénio e, necessariamente, a sua asfixia (YYY).

77. O normal funcionamento dos tanques servidos pelo emissário de captação nº 1 só foi alcançado em Junho de 2010 (ZZZ).

78. A produção desde Abril de 2009 a Maio de 2010, bem como, o fornecimento previsto de alevins de Abril de 2009 a Maio de 2010 ficou condicionado pelo referido em 77 [ZZZ) (AAAA).

79. Durante o período compreendido entre Abril de 2009 a Maio de 2010, a autora procedeu à limpeza dos resíduos acumulados nos circuitos de captação e de retorno de água, por forma a impedir o contínuo aumento da morte dos peixes (BBBB).

80. Na zona de produção, e também com esse objectivo, a autora procedeu às seguintes tarefas: utilizou dois sistemas de limpeza com água de alta pressão a funcionar continuamente, para manter o caudal de água nos locais em que a acumulação de sedimentos afectava a sobrevivência dos peixes; construiu redes de protecção para separar os peixes do sedimento; construiu tubos centrais de rede para facilitar a saída do material sem deixar escapar os peixes; transferiu os peixes vivos dos tanques com níveis mais elevados de sedimentação para outros já limpos; transferiu pessoal técnico do Grupo Pescanova para apoiar a coordenação das tarefas de limpeza, contagem e salvamento de peixes; contratou novos empregados para eliminar os sedimentos dos tanques de cultivo e transferir peixes entre tanques (CCCC).

81. O número de peixes que morreram e que se perderam com o referido em 47 (UU) foi de 171.277 peixes, correspondente a 32.317,26 kg, sobrevivendo 838.568 com a biomassa de 171.295 kg (DDDD).

82. Para além da morte imediata de peixes, o referido em 47 [UU) veio a determinar um acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe (EEEE).

83. A mortalidade dos pregados considerada normal para este tipo de instalação aquícola corresponde a 5% ao ano (FFFF).

84. Até à reparação definitiva, em Maio de 2010, da tubagem do sistema de captação n.º 1, continuou a entrar material nos tanques, o qual apresentava componentes tóxicos, como bactérias e parasitas, que contaminavam os peixes (GGGG).

85. Os cortes de água sucessivos e necessários para as tarefas de reparação do sistema de captação nº 1 pela ré ACUPM, que decorreram entre Abril de 2009 e Abril de 2010, afectaram em grande medida os peixes, provocando um aumento de “stress” na produção destes (HHHH).

86. Numa instalação aquícola normal análoga à da autora, o período de corte de água para tarefas de manutenção e limpeza é no máximo de 4 horas em cada seis meses (IIII).

87. Entre Abril de 2009 e Maio de 2010, em ordem a que a ré ACUPM realizasse os trabalhos de reparação, a autora teve de proceder a cortes de água no total de 890 horas, representando uma afectação em 20% das horas de alimentação dos peixes (JJJJ).

88. O preço médio das existências em stock era de € 3,20 por peixe dos existentes em Abril de 2009 (KKKK).

89. Quanto aos peixes perdidos entre Maio de 2009 e Maio de 2010, o valor por calibre, variava, entre € 2,10 e € 2,30 por peixe.

90. Com a morte dos peixes, a autora perdeu, de igual modo, resultado operacional em 2010 e 2011, que não foi realizado relativamente à mercadoria em stock, afectada, sendo que o preço unitário médio de venda para os anos 2010 e 2011 estava estimado em € 6,00/kg (MMMM).

91. Durante o período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010, devido à redução temporária da capacidade, que ocorreu em virtude do referido em 47 (UU), não entraram no processo produtivo da unidade de aquicultura da autora, 3.312.376 unidades de alevins, como estava previsto, entradas que foram retomadas após aquela última data, sendo certo que a autora não suspendeu totalmente o funcionamento ou exploração daquela unidade de aquicultura, durante esse período (NNNN).

92. Assim, em Abril e Maio de 2009 não se registou a entrada de alevins no processo produtivo e de Junho de 2009 a Abril de 2010 colocaram-se globalmente alevins no processo produtivo a um ritmo inferior ao previsto (OOOO).

93. Em virtude da não entrada de mercadoria no processo produtivo entre Abril de 2009 e Maio de 2010, verificou-se uma redução do volume de vendas, em montante não apurado, nos anos de 2011 e 2012 (PPPP).

94. Em decorrência do evento aludido em 47 (UU), a autora suportou ainda custos relacionados com despesas conexionadas com a limpeza e retirada da mercadoria perdida, com custos de salvamento dos restantes peixes em processo de engorda, incluindo a adopção de soluções de emergência, com custos respeitantes à normalização das operações, como sejam, consumos adicionais de oxigénio e de gasóleo, fardamento para o pessoal, mangueiras e alugueres de autogruas, com despesas relacionadas com horas extra do pessoal da autora, contratação temporária e apoio de pessoal do Grupo Pescanova, no montante não apurado ao certo, mas não inferior a € 285.765,96 nem superior a € 378 622,21 (QQQQ).

95. Devido às tarefas levadas a cabo em acções de reparação da tubagem de captação 1 e da limpeza dos lodos/areias que se iam acumulando nos elementos hidráulicos e nos tanques da unidade de aquicultura, a autora teve que realizar diversos cortes de abastecimento de água, o que levou à necessidade de utilizar o sistema de oxigénio de emergência, com vista à sobrevivência dos peixes (RRRR).

96. Tal sistema de oxigénio funciona mediante injecção de oxigénio individualmente em cada tanque, sendo este método menos eficiente que o sistema de funcionamento normal, que é a injecção desse oxigénio no poço de oxigenação, verificando-se, por isso, um consumo extraordinário de oxigénio não apurado ao certo, mas não inferior a € 14.869,48 nem superior a € 117 490,50 (SSSS).

97. A autora suportou, também o custo com a substituição de 6 impulsores das bombas instaladas no poço de captação nº 1, uma vez que tais bombas destinadas a bombear água, estiveram, devido ao evento aludido, a bombear grandes quantidades de areia corrosiva, o que provocou o desgaste prematuro daqueles impulsores, valor esse que ascende a € 88.500,00 (TTTT).

98. Para a realização de tarefas de limpeza, a autora contratou adicionalmente novos trabalhadores temporários, o que implicou um custo para a autora de € 44.849,55 (UUUU).

99. Devido à constante bombagem de água misturada com areia, foi necessário proceder à limpeza e manutenção das bombas instaladas no poço de captação nº 1, o que implicou, para a autora, um custo de € 32.938,46 (VVVV).

100. A quantidade de areia que entrou na unidade de aquicultura através dos vários pontos do circuito hidráulico e dos tanques de cultivo, determinaram a necessidade de realizar diversos trabalhos realizados de emergência, que implicaram, para a autora, um custo de € 12.015,32 (WWWW);

101. E ainda outros trabalhos que foram sendo necessários ao longo do período que demorou a reparação do emissário de captação n.º 1, o que implicou um custo, para a autora, no valor de € 14 487,15 (XXXX).

102. A autora pagou em Maio de 2009, a título de horas extraordinárias dos trabalhadores nos esforços de salvamento dos peixes, traduzindo-se em 1039 horas realizadas em dias úteis, 441 horas realizadas em fim-de-semana e dias feriados e 200 horas em horário nocturno o montante de € 11.082,03 (YYYY).

103. A autora suportou também as despesas relacionadas com gastos com fardamento para pessoal contratado em regime de trabalho temporário para assistir a autora nas tarefas de limpeza e salvamento de peixes, com gastos de aluguer de bombas, mangueiras e outro material necessário para as limpezas, com custos extraordinários com consumíveis e ferramentas de desgaste rápido, com gastos com aluguer de gruas para retiradas e recolocação de bombas sujeitas a manutenção extraordinária como consequência do acidente, com gastos extraordinários com água doce necessária às limpezas dos tanques de cultivo contaminados com bactérias e parasitas, com custos com retirada e destruição dos peixes mortos por parte de gestor autorizado, perfazendo o montante de € 67.023,97 (ZZZZ).

104. A autora suportava custos financeiros uma vez que celebrou, para efeitos de desenvolvimento das suas actividades de aquicultura, um contrato de Project Finance com um sindicato bancário que envolvia um financiamento com uma taxa de juro que foi fixada por contratos SWAP em 3,775% acrescida de um spread de 2,7%, do qual resultava um custo médio de financiamento para a autora à taxa de 6,475% (AAAAA).

105. Após o evento ocorrido em 11 e 12 de Abril de 2009, a autora comunicou de imediato o sucedido à ré ACUPM (CCCCC).

106. Nos termos do projecto de execução anexo ao contrato, a conclusão da Fase 1 estava originariamente prevista para 31.10.2008, data em que o emissário de captação 1 deveria estar totalmente concluído em toda a extensão dos seus 3.000m e os ensaios realizados, seguindo-se-lhe a entrada em serviço parcial da instalação (entrada de peixes) (DDDDD).

107. Em reunião de seguimento n.º 42, realizada em 31.07.2008, a autora comunicou que pretendia colocar alevins na instalação a partir de 1/9/2008, iniciando assim nessa data a exploração comercial da instalação com 20 tanques, em 1/10/2008 com 20 adicionais e em 1/11/2008 com outros 20 adicionais, ficando agendada uma reunião para o dia seguinte e declarando o ACUPM que tudo faria para concretizar esse objectivo (EEEEE).

108. Em sequência do referido em 107 (EEEEE), a ré Impulso iniciou o projecto de antecipação, cujos primeiros desenhos provisórios foram remetidos à Autora e à ré ACUPM em 7/8/2008 (FFFFF).

109. Esse projecto de antecipação previu que antes da colocação da caixa pantalon, a captação fosse feita a 1.500m do poço, a partir da extremidade aberta do 1.º tubo da conduta de betão, com captação a cerca de 8 m abaixo do fundo do mar, a partir da extremidade aberta do 1.º tubo de betão, em zona próxima da rebentação (GGGGG).

110. Sendo que, aquando do referido em 109 (GGGGG), a captação da água era feita por vãos comunicantes entre o mar e o poço de captação, com a comporta fechada, entrando a água proveniente do emissário em betão para poço através de mangueiras instaladas na comporta, que a conduziam até dois tanques provisórios instalados dentro do poço de captação, de onde era bombeada a água para os tanques dos peixes (HHHHH).

111. Após a colocação da caixa pantalon, a tomada de água provisória passaria a fazer-se através de um riser provisório, com cinco metros de altura e 2,5 m de diâmetro, colocado na “entrada de homem” da caixa pantalon, situada na sua parte superior, já com a comporta aberta, os tanques provisórios retirados e o sistema de bombagem definitivo em funcionamento (IIIII).

112. Na data do anúncio de antecipação de entrada dos alevins (31.07.2008), nos trabalhos de mar estava terminada a tunelação, não tendo a tuneladora sido retirada do mar quando previsto pelo que existiu um atraso na colocação do pantalon (JJJJJ),

113. Situação que continuou durante o mês de Agosto de 2008 e de que foi dado conhecimento da autora (KKKKK).

114. Ainda em Agosto de 2008 teve início a execução do projecto de antecipação, tendo em vista a exploração parcial antecipada da Fase 1 da instalação (LLLLL).

115. Entretanto, a comporta do poço de captação n.º 1 ficou instalada e iniciou-se o enchimento do emissário, com a comporta fechada (MMMMM).

116. A Ré Impulso entendia que a dragagem para retirada da tuneladora (efectuada em torno desta e executada até à geratriz inferior do emissário) poderia ser executada em simultâneo com o referido em 115 (MMMMM) (NNNNN).

117. A tuneladora foi separada do 1.º tubo da conduta de betão em início de Setembro de 2008, tendo sido retirada em 9/9/2008 (OOOOO).

118. A autora recebeu parcial e provisoriamente a Fase 1 da obra em 25.09.2008 (PPPPP).

119. Apenas foram vistoriados os trabalhos de terra, o mesmo não sucedendo com os trabalhos de mar, designadamente, ao emissário em betão (QQQQQ).

120. Foram realizados testes de bombagem para os tanques provisórios em 24.09.2008 (RRRRR).

121. A captação de água a partir da extremidade aberta do 1º tubo da conduta de betão, conforme projecto de antecipação teve início a 25.09.2008 (SSSSS).

122. A dragagem para instalação da caixa pantalon foi iniciada a 21 de Setembro e concluída a 30 de Setembro de 2008 (TTTTT).

123. Esta dragagem foi realizada com draga de sucção e abaixo da geratriz inferior do emissário, visando o posicionamento da caixa pantalon à cota final e a sua ligação por aparafusamento à flange do 1.º tubo da conduta de betão (UUUUU).

124. A ré Impulso enviou email ao ACUPM a 28.09.2008 efectuando observações quanto a atrasos na obra do mar entendendo que os ritmos de dragagem na zona de colocação de pantalon eram muito inferiores ao necessário pelo que a ré Impulso solicitou reunião a ter lugar a 30.09.2008 com os responsáveis de obras marítimas (VVVVV).

125. Em 02.10.2008 teve início a entrada de alevins na instalação (WWWWW).

126. Entre 01.10.2008 e 13.10.2008, os recursos marítimos estiveram parados em porto, devido às condições marítimas, não havendo trabalhos no emissário de captação nº 1 neste período (XXXXX).

127. A vala realizada por dragagem para o resgate da tuneladora teve de se manter aberta desde a data referida em 117 (OOOOO), de modo a permitir a captação de água para a instalação através da boca do emissário de betão, como decorria do projecto de antecipação (YYYYY).

128. Em 13.10.2008, no decurso dos trabalhos preparatórios de colocação da caixa pantalon, e aquando da colocação de uma cércea metálica de apoio à montagem à caixa pantalon, os mergulhadores constataram a existência de um desnivelamento dessa cércea, incompatível com a instalação da caixa pantalon, observando que o desnível ocorria no último tubo, detectando uma abertura na junta entre os dois últimos tubos (1 e 2) (ZZZZZ).

129. Devido à impossibilidade de retirada e anulação do último tubo de betão – uma vez que só este último estava preparado no seu topo para permitir a ligação aparafusada ao elemento de ligação em PRFV – foi construída pelo exterior uma estrutura de puxe e ligação entre os tubos, composta por 4 varões dywidag, instalados no sentido do emissário, sobre chapas metálicas aparafusadas nos dois tubos, saindo as respectivas paredes exteriores, que, por aperto, os foram aproximando no sentido da sua posição inicial, o que mereceu a concordância e autorização da ré Impulso (AAAAAA).

130. Por subsistir uma abertura que o ACUPM não conseguiu anular completamente por acção dos varões, a zona de abertura foi exteriormente tapada com tela armada de borracha, apertada superiormente contra o tubo pelos varões dywidag e coberta com sacos de geotêxtil e big bags de areia, cobrindo-a até ao nível do fundo, lateralmente ao tubo de betão (BBBBBB),

131. Pelo que os tubos ficaram interligados pelo conjunto dos varões dywidag, impedindo o movimento dos tubos e garantindo a sua posição relativa, o que foi efectuado com o acordo da ré Impulso (CCCCCC).

132. Entre 17 e 19 de Outubro procederam-se aos trabalhos de colocação da caixa pantalon (DDDDDD).

133. Em Novembro de 2008 teve início o afundamento da peça em PRFV de ligação da caixa pantalon à conduta em betão (EEEEEE).

134. Em final de Novembro 2008 foi colocado um riser provisório, com um metro de diâmetro, na caixa pantalon, através do qual a captação da água passou a ser feita, substituindo a tomada de água pela boca da conduta de betão (FFFFFF).

135. Tal riser foi substituído em 28.11.2008 por um segundo riser provisório, com 2,50 m de diâmetro e 5 m de altura e também colocado na parte superior da caixa pantalon (GGGGGG).

136. Em 10.12.2008 a comporta do poço de captação 1 foi aberta, após retirada dos tanques e sistema de bombagem provisórios, passando a água utilizada na exploração da autora a ser captada através do segundo riser provisório, para o poço de captação 1 e já com o sistema de bombagem definitivo em funcionamento (HHHHHH).

137. A água utilizada na exploração era captada a 1 500m do poço de captação, numa zona de maior turbulência marítima e com maior quantidade de sedimentos em suspensão do que a zona de captação prevista no projecto inicial que se situava a cerca de 2,5km da costa (IIIIII).

138. A unidade de aquicultura da autora possui, desde 15 de Dezembro de 2008, equipamento que permite a medição e registo de valores de turbidez, instalado perto do poço de captação 1 (JJJJJJ).

139. Devido a más condições climatéricas e de mar, os trabalhos de mar foram retomados em meados de Fevereiro 2009, com redragagens para permitir a realização da ligação da caixa pantalon a um dos tubos em PEAD (tubo sul) (KKKKKK).

140. Após o referido em 47 (UU) as operações de limpeza pelo ACUPM tiveram início a 16.04.2009 (LLLLLL).

141. Os mergulhadores verificaram que o riser estava em boas condições, tendo apenas sido reapertadas as oito correntes metálicas que o prendiam à caixa pantalon (MMMMMM).

142. Em 18.04.2009 e no decurso de novo mergulho, verificou-se a existência no fundo do mar das condições referidas em 50/XX (NNNNNN).

143. Procedeu-se, de imediato, a uma primeira reparação, pelo exterior, com cobertura com tela de borracha armada e sacos de areia, por esta ser a forma mais rápida de selar a entrada de areia (OOOOOO).

144. Em sede de reunião de mar n.º 27, realizada em 23.04.2009, foi analisada uma solução provisória, ficando o ACUPM de estudar e apresentar solução definitiva no espaço de uma semana (PPPPPP).

145. Na reunião de mar n.º 28, realizada em 29.04.2009, o ACUPM propôs solução de protecção e fecho da abertura com resina e chapa metálica de aço inox 360L, de 3mm pelo interior do tubo, e posterior injecção com resina de poliuretano, de modo a tapar-se o espaço entre os dois primeiros tubos, o que foi objecto de aprovação por parte da ré Impulso (QQQQQQ).

146. Após visualização de vídeo efectuado em mergulho ao local, foi possível observar que o último tubo havia basculado; que o anel do penúltimo tubo do emissário estava arrancado, e as armaduras de 08 da sua amarração à armadura longitudinal do tubo de betão haviam cedido (RRRRRR).

147. A solução aludida em 145 (QQQQQQ) supra ficou concluída em 13.05.2009 (SSSSSS).

148. A reparação foi testada, conforme acordado com a autora e ré Impulso, com a colocação em funcionamento crescente e gradual das bombas do poço de captação 1, o que foi acompanhado por mergulhadores (TTTTTT).

149. Em final de Maio de 2009 entrou em funcionamento a captação pelo PEAD sul, tendo nessa data sido tapado e deixado de funcionar o riser provisório (UUUUUU).

150. O ACUPM e a IMPULSO declararam entender que em 26.06.2009 terminaram todos os trabalhos relativos à captação 1 (VVVVVV).

151. No início de Outubro de 2009, a ré ACUPM sobrepôs à reparação de Maio uma junta AMEX (manga e tela de borracha presa por anéis, comprimindo-a contra as paredes do tubo) e que se veio a rasgar quando foram realizados os ensaios de bombagem, em 13.10.2009 (WWWWWW).

152. Além do rompimento referido em 151 (WWWWWW), perdeu-se a cofragem metálica interior (que deixou a selagem com resina à vista e sem a sua protecção complementar (XXXXXX).

153. Foi encomendada nova junta AMEX com tela reforçada, menos maleável e manuseável, o que impossibilitou a sua colocação (YYYYYY).

154. Em alternativa à junta AMEX foi desenvolvida uma nova solução que consistia na cobertura da abertura (selada com resina) com chapas de aço inox moldadas e solidarizadas por aparafusamento às superfícies expostas dos tubos e posterior injecção com calda de cimento, o que foi efectuado em Abril de 2010, com sucesso (ZZZZZZ).

155. A autora recebeu provisoriamente a fase 1 em 19.04.2010 (AAAAAAA).

156. No auto desta recepção, a ré ACUPM e a ré Impulso manifestaram que não aceitavam a data de 19.04.2010, registando ambos que os trabalhos tinham se haviam concluído em 26.06.2009, conforme 150 (VVVVVV) (BBBBBBB).

157. Existem habitualmente manchas em suspensão ao largo de Mira, provenientes da Ria de Aveiro e do Rio Vouga, desenvolvendo-se até vários quilómetros da costa, em frente à instalação da piscicultura e abrangiam a zona onde se localizava o riser provisório, por onde à data e desde 10.12.2008 se realizava a captação de água para a instalação (CCCCCCC).

158. O projecto de execução elaborado pela ré Impulso previu que a agitação intensa poderia provocar instabilidade nas valas de dragagem, assim como a aspiração dos sedimentos postos em suspensão pelas ondas, para a situação das captações definitivas (DDDDDDD).

159. Em situações de agitação marítima intensa, que também se verificaram durante o período de captação provisória, as quantidades de sedimentos em suspensão aumentam, potenciando a aspiração de maiores quantidades dos mesmos sedimentos pelas captações (EEEEEEE).

160. A partir do início da exploração e bombagem de água ao abrigo da solução do projecto de antecipação, o emissário ficou exposto à entrada de areias e sedimentos em suspensão (FFFFFFF).

161. A exploração antecipada coincidiu com a execução de trabalhos de mar pela ré ACUPM na zona de captação provisória da água, o que provocou a colocação de material sedimentar em suspensão (GGGGGGG).

162. O último tubo do emissário ficou descalço e, devido à perda do seu apoio inferior, gerou esforços de tracção sobre a junta entre os tubos 1 e 2 da conduta de betão (HHHHHHH).

163. O projecto de execução não previu a possível falta de resistência das juntas dos tubos de betão aos esforços de tracção nas juntas.

164. Era necessário efectuar dragagem, para a instalação da caixa pantalon, na rasante exterior inferior do emissário, de modo a permitir o posicionamento da caixa pantalon à cota final e a sua ligação por aparafusamento à flange do 1º tubo da conduta de betão (IIIIIII).

165. O projecto de execução entregue à autora não previa a hipótese de a dragagem para a instalação da caixa pantalon expor os últimos tubos ao descalçamento e à acção da ondulação; as juntas dos últimos tubos não estavam preparadas ou protegidas para o descalçamento e para a acção da ondulação.

166. O modo e velocidade de execução da dragagem veio a determinar o descalçamento do 1º tubo e aumentaram os esforços de tracção nas juntas entre os tubos, levando à sua abertura máxima detectada em 13.10.2008 (JJJJJJJ).

167. A ré ACUPM sempre entendeu e comunicou à autora e ré Impulso que a ocorrência da abertura se devia a esforços de tracção na junta, não previstos no projecto entregue àquela primeira (KKKKKKK).

168. Após o evento de Abril de 2009, a ré ACUPM procedeu a limpezas, reparações e intervenções na unidade de aquicultura exigidas pela autora (LLLLLLL).

169. O ACUPM sempre informou a autora e a ré Impulso do andamento dos trabalhos e dos problemas que iam surgindo (MMMMMMM).

170. A ré ACUPM sempre se sujeitou à fiscalização promovida pela ré Impulso, também durante os trabalhos de instalação e construção do colector de captação de água marinha – emissário I (NNNNNNN).

171. A execução do emissário 1 foi efectuada pela ré ACUPM com uma inclinação diferente daquela que foi projectada pela ré Impulso sem que previamente tenha consultado a ré Impulso (OOOOOOO).

172. Logo que terminado o trabalho de escavação e instalação dos tubos de betão, a ré Impulso procedeu à inspecção do túnel, o que permitiu verificar que as condições finais de selagem de juntas, selagem de injectores de betonite e condições gerais de execução dos túneis apresentavam-se com um grau de perfeição de execução, acabamento, selagem e limpeza, muito bom (PPPPPPP).

173. A partir do momento em que se iniciou o funcionamento da instalação (em 25 de Setembro de 2008), tornou-se difícil o trabalho de fiscalização a realizar na parte de dentro do emissário, devido ao contínuo processo de toma de água do mar (QQQQQQQ).

174. A instalação entrou em funcionamento mediante colecta de água efectuada pelo emissário 1, o qual apenas havia sido executado até à conclusão do lanço feito de peças de betão (RRRRRRR).

175. Em Outubro e Novembro de 2008, estando em funcionamento a instalação, os trabalhos de construção do emissário, mediante a colocação da peça de ligação entre o tubo de betão e os dois tubos de polietileno de alta densidade, continuaram (SSSSSSS).

176. Os trabalhos de concepção da caixa pantalon, dragagens a efectuar para a colocação dessa mesma peça no leito marinho e modo de conexão da mesma com os tubos, quer os de betão, quer os de polietileno de alta densidade, foram efectuados com base em projecto elaborado pela ré ACUPM e não com base no projecto original da ré Impulso (TTTTTTT),

177. Sendo que a forma daquela caixa que veio a ser implementada na obra é prismática, quando na concepção da ré Impulso teria a forma cilíndrica (UUUUUUU).

178. A mudança da forma daquela caixa conduziu a modificações nos sistemas de ligação das condutas à caixa de união (VVVVVVV).

179. A solução apontada pela ré ACUPM quanto à caixa com forma prismática, levou-a a aprofundar o nível da plataforma de assentamento da sua soleira, o que fez descalçar o primeiro tubo do lanço de betão do emissário 1 (WWWWWWW).

180. Os trabalhos de dragagem com vista à retirada da tuneladora e a colocação da peça pantalon foram efectuados com máquinas de dragagem diferentes das que haviam sido previstas pela ré impulso no seu projecto (XXXXXXX).

181. Por se ter dragado mais do que estava projectado, ocorreu uma sobre-escavação, o que determinou que ficasse retirada a base de sustentação do tubo 1 do emissário (YYYYYYY).

182. A ré ACUPM, cumprindo o projecto da ré Impulso, deveria ter procedido à regularização (nivelação) da zona dragada com brita, permitindo, assim, salvar o desnível entre o fundo da peça e a rasante do tubo de cravação (ZZZZZZZ).

183. Em 13 de Outubro de 2008, a ré ACUPM comunicou verbalmente a ré Impulso que, aquando da colocação da peça pantalon, o tubo 1 deslocou-se (AAAAAAAA).

184. Tendo sido decidido pelas rés ACUPM e IMPULSO a instalação de um mecanismo de tracção de modo a conseguir levar o tubo 1 à sua posição original, o que não foi conseguido, o que significou que o referido tubo ficou afastado do tubo 2 (BBBBBBBB).

185. A fim de assegurar que o tubo 1 não se tornaria a mover desse modo afastando-se do tubo 2, foram colocadas barras de aço no exterior desses dois tubos a uni-los (CCCCCCCC).

186. Quando a ré Impulso tentou verificar o referido em 184 e 185 (BBBBBBBB) e CCCCCCCC), em Novembro de 2008, não conseguiu observar no local tal situação, devido a más condições de visibilidade (DDDDDDDD).

187. A ré Impulso informou a ocorrência do referido em 184, 185 e 186, [AAAAAAAA), BBBBBBBB) e CCCCCCCC] à Autora (EEEEEEEE).

188. Aquando do referido em 184 e 185 [BBBBBBBB) e CCCCCCCC], a ré ACUPM com acordo da ré Impulso colocou sacos de areia no local onde ocorreu a deslocação do tubo 1 (na junta entre este e o tubo 2) (FFFFFFFF).

189. A abertura inicial que se verificou em Outubro de 2008 entre os tubos 1 e 2, por efeito da deslocação do tubo 1, foi cerca de 30 centímetros e, após os trabalhos de tracção promovidos pela ré ACUPM, de modo a aproximar os dois tubos, a abertura ficou em cerca de 12 centímetros (HHHHHHHH).

190. Em Novembro de 2008 a ré ACUPM procedeu à instalação de um riser, como referido em 134 (FFFFFF), contra a vontade da ré Impulso, não obstante esta última entender que seria necessário elaborar um projecto específico para tal efeito (IIIIIIII).

191. A ré Impulso declarou, quer à autora, quer à ré ACUPM, que não assumia qualquer espécie de responsabilidade relacionada com funcionamento da instalação por via da toma da água efectuada pelo riser provisório, até porque a colocação, em chaminé, do riser (tubo de captação) provisório em cima da peça pantalon, corria o risco de tombar caso todo o conjunto não fosse aterrado até à cota do perfil natural do fundo marinho (JJJJJJJJ).

192. Uma vez que a inviabilização da possibilidade de se prosseguir com os trabalhos de finalização do emissário acarretaria o incumprimento do prazo de 30 de Novembro, a autora manifestou a sua intenção de não colocar mais peixes na instalação caso a ré ACUPM e a ré Impulso não assegurassem a estabilidade da peça de captação provisório, mais alertando que o incumprimento do prazo estabelecido acarretaria prejuízos económicos e aplicação de multas contratuais (KKKKKKKK).

193. Nessa sequência, em 30/11/2008, autora e ré ACUPM elaboraram um acordo que passava pelas seguintes estipulações: 1 - Ambos reconheciam que o emissário de toma de água não estava concluído, apesar disso, ambos aceitavam que se executasse o projecto de captação de água provisória da autoria da ré ACUPM, iniciando-se a respectiva toma de água cujo fluxo era garantido pela ré ACUPM em caudal suficiente para a entrada e exploração da unidade aquícola; 2 - Esse início de funcionamento da captação de água provisória era efectuado sem que se realizassem as provas e ensaios tal como previstos no projecto da ré Impulso; 3 - Ambos aceitavam a recepção provisória da obra da Fase 1, pelo que ao que respeitava ao emissário de captação, ficava adiada para 01 de Maio de 2009, apenas se procedendo à entrega parcial e recepção provisória da restante obra; 4 - A ré ACUPM assumia, individualmente ou por via da Seguradora, toda a responsabilidade por qualquer dano provocado à autora por via da utilização da captação da água provisória, até ao limite de € 6.000.000, nomeadamente e sobretudo caso essa mesma captação falhasse desse modo, causando um evento de mortalidade anormal de peixes; 5 - A autora assumia, individualmente, toda a responsabilidade por aquilo que pudesse acontecer aos peixes que já se encontravam nas instalações na data da entrada em funcionamento da captação provisória; 6 - A autora aceitava apenas aplicar a cláusula contratual que, no contrato de construção por si celebrado com a ré ACUPM, previa a aplicação de penalizações por atraso na entrega da obra em cada uma das suas fases, apenas a partir do dia 01 de Maio de 2009 (LLLLLLLL).

194. Por decisão tomada entre a autora e a ré ACUPM foi instalado esse riser, tendo entrado em funcionamento no final do mês de Novembro de 2008 (MMMMMMMM).

195. Após a entrada em funcionamento do sistema de captação provisório e até ao mês de Fevereiro de 2009, não foi possível retomar os trabalhos de conectar o pantalon com os tubos de polietileno (NNNNNNNN).

196. Em Fevereiro de 2009 reiniciaram-se os trabalhos de dragagem em condições adversas - os aterramentos ocorriam continuamente, a visibilidade era nula atenta a turbidez da água e ocorreram várias avarias nas bombas (OOOOOOOO).

197. Tal falta de visibilidade ficou a dever-se à presença de sedimentos na água provocados pela própria dragagem, que ao depositar os materiais dragados próximos da zona de trabalho, não evitava que os mesmos, devido à força das correntes marítimas, acabassem por voltar para o mesmo sítio (PPPPPPPP).

198. Por diversas vezes a ré Impulso comunicou a ré ACUPM considerar haver deficiente planificação dos trabalhos marítimos e deficiente instrução das equipas nas frentes de obra (QQQQQQQQ).

199. Por diversas vezes a ré Impulso comunicou ao ACUPM entender haver falta de meios técnicos e humanos adequados como o número inadequado de pontões; roturas evitáveis de vários aparelhos; falta de equipamentos de comunicação adequados entre mergulhadores; falta de pessoal conhecedor das especificidades das tarefas (RRRRRRRR).

200. A partir do fim de Março de 2009, a água que chegava à instalação captada do mar por via do emissário 1, começou a apresentar níveis de turbidez gradualmente elevados (SSSSSSSS).

201. A entrada massiva de areias e lodos em Abril de 2009 teve origem na fissura ocorrida entre os tubos 1 e 2 (TTTTTTTT).

202. Em 17 e 18 de Abril de 2009, quando as condições marítimas permitiram, a ré Impulso procedeu a inspecção ao local onde havia ocorrido a fissura entre os tubos 1 e 2 por causa da fissura ocorrida em Outubro de 2008, devido à execução de dragagens excessivas e efectuadas em muita proximidade do extremo livre do tubo 1, uma vez que foram efectuadas em cotas mais profundas do que a rasante exterior desse tubo e em condições de baixa visibilidade (UUUUUUUU).

203. A fissura originária havia atingido uma dimensão de cerca de 30 cm entre os dois tubos com uma longitude em arco de circunferência de cerca de 3 metros (VVVVVVVV).

204. Em Abril de 2009 a fissura era a mesma que se havia verificado em Outubro de 2008, mantendo-se com as mesmas dimensões da posição final então conseguida (WWWWWWWW).

205. Os sacos de areia colocados em Outubro de 2008 deslocaram-se (XXXXXXXX).

206. Em Maio de 2009 a ré ACUPM instalou uma série de chapas de aço inoxidável na zona da junta as quais foram injectadas com resinas, como medida provisória (YYYYYYYY).

207. Com essa medida os níveis de turbidez da água baixaram (ZZZZZZZZ).

208. Em 14 de Agosto de 2009 a ré Impulso informou a autora e a ré ACUPM de que se verificava ainda a existência de uma fuga na união entre os tubos 1 e 2, numa zona onde as chapas utilizadas como cofragem perdida se deslocaram e ainda outros dois pontos de possível fuga (AAAAAAAAA).

209. Nessa sequência, a ré Impulso e o ACUPM optaram por uma solução com base na instalação de chapas fixadas mecanicamente e injectadas (BBBBBBBBB).

210. Face à insistência da Impulso e da Autora, de que a solução não era satisfatória, a ré ACUPM colocou, a 11 de Outubro de 2009 uma manga de borracha por dentro da tubagem afectada, tensionada por anéis de aço contra as paredes interiores das tubagens a fim de garantir a estanquicidade da zona afectada (CCCCCCCCC).

211. Tal medida não se revelou adequada para garantir a plena estanquicidade (DDDDDDDDD).

212. Como durante o período de Inverno não seria possível aplicar uma solução definitiva, a ré ACUPM selou os pontos de fuga com resinas sintéticas para assegurar a estanquicidade durante o Inverno (EEEEEEEEE).

213. Em Abril de 2010 foi aplicada uma medida definitiva com recurso a um levantamento exaustivo da forma da junta, elaboração de uma junta (anel) em aço para sobrepor e aparafusar, injectando-se com cimento sem retracção pelo seu interior, medida essa capaz de resistir aos testes de bombagem levados a cabo posteriormente e tendo sido validada pelas inspecções efectuadas subsequentemente (FFFFFFFFF).

214. Devido ao facto de a autora ter procedido à antecipação do funcionamento das instalações da unidade de aquicultura, não foi possível proceder aos ensaios prévios (GGGGGGGGG).

215. No decurso das obras marítimas esteve presente, em algumas ocasiões, no local das obras um representante da ré Impulso, destacado para a fiscalização, o qual tinha o seu posto de trabalho no batelão que realizava as obras (HHHHHHHHH).

216. A ré Impulso assegurou a fiscalização da obra com a presença de dois directores da obra, uma directora-adjunta, dois engenheiros de vigilância e seguimento da obra marinha trabalhando com uma equipa de apoio ao controlo da obra marinha, uma equipa de mergulhadores de controlo da obra marinha, dois engenheiros responsáveis pela obra em terra, um engenheiro responsável da edificação trabalhando em colaboração com uma engenheira industrial e um engenheiro de construção, dois geólogos responsáveis pelas terraplenagens e movimentos das terras, dois engenheiros responsáveis pelas instalações, um engenheiro responsável de instalações eléctricas, um engenheiro responsável de estruturas trabalhando em colaboração com um engenheiro de estruturas, um engenheiro responsável de hidráulica trabalhando em colaboração com dois engenheiros de infra-estruturas, um engenheiro responsável de meio ambiente e um coordenador de segurança e saúde no trabalho, embora nem todos permanecendo diariamente no local (IIIIIIIII).

217. A ré Impulso manteve uma presença permanente de controlo da própria obra, tendo instalações próprias dentro do recinto de construção (JJJJJJJJJ).

218. Elaborou um diário de obra com registo detalhado das empresas presentes em obra, do pessoal de cada empresa e qualificação profissional dos mesmos, dos meios e equipamentos de serviço, da descrição sucinta dos trabalhos em curso e da descrição das condições meteorológicas (KKKKKKKKK).

219. Elaborou um registo de modificações, com detalhe específico das modificações solicitadas, o solicitante, a data da solicitação e os impactos de cada modificação sobre os objectivos de custo e prazos estipulados (LLLLLLLLL).

220. Seguiu a execução física e financeira da obra (MMMMMMMMM).

221. Elaborou um registo de materiais e equipamentos, por via do qual cada material ou equipamento que entrava em obra era submetido a protocolo de inspecção (NNNNNNNNN).

222. Procedeu ao registo das horas de trabalho (OOOOOOOOO).

223. Celebrou reuniões para seguimento dos trabalhos, elaborando actas dessas reuniões assinadas por todas as partes e registadas em livros de actas próprios (PPPPPPPPP).

224. No que concerne à obra marítima, procedeu ao controlo das seguintes questões: 1 - Controlo do fabrico da máquina que traçou os túneis com inspecção “in situ” da respectiva fábrica localizada na Alemanha; 2 - Controlo do fabrico dos moldes que serviram para fabricar os tubos de betão dos emissários marítimos com vista “in situ” à respectiva fábrica na Alemanha; 3 - Controlo das operações de saída dos tubos e acompanhamento da viagem até ao Porto de Aveiro; 4 - Controlo de recepção e aprovisionamento dos tubos de polietileno no Porto de Aveiro; 5 - Controlo de fabricação dos tubos de betão dos emissários marítimos “in situ”; 6 - Controlo de fabricação dos lastros; 7 – Controlo de aderência dos lastros; 8 - Controlo de execução dos poços de instalação dos tubos; 9 - Controlo das operações de tunelagem dos emissários nomeadamente os tipos de tubos inseridos, modo de empurre e desvios direccionais; 10 - Controlo da geometria das dragagens mediante batimetrias; 11 - Controlo dos dias, volumes e meios de dragagem empregues; 12 - Controlo das operações marinhas e submarinas mediante a presença assídua de engenheiro ou engenheiros nas duas frentes; 13 - Na parte final da obra, elaboração de um registo de filmagens submarinas; 14 - Na parte final da obra, controlo das operações submarinas através de equipas de mergulho próprias (QQQQQQQQQ).

225. A autora recebeu entretanto quantias pagas pela ré Mapfre, para liquidação de indemnização por danos sofridos com o evento ocorrido em Abril de 2009, aqui não valoradas (RRRRRRRRR).

 

Factos dados como não provados:

1. Que a falha aludida em 55 (CCC) se devesse também a eventuais esforços adicionais para ligar o tubo de betão à caixa pantalon;

2. Que na ocasião referida em 63 (KKK), a ré ACUPM comunicasse à ré Impulso que a situação de afastamento do tubo nº 1 em relação ao tubo nº 2 era de 12 cm, e poucos dias depois comunicasse que o tubo já estava no seu sítio original, faltando apenas 2 cm entre os tubos.

3. Que ao fazer o aperto da peça em PRFV o tubo 1 se desencaixasse do tubo 2 e que a junta entre os tubos 1 e 2 da tubagem de betão do sistema de captação nº 1 ficou pré-aberta ainda que não totalmente.

4. Que devido ao referido em 47 (UU) ocorresse a morte de mais 272.034 peixes acima do standard normal.

5. Que as patologias bacterianas e parasitárias no tipo de situações descritas em 84 [GGGG: por lapso a decisão do tribunal a quo remeteu para a alínea GGG) tenham um período de desenvolvimento de cerca de 6 meses.

6. Que a morte de 272.034 peixes determinasse um custo de € 639.279,83.

7. Que a perda de margem de comercialização, em 31 de Dezembro de 2011, ficasse estimada em € 1.316.965,67, valor que se traduz na consideração da quantidade correspondente à mercadoria localizada na zona afectada que seria vendida à data em que atingiria o calibre comercial, deduzida de uma taxa anual de mortalidade de 5%; a consideração de distribuição de calibre comercial por intervalo de peso, de modo a determinar o total de quilos vendidos por categoria; o preço unitário de venda média de € 7,30 e a margem de 38,1% após custos variáveis.

8. Que a redução referida em 91 (NNNN) se devesse a evitar a perda de alevins com custos acrescidos.

9. Que a falta de entrada referida em 92 (OOOO) se devesse a evitar custos acrescidos, apenas tendo sido retomada a entrada em termos normais a partir de Maio de 2010.

10. Que a redução fosse de 4.009 toneladas, que corresponde a uma margem de comercialização não realizada de mercadoria no valor de € 9.840.259,61.

11. Que o custo referido em 98 (UUUU) fosse de € 38.042,04.

12. Que o custo referido em 103 (ZZZZ) fosse de € 64.066,71.

13. Que o financiamento referido em 104 (AAAAA) fosse estruturado de € 94.000.000,00 a 14 anos.

14. Que os prejuízos suportados pela autora com os seus financiamentos até 31 de Dezembro de 2011 fossem de € 2.278.529,13.

15. Que a autora desse ao projectista e ao empreiteiro apenas um mês para elaborar o projecto de antecipação e para o executar.

16. Que a ré Impulso não cuidasse de avisar o dono da obra dos riscos de implementação da antecipação.

17. Que a captação fosse a cerca de 12 metros abaixo da cota prevista.

18. Que o referido em 115 (MMMMM) tivesse ocorrido em 30/8/2008.

19. Que o referido em 116 (NNNNN) fosse efectuado por instruções da ré Impulso.

20. Que a tuneladora fosse separada a 4/9/2008 e ficasse no fundo da vala porque os pontões tiveram que regressar ao porto devido ao agravamento das condições de mar, regressando em 8/9/2008.

21. Que fosse a autora e a ré Impulso a vistoriarem os trabalhos de terra.

22. Que a dragagem referida em 123 (UUUUU) tenha sido realizada para as cotas previstas no projecto.

23. Que a dragagem referida em 123 (UUUUU) fosse executada com demora e cautela para que o equipamento não batesse na tubagem de betão e/ou PEAD.

24. Que os recursos marítimos referidos em 126 (XXXXX) estivessem parados desde 30.09.2008 e que nos dias 03 e 04 de Outubro estivessem activos noutras frentes.

25. Que os trabalhos referidos em 128 (ZZZZZ) implicassem nova dragagem, prevista em projecto, para acerto da vala efectuada para o resgate da tuneladora e dos assoreamentos verificados devido à força das correntes e agitação marítima.

26. Que a abertura referida em 130 (BBBBBB) fosse pequena e fosse impossível anulá-la completamente.

27. Que o início do afundamento referido em 133 (EEEEEE) fosse a 13 de Novembro e a ligação ficasse concluída em 26.11.2008.

28. Que o riser referido em 134 (FFFFFF) fosse colocado a 21 de Novembro.

29. Que os trabalhos de mar ficassem apenas concluídos em 24/2/2009 e que a ligação aludida em 139 (KKKKKK) ficasse concluída em 6 de Abril de 2009.

30. Que na reunião aludia em 144 (PPPPPP) fosse analisada uma solução definitiva que passava pela selagem pelo interior da zona da abertura, servindo a reparação feita pelo exterior como cofragem perdida, ou seja, proceder a selagem da abertura pelo interior com injecção de resina poliuretana expansiva, envolvendo brita e coberta com cofragem metálica inox perdida;

31. Que a solução referida em 145 (QQQQQQ) fosse objecto de aprovação pela Autora.

32. Que o basculamento do último tubo se devesse ao arranque do anel do penúltimo tubo do emissário, por cedência das armaduras de 08 da sua amarração à armadura longitudinal do tubo de betão.

33. Que a reparação aludida em 148 (TTTTTT) fosse testada com sucesso.

34. Que o referido em 151 (WWWWWW) ocorresse devido a receios manifestados pela autora quanto à eficácia da reparação da junta realizada em Maio de 2009 e após pedido desta para realizar duas intervenções complementares.

35. Que os ensaios referidos em 151 (WWWWWW) fossem realizados com a capacidade máxima de bombagem.

36. Que não obstante o referido em 152 (XXXXXX), não entrasse areia pela junta entre os dois tubos 1 e 2, que se encontrava selada desde Maio de 2009.

37. Que desde o início de Outubro de 2009 e até 19.04.2010, ou seja, depois de executada a selagem da junta em Maio de 2009, não entrasse areia pela abertura selada.

38. Que uma das principais causas de entrada massiva de lodos e areias em Abril de 2009 residisse no fenómeno de climatologia marítima do transporte litoral de materiais em suspensão provenientes das descargas do rio Vouga e dos fundos arenosos e finos, relacionado com a opção quanto à localização da instalação.

39. Que a autora e a ré Impulso não solicitassem estudos concretos e suficientes que permitissem caracterizar devidamente as condições naturais, no local da obra, no que respeita aos fenómenos de dinâmica sedimentar.

40. Que o referido em 157 (CCCCCCC) se verificasse desde Janeiro de 2009 em aumento crescente, atingindo o seu máximo em Abril de 2009.

41. Que os sedimentos captados pelos emissários da instalação da autora tivessem origem exterior à zona da obra, em concreto na Ria de Aveiro.

42. Que não fosse entregue à ré ACUPM projecto com descrição do funcionamento ou das condições de funcionamento do sistema das tomadas de água provisórias do ponto de vista da hidráulica e da dinâmica sedimentar.

43. Que aquando do referido em 160 (FFFFFFF), depositaram-se areias e sedimentos no fundo do emissário, enquanto a comporta do poço de captação se manteve fechada, ou seja, entre 25.09.2008 e 10.12.2008.

44. Que com a entrada em funcionamento da captação pelo riser provisório (até 21.05.2009), a entrada de sedimentos em suspensão continuou, dado que o riser e a força de bombagem do mesmo, potenciavam aquele fenómeno.

45. Que grande percentagem dos materiais que entrou na unidade de aquicultura em Abril de 2009, ou já se encontrava depositada ao longo do emissário de captação ou entraram na tubagem pelo riser provisório, por força da sucção originada pela bombagem de captação, e que, após a abertura da comporta, se fossem deslocando no sentido do poço de captação.

46. Que o aumento de turbidez fosse reconhecido pela ré Impulso já desde Dezembro de 2008, o que coincidiu com a abertura da comporta.

47. Que no projecto de antecipação não fosse feito um estudo nem contemplado o funcionamento do sistema de tomada de água provisória do ponto de vista da hidráulica, razão pela qual o projecto de antecipação não considerou que, à erosão sobre o 1.º tubo devida à previsível agitação e correntes marítimas de fundo provocadas pelas ondas e marés, acresceria o efeito de correntes geradas pela bombagem e pela captação directa da água pela extremidade livre e totalmente aberta da tubagem de betão, no fundo da vala dragada em areias, com fundos e taludes desprotegidos e por isso necessariamente instáveis.

48. Que o descalçamento do último tubo de betão do emissário de captação se devesse ao projecto de execução não prever que a captação fosse efectuada no final do emissário em betão e se iniciasse antes da conclusão da fase 1 da captação 1.

49. Que os esforços de tracção nas juntas manifestaram-se desde que foi retirada a tuneladora e também posteriormente, durante o período de bombagem de antecipação através da extremidade da conduta em betão aberta no fundo da vala, mais acrescendo em simultâneo os esforços provocados com a dragagem para instalação da caixa pantalon.

50. Que a retirada da tuneladora e a bombagem por antecipação através da extremidade da conduta em betão aberta no fundo da vala e os esforços provocados com a dragagem para a instalação da caixa pantalon provocassem o início do processo de abertura da junta entre os tubos 1 e 2.

51. Que a dragagem de acerto para instalação da caixa pantalon, segundo o projecto de execução, causasse esforços de tracção nas juntas dos tubos de betão.

52. Que a dragagem para a instalação da caixa pantalon necessariamente exporia os últimos tubos ao descalçamento e à acção da ondulação.

53. Que a execução da dragagem (conforme previsto em projecto - em cota inferior à do emissário), a simultaneidade desta operação com a bombagem de antecipação e as condições de mar, aumentassem o descalçamento do 1º tubo e aumentassem os esforços de tracção nas juntas entre os tubos.

54. Que o custo das limpezas, reparações e intervenções referidas em 168 (LLLLLLL), ascenda ao montante de € 3.507.983,13, suportado pelo ACUPM, não tendo a autora liquidado qualquer valor até ao momento, pese embora a sua interpelação.

55. Que a ré ACUPM respeitasse todos os desenhos, planos e directrizes do projecto elaborado pela ré Impulso.

56. Que a ré Impulso se opusesse à decisão de antecipação de funcionamento da instalação tomada pela autora, por considerar que, desse modo, iriam ocorrer riscos acrescidos derivados de mau funcionamento.

57. Que para a colocação de uma caixa de forma prismática seria necessário aplicar taludes em tronco de pirâmide, o que implicava o aumento da profundidade da zona em que era retirado o suporte à conduta do betão.

58. Que aquando da realização das dragagens, o último tubo de betão (tubo 1) foi golpeado, várias vezes, pela oscilação das bombas de dragagem em funcionamento.

59. Que para a colocação da peça pantalon no leito marinho, a ré ACUPM montasse uma estrutura auxiliar que efectuasse pressão sobre o tubo 1 e sendo que o uso dessa peça auxiliar não estava prevista no projecto da ré Impulso.

60. Que a ré ACUPM não permitisse que a ré Impulso interferisse em tudo o quanto tivesse a ver com o modo como os processos construtivos se adaptavam ao projecto considerando aquela ré ACUPM que lhe cabiam todas as decisões a tomar quanto à execução da obra, perante o acordo firmado entre esta e a autora.

61. Que o referido em 184 (BBBBBBBB) fosse informado verbalmente pelo ACUPM à Impulso e que o afastamento ficasse em cerca de dois centímetros.

62. Que o referido em 185 (CCCCCCCC) fosse informado verbalmente pelo ACUPM à Impulso.

63. Que o referido em 184 e 185 [BBBBBBBB) e CCCCCCCC] fosse efectuado pela ré ACUPM sem qualquer conhecimento ou intervenção prévia por parte da ré Impulso.

64. Que a ré Impulso autorizasse e aceitasse o referido em FFFFFFFF (colocação de sacos de areia no local onde ocorreu a deslocação do tubo 1) por acreditar que os dois tubos teriam ficado afastados em apenas dois centímetros.

65. Que a Ré Impulso viesse a saber posteriormente, sem que tal lhe tenha sido comunicado pelo ACUPM o descrito em 189 (HHHHHHHH) e que, após os trabalhos de tracção a separação fosse de 10 centímetros.

66. Que o referido em 190 (IIIIIIII) não fosse aceite pela ré ACUPM, mediante a justificação de que não havia tempo para tal.

67. Que em Novembro de 2008, a obra não se encontrasse em condições de iniciar o seu funcionamento por via do uso do riser provisório.

68. Que a entrada massiva de areias e lodos em Abril de 2009 tivesse origem também no facto de estar em funcionamento uma solução provisória de toma de água.

69. Que o referido em 203 (VVVVVVVV) fosse apenas verificado pela Impulso em Abril de 2009.

70. Que o referido em 205 (XXXXXXXX) se devesse às dragagens efectuadas em Março de 2009.

71. Que os níveis de turbidez aludidos em 207 (ZZZZZZZZ) passassem para valores normais.

72. Que em finais de Junho de 2009 terminassem os trabalhos marítimos correspondentes às fases 1 e 2.

73. Que a ré Impulso sugerisse o referido em 209 (BBBBBBBBB), o que não foi aceite pela ré ACUPM.

74. Que a autora permitisse, por diversas vezes, que a ré ACUPM procedesse a alterações daquilo que constava no projecto da ré Impulso, sem que esta tivesse sido previamente consultada.

75. Que a ré ACUPM recebesse, entretanto, da ré Mapfre, a quantia de € 3.507.983,13, a título de liquidação de indemnização por danos patrimoniais sofridos com o evento de Abril de 2009.

 

4. Tendo em conta o disposto no nº 4 do art. 635º do Código de Processo Civil, o objecto do recurso delimita-se pelas respectivas conclusões.

Assim, os presentes recursos têm como objecto as seguintes questões:

  1. Repristinação da decisão da 1ª instância que condenou os RR. a pagar à A. a quantia certa de catorze mil oitocentos e sessenta e nove euros e quarenta e oito cêntimos (€14.869,48), a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio [recurso dos RR. Arch, Ltd e Impulso, S.A.];
  2. Repristinação da decisão da 1ª instância que absolveu os RR. do pedido de indemnização pela perda de uma margem de comercialização não realizada devido a uma putativa mortalidade excessiva de peixes no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010 [recurso do R. Acupm, ACE e recurso dos RR. Arch. Ltd. e Impulso, S.A.];
  3. Revogação da decisão do acórdão recorrido, que, quanto ao pedido de indemnização pela perda da margem de comercialização relativamente aos peixes que deveriam ter entrado na instalação no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010, revogou a decisão da 1ª instância que fixou indemnização equitativa (art. 566º, nº 2, do CC) no valor de €1.550.000,00, substituindo-a por decisão de condenação em quantia a liquidar, devendo:

Segundo a pretensão dos RR. Arch. Ltd. e Impulso, S.A.:

  • Absolver-se os RR. do pedido;
  • Subsidiariamente fixar-se equitativamente a indemnização em valor inferior ao fixado pela 1ª instância.

E, devendo, segundo a pretensão do R. Acupm, Ltd.:

  • Repristinar-se a decisão da 1ª instância.

 

5. Antes de prosseguir, sintetizemos os fundamentos invocados para impugnar cada um dos segmentos decisórios em que a Relação alterou a decisão da 1ª instância:

Quanto à 1ª Questão: Repristinação da decisão da 1ª instância que condenou os RR. a pagar à A. a quantia certa de catorze mil oitocentos e sessenta e nove euros e quarenta e oito cêntimos (€ 14.869,48), a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio:

  • Por apenas ter ficado provado o valor sobre o qual não há dúvida, devendo, de acordo com as regras de distribuição do ónus da prova, o insucesso probatório quanto ao mais ser decidido contra a A. [recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A.];
  • Por, de qualquer forma, não existir possibilidade séria e credível de se produzir prova no âmbito da liquidação [recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A.].

Quanto à 2ª Questão: Repristinação da decisão da 1ª instância que absolveu os RR. do pedido de indemnização pela perda de uma margem de comercialização não realizada devido a uma putativa mortalidade excessiva de peixes no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010:

  • Por falta de prova do dano porque a mortalidade excessiva de peixes não pode calcular-se, nos termos em que foi calculada, em unidades de piscicultura em fase de instalação [recurso do R. Acupm, ACE];
  • Por tais danos se deverem a culpa da própria A., não existindo nexo de causalidade adequada entre o acidente e os danos [recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A.];
  • Por falta de prova do dano, a qual não pode ser suprida pelo facultar de uma nova oportunidade de a A. fazer prova, devendo a falta de prova resolver-se contra a mesma A. [recurso do R. Acupm, ACE e recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A.].

Quanto à 3ª Questão: Revogação da decisão do acórdão recorrido, que, quanto ao pedido de indemnização pela perda da margem de comercialização relativamente aos peixes que deveriam ter entrado na instalação no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010, revogou a decisão da 1ª instância que fixou uma indemnização equitativa (art. 566º, nº 3, do CC) no valor de € 1.550.000,00, substituindo-a por decisão de condenação em quantia a liquidar:

  • Em ambos os recursos se alega que não se pode remeter o cálculo da indemnização para incidente de liquidação por, não tendo a A. logrado provar o dano alegado, não pode ser-lhe facultada nova oportunidade de fazer essa prova.

O Recorrente Acupm, ACE pretende:

  • Que se repristine a decisão da 1ª instância que fixou a indemnização com recurso à equidade, por falta de elementos que, mesmo com recurso a prova pericial, permitam calcular o dano em sede de incidente de liquidação.

Os Recorrentes Arch, Ltd. e Impulso, S.A. pretendem:

  • Que se absolva os RR. do pedido por falta de prova do nexo de causalidade entre o evento e os danos: uma vez que, nas circunstâncias verificadas, os custos de exploração não seriam absorvidos pelas vendas; e/ou por existência de culpa do lesado, a aqui A.;
  • Subsidiariamente, que se fixe equitativamente a indemnização, mas em valor inferior ao fixado pela 1ª instância, sem remeter para liquidação, por falta de possibilidade séria e credível de se produzir prova no âmbito do respectivo incidente.

 

6. Comum à impugnação dos três segmentos decisórios alterados pela Relação, identifica-se a problemática em torno da interpretação da norma do nº 2 do art. 609º do CPC, de acordo com a qual:

“Se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.”

O acórdão recorrido, referindo-se expressamente a essa questão, pronunciou-se nos seguintes termos:

“(…) importa dizer que a pretensão da recorrente tem as seguintes particularidades:

1. Num caso (o dos gastos com o consumo extraordinário de oxigénio), trata-se de substituir uma condenação em quantia certa por uma condenação em quantia ilíquida;

2. Noutros casos (prejuízo sofrido com a mortalidade anormal dos peixes e lucros perdidos com a não comercialização dos peixes que morreram) trata-se de substituir um julgamento de improcedência por uma condenação ilíquida;

3. Noutro caso (lucros não realizados em consequência da não entrada de peixes no processo produtivo) trata-se de substituir um julgamento segundo juízos de equidade por uma condenação ilíquida.

Pelas razões a seguir expostas, há razões para alterar o que foi decidido pela sentença a propósito da indemnização pelos gastos com o consumo extraordinário de oxigénio, pela morte anormal de peixes até Maio de 2010 e pela não entrada de alevins no processo produtivo.

Vejamos.

Em relação à indemnização que é devida à autora pelos gastos com o consumo extraordinário de oxigénio, há razões para modificar a sentença no sentido de uma condenação ilíquida.

O n.º 2 do artigo 609.º do CPC tem em vista os casos em que não há elementos para fixar o objecto ou a quantidade da condenação. Em tais hipóteses, a norma prescreve que o tribunal condene no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.

O segmento da norma constituído pelos dizeres “se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade…” tem sido objecto de duas interpretações.

Segundo uma, a falta de elementos para fixar o objecto ou a quantidade da condenação é a mesma falta que justifica o pedido ilíquido, ou seja, é a falta de elementos que procede da circunstância de não serem conhecidos ou de estarem em desenvolvimento à data da acção ou à data do julgamento da matéria de facto. Fora do alcance da norma estavam os casos em que a inexistência de elementos procede do insucesso da actividade probatória do interessado. Cita-se, a título de exemplo, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Janeiro de 1995, publicado no BMJ, n.º 443, páginas 404 e 405, e o acórdão do STJ proferido em 28-04-2009, proferido no processo n.º 08B0782, publicado no sítio www.dgsi.pt. onde a este propósito se afirmou: “a possibilidade de se remeter para liquidação posterior o montante da indemnização, constante do nº 2 do artigo 661º do Código de Processo Civil (….), numa sentença que condene no pagamento de uma indemnização, não se destina a ultrapassar a falta de prova de factos oportunamente alegados para demonstrar os prejuízos. Antes se destina a permitir a quantificação de danos que não seja viável no momento da sentença, seja por estar dependente de cálculos a efectuar, seja por não terem ainda cessado os danos a ressarcir”.

Segundo outra interpretação [que é a dominante no STJ e que este tribunal irá seguir, atendendo ao disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil e à circunstância de tal interpretação ser a que favorece o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei], a inexistência de elementos que é tida em vista pela norma tanto abrange a inexistência de elementos que tenha origem na impossibilidade de os determinar até ao encerramento da discussão em primeira instância, como a inexistência que proceda do insucesso da actividade probatória do demandante. Em ambos os casos não há elementos para fixar o objecto ou a quantidade da condenação e a solução deve ser igual para eles. Cita-se, a título de exemplo, o acórdão do STJ de 6 de Dezembro de 2006, publicado na Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano XIV, Tomo III/2006, páginas 154 a 156, o acórdão do STJ proferido em 11-07-2013, no processo n.º 5523/05.2TVLSB, publicado em www.dgsi.pt. [onde se afirmou que a jurisprudência largamente dominante do Supremo ia no sentido desta interpretação] e o acórdão do STJ proferido em 5 de Fevereiro de 2015, no processo n.º 4747/07.2TVLSB, publicado no sítio www.dgsi.pt. onde se afirmou: “desde que se prove a existência (qualitativa) de danos, sem que os autos permitam a sua imediata quantificação, com ou sem recurso à equidade (quando esta seja admissível), a acção declarativa deve terminar com uma sentença de condenação ilíquida”, bem como o acórdão do STJ proferido em 22-09-2016, no processo n.º 681/14.8TVLSB, publicado em www.dgsi.pt.

Precise-se que, quando esteja em causa, como sucede no caso, uma obrigação de indemnização, a falta que é compatível com a condenação ilíquida é a que diz respeito a elementos relativos à determinação da medida da indemnização em dinheiro. Se a falta incidir sobre outros elementos essenciais da obrigação de indemnização, designadamente sobre o dano, o nexo de causalidade entre o facto e o dano ou sobre a culpa, nos casos em que esta constitui pressuposto da obrigação de indemnização, então a consequência é a improcedência da acção. Com efeito, se a falta de elementos versar sobre a existência do próprio dano, sobre o nexo de causalidade entre o facto e o dano, nos termos exigidos pelo artigo 563.º do Código Civil, ou sobre a culpa do demandado, então tal significará que o demandante não provou, como lhe competia, nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, os factos constitutivos do seu direito e a consequência desta falta de prova é a improcedência da sua pretensão.” [negritos nossos]

 

6.1. A divergência jurisprudencial assinalada pela Relação repercute-se na posição assumida pelos Recorrentes e pela Recorrida.

Os primeiros pugnam pela enunciada interpretação restritiva da norma do nº 2 do art. 609º do CPC que permite condenar em quantia a liquidar, sustentada designadamente na decisão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/04/2009 (proc. nº 08B0782), disponível em www.dgsi.pt, assim fundamentada:

A possibilidade de se remeter para liquidação posterior o montante da condenação, constante do nº 2 do artigo 661º do Código de Processo Civil [actual nº 2 do art. 609º] (…) numa sentença que condene no pagamento de uma indemnização, não se destina a ultrapassar a falta de prova de factos oportunamente alegados para demonstrar os prejuízos.

Antes se destina a permitir a quantificação de danos que não seja viável no momento da sentença, seja por estar dependente de cálculos a efectuar, seja por não terem ainda cessado os danos a ressarcir (artigo 378º do Código de Processo Civil).

O autor alegou que em finais de Fevereiro de 1994 se encontrava restabelecido e que foi por causa das infiltrações que não pode reabrir o estabelecimento; não fez, todavia, prova disso. Não pode, em incidente de liquidação, vir alegar momento diverso – a alegação de factos está precludida – nem tão pouco vir fazer prova que permita ultrapassar a decisão proferida no julgamento da matéria de facto, e que foi no sentido de não estar apurado esse momento.

Não pode, pois, manter-se a condenação no pagamento de uma indemnização por perda de rendimento em consequência do encerramento do estabelecimento, nem mesmo a liquidar posteriormente: a falta de prova resolve-se contra o autor (artigo 342º, nº 1, do Código Civil, já citado).” [negritos nossos]

Diversamente, a Recorrida defende a interpretação lata da referida norma do nº 2 do art. 609º do CPC, adoptada no acórdão recorrido e sustentada na jurisprudência actualmente dominante do Supremo Tribunal de Justiça, que se encontra explanada, entre outros, no acórdão de 11/07/2013 (proc. nº 5523/05.2TVLSB.L1.S1), disponível em www.dgsi.pt:

“(…) a questão prende-se essencialmente com o âmbito de aplicação do disposto no artigo 661.º, n.º 2, do CPC, norma que, procurando definir os limites da condenação, dispõe que “se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condenará no que vier a ser liquidado, sem prejuízo da condenação imediata na parte que já seja líquida”.

Não existe uma uniformidade de pontos de vista quanto ao alcance deste preceito. Já se tem entendido que o apontado preceito só permite remeter para liquidação de sentença quando não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, mas apenas como consequência de não se conhecerem ainda, com exactidão, as unidades componentes da universalidade ou de ainda não se terem revelado ou estarem em evolução todas as consequências, e não também no caso em que a carência de elementos resulte da falta de prova sobre os factos alegados [20].

Esta é uma interpretação restritiva, que reconduz o âmbito de aplicação do preceito aos casos em que o autor tenha deduzido um pedido genérico, nos termos previstos no artigo 471.º do CPC, ou tenha formulado um pedido específico, mas não tenha sido possível, no momento da decisão, fixar o objecto ou a quantidade da condenação por se desconhecerem todas ou algumas consequências do facto ilícito, por estas ainda não se terem produzido ou por não se terem produzido todos os factos influentes na determinação do quantitativo de uma dívida.

A questão não é, no entanto, pacífica, e ainda em data relativamente recente teve este Supremo ensejo de se pronunciar, no Acórdão de 22/02/11, Proc. nº 81/04.8TBVLF.C1.S1A, disponível no ITIJ, subscrito pelo ora relator, do qual se transcreve o seguinte passo: “A aplicação desta norma, para o que aqui interessa, depende da verificação, em concreto, de uma indefinição de valores de prejuízos. Mas como pressuposto primeiro de aplicação do dispositivo, deverá ocorrer a prova de existência de danos. Este preceito tanto se aplica no caso de se ter inicialmente formulado um pedido genérico e de não se ter logrado converter em pedido específico, como ao caso de ser formulado pedido específico sem que se tenha conseguido fazer prova da especificação, ou seja, quando não se tenha logrado coligir dados suficientes para se fixar, com precisão e segurança, o quantitativo na condenação (neste sentido A. Reis, C.P.C. Anotado, Vols. I pág. 614 e segs. e V pág. 71, Vaz Serra, RLJ, ano 114º, pág. 309, Rodrigues Bastos, Notas ao C.P.C, vol. III, pág. 233). Portanto e para o que aqui importa, tendo os AA. deduzido um pedido específico (isto é, um pedido de conteúdo concreto), não tendo logrado fixar com precisão a extensão dos prejuízos, poderão fazê-lo em liquidação em execução de sentença”.

A jurisprudência deste STJ, amplamente dominante, vai no sentido das transcritas considerações, como se verifica, compulsando, por exemplo, os Acórdãos de 29/01/98, no BMJ 473º-445, 2/02/06, Proc. n.º 3225/05, 9/02/06, Proc. nº 05B4187, 29/11/06, Proc. nº 06A3794, 16/01/08, Proc. nº 07S2713, 17/06/08, já citado, 11/09/08, Proc. nº 08B2013, 3/02/09, Proc. nº 08A3942, disponíveis no ITIJ, e Ac. de 11/04/13, Proc. nº 539/10.0TVLSB.L1.S1, não publicitado, deste Relator e Conferência, nos Sumários de Acórdãos das Secções Cíveis.

Como tal, uma vez assente a existência de danos mas não se tendo apurado com precisão o seu montante, e antes de lançar mão da equidade, há que condenar no que se vier a liquidar. E não se poderá dizer que por esta forma se está a facultar ao autor uma nova oportunidade para provar os danos pois que a existência dos mesmos já está definida.

Se resultar dos factos provados que assiste ao autor o direito accionado, expresso na apresentação dum pedido específico, sem que, porém, tenha sido possível ao tribunal lograr a prova da especificação, “a mais elementar razão de sã justiça, de equidade, veda a solução de se absolver o réu apesar de demonstrada a realidade da sua obrigação; mas também se revela inadmissível, intolerável, que o juiz profira condenação à toa.

Por isto, o legislador ditou a regra da condenação no que se liquidar em execução de sentença – artº 661º, nº 2, do Código de Processo Civil” (Acórdão de 29/01/98 acima citado).

A mera falta de prova na acção declarativa do objecto ou da quantidade não implica decisão de absolvição do pedido, como decidiu a Relação, antes justificando a condenação no que se liquidar no incidente acima referido. Na realidade, não parece curial que, tendo o autor provado a existência de uma situação de direito à reparação do dano (art. 562.º do CC), apesar disso, a acção devesse ser julgada improcedente apenas porque se não provou o exacto montante que se encontra, a esse título, em dívida.” [negritos nossos]

Desta dicotomia de posições jurisprudenciais na interpretação do regime normativo relativo à condenação em montante a liquidar, dá conta, mais recentemente, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/03/2019 (proc. nº 4966/17.3T8LSB.L1.S1), consultável em www.dgsi.pt:

“A determinação do valor pode ser concretizada na ação, havendo elementos que o permitam fixar com exatidão ou recorrendo à equidade, como se entendeu na sentença, ao determinar o valor da indemnização na quantia de € 31 805,85, ou, então, em liquidação ulterior, nos termos do art. 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), como se decidiu no acórdão recorrido.

A liquidação da obrigação em momento ulterior é, efetivamente, admissível, nos termos do disposto no art. 609.º, n.º 2, do CPC, que acaba por reproduzir, sem alterações, o art. 661.º, n.º 2, do CPC/1961, na redação dada pelo DL n.º 38/2003, de 8 de março.

Na jurisprudência, a questão da liquidação ulterior declarada na sentença tem sido objeto, sobretudo, de duas posições diferenciadas, uma restrita e outra lata.

A posição restrita, perfilhada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de janeiro de 1995 (BMJ n.º 443, pág. 395), admitindo a liquidação ulterior quando ainda não é possível, no momento da sentença, conhecer todos os factos necessários para tal efeito, e excluindo-a se os factos já tiverem ocorrido, designadamente quando não tiverem sido provados.

A posição lata, seguida pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de janeiro de 1998 (BMJ n.º 473, pág. 445), aceita a liquidação ulterior nos casos em que o dano já ocorreu, mas não se consegue obter a sua quantificação.

Esta corrente, que se apresenta como maioritária, apoia-se especialmente numa razão de justiça, a prevalecer sobre a fixação por equidade.” [negritos nossos]

Quid iuris?

 

6.2. Reconhecendo-se a complexidade da questão e a existência de argumentos válidos a favor de cada uma das posições enunciadas, não pode deixar de se assinalar que a interpretação lata, correspondendo à orientação que se tem vindo a estabilizar na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, será, em princípio, de manter. Aliás, o afastamento dessa orientação dominante implicaria, em princípio, a utilização do meio do julgamento ampliado de revista (cfr. art. 686º do CPC).

Na base daquele entendimento – segundo o qual, provada a realidade de um dano, a eventual insuficiência da prova de elementos relevantes para o quantificar, ainda que por fracasso da actividade  probatória do lesado, não impede a utilização do mecanismo da condenação genérica – afigura-se estar a ideia, extraída do regime do art. 569º do CC (conjugado com o do art. 556º, nº 1, alínea b), segunda parte, do CPC), segundo a qual não impende sobre o lesado um ónus de avançar logo com todos os elementos necessários para especificar cabalmente o dano sofrido; sendo-lhe facultada a possibilidade de formular um pedido genérico, não deverá ser afectado negativamente pela opção de ter avançado com um pedido específico, cujos elementos factuais não logrou, porém, demonstrar inteiramente.

Na verdade, dispõe-se no referido art. 556º, nº 1, o seguinte:

“1 - É permitido formular pedidos genéricos nos casos seguintes:

(…)

b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil;

(…).”

Conforme explicam, entre outros, Lebre de Freitas/Montalvão Machado/Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, págs. 239 e seg. (em anotação ao art. 471º, correspondente ao actual art. 556º), a respeito deste regime legal:

“(…) a formulação de pedido genérico ocorre quando, no momento da propositura da acção de indemnização, não é ainda possível fixar de modo definitivo as consequências do facto ilícito (nº 1-b): o autor pede uma indemnização cujo quantitativo não precisa, quer por tal lhe ser ainda impossível (não é ainda conhecida toda a extensão do dano), quer por querer usar da faculdade que lhe concede a 1ª parte do art. 569 CC (a de não indicar a quantia exacta em que avalia o dano).

Na redacção anterior a 1995-1996, apenas a primeira situação era prevista: o autor podia deixar de deduzir um pedido líquido quando, à data da acção, ignorasse, sem lhe ser possível conhecer, o montante do dano sofrido. (…) Com o aditamento da 2.ª situação, ficou esclarecido que, em conformidade com o art. 569.º do CC, o autor pode também deduzir um pedido ilíquido, pelo menos em caso de dúvida quanto ao apuramento do quantitativo, já possível, do dano verificado. (…) Quanto aos danos imprevisíveis (…), hão-de ser objecto de alegação em articulado superveniente (…), a ter lugar quando se verifiquem, ampliando-se o pedido em consequência (…)”.

Dando contas das dúvidas interpretativas da conjugação entre o art. 471º, nº 1, alínea b), do CPC (na redacção anterior à reforma de 1995/1996) e o art. 559º do Código Civil, pronunciou-se também Abrantes Geraldes (Temas da Reforma de Processo Civil, Vol. I, 2ª ed., Almedina, Coimbra, 1998, pág. 167):

Estava em causa saber se a norma do Código Civil “era ou não era mais alargada do que a do anterior art. 471º, nº 1, al. b), designadamente, se consentia a dedução de pedido genérico ainda que o autor já estivesse na posse de elementos que permitissem, total ou parcialmente, a quantificação da sua pretensão, ou se, pelo contrário, limitava essa possibilidade aos casos em que ainda fosse objectivamente possível a determinação das consequências do facto gerador de responsabilidade civil”.

Sendo que a questão foi resolvida pela reforma do processo civil de 1995/1996, ao aditar a segunda parte da alínea b) do nº 1 do art. 471º do CPC. Afirma o mesmo autor que este regime:

“[C]onfere ao lesado a possibilidade de deduzir pedido genérico quando “pretenda usar da faculdade que lhe confere o art. 566º do CC”, o qual, por seu lado, dispõe que “quem exigir a indemnização, não carece de indicar a importância exacta em que avalia os danos…”, tarefa que pode ser relegada para o incidente de liquidação (…).

Afigura-se de manter esta orientação na interpretação conjugada entre o actual art. 556º, nº 1, alínea b), do CPC, e o art. 569º do CC, com a consequência de que a condenação em quantia a liquidar nos termos do art. 609º, nº 2, do CPC, poderá ter lugar:

 “[T]anto nos casos em que é deduzido um pedido genérico não subsequentemente liquidado (…) como naqueles em que o pedido se apresenta determinado, mas os factos constitutivos da liquidação da obrigação não são provados (…)” (Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª ed., Almedina, 2017, págs. 715-715, em anotação ao art. 609º, nº 2).

Contra esta orientação, não podem naturalmente ser convocadas decisões anteriores tanto à data de aprovação como de entrada em vigor da reforma de 1995/1996 – como o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/01/1995, referido no acórdão recorrido – reforma pela qual foi alterada alínea b) do nº 1 do art. 471º do CPC (actual art. 556º), aditando-se a segunda situação aí prevista actualmente.

 

6.2. Aqui chegados, porém, torna-se necessário sublinhar que – para não se distorcerem as regras gerais de distribuição do ónus da prova, consagradas no Código Civil, com o inerente efeito cominatório do art. 414º do CPC – a possibilidade de condenação em quantia a liquidar pressupõe, necessariamente, que o lesado conseguiu demonstrar tanto a existência como o “núcleo essencial” do dano em causa (na expressão utilizada nos acórdãos deste Supremo Tribunal de 28/10/2010 (proc. nº 272/06), e de 17/11/2011 (proc. nº 7898/09), consultáveis em www.dgsi.pt), faltando apenas a prova de elementos circunstanciais ou temporais para aferir da exacta quantificação do dano.

Há, por outro lado, um limite evidente: se, na acção, a respeito de certo dano invocado, são julgados não provados determinados factos relevantes para a sua delimitação e quantificação, tal decisão negativa, por força do respeito pelo caso julgado formal, terá de ser respeitada no incidente de liquidação, não sendo obviamente admissível que, no âmbito de um mesmo processo, certo facto seja sucessivamente considerado como provado e não provado.

As condicionantes, assim enunciadas, à dita orientação jurisprudencial dominante, conduzem a que – na resolução dos casos concretos – se circunscrevam afinal as consequências práticas entre a adopção da interpretação lata ou restrita do nº 2 do art. 609º do CPC. Para o confirmar, retomemos a fundamentação do citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/04/2009 (proc. nº 08B0782), no qual se segue a dita interpretação restrita:

“O autor alegou que em finais de Fevereiro de 1994 se encontrava restabelecido e que foi por causa das infiltrações que não pode reabrir o estabelecimento; não fez, todavia, prova disso. Não pode, em incidente de liquidação, vir alegar momento diverso – a alegação de factos está precludida – nem tão pouco vir fazer prova que permita ultrapassar a decisão proferida no julgamento da matéria de facto, e que foi no sentido de não estar apurado esse momento. [negrito nosso]

O que se extrai desta fundamentação é que, no caso concreto, a razão determinante pela qual não se condenou em valor a liquidar foi a necessidade de respeitar a decisão da matéria de facto em que foi dado como não provado facto essencial para a prova da existência do dano invocado. Pelo que a solução sempre seria a mesma quer se adoptasse a interpretação restrita quer a interpretação lata do nº 2 do art. 609º do CPC.

 

Por tudo o exposto, conclui-se não ser de censurar a decisão do acórdão recorrido de seguir no caso dos autos a enunciada interpretação lata do nº 2 do art. 609º do CPC, desde que respeitadas as condicionantes supra formuladas.

 

7. Passemos a apreciar da questão, suscitada no recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A, relativa à pretendida repristinação da decisão da 1ª instância que condenou os RR. a pagar à A. a quantia certa de € 14.869,48, a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio.

De acordo com o supra exposto, não se acolhe o fundamento para esta pretensão resultante da interpretação restrita do nº 2 do art. 609º do CPC. Contudo, os Recorrentes invocam um outro fundamento – ausência de possibilidade séria e credível de se produzir prova no âmbito do incidente de liquidação – que cumpre aqui apreciar.

Vejamos os termos em que a Relação fundou a decisão, no que ora importa:

“Por sua vez, o n.º 3 do artigo 566.º, inserido nas disposições do Código Civil sobre a obrigação de indemnização, mais concretamente na que versa sobre a indemnização em dinheiro, estabelece que “se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.

Vista a hipótese do n.º 2 do artigo 609.º do CPC e a do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil não é isento de dúvida a aplicação daquela ou desta norma a situações em que não seja conhecido o valor ou o valor exacto dos danos a ressarcir.     

No entender deste tribunal, o campo de aplicação das duas normas é, em termos esquemáticos, o seguinte: se ainda for possível fixar no incidente de liquidação a quantidade da condenação aplica-se o n.º 2 do artigo 609.º do CPC; se não for possível, aplica-se o n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil.

A possibilidade de quantificação da condenação, apesar de não figurar na letra no n.º 2 do artigo 609.º do CPC, resulta da conjugação deste preceito com o n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil (quando esteja em causa a medida de indemnização) e ainda com os n.ºs 3 e 4 do artigo 360.º do CPC, relativos aos termos da liquidação e com o princípio da limitação dos actos enunciado no artigo 130.º do CPC, segundo o qual não é lícito realizar no processo actos inúteis. Na verdade, se não for possível fixar a quantidade no incidente de liquidação, a condenação do que se vier a liquidar constitui um acto inútil, o que é proibido por lei.

A favor desta interpretação do n.º 2 do artigo 609.º do CPC citam-se, além dos acórdãos indicados pela recorrente, o acórdão do STJ proferido em 27 de Junho de 2000, publicado no BMJ, n.º 498, Julho de 2000, páginas 222 a 225] e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 17/06/2008, no processo n.º 08A1700, publicado em www.dgsi.pt.

Segue-se daqui que, quando não houver elementos para fixar a quantidade, a opção do tribunal pela condenação no que se vier a liquidar, nos termos do n.º 2 do artigo 609.º, ou pelo julgamento segundo a equidade, conforme prevê no n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil, há-de ser fundamentada. Socorrendo-nos das palavras do acórdão do STJ proferido em 27 de Junho de 2000 “… a opção por uma ou outra dessas soluções depende do juízo que se formar, em face das circunstâncias concretas de cada caso, sobre a possibilidade de determinação do valor exacto dos danos: se esse juízo for afirmativo será de aplicar o artigo 661.º, n.º 2 [o artigo em causa é relativo ao CPC e corresponde ao n.º 2 do artigo 609.º do CPC civil em vigor] e, de contrário, deve aplicar-se o artigo 566.º, n.º 3”.

Seguindo a interpretação que se acaba de expor, a razão estaria do lado da recorrente, em relação à decisão sobre o pedido de indemnização dos gastos com o consumo extraordinário de oxigénio, se faltassem elementos para fixar a medida da indemnização devida por tais gastos e se ainda fosse possível apurá-los em sede de liquidação.

Assim sucede no entender deste tribunal. Vejamos.

O tribunal a quo julgou provado que, em consequência da entrada massiva de areias na unidade de aquicultura, a autora suportou custos com consumo adicionais de oxigénio de, pelo menos € 14 869,48 [alínea SSSS]. Este tribunal, alterando a decisão, julgou provado que a autora suportou com o consumo extraordinário de oxigénio uma quantia não apurada ao certo, mas que não era inferior a € 14 869,48 nem superior a € 117 490,50. Isto é, neste momento conhecem-se os limites mínimos e máximos dos gastos. O que se desconhece é o seu valor exacto.

No entender deste tribunal é possível, em sede de liquidação, apurar esse valor, com recurso designadamente à produção de prova pericial. E ainda que não seja possível apurá-lo com total exactidão, será possível fazê-lo em termos aproximados do que os que conseguidos até este momento, o que permitirá, em último caso, um julgamento mais equitativo do que aquele que é possível nesta altura, ao abrigo do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil.

Segue-se do exposto que há fundamento para revogar a decisão na parte em que condenou os réus a pagar à autora a quantia de catorze mil oitocentos e sessenta e nove euros e quarenta e oito cêntimos [€ 14 869,48], a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio, e substituir essa parte por decisão a condenar os réus no pagamento à autora no que se vier a liquidar, com dedução, em relação às rés Mapfre e Arch, das franquias contratuais.” [negritos nossos]

Insurgem-se os Recorrentes Arch, Ltd. e Impulso, S.A. contra esta decisão, concluindo o seguinte:

“O Tribunal de Primeira Instância, face à prova produzida, fixou um valor para os gastos com o consumo extraordinário de oxigénio (€ 14.869,48), não lhe sendo exigível que, face à falta de prova quanto à quantificação desses alegados prejuízos, cujo ónus impendia sobre a Autora (artigo 342.º n.º1 do CC), condenasse no que viesse a ser liquidado.”; “Em sentido contrário, no entender do Tribunal da Relação quando não existe uma quantia apurada ao certo, mas conhecem-se os limites mínimos (resultante da prova produzida) e máximos (o peticionado pela Autora), deverá a mesma ser apurada em sede de liquidação para produção de prova adicional, designadamente prova pericial.”;“O Tribunal de Primeira Instância, ao contrário do que afirma o Tribunal da Relação na sua fundamentação, não fixou o valor dos gastos ao abrigo de um juízo de equidade nos termos do artigo 566.º n.º 3 do CC.”; “O que na realidade sucedeu e resulta claro da Sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância é que face à abundante e exaustiva produção de prova realizada em sede de Audiência de Julgamento, a Autora apenas logrou provar parte dos gastos que alegadamente teve com o consumo extraordinário de oxigénio, não assistindo assim qualquer razão para condenar as ora Recorrentes no que se vier a liquidar (…)”.

Relevam os seguintes factos provados:

95. Devido às tarefas levadas a cabo em acções de reparação da tubagem de captação 1 e da limpeza dos lodos/areias que se iam acumulando nos elementos hidráulicos e nos tanques da unidade de aquicultura, a autora teve que realizar diversos cortes de abastecimento de água, o que levou à necessidade de utilizar o sistema de oxigénio de emergência, com vista à sobrevivência dos peixes (RRRR).

96. Tal sistema de oxigénio funciona mediante injecção de oxigénio individualmente em cada tanque, sendo este método menos eficiente que o sistema de funcionamento normal, que é a injecção desse oxigénio no poço de oxigenação, verificando-se, por isso, um consumo extraordinário de oxigénio não apurado ao certo, mas não inferior a € 14.869,48 nem superior a € 117 490,50 (SSSS).

Assinale-se que o teor do facto provado 96. [facto SSSS) da sentença] foi alterado pela Relação de modo a que, em lugar de constar “verificando-se, por isso, um consumo extraordinário de oxigénio pelo menos de € 14.869,48, passou a constar verificando-se, por isso, um consumo extraordinário de oxigénio não apurado ao certo, mas não inferior a € 14.869,48 nem superior a € 117 490,50.

Tem assim razão a Recorrida ao afirmar que a ratio da decisão de revogação da decisão da sentença, na parte em que condenou os RR. a pagar à A. a quantia de € 14.869,48, a título de indemnização pelo consumo extraordinário de oxigénio, substituindo-a por decisão de condenação no pagamento do que se vier a liquidar, resultou da dita alteração da matéria de facto. Na verdade, e diversamente da sentença que, quanto ao custo do consumo extraordinário de oxigénio, só tinha dado como provado o valor de € 14.869,48, o acórdão recorrido deu como provado que esse custo se situou entre um valor mínimo (€ 14.869,48) e um valor máximo (€ 117 490,50), remetendo para liquidação a determinação do valor com maior exactidão.

Esclareça-se também que, ao contrário do alegado pelos Recorrentes, no acórdão recorrido não se afirma que o valor indemnizatório fixado pela sentença (€ 14.869,48) o foi com base em juízos de equidade. O acórdão recorrido, a partir da alteração do facto provado 96., equacionou sim a dúvida de saber se a quantia indemnizatória deveria ser, desde logo, equitativamente fixada em montante situado entre o limite mínimo (€ 14.869,48) e o limite máximo (€ 117.490,50) apurados; ou se, tal fixação deveria ser feita apenas em incidente de liquidação.

Assim sendo, conclui-se não merecer censura o entendimento do tribunal a quo segundo o qual será possível, em sede de liquidação, apurar o valor a indemnizar pelo consumo extraordinário de oxigénio, designadamente com recurso à produção de prova pericial; e segundo o qual, ainda que não seja possível apurá-lo com exactidão, será possível fazê-lo em termos mais aproximados, o que permitirá uma decisão mais justa.

 

8. Consideremos agora a segunda questão, comum a ambos os recursos, relativa à pretensão de repristinação da decisão da 1ª instância que absolveu do pedido de indemnização pela perda de uma margem de comercialização não realizada devido a uma mortalidade excessiva de peixes no período compreendido entre os meses de Abril de 2009 e Maio de 2010.

Para além do fundamento, sustentado em ambos os recursos, da interpretação restritiva do nº 2 do art. 609º do CPC – supra rejeitado no ponto 6.2. do presente acórdão – foi invocado (para sustentar a pretensão de revogação da condenação proferida pela Relação e a absolvição dos RR. do pedido de indemnização pela perda da dita margem de comercialização) o seguinte:

  • Falta a prova do dano porque a mortalidade excessiva de peixes não pode calcular-se nos termos em que foi calculada em unidades de piscicultura em fase de instalação [recurso do R. Acupm, ACE];
  • Tais danos devem-se a culpa da própria A., não existindo nexo de causalidade adequada entre o acidente e os danos [recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A.].

Para resolver cabalmente a questão há que ter presente, antes de mais, a alteração da matéria de facto na parte relevante.

A sentença tinha dado como provado o seguinte:

“EEEE) Para além da morte imediata de peixes, o referido em UU) veio a determinar um acréscimo da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola (resposta restritiva ao art. 51.º da base instrutória)”

E como não provado:

“8) Que quanto aos peixes perdidos entre Abril de 2009 e Maio de 2010, o preço por calibre fosse, em média, €2,35 por peixe (resposta negativa ao art. 60.º da base instrutória)”

A Relação alterou a matéria de facto nos seguintes termos:

“Apreciação do tribunal:

Como se vê pela exposição efectuada, as questões de facto essenciais que estão em causa são as seguintes:

1. Saber se a entrada massiva de areias nas instalações da autora, em Abril de 2009, determinou no período subsequente de Maio de 2009 e Maio de 2010, uma mortalidade anormal de 272 034 peixes;

2.         Saber, quanto aos peixes perdidos entre Abril de 2009 e Maio de 2010, se o preço por calibre era, em média, de € 2,35 por peixe.

Salvo o devido respeito, os meios de prova indicados pelo recorrente não impõem a alteração da decisão no sentido pretendido pela recorrente.

(…)

Em consequência, embora não se atenda a pretensão da recorrente, justifica-se alterar a decisão proferida sob a alínea EEEE no seguinte sentido: provado que, “para além da morte imediata de peixes, o referido em UU) veio a determinar um acréscimo, em número não apurado, de mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065 Kg de peixe.”

Vejamos, agora, a questão de saber se, quanto aos peixes perdidos entre Maio de 2009 e Maio de 2010, o preço por calibre era, em média, de € 2,35 por peixe.

(…)

Sendo inequívoco que os peixes mortos no citado período tinham valor e considerando o depoimento da testemunha José Roberto Romero sobre o cálculo contabilístico do valor de cada peixe e o valor reclamado pela autora à seguradora, consideramos que há indícios credíveis e suficientes para julgar como provado que o valor médio de cada peixe que morreu entre Maio de 2009 e Maio de 2010 variava entre € 2,10 e 2,30.

Em consequência:

1.         Altera-se a resposta dada ao ponto n.º 60 da base instrutória, julgando-se provado que, “quanto aos peixes perdidos entre Maio de 2009 e Maio de 2010, o valor por calibre, variava, entre € 2,10 e € 2,30” por peixe;

2.         Elimina-se o ponto n.º 8 dos factos julgados não provados.” [negritos nossos]          

Em função destas alterações à matéria de facto, o acórdão recorrido reapreciou a questão da pretendida indemnização pela perda de uma margem de comercialização não realizada devido a mortalidade excessiva de peixes, durante os meses que decorreram de Abril de 2009 a Maio de 2010, nos termos seguintes:

 “Apreciemos, de seguida, o recurso na parte em que ele tem por objecto a decisão que julgou improcedente o pedido de indemnização do prejuízo consistente na morte anormal de peixes até Maio de 2010 e o pedido de indemnização pela margem de comercialização não realizada pela autora em consequência dessa mortalidade anormal.

Está em questão a alteração de uma decisão de improcedência para uma decisão que condene no que se vier a liquidar, ao abrigo do n.º 2 do artigo 609.º CPC.

Seguindo a interpretação deste preceito acima exposta, a razão estaria do lado da recorrente se estivessem reunidas as seguintes condições:

1. Se estivesse provado o dano, consistente na mortalidade anormal dos peixes e na perda de benefícios em consequência da não comercialização dos peixes que morreram;

2. Se faltassem elementos para fixar a medida da indemnização devida por tais danos;

3. Se ainda fosse possível apurá-los em sede de liquidação.

Estas condições estão verificadas.

O dano resulta da prova dos seguintes factos:

1. Para além da morte imediata de peixes, o referido em 47 [UU) veio a determinar um acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe [n.º 82 dos factos julgados provados];

2. Quanto aos peixes perdidos entre Maio de 2009 e Maio de 2010, o valor por calibre variava, entre € 2,10 e € 2,30 por peixe [n.º 89 dos factos julgados provados];

3. Que com a morte dos peixes a autora perdeu, de igual modo, resultado operacional em 2010 e 2011, que não foi realizado relativo à mercadoria em stock, sendo que o preço unitário médio de venda para os anos de 2010 e 2011 estava estimado em € 6,00/Kg [n.º 90 dos factos julgados provados].

Com efeito, entendendo-se por dano ou prejuízo a privação ou diminuição do gozo de um bem, material ou espiritual [noção colhida em Direito das Obrigações de Inocêncio Galvão Teles, 7.ª Edição Reimpressão, Wolters Kluwer e Coimbra Editora, página 375], é isento de dúvida que a mortalidade anormal de pregados entre Abril de 2009 e Maio de 2010, determinada pela entrada massiva de areias na unidade de aquicultura da autora, e a perda de resultado operacional em 2010 e 2011, que não foi realizado, configuraram um prejuízo que os réus estão obrigados a indemnizar, visto o disposto nos artigos 562.º e 563.º, ambos do Código Civil.

Em consequência não pode subsistir a sentença na parte em que julgou improcedente o pedido de indemnização dos prejuízos ora em apreciação.

Em segundo lugar, está verificada a falta elementos para fixar a medida da indemnização devida por tais danos, sendo ainda possível apurá-los em sede de liquidação.

Antes de justificarmos esta nossa afirmação, importa, no entanto, precisar o dano que irá ser objecto de liquidação. Esta precisão impõe-se pelo seguinte.

A recorrente alegou que a morte anormal dos peixes até Maio de 2009 deu origem a um duplo prejuízo:

1. Um directo, consistente na morte dos peixes, que calculou no montante de € 639 279,83, tendo por referência preço médio dos peixes mortos [272 034 peixes];

2. Um indirecto, consistente na margem de comercialização não realizada com os peixes que morreram. Na acção, o valor desta margem não foi individualizado. Tal valor foi somado à margem de comercialização não realizada com os 171 277 peixes que morreram imediatamente com a entrada de areias na unidade de aquicultura da aurora e foi o produto da soma destas duas margens de comercialização [€ 1 187 366,99] que foi reclamado pela autora.

É inegável que a morte dos peixes representou para a autora um prejuízo, pois os (peixes) eram um elemento do seu activo, que se perdeu com a morte deles. E é inegável que tal morte impediu que eles se desenvolvessem e atingissem o tamanho adequado para venda [ou para venda de parte deles, considerando a mortalidade normal que sempre se verificaria] no fim do seu ciclo produtivo (2 anos).

O artigo 562.º do Código Civil e n.º 2 do artigo 566.º do mesmo diploma, na parte em que dispõe que “a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder se atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos”, não consentem, no entanto, que a medida da indemnização compreenda simultaneamente o preço médio dos peixes que morreram e a margem de comercialização não realizada com a venda dos peixes. Vejamos.

Como bem salienta a recorrente ao citar Calvão da Silva em anotação ao acórdão do STJ de 1 de Março de 2001, na RLJ, ano 134, página 113, “Sentido e fim da indemnização é, pois, a criação da situação em que o lesado estaria presentemente, no momento em que é julgada a acção de responsabilidade se não tivesse tido lugar o facto lesivo – situação hipotética ou provável, portanto – e não a reconstituição da situação anterior à lesão”, pelo que “coerentemente com a assinalada função - criação da provável situação actual – a indemnização apenas existe em relação aos danos (reais que o lesado provavelmente ou presumivelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, neles se compreendendo não só os prejuízos causados (danos emergentes) como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucros cessantes) incluindo os danos futuros – danos emergentes e lucros cessantes – desde que previsíveis”.

Tendo presente o sentido do princípio geral da obrigação de indemnização enunciado no artigo 562.º do Código Civil e o sentido da indemnização em dinheiro, prevista no n.º 2 do artigo 566.º do mesmo diploma, cabe por perguntar se, na hipótese de não terem morrido os peixes, o património da autora, na data mais recente que pudesse ser atendida pelo tribunal, teria, como elementos do activo, o “preço médio dos peixes mortos” e a “margem de comercialização não realizada”.

Data mais recente que é a do encerramento da discussão em primeira instância pois, como afirmou o acórdão do STJ de 17 de Janeiro de 1995, publicado no BMJ n.º 443, Fevereiro de 1995, páginas 270 a 281, “é jurisprudência há muito firmada a de que, face ao disposto no n.º 1 do artigo 663.º [correspondente ao n.º 1 do artigo 611.º do CPC em vigor] a data mais recente que pode ser atendida pelo tribunal é a do encerramento da discussão e julgamento, já que a quantificação do valor dos danos constitui matéria de facto”.

A resposta à questão acima posta é negativa. Com efeito, sabendo-se que a autora criava peixes para vender e que estes, depois de entrados na unidade de aquicultura, estariam em condições de ser vendidos ao fim de dois anos, então, se eles não tivessem morrido, o que era normal, no momento em que a acção foi julgada, é que parte deles tivesse sido vendida, não integrando, nessa altura, o activo patrimonial da autora. O que havia no património desta era o produto dessa venda, deduzidos dos custos de produção, ou seja, o que existiria era a margem de comercialização dos peixes.

Observe-se que aquilo a que a autora, ora recorrente, chama de “preço médio” dos peixes, quando os mesmos não têm tamanho para serem comercializados, é o custo desses peixes (custos de aquisição, alimentação e outros). Com efeito, sempre que eles não tenham tamanho normal para serem comercializados, do que se pode falar é de um valor do peixe, calculado em função dos seus custos de produção e não de preço médio, já que só tem sentido falar em preço médio em relação a bens que estejam em condições de ser vendidos. Uma vez que a margem de comercialização corresponde à diferença entre o preço da venda e os custos variáveis de produção, a indemnização da perda da margem de comercialização implica que se deduzam os custos de produção.  

Segue-se do exposto que pela mortalidade anormal de peixes, verificada de Abril de 2009 a Maio de 2010, o dano que importa liquidar é apenas a perda da margem de comercialização de tais peixes.

Liquidação que não está em condições de ser feita, pois não se conhecem o número de peixes mortos anormalmente, o preço médio de cada peixe no fim do seu ciclo produtivo e os custos de produção de tais peixes, sendo estes dados indispensáveis para o cálculo do dano.

No entender deste tribunal, é possível, em sede de liquidação, apurar, com recurso designadamente à produção de prova pericial, estes dados ou alguns deles. E ainda que não seja possível apurá-los com exactidão, será possível fazê-lo em termos aproximados, o que permitirá, em último caso, um julgamento mais equitativo do que aquele que é possível neste momento, ao abrigo do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil.

Segue-se do exposto que há fundamento para revogar a decisão na parte em que julgou improcedente o pedido de indemnização pela margem de comercialização não realizada com a venda dos peixes que morreram anormalmente entre Maio de 2009 e Abril de 2009 e substituí-la por decisão a condenar os réus na indemnização que se vier a liquidar.” [negritos nossos]

Contra esta decisão insurgem-se os Recorrentes Arch, Ltd. e Impulso, S.A., invocando, por um lado, que não se encontra provado o nexo de causalidade entre o acidente e o dano, e, por outro lado, que ocorreu culpa da própria lesada; e insurge-se o Recorrente Acupm, ACE, invocando não estar provado o dano porque a mortalidade excessiva de peixes não pode calcular-se nos termos em que foi calculada em unidades de piscicultura em fase de instalação, alegando mais concretamente o seguinte:

“É do conhecimento comum que só se podem aplicar mortalidades estandardizadas a unidades de piscicultura que estão maduras e não a unidades que estão a arrancar, como era o caso da instalação da recorrida ACUINOVA, para mais, quando durante uma parte daquele período a adução de água à instalação foi feita através de uma captação provisória, por se ter querido antecipar a exploração, apesar de saber-se que não estavam reunidas todas as condições para o poder fazer”).

Consideremos os factos relevantes:

77. O normal funcionamento dos tanques servidos pelo emissário de captação nº 1 só foi alcançado em Junho de 2010 (ZZZ).

78. A produção desde Abril de 2009 a Maio de 2010, bem como, o fornecimento previsto de alevins de Abril de 2009 a Maio de 2010 ficou condicionado pelo referido em 77 [ZZZ) (AAAA).

79. Durante o período compreendido entre Abril de 2009 a Maio de 2010, a autora procedeu à limpeza dos resíduos acumulados nos circuitos de captação e de retorno de água, por forma a impedir o contínuo aumento da morte dos peixes (BBBB).

80. Na zona de produção, e também com esse objectivo, a autora procedeu às seguintes tarefas: utilizou dois sistemas de limpeza com água de alta pressão a funcionar continuamente, para manter o caudal de água nos locais em que a acumulação de sedimentos afectava a sobrevivência dos peixes; construiu redes de protecção para separar os peixes do sedimento; construiu tubos centrais de rede para facilitar a saída do material sem deixar escapar os peixes; transferiu os peixes vivos dos tanques com níveis mais elevados de sedimentação para outros já limpos; transferiu pessoal técnico do Grupo Pescanova para apoiar a coordenação das tarefas de limpeza, contagem e salvamento de peixes; contratou novos empregados para eliminar os sedimentos dos tanques de cultivo e transferir peixes entre tanques (CCCC).

81. O número de peixes que morreram e que se perderam com o referido em 47 (UU) foi de 171.277 peixes, correspondente a 32.317,26 kg, sobrevivendo 838.568 com a biomassa de 171.295 kg (DDDD).

82. Para além da morte imediata de peixes, o referido em 47 [UU) veio a determinar um acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe (EEEE).

83. A mortalidade dos pregados considerada normal para este tipo de instalação aquícola corresponde a 5% ao ano (FFFF).

84. Até à reparação definitiva, em Maio de 2010, da tubagem do sistema de captação n.º 1, continuou a entrar material nos tanques, o qual apresentava componentes tóxicos, como bactérias e parasitas, que contaminavam os peixes (GGGG).

85. Os cortes de água sucessivos e necessários para as tarefas de reparação do sistema de captação nº 1 pela ré ACUPM, que decorreram entre Abril de 2009 e Abril de 2010, afectaram em grande medida os peixes, provocando um aumento de “stress” na produção destes (HHHH).

86. Numa instalação aquícola normal análoga à da autora, o período de corte de água para tarefas de manutenção e limpeza é no máximo de 4 horas em cada seis meses (IIII).

87. Entre Abril de 2009 e Maio de 2010, em ordem a que a ré ACUPM realizasse os trabalhos de reparação, a autora teve de proceder a cortes de água no total de 890 horas, representando uma afectação em 20% das horas de alimentação dos peixes (JJJJ).

88. O preço médio das existências em stock era de € 3,20 por peixe dos existentes em Abril de 2009 (KKKK).

89. Quanto aos peixes perdidos entre Maio de 2009 e Maio de 2010, o valor por calibre, variava, entre € 2,10 e € 2,30 por peixe.

90. Com a morte dos peixes, a autora perdeu, de igual modo, resultado operacional em 2010 e 2011, que não foi realizado relativamente à mercadoria em stock, afectada, sendo que o preço unitário médio de venda para os anos 2010 e 2011 estava estimado em € 6,00/kg (MMMM).

Perante a factualidade dada como provada e, em especial, perante o teor do facto 82. (“Para além da morte imediata de peixes, o referido em 47 [UU) veio a determinar um acréscimo, em número não apurado, da mortalidade dos pregados acima do normal para este tipo de instalação aquícola, sendo que, no período de Maio de 2009 a Maio de 2010, morreram 25 065Kg de peixe”), dúvidas não subsistem não apenas acerca da responsabilidade dos RR. pelo evento lesivo (facto 47.) – a qual não foi posta em causa nos presentes recursos – como acerca da prova do nexo de causalidade naturalística, e conforme ao juízo normativo da causalidade adequada (art. 563º do Código Civil), entre tal evento lesivo e o dano correspondente à perda pela A. de uma margem de comercialização devido a uma mortalidade excessiva de peixes no período compreendido entre os meses de Abril de 2009 e Maio de 2010.  

Quanto à sustentada culpa da A.: (i) no que se refere à ocorrência do evento lesivo, foi afastada pelas instâncias (ao darem como não provado “Que a entrada massiva de areias e lodos em Abril de 2009 tivesse origem também no facto de estar em funcionamento uma solução provisória de toma de água” - ponto 68. dos factos não provados); (ii) no que se refere à causalidade dos danos aqui em jogo (perda da margem de comercialização devido à mortalidade excessiva de peixes), se é certo que a 1ª instância admitiu, ao enunciar os factores que conduziram, nesta parte, à decisão de absolvição, que a conduta da A. teria contribuído para tais danos (afirmando que “a sua [da A.] própria opção de colocar peixe ao invés de aguardar o fim da obra, apesar de consciente dos riscos e a sua própria opção de não colocar peixe ou reduzir a sua entrada após o incidente”), também é certo que a culpa da A. não foi admitida pela Relação nem resulta dos factos dados como provados.

Quanto à argumentação do Recorrente Acupm, ACE, constata-se que, para além da prova dos factos 77., 78., 82. e 83., demonstrativos da ocorrência de mortalidade excessiva de peixes para o “tipo de instalação aquícola” dos autos, nada mais foi provado que permita atribuir relevância à invocada distinção entre unidades de piscicultura em fase de instalação ou em fase de “maturidade”.

Assim sendo, não merece censura a decisão da Relação que revogou o segmento da sentença que julgou improcedente o pedido indemnizatório pela margem de comercialização não realizada com os peixes mortos acima do normal, no período compreendido entre Maio de 2009 e Maio de 2010, substituindo esse segmento pela decisão de condenação dos RR. no que se vier a liquidar.

9. Por fim, cabe conhecer da questão relativa à decisão do acórdão recorrido, que, quanto ao pedido de indemnização pela perda da margem de comercialização relativamente aos peixes que deveriam ter entrado na instalação no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010, revogou a decisão da 1ª instância que fixou uma indemnização equitativa no valor de €1.550.000,00, substituindo-a por decisão de condenação em quantia a liquidar.

A este respeito invoca-se em ambos os recursos o fundamento da necessária interpretação restritiva do nº 2 do art. 609º do CPC, o qual foi já supra apreciado e rejeitado (cfr. ponto 6.2. do presente acórdão).

Para além disso, importa apreciar os demais fundamentos invocados, a saber:

  • Se devem os RR. ser absolvidos de tal pedido por falta de prova de nexo de causalidade entre o evento lesivo e o dano em causa, uma vez que, nas circunstâncias verificadas, os custos de exploração não seriam absorvidos pelas vendas; e/ou por ocorrência de culpa da lesada, a aqui A. [recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A];
  • Se deve ser repristinada a decisão da 1ª instância que fixou a indemnização com recurso à equidade, por falta de elementos que, mesmo com recurso a prova pericial, permitam calcular o dano em sede de incidente de liquidação [recurso do R. Acupm, ACE];
  • Seguindo-se a via da indemnização equitativa, se deve o montante indemnizatório ser fixado em valor inferior ao fixado pela 1ª instância [recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A.].

Consideremos o teor da fundamentação do acórdão recorrido, na parte respeitante ao pedido de indemnização pela perda da margem de comercialização relativamente aos peixes que deveriam ter entrado na instalação no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010:

“Apreciemos, de seguida, o recurso na parte em que tem por objecto a decisão que, recorrendo à equidade, fixou em € 1 550 000,00 a indemnização devida pelos lucros que a autora deixou de obter em consequência de não terem entrado no processo produtivo, como previsto, entre Abril de 2009 e Maio de 2010, 3 312 376 alevins.   

Está em questão a substituição de uma decisão que julgou segundo a equidade, ao abrigo do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil, por decisão que condene no que se vier a liquidar, ao abrigo do n.º 2 do artigo 609.º CPC.

Recorde-se que a sentença considerou que não era possível apurar o valor dos danos ora em causa. A recorrente discorda, dizendo que era viável apurar o valor dos danos em sede de liquidação.  

Tendo presentes os pressupostos da condenação ilíquida, ao abrigo do n.º 2 do artigo 609.º, do CPC, a questão que está verdadeiramente em causa nesta parte do recurso é a de saber se ainda é possível apurar, em sede de liquidação, a margem de comercialização que a autora deixou de obter pelo facto de não terem entrado no processo produtivo, entre Abril de 2009 e Maio de 2010, 3 312 376 alevins.  

Quanto aos demais requisitos – existência de dano e falta de elementos para fixar a medida da indemnização devida por tal dano – não há controvérsia. E assim sucede na realidade.

A existência do dano resulta dos seguintes factos:

1. Durante o período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010, devido à redução temporária da capacidade, que ocorreu em virtude da entrada massiva de areias, não entraram no processo produtivo da unidade de aquicultura da autora, 3 312 376 unidades de alevins, como estava previsto, entradas que foram retomadas após aquela última data, sendo certo que a autora não suspendeu totalmente o funcionamento ou exploração daquela unidade de aquicultura, durante esse período;

2. Em virtude da não entrada de mercadoria no processo produtivo entre Abril de 2009 e Maio de 2010, verificou-se uma redução do volume de vendas, em montante não apurado, nos anos de 2011 e 2012 [n.º 93 dos factos julgados provados].  

A falta de elementos para estabelecer a medida da indemnização resulta do seguinte. Sabendo-se que a medida da indemnização deste prejuízo, de acordo com a directriz traçada pelo n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, corresponde à diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida [encerramento da discussão em primeira instância] e a que teria nessa data se não existisse a redução das vendas, seria necessário, para fixar a medida da indemnização, conhecer o volume das vendas não realizado e a margem de comercialização obtida com esse volume de vendas, quando o tribunal não conhece estes dados, pois embora alegados eles não foram provados.

Também aqui entendemos que se justifica o recurso à liquidação. Com efeito, é possível, em sede de liquidação, apurar, com recurso designadamente à produção de prova pericial, estes elementos ou alguns deles, ou, pelo menos apurá-los, em termos aproximados, o que permitirá, em último caso, um julgamento mais equitativo do que aquele que é possível neste momento, ao abrigo do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil. Observe-se que a prova produzida pela autora para demonstrar os prejuízos ora em causa consistiu em documentos e testemunhas, quando, segundo o n.º 4 do artigo 360.º do CPC, é lícita ao juiz ordenar a produção de outras provas, designadamente a produção de prova pericial. 

Acresce, a favor da liquidação, que, como já escrevemos acima, mesmo que não se apurem com exactidão todos os elementos para o cálculo da indemnização, poderão ser apurados, em termos aproximados, o que permitirá, em último caso, um julgamento mais equitativo do que aquele que é possível neste momento. Ora é dever do tribunal – bem como dos mandatários e das partes – concorrer para a justa composição do litígio (n.º 1 do artigo 7.º do CPC).

Em consequência, importa revogar a sentença na parte em que condenou, com recurso à equidade, os réus a pagar à autora a quantia de € 1 550 000,00, a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os alevins que não deram entrada no processo produtivo da autora e substitui-la por decisão que condene os réus no pagamento da indemnização que se vier a liquidar.

*

Para a hipótese de este tribunal não atender a pretensão anterior, a autora insurgiu-se contra o juízo de equidade feito pela sentença, sustentando que o juízo de equidade que lhe está subjacente era inadequado, devendo ser substituído por outro.

Visto que a pretensão anterior foi atendida, está prejudicado o conhecimento da questão de saber se o juízo de equidade foi o adequado.” [negritos nossos]

Contra o decidido pela Relação, alegam os Recorrentes Arch, Ltd. e Impulso, S.A.: “De facto, face à previsível taxa de mortalidade dos peixes muito superior à normal, resultante do carácter provisório das instalações e do facto de que decorriam nessas instalações obras de construção, redunda que os custos de exploração não são absorvidos pelas vendas, e nessa medida, resulta um prejuízo que, seja por inexistência de nexo com o sinistro sub judice (artigo 563.º do CC) ou por exclusão da indemnização por culpa do lesado (artigo 570º nº 1 do CC), não poderá tal pretenso prejuízo ser imputável às ora Recorrentes, mas sim à decisão exclusiva da Autora de introdução de peixes numa instalação provisória enquanto decorriam trabalhos de construção.”

 

Foram dados como provados os factos seguintes:

91. Durante o período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010, devido à redução temporária da capacidade, que ocorreu em virtude do referido em 47 (UU), não entraram no processo produtivo da unidade de aquicultura da autora, 3.312.376 unidades de alevins, como estava previsto, entradas que foram retomadas após aquela última data, sendo certo que a autora não suspendeu totalmente o funcionamento ou exploração daquela unidade de aquicultura, durante esse período (NNNN).

92. Assim, em Abril e Maio de 2009 não se registou a entrada de alevins no processo produtivo e de Junho de 2009 a Abril de 2010 colocaram-se globalmente alevins no processo produtivo a um ritmo inferior ao previsto (OOOO).

93. Em virtude da não entrada de mercadoria no processo produtivo entre Abril de 2009 e Maio de 2010, verificou-se uma redução do volume de vendas, em montante não apurado, nos anos de 2011 e 2012 (PPPP).

Perante esta factualidade, e à semelhança do que se afirmou supra, quanto à questão recursória anterior (ponto 8. do presente acórdão), não existem dúvidas tanto sobre a responsabilidade dos RR. pelo evento lesivo (descrito no facto 47.) como sobre a prova do nexo de causalidade naturalística e sua conformidade ao juízo normativo de causalidade adequada do art. 563º do Código Civil entre tal evento lesivo e o dano consubstanciado na perda, pela A., da margem de comercialização relativamente aos peixes que deveriam ter entrado na instalação no período compreendido entre Abril de 2009 e Maio de 2010. Tal como se afirmou supra, dos factos provados não resulta provada qualquer contribuição causal culposa da A. para a produção e agravamento desses danos. Nem tampouco resulta a prova de factos que levem a concluir que os custos de exploração não seriam absorvidos pelo resultado das vendas que não chegaram a realizar-se. Cabendo aos RR. alegar e provar tanto os factos que consubstanciam a culpa do lesado (art. 572º do Código Civil) como os factos impeditivos ou modificativos do direito invocado (art. 342º, nº 2, do mesmo Código), não merece censura a decisão da Relação de dar como provado o nexo causal entre o evento lesivo e o dano em causa.

 

Consideremos agora a pretensão do Recorrente Acupm, ACE de que seja repristinada a decisão da 1ª instância que fixou a indemnização com recurso à equidade, por falta de elementos que, mesmo com recurso a prova pericial, permitam calcular o dano em sede de incidente de liquidação; assim como, se tal pretensão foi julgada procedente, a pretensão do recurso dos RR. Arch, Ltd. e Impulso, S.A. de que tal indemnização equitativa seja fixada em valor inferior ao fixado pela 1ª instância.

Vejamos.

A respeito da escolha entre a via da condenação em indemnização a liquidar e a via da fixação equitativa do montante indemnizatório, pronuncia-se, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/03/2019 (proc. nº 4966/17.3T8LSB.L1.S1), supra referido, nos seguintes termos:

Na verdade, sendo possível obter o valor do dano de modo mais justo, tal é preferível do que arbitrá-lo segundo o critério da equidade, especificado no art. 566.º, n.º 3, do CC, dada uma certa aleatoriedade e delicadeza na fixação do dano por equidade.

A opção, contudo, dependerá das circunstâncias do caso, tendo em consideração as possibilidades da prova a realizar no âmbito da liquidação. Apresentando-se essa prova como improvável, deve desde logo, na sentença, fixar-se o valor do dano com recurso à equidade, evitando a demora excessiva e inútil (ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e LUÍS DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, VOL. I, 2018, pág. 729).

Não obstante o valor do dano deva ser fixado na sentença, sempre que possível, pode relegar-se para liquidação ulterior quando, inexistindo factos para determinar o valor exato, é possível prever a sua prova. De contrário, justifica-se a fixação imediata, recorrendo à equidade, do valor exato do dano (posição idêntica foi sufragada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de novembro de 2015, no processo n.º 480/11.9TBMCN.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt).”

De acordo com esta orientação, que aqui se sufraga, considera-se não merecer censura a fundamentação do acórdão ora recorrido, ao declarar:

Para se “conhecer o volume das vendas não realizado e a margem de comercialização obtida com esse volume de vendas, quando o tribunal não conhece estes dados, pois embora alegados eles não foram provados (…) é possível, em sede de liquidação, apurar, com recurso designadamente à produção de prova pericial, estes elementos ou alguns deles, ou, pelo menos apurá-los, em termos aproximados, o que permitirá, em último caso, um julgamento mais equitativo do que aquele que é possível neste momento, ao abrigo do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil. Observe-se que a prova produzida pela autora para demonstrar os prejuízos ora em causa consistiu em documentos e testemunhas, quando, segundo o n.º 4 do artigo 360.º do CPC, é lícita ao juiz ordenar a produção de outras provas, designadamente a produção de prova pericial.”

Deste modo, conclui-se ser de manter a decisão que revogou a condenação dos RR. a pagar à A. a quantia de € 1.550.000,00, a título de indemnização pela margem de comercialização não realizada com os 3.312.376 peixes que não entraram no processo produtivo da A. entre Abril de 2009 e Maio de 2010, substituindo-a por decisão a condenar os RR. no que se vier a liquidar. E ficando, assim, prejudicada a apreciação da questão da fixação da indemnização em montante inferior ao que foi fixado pela sentença da 1ª instância.

10. Pelo exposto, julgam-se ambos os recursos improcedentes, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido.

 

Custas dos recursos pelos respectivos Recorrentes.

 

Lisboa, 7 de Maio de 2020

 

Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade das Exmas. Senhoras Conselheiras Maria Rosa Tching e Catarina Serra que compõem este colectivo.

 

 

 

Maria da Graça Trigo (Relatora)

 

Maria Rosa Tching

 

Catarina Serra

Descritores:
 Liquidação; Liquidação ulterior dos danos; Pedido genérico; Ónus da prova; Ónus de alegação; Dano; Equidade