1. No caso de sucessão de pagamentos parcelares da indemnização pela seguradora, o início da contagem do prazo de prescrição, previsto no art. 498º, nº 2, do CC, fixa-se, por regra, na data do último pagamento efectuado.
2. Tratando-se de indemnização de danos autónomos e consolidados e de natureza claramente diferenciada, deve atender-se ao último pagamento de cada um desses núcleos indemnizatórios autónomos de danos.
Não disponível.
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I.
LUSITÂNIA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. propôs esta acção declarativa, com processo comum, contra MAPFRE - SEGUROS GERAIS, S.A..
Pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia total de €222.477,36, acrescida de juros de mora, mais concretamente:
A - Relativamente aos herdeiros do sinistrado AA, reclama a Autora o valor global de Euros 25.468,31, a seguir discriminados:
a) Euros 21.666,06, relativo a entrega do capital de remição, conforme artigo 17°. da petição inicial;
b) Euros 3.224,00, relativo a despesas de funeral, conforme artigo 17°. da petição inicial;
c) Euros 181,50, relativo a despesas com assistência médica, conforme artigo 18°. da petição inicial;
d) Euros 12,75, relativo a despesas diversas, conforme artigo 18°. da petição inicial;
e) Euros 384,00, relativo a despesas judiciais, conforme artigo 18°. da petição inicial;
B - Relativamente aos herdeiros do sinistrado BB, reclama a Autora o valor global de Euros 51.651,00, a seguir discriminados:
a) Euros 22.447,30, relativo a entrega do capital de remição, pago a DD, conforme artigo 25°. da petição inicial;
b) Euros 23.105,65, relativo a entrega do capital de remição, pago a EE, conforme artigo 25°. da petição inicial;
c) Euros 3.224,00, relativo a despesas de funeral, conforme artigo 26°. da petição inicial;
d) Euros 15,00, relativo a despesas de transportes, conforme artigo 26°. da petição inicial;
e) Euros 3,05, relativo a despesas diversas, conforme artigo 26°. da petição inicial;
f) Euros 2.856,00, relativo a despesas judiciais, conforme artigo 26°. da petição inicial;
C - Relativamente à sinistrada CC, reclama a Autora o valor global de Euros 93.217,60, a seguir discriminados:
a) Euros 17.124,84, relativo a indemnização por incapacidade temporária absoluta, conforme artigo 33°. da petição inicial;
b) Euros 22,41, relativo a indemnização por incapacidade temporária parcial, conforme artigo 33°. da petição inicial;
c) Euros 38.048,09, relativo a despesas com assistência médica, conforme artigo 34°. Da petição inicial;
d) Euros 6.540,12, relativo a despesas com honorários de intervenção cirúrgica, conforme artigo 34.º da petição inicial;
e) Euros 2.149,51, relativo a despesas diversas, conforme artigo 34°. da petição inicial;
f) Euros 2.091,00, relativo a despesas judiciais, conforme artigo 34°. da petição inicial;
g) Euros 154,73, relativo a despesas sns, conforme artigo 34°. da petição inicial;
h) Euros 100,00, relativo a despesas com juntas médicas, conforme artigo 34°. da petição inicial;
i) Euros 703,82, relativo a despesas com medicamentos, conforme artigo 34°. da petição inicial;
j) Euros 1.039,70, relativo a despesas de transportes, conforme artigo 34°. da petição inicial;
k) Euros 25.243,38, relativo a pensão anual e vitalícia paga até 19 de Maio de 2016, conforme artigo 36°. da petição inicial;
Tudo no valor total de Euros 170.336,91.
E bem assim da provisão matemática actualizável e que em 19 de Maio de 2016 estava fixada em Euros 52.140,45.
Como fundamento, alegou que, no dia 00 de ... de 2007, quando eram transportados no veículo automóvel de matrícula 00-00-GI, em deslocação no âmbito da actividade prestada à sua entidade patronal, os trabalhadores desta, CC, AA e BB foram vítimas de acidente de viação, causado pelo condutor do referido veículo, seguro na Ré, tendo a Autora, seguradora do trabalho, pago aos herdeiros dos sinistrados AA e BB e à sinistrada CC as respectivas indemnizações, de que pretende ser reembolsada.
A Ré contestou, defendendo-se, além do mais, com a excepção da prescrição, por haver decorrido o prazo de três anos sobre o pagamento da totalidade das prestações.
Foi proferida sentença em que – considerando ser aplicável o prazo de prescrição de três anos (e não o prazo de 10 anos), de acordo com os diferentes lesados e as diferentes espécies de indemnização, o direito de regresso da Autora sobre a Ré relativamente a todas as quantias mostra-se prescrito – foi julgada improcedente a acção e a ré absolvida do pedido.
Discordando desta decisão, a autora interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou improcedente, confirmando essa decisão.
Ainda inconformada, a ré interpôs recurso de revista excepcional, que foi admitida, tendo formulado as seguintes conclusões:
(…)
UU) O Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 3 de Julho de 2018, com referência a estes autos, veio a considerar que o prazo de prescrição aplicável para exercer o direito ao reembolso das quantias pagas, nos termos da Lei, para os valores liquidados por força da existência da apólice de acidente de trabalho, junto do civilmente responsável, é de 3 anos;
VV) Mais, foi ainda delimitado no âmbito daquele Acórdão de 3 de Julho de 2018, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça que, quanto ao momento a partir do qual se inicia a contagem desse prazo prescricional ("pagamento de cada uma das prestações", "de um núcleo de prestações de idêntica finalidade" ou "do último pagamento realizado"), se deve atender ao último pagamento efectuado;
WW) Vem ainda aquele Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça definir que, se ocorrer uma subjectiva autonomização das indemnizações, relativa a núcleos de danos claramente diferenciados, esta autonomização será admissível apenas em relação a danos autónomos e consolidados, de natureza diferenciada e inteiramente ressarcidos;
XX) No entanto, conforme fixado naquele Acórdão proferido, não pode esta autonomização "cindir danos da mesma natureza, relativos a um mesmo lesado, em função do que parecer razoável ao julgador, sob pena de cairmos numa situação de inaceitável incerteza, absolutamente contrária a uma das razões - a certeza e segurança jurídicas - que está na base da prescrição. "
YY) Acrescenta aquele Acórdão que "No caso dos autos, verifica-se que, no tocante à questão da prescrição, foi considerada provada matéria de facto extremamente exígua, que seria suficiente para a decisão, (...), mas que é claramente insuficiente se se acolher, como acolhemos, o entendimento de que é aplicável o prazo de três anos, a contar do último pagamento, com a ressalva apontada, de poderem ser autonomizadas parcelas da indemnização global.";
ZZ) Da decisão do Supremo Tribunal de Justiça resulta evidente que são dois os critérios atendíveis para enquadrar a prescrição do direito da Autora, ora Recorrente, os pagamentos por si efectuados, que são, por um lado, a autonomização de núcleos de indemnização e, por outro, a data do último dos pagamentos;
AAA) Importa ter presente, e encontra-se provado que a ora Autora, por força do sinistro simultaneamente de viação e de trabalho, ocorrido em 00 de ... de 2007, pagou aos herdeiros de AA, os seguintes montantes:
a) Euros 21.666,06, como entrega do capital de remição, em 19/01/2009;
b) Euros 3.224,00, a título de despesas de funeral, em 19/02/2009;
c) Euros 384,00, a título de despesas judiciais, em 10/02/2009; e
d) Euros 181,50, a título de despesas administrativas, com averiguação realizada, em 28/11/2007;
BBB) Por outro lado, encontra-se provado que a ora Autora, por força do mesmo facto gerador, nesta circunstância, o sinistro simultaneamente de viação e de trabalho, ocorrido em 00 de ... de 2007, pagou aos herdeiros de BB, os seguintes montantes:
a) Euros 22.447,30 e Euros 23.105,65, respectivamente a DD e a EE, como entrega do capital de remição, em 08/06/2009;
b) Euros 3.224,00, a título de despesas de funeral, em 08/06/2009;
c) Euros 15,00, a título de despesas de transporte, em 08/06/2009; e
d) Euros 714,00, a título de despesas judiciais, em 08/06/2009;
CCC) Atendendo aos dois critérios atentatórios para o pagamento de indemnização, resulta evidente que, no que respeita à autonomização de núcleos de indemnização, temos que, à sinistrada CC, foi pago:
a) Euros 17.147,25, relativo a indemnização por incapacidades que padeceu, entre 14/08/2007 até 18/06/2009;
b) Euros 3.757,64, ao Hospital de ..., em 31/122007;
c) Euros 2,10, ao Centro de Saúde de ..., em 20/12/2007;
d) Euros 122,85, ao Hospital de ..., em 14/01/2008;
e) Euros 310,00, a Unimed, em 19/01/2008;
f) Euros 9,54, a ..., Lda., em 27/03/2008;
g) Euros 3.562,89, a Unimed, em 01/03/2008;
h) Euros 30.201,02, aos Hospitais da …, EPE, em 13/05/2008;
i) Euros 4.195,22, a Unimed, em 17/11/2009;
j) Euros 800,70, com despesas judiciais, em 24/08/2011;
k) Euros 25.243,38, por conta da pensão anual e vitalícia, com efeitos reportados a 19/06/2009 até 19/05/2016;
DDD) Aqui chegados, verificamos que o último pagamento efectuado ocorreu em 19 de Maio de 2016, e foi efectuado à sinistrada CC - ponto 33 dos factos provados;
EEE) De resto, as pensões pagas àquela CC, de acordo com a sentença proferida em 30 de Setembro de 2010, no âmbito do processo de trabalho, com o n°. 722/08.8TTLRA, do 1º. Juízo, do Tribunal do Trabalho de ..., tendo sido a pensão anual e vitalícia desde 19 de Junho de 2009 (data da alta), ininterruptamente até 19 de Maio de 2016;
FFF) Acresce que, e no que ao momento que deverá ser atendido ao início do curso da prescrição, tem vindo a ser dominante na jurisprudência deste Tribunal Superior que a prescrição contar a partir do último pagamento, quando a indemnização é satisfeita de forma parcelar;
GGG) Neste sentido, atendemos ao enunciado no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no processo n°. 900/13.8TBSLV.E1.S1, de 21.09.2017, disponível em www.dgsi.pt: (…)
HHH) É que, na sequência da sentença proferida no processo que conheceu da situação (que, com o n°. 1638/08.3TBACB, correu seus termos junto da Comarca de ... - ... - Instância Central - Secção Cível – J1 (ex-Tribunal Judicial de ..., 2º. Juízo)), a sinistrada CC optou por receber a indemnização em sede de processo civil, assim fazendo suspender a obrigação da ora Requerente em pagar a pensão anual e vitalícia a partir do trânsito em julgado daquela decisão e até que se mostre esgotado o montante de Euros 191.614,56 - conforme Acta da Audiência de Partes realizada em 2 de Novembro de 2016, naquele processo n°. 722/08.8TTLRA-A;
III) Parece inequívoco que os montantes pagos à lesada CC, bem como aqueles que foram pagos aos herdeiros dos falecidos AA e BB, não estavam prescritos quando, em 28 de Março de 2016, a Autora, ora Recorrente, apresentou a Notificação Judicial Avulsa;
JJJ) Assim sendo, e tendo presente que a Autora apresentou em Tribunal uma Notificação Judicial Avulsa naquele dia 28 de Março de 2016, nos termos da qual era requerida a notificação da Ré Mapfre, do propósito da ora Autora de reclamar desta os direitos, enquanto seguradora de acidentes de trabalho, que lhe assistiam face aos pagamentos efectuados no âmbito da apólice de acidente de trabalho aos lesados, ocupantes do veículo GI, seguro na ora Ré, à luz da responsabilidade do condutor desta viatura na produção do evento dos autos, resulta evidente que os montantes pagos pela ora Recorrente e reclamados no âmbito dos presentes autos não se encontram prescritos;
KKK) Acresce que, entendendo-se a obrigação de indemnizar da seguradora como una e simples, quanto ao seu cumprimento, está-se a atender ao cumprimento integral, e isto porque, se correria o risco de, por cada pagamento ou grupo de pagamentos, a Autora, ora Recorrente, ter de intentar uma acção e vir sucessivamente com acções relativamente a cada pagamento ou grupo de pagamentos posteriores, o que só complicaria a apreciação judicial do caso;
LLL) A este respeito, encontra-se expresso no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 07/04/2011, no Processo 329/06.4TBAGN.C1.S1, acessível in www.dgsi.pt. que: (…)
MMM) Não vê a Autora, ora Recorrente, fundamento para vir autonomizar núcleos de indemnização pagas a um mesmo lesado, nomeadamente, e no que aos pagamentos efectuados por conta das lesões sofridas pela sinistrada CC, porquanto se encontra perfeitamente delimitado o período temporal em que ocorreu o pagamento de indemnizações àquela;
NNN) Desta forma, considera a Autora, ora Recorrente, que o direito a reclamar o pagamento dos montantes liquidados por força das lesões sofridas especificamente por esta lesada CC não se encontra prescrito, pelo que deverá a Ré, Recorrida, ser condenada no pagamento à Autora do montante de Euros 85.352,59;
OOO) Acresce ainda que, além dos fundamentos atrás invocados que, salvo o devido respeito demonstram que não está prescrito o direito reclamado pela Recorrente na presente acção, nomeadamente, quanto ao direito de ser ressarcida por todos os montantes despendidos por força da apólice de Acidente de Trabalho aos sinistrados, cuja responsabilidade do acidente de viação, que também é de trabalho, recai integralmente sobre a Ré/Recorrida por força da responsabilidade imputável ao condutor do veículo seguro nesta (GI), terá de se atender às conclusões da sentença proferida no processo emergente de acidente de viação, cujo trânsito em julgado ocorreu em 19 de Maio de 2016, que determinou:
a) que a sinistrada CC terá direito a receber da Ré Mapfre a quantia de Euros 242.975,80, a título de danos patrimoniais (encontrando-se a Ré Mapfre desonerada a pagar àquela a quantia de Euros 17.907,21, que esta já recebeu da Lusitânia, a título de pensão anual e vitalícia e de outras quantias que eventualmente venha ainda a receber a este título);
b) não condenar a Ré Mapfre, por não ter sido demandada, no pagamento dos montantes que a Autora despendeu com a regularização do acidente, simultaneamente de viação e de trabalho;
PPP) E que, como se encontra expresso a fls. 61 daquela sentença proferida no processo n°. 1638/08.3TBACB, resulta que a sinistrada CC terá direito a receber da Ré Mapfre a quantia de Euros 242.975,80, a título de danos patrimoniais (encontrando-se a Ré Mapfre desonerada a pagar àquela a quantia de Euros 17.907,21, que esta já recebeu da Lusitânia, a título de pensão anual e vitalícia e de outras quantias que eventualmente venha ainda a receber a este título), assim reconhecendo que não se arbitra indemnização a pagar à ora Autora, por nesta acção não ter sido desde logo liquidado e formulado o pedido para a condenação da Ré;
QQQ) Todavia, não se pode omitir que a sentença proferida neste processo n°. 1638/08.3TBACB, repita-se, transitada em julgado em 19 de Maio de 2016, reconheceu o direito da ora Autora, com fundamento na responsabilidade integralmente imputada ao condutor do veículo seguro na Ré Mapfre, determinar que esta é responsável pelo pagamento das indemnizações por força da apólice de acidente de trabalho que foram pagas pela Autora, incluindo a importância de Euros 17.907,21 que reconhecidamente já lhe estava paga e foi deduzida à indemnização total por danos patrimoniais à sinistrada CC, bem como aquelas que foram ou serão no futuro pagas em consequência do evento aos lesados garantidos pela apólice de acidente de trabalho;
RRR) Ora, o direito da Autora, ora Recorrente, exercido na presente acção, não pode pôr em causa os valores reconhecidos como devidos àquela CC, por condenação da Ré Mapfre - que só não foram objecto de condenação por não terem sido expressamente liquidados e peticionados mas foram, isso sim, reconhecidos expressamente como direito da Autora nessa sentença (de acidente de viação), que transitou em julgado em 19 de Maio de 2016;
SSS) É assim evidente que, também nesta parte, resulta manifesto que o direito invocado pela Autora e os valores reclamados na presente acção emergem do reconhecimento do direito que se invoca e decorre da imputação de responsabilidade da Ré no processo emergente de acidente de viação (Maio/2016), significando reconhecimento de valores pagos e devidos à Autora, a pagar pela Ré, já liquidados ou a liquidar, que suportam o pedido formulado na presente acção e afastam a prescrição defendida na sentença recorrida;
TTT) Desta forma, considera a Autora, ora Recorrente, que o direito a reclamar o pagamento dos montantes liquidados na presente acção por força das lesões sofridas pela lesada CC não se encontra prescrito, nem se encontram prescritos os direitos reclamados relativos aos montantes despendidos aos herdeiros dos lesados AA e BB, pelo que deverá a Ré, Recorrida, ser condenada no pagamento à Autora do montante de Euros 164.801,00.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso de Revista Excepcional e, em consequência, ser substituído o Acórdão Recorrido nos termos supra expostos, assim condenando-se a Recorrida nos montantes peticionados na presente acção.
Não foram oferecidas contra-alegações.
Cumpre decidir.
II.
Questões a resolver:
Discute-se se o direito de reembolso exercido pela autora se encontra prescrito.
III.
Vêm provados os seguintes factos:
1. A Real Seguros, S.A. foi incorporada, por fusão, na sociedade Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., com sede na Rua ..., n°. 00, 0000-000 …, Freguesia …, Concelho de …, com o capital social de Euros 25.580.895,00 (vinte e cinco milhões, quinhentos e oitenta mil, oitocentos e noventa e cinco euros), matriculada na Conservatória do Registo Comercial de …, sob o número único de matrícula e Pessoa Colectiva 000 000 000, conforme escritura pública de fusão, aumento de capital e alteração parcial do contrato de sociedade, outorgada no dia 31 de Dezembro de 2009, lavrada a fls, cinquenta e oito, do livro de notas para escrituras diversas número Oitenta - B, do Cartório Notarial de FF [1.º P.I.].
2. Foi promovido, no dia 31 de Dezembro de 2009 e com efeitos reportados a essa data, o pedido de inscrição no registo predial, por forma on Une, dos factos titulados pela escritura pública identificada no ponto um precedente, tendo sido disponibilizada a respectiva Certidão Permanente, a qual poderá ser consultada através do si te www.portaldaempresa.pt. com o código de acesso 0618-7441-4305 [2.º P.I.].
3. Por efeito da fusão, a Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A., na qualidade de sociedade incorporante, sucedeu, in totum, nos respectivos direitos e obrigações da Real Seguros, S.A. [3.º P.I.].
4. A Autora é uma Sociedade que se dedica à actividade seguradora [4.º P.I.].
5. No exercício da sua actividade, a Autora, ex-Real Seguros, S.A, celebrou com Churrasqueiras Rei dos Frangos, Lda., um contrato de seguro do Ramo Acidentes de Trabalho, titulado pela apólice n.º 00/000000, conforme consta das Condições Particulares, Gerais e Especiais da apólice [5.º P.I.].
6. Nos termos da referida apólice n.º 00/000000 encontravam-se abrangidos, no âmbito de cobertura daquele contrato de seguro, entre outros, CC, AA e BB [6.º P.I.].
7. Correu seus termos, com o n°. 796/07.9TTLRA, junto do 1°. Juízo, do Tribunal do Trabalho de ..., um processo relativo à beneficiária do sinistrado falecido, AA, contra a ora Autora, em consequência do acidente de viação dos autos, que foi de trabalho para aquele [8.º P.I.].
8. E correu seus termos, com o n.º 797/07.7TTLRA, junto dos Serviços do Ministério Público, do Tribunal do Trabalho de ..., um processo relativo à beneficiária do sinistrado falecido, BB, contra a ora Autora, em consequência do mesmo acidente de viação dos autos, que também foi de trabalho para aquele [9.º P.I.].
9. Encontrando-se esses processos judiciais já findos [10.º P.I.].
10. Por força do acidente dos autos, CC sofreu lesões corporais, sendo que a ora Autora suportou despesas com o acompanhamento clínico, médico e de recuperação, para além de estar também a pagar mensalmente uma pensão anual e vitalícia, de Euros 3.468,63, reportada a 8 de Outubro de 2009 [11.º P.I.].
11. No processo de acidente de trabalho, identificado no artigo 8.º da P.I., foi reconhecido que o sinistrado AA, foi vítima de um acidente no dia 00 de ... de 2007, em ..., ... [12.º P.I.].
12. Quando aquele AA era transportado no veículo de matrícula 00-00-GI, seguro na Ré e se deslocava no âmbito da actividade de trabalho dependente que prestava para a segurada da ora Autora [13.º P.I.].
13. Sendo que aquele AA trabalhava sob a autoridade e direcção da Churrasqueiras Rei dos Frangos, Lda., como .../..., sendo que esta sociedade tinha a responsabilidade emergente do acidente de trabalho transferida para a Autora (ex-Real Seguros, S.A.) através da apólice nº 00/000000, e auferia a remuneração mensal de Euros 523,50 x 14 meses + Euros 85,00 x 11 meses (subsídio de alimentação) + Euros 50,00 x 12 meses (suplemento de fim de semana) + Euros 227,72 x 1 (média anual de subsídio de caixa) [14.º P.I.].
14. Tendo sido reconhecido que, em consequência directa e necessária deste acidente o sinistrado sofreu as lesões descritas no respectivo relatório de autópsia, efectuado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, tendo causado a sua morte [15.º P.I.].
15. Em processo judicial, foi fixado e homologado por sentença nos autos identificados no anterior artigo 8.º da petição inicial, que a ora Autora teria de pagar a GG, em consequência do sinistro que vitimou aquele AA, e por força da existência da atrás identificada apólice de acidentes de trabalho [16.º P.I.]:
a. O capital de remição calculado da pensão anual e vitalícia de Euros 1.363,76, com início em 15/08/2007, tendo por base a retribuição mensal de Euros 523,50 x 14 meses + Euros 85,00 x 11 meses (subsídio de alimentação) + Euros 50,00 x 12 meses (suplemento de fim de semana) + Euros 227,72 x 1 (média anual de subsídio de caixa);
b. A quantia de Euros 3.224,00 a título de despesas de funeral com transladação, que havia suportado aquele montante.
16. Tendo a ora Autora procedido à entrega, a 19/01/2009, no respeito pelo disposto na Lei de Acidentes de Trabalho, do capital de remição, no montante de Euros 21.666,06 [17.º P.I.].
17. Para além do montante de Euros 21.666,06, entregue a título de capital de remição, a ora Autora pagou ainda por conta do sinistro que vitimou aquele AA [18.º P.I.]:
a) No dia 19/02/2009, a quantia de Euros 3.224,00, a título de despesas de funeral;
b) No dia 10/02/2009, a quantia de Euros 384,00, a título de despesas judiciais;
c) No dia 28/11/2007, a quantia de Euros 181,50, a título de despesas administrativas, com averiguação realizada.
18. No processo de acidente de trabalho, identificado no anterior artigo 9.º da petição inicial, foi reconhecido que o sinistrado BB, foi vítima de um acidente no dia 00 de ... de 2007, em ..., ... [20.º P.I.].
19. Quando aquele BB era transportado no atrás referido veículo seguro na Ré, de matrícula 00-00-GI, e se deslocava no âmbito da actividade de trabalho dependente, que exercia como ..., para a segurada da ora Autora [21.º P.I.].
20. O que fazia sob a autoridade e direcção de Churrasqueiras Rei dos Frangos, Lda., que tinha a responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para a Autora (ex- Real Seguros, S.A.) através da apólice nº. 00/000000, e auferia a remuneração mensal de Euros 583,00 x 14 meses + Euros 85,00 x 11 meses (subsídio de alimentação) + Euros 50,00 x 11 meses (suplemento de fim de semana) + Euros 36,05 x 11 (subsídio de caixa) [22.º P.I.].
21. Tendo sido reconhecido que, em consequência directa e necessária deste acidente o sinistrado sofreu as lesões descritas no relatório de autópsia, efectuado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, que foram causa directa da sua morte [23.º P.I.].
22. Foi fixado e homologado por sentença nos autos identificados no artigo 9.º da petição inicial, que a ora Autora teria de pagar a EE e a DD, enquanto herdeiros, por força do sinistro que vitimou aquele BB [24.º P.I.].:
a. O capital de remição calculado da pensão anual e vitalícia de Euros 1.506,53, com início em 15/08/2007, tendo por base a retribuição mensal de Euros 583,00 x 14 meses + Euros 85,00 x 1 I meses (subsídio de alimentação) + Euros 50,00 x 11 meses (suplemento de fim de semana) + Euros 36,05 x II (subsídio de caixa);
b. A quantia de Euros 3.224,00 a título de despesas de funeral com transladação, que havia suportado aquele montante;
c. A quantia de Euros 15,00 a título de despesas de transportes, despendidas em deslocações para o Tribunal.
23. Pelo que a Autora procedeu à entrega, no respeito pelo disposto na Lei de Acidentes de Trabalho, do capital de remição (pensões anuais e vitalícias), no montante de Euros 22.447,30 relativamente a DD e Euros 23.105,65 a EE, em 08/06/2009 [25.º P.I.].
24. E ainda pagou a EE e DD, por conta do mesmo sinistro [26.º P.I.]:
- No dia 08/06/2009, Euros 3.224,00, a título de despesas de funeral;
- No dia 08/06/2009, Euros 15,00, a título de despesas de transporte;
- No dia 08/06/2009, Euros 714,00, a título de despesas judiciais.
25. Correu seus termos, com o n°. 722/08.8TTLRA, junto do 1°. Juízo, do Tribunal do Trabalho de ..., o processo de acidente de trabalho, relativamente ao evento em que CC foi vítima de um acidente no dia 00 de ... de 2007, em ..., ... [28.º P.I.].
26. Quando aquela CC era transportada no veículo seguro na Ré, de matrícula 0000-GI, e se deslocava no âmbito da actividade de trabalho dependente, que prestava para a segurada da Autora [29.º P.I.].
27. Concretamente, trabalhava como ..., sob a autoridade e direcção de Churrasqueiras Rei dos Frangos, Lda., que tinha a responsabilidade transferida para a ex-Real Seguros, S.A. através da apólice n", 00/000000, e auferia a remuneração mensal de Euros 689,00 x 14 meses + Euros 85,00 x 11 meses (subsídio de alimentação) + Euros 50,00 x 12 meses (suplemento de fim de semana) + Euros 36,05 x 11 (subsídio de caixa), o que se traduz num salário anual de Euros 11.577,55 [30.º P.I.].
28. Foi reconhecido que, em consequência directa e necessária deste acidente a sinistrada, CC, sofreu lesões graves que lhe determinaram períodos de incapacidade [31.º P.I.].
29. Tendo, pelo acompanhamento clínico realizado àquela CC, nos serviços clínicos da ora Autora, sido possível fixar [32.º P.I.]:
a. Incapacidade Temporária Absoluta, de 15 de Agosto de 2007 a 26 de Outubro de 2008;
b. Incapacidade Temporária Parcial, de 20%, de 27 de Outubro de 2008 a 28 de Outubro de 2008;
c. Incapacidade Temporária Absoluta, de 29 de Outubro de 2008 a 18 de Junho de 2009;
d. Alta Clínica em 18 de Junho de 2009, com a atribuição de Incapacidade Permanente Parcial de 41,50 %.
30. Foram pagos àquela CC, por conta dos períodos de incapacidade de que padeceu em consequência do evento dos autos, o montante total de €17.147,25, desde a data do acidente à data da alta (14/08/2007 a 18/06/2009) [33.º P.I.].
31. A Autora pagou ainda àquela CC, por conta do sinistro objecto dos presentes autos as seguintes despesas [34.º P.I.]:
- No dia 31/12/2007, do Hospital de ..., a quantia de €3.757,64 (doc. 47);
- No dia 20/12/2007, do Centro de Saúde de ..., a quantia de €2,10 (doc. 48);
- No dia 14/01/2008, do Hospital de ..., a quantia de €122,85 (doc. 48);
- No dia 19/01/2008, da Unimed, a quantia de €310,00 (doc. 49);
- No dia 27/03/2008, da ..., Lda., a quantia de €9,54 (doc. 50);
- No dia 01/03/2008, da Unimed, a quantia de €3.562,89 (doc. 51);
- No dia 13/05/2008, dos Hospitais da …, EPE, a quantia de €30.201,02 (doc. 52);
- No dia 17/11/2009, da Unimed, a quantia de €4.195,22 (doc. 54);- No dia 24/08/2011, despesas judiciais, a quantia de €800,70 (doc. 61).
32. Em 30 de Setembro de 2010, foi proferida sentença no processo que correu termos junto do 1.º Juízo do Tribunal do Trabalho de ..., melhor identificado no anterior artigo 28.º da petição inicial, nos termos do qual [35.º P.I.]:
a) foi fixada a desvalorização funcional da sinistrada CC, de 0,4280 de IPP, desde 08.10.2009;
b) condenada a ora Autora a pagar à sinistrada a pensão anual e vitalícia de Euros 3.468,63, reportada a 08.10.2009, a pagar em 12 prestações mensais, no valor de 1/14 da pensão anual, até ao 3°. dia de cada mês, acrescida de subsídio de férias e de natal, também no valor de 1/14 da pensão anual, a pagar, respectivamente, em Maio e Novembro de cada ano;
c) condenada a ora Autora a pagar à sinistrada a quantia de Euros 40,00, a título de despesas efectuadas com deslocações obrigatórias;
d) condenada a ora Autora a pagar à sinistrada indemnização respeitante ao diferencial entre o montante já pago e o devido a título de IT's, no valor de Euros 263,45;
e) condenada a ora Autora a pagar juros de mora à taxa legal sobre as prestações já vencidas a calcular desde a data do seu vencimento e até integral pagamento;
f) condenada a ora Autora no pagamento das custas processuais, nos termos do artigo 446°., do Código de Processo Civil.
33. Conforme decorre da sentença proferida no atrás identificado processo judicial, a ora Autora pagou já àquela CC, por conta da pensão anual e vitalícia a que foi condenada, com efeitos reportados a 19 de Junho de 2009, data da alta, até 19 de Maio de 2016, a quantia total de Euros 25.243,38 (documentos 73 a 91) [36.º P.I.].
34. Encontrando-se ainda constituída uma provisão matemática, actualizável em razão dos pagamentos, na sequência do acidente de trabalho dos presentes autos, destinada a garantir as prestações futuras previstas na sentença judicial que, em 19 de Maio de 2016, era de Euros 52.140,45 [37.º P.I.].
35. A responsabilidade do condutor do GI foi apurada em sentença transitada em julgado, no processo que, com o n.º 1638/08.3TBACB, correu seus termos junto da Comarca de ... - ... - Instância Central - Secção Cível - 11 (ex-Tribunal Judicial de ..., 2°. Juízo) [43.º P.I.].
36. Com fundamento no acidente de viação ocorrido em 00 de ... de 2007, pelas 02:30 horas, na Estrada Nacional …. (EN …) ao km 00,0, em ..., concelho de ..., que foi também de acidente de trabalho, que provocaram as lesões corporais atrás enunciadas e produzidas aos ocupantes atrás identificados [44.º P.I.].
37. Foi intentada acção judicial pela lesada, CC, e pelos herdeiros dos falecidos AA e BB, junto do Tribunal Judicial de ..., contra as seguradoras para quem se encontrava transferida a responsabilidade civil pela circulação dos veículos intervenientes no sinistro dos autos, de matrículas 00-00-GI e 00 -CQ-00, respectivamente, a Ré, Mapfre - Seguros Gerais, S.A., e a Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A. [45.º P.I.].
38. Onde aqueles reclamaram o pagamento das indemnizações devidas pelos danos materiais e corporais sofridos pelas vítimas [46.º P.I.].
39. Nesse processo, aquele Tribunal veio a considerar como único e exclusivo responsável pelo acidente de viação dos autos o condutor do veículo de matrícula 00-00-GI, HH, condutor do veículo seguro na Ré, Mapfre, S.A. [47.º P.I.].
40. Sendo que aquela decisão foi objecto de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, apresentado pela Ré Mapfre, S.A. [48.º P.I.].
41. Tendo aquele Tribunal da Relação de Coimbra confirmado a sentença de 1.ª Instância, no sentido de imputar a responsabilidade pela produção do sinistro dos autos, de forma exclusiva, ao condutor do veio GI, seguro na Ré Mapfre, S.A. [49.º P.I.].
42. A Ré Mapfre, S.A., apesar da sentença de lª. Instância ter sido confirmada no Tribunal da Relação de Coimbra, esta veio a interpor ainda recurso para o Supremo Tribunal de Justiça [50.º P.I.].
43. Mas tal recurso veio a ser objecto de decisão singular em 5 de Maio de 2016, em razão da qual se confirmou a sentença de 1.ª Instância e a decisão do Tribunal da Relação de Coimbra [51.º P.I.].
44. Pelo que, em 28 de Março de 2016, a Autora avançou e fez entrar em Tribunal uma notificação judicial avulsa, nos termos da qual era requerida a notificação da Ré, Mapfre, do propósito da ora Autora de reclamar desta os direitos, enquanto seguradora de acidentes de trabalho, que lhe assistiam face aos pagamentos efectuados no âmbito da apólice de acidente de trabalho aos lesados, ocupantes do veículo GI, seguro na ora Ré, à luz da responsabilidade do condutor desta viatura na produção do evento dos autos [53.º P.I.].
45. Tendo, em 26 de Abril de 2016, sido concretizada tal Notificação Judicial Avulsa [54.º P.I.].
46. No atrás identificado processo nº, 1638/08.3TBACB, que correu seus termos junto da Comarca de ... - ... - Instância Central - Secção Cível - J1 (ex-Tribunal Judicial de ..., 2°. Juízo), foram apreciadas as circunstâncias em que aquele acidente de viação ocorreu [55.º P.I.].
47. E, a final, o Tribunal veio a concluir pela responsabilidade integral do condutor do veículo 0000-00, seguro na Ré Mapfre [56.º P.I.].
48. No dia 00 de ... de 2007, pelas 02:30 horas, no IC0, Km…, ..., ..., Concelho de ..., Distrito de ..., ocorreu um embate entre os veículos ligeiro de passageiros com matrícula 00-00-00, marca Fiat, modelo Punto 55, e o pesado de mercadorias com matrícula 00-CQ-00, marca Scania, modelo R420A, que fazia conjunto com a galera de matrícula L-..., doravante designados respectivamente por GI e CQ [57.º P.I.].
49. Sendo o veículo pesado CQ, conduzido por II, tinha a responsabilidade civil decorrente da circulação transferida para a Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A., através da apólice n.º 0000/000000 [58.º P.I.].
50. E o veículo ligeiro GI, conduzido por HH, encontrava-se à data do acidente com a responsabilidade civil relativa a terceiros, decorrente da circulação daquele, transferida para a Ré Mapfre - Seguros Gerais, SA, através da apólice n.º 0000000000000/0 [59.º P.I.].
51. O veículo pesado CQ seguia no sentido de marcha …/..., e o veículo 01 no sentido de marcha inverso [60.º P.I.].
52. Sendo que o veículo pesado CQ circulava a velocidade não apurada, mas não superior a 74,6 km/hora, com as luzes "médios" acesas, dentro da sua hemi-faixa de rodagem, com os seus rodados esquerdos rolando a 0,80 metros do traço descontínuo [61.º P.I.].
53. Quando o condutor do veículo GI, sem qualquer razão aparente, invadiu a faixa onde circulava o veículo CQ [62.º P.I.].
54. Sendo que o condutor do CQ, numa manobra de reacção, ao aperceber-se do veículo GI à sua frente, travou bruscamente [63.º P.I.].
55. E, em simultâneo com a referida travagem brusca, o condutor do veículo CQ foi guinando o mesmo para o seu lado esquerdo, a fim de evitar a colisão [64.º P.I.].
56. Não obstante a manobra do condutor do veículo m, o veículo GI foi embater neste, tendo a colisão ocorrido entre a frente do GI, com mais incidência sobre o seu lado esquerdo e a frente, à direita da placa de alvará do CQ [65.º P.I.].
57. Sendo certo que, com a violência do embate o CQ passou por cima da parte frontal (do motor) do GI [66.º P.I.].
58. Tendo o veículo CQ, ficado imobilizado na berma do lado direito, atento o sentido de marcha em que seguia (Lisboa/...) [67.º P.I.].
59. Devido à velocidade e violência de impacto, o ligeiro de passageiros GI foi projectado ao longo de 14 metros, com uma rotação à esquerda, até se imobilizar junto à berma, à distância de 12 metros do eixo da via, perpendicularmente em relação ao CQ [68.º P.I.].
60. No pavimento ficaram marcadas marcas dos pneumáticos do veículo pesado CQ, resultantes da travagem [69.º P.I.].
61. Tendo igualmente ficado no local vestígios de líquido derramado pelo veículo ligeiro GI, que ocupavam 0,90 metros da hemi-faixa direita, onde circulava o veículo CQ, e uma parte não apurada da hemi-faixa esquerda donde provinha o GI, mas muito inferior à direita [70.º P.I.].
62. O embate frontal ocorreu na faixa de rodagem onde circulava o veículo CQ (…/...) [71.º P.I.].
63. A cerca de 0,90 metros do eixo da via [72.º P.I.].
64. Assim se concluindo que a responsabilidade pela produção do acidente de viação objecto dos presentes autos recai sobre o condutor do veículo ligeiro GI, HH [73.º P.I.].
65. A Autora (ex-Real Seguros, S.A.) celebrou o contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho com a sua segurada, Churrasqueiras Rei dos Frangos, Lda., nos termos das Condições Gerais e Particulares [78.º P.I.].
Não se demonstraram os seguintes factos:
a) Que a Autora pagou ainda Euros 12,75, a título de despesas diversas [18.º, P.I.].
b) Que a Autora pagou outras despesas judiciais para além das que constam dos factos provados e que pagou Euros 3,05, a título de despesas diversas [26.º, P.I.].
c) Que a ora Autora pagou ainda àquela CC, por conta do sinistro objecto dos presentes autos [34.º P.I.]:
Euros 1.039,70, a título de despesas de transportes;
Euros 703,82, a título de despesas com aquisição de medicamentos;
Euros 100,00, com a realização de juntas médicas;
Euros 2.091,00, a título de despesas judiciais;
Euros 2.304,24, com despesas diversas;
Que despendeu outras quantias.
IV.
No anterior Acórdão do Supremo de 03.07.2018, proferido neste processo, por este mesmo Colectivo, concluiu-se que o prazo de prescrição do direito de reembolso exercido pela autora era de três anos, a contar do cumprimento, por aplicação analógica do art. 498º, nº 2, do CC.
De seguida, tomou-se posição sobre a questão, agora colocada neste recurso, do início da contagem desse prazo de três anos nas situações em que, para ressarcir os danos resultantes de um mesmo acidente de trabalho, ocorre uma sucessão de actos de pagamento efectuados pela seguradora.
Sobre esta questão, lê-se na fundamentação do referido Acórdão:
"Concorda-se que, nestes casos de fraccionamento do pagamento da indemnização, se deva atender, por regra, ao último pagamento efectuado.
Este critério foi, aliás, já expressamente consagrado no citado art. 54º, nº 6, do DL 291/2007, em relação ao Fundo de Garantia Automóvel, havendo quem defenda que o mesmo deve ser estendido a situações semelhantes (Garção Soares e Maria José Rangel de Mesquita, Regime do Sistema de Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, Anotado e Comentado, 239; Acórdão do STJ de 21.09.2017 (P. 900/15), acessível em www.dgsi.pt, como todos os adiante citados sem outra menção).
Admite-se, contudo, que, se ocorrer uma objectiva autonomização das indemnizações, relativas a danos claramente diferenciados, se possa temperar a referida regra, tendo em conta alguns inconvenientes que lhe têm sido associados. (…)
Esta questão do funcionamento da prescrição, no caso de fraccionamento do pagamento da indemnização, foi doutamente apreciada no Acórdão do STJ de 07.04.2011, aí se chegando a um critério que tem merecido significativa adesão da jurisprudência do Supremo (Cfr. Acórdãos de 19.05.2016 (P. 645/12), de 07.02.2017 (P. 3115/13) e de 19.01.2018 (P. 1195/08).
Ponderando cada uma das aludidas soluções, escreveu-se nesse Acórdão:
«Não sendo a letra da lei - ao reportar-se apenas ao «cumprimento», como momento inicial do curso da prescrição – suficiente para resolver, em termos cabais, esta questão jurídica, será indispensável proceder a um balanceamento ou ponderação dos interesses envolvidos: assim, importa reconhecer que a opção pela tese que, de um ponto de vista parcelar e atomístico, autonomiza, para efeitos de prescrição, cada um dos pagamentos parcelares efectuados ao longo do tempo pela seguradora acaba por reportar o funcionamento da prescrição, não propriamente à «obrigação de indemnizar», tal como está prevista e regulada na lei civil (arts. 562º e segs.) mas a cada recibo ou factura apresentada pela seguradora no âmbito da acção de regresso, conduzindo a um – dificilmente compreensível – desdobramento, pulverização e proliferação das acções de regresso, no caso de pagamentos parcelares faseados ao longo de períodos temporais significativamente alongados.
Pelo contrário, a opção pela tese oposta – conduzindo a que apenas se inicie a prescrição do direito de regresso quando tudo estiver pago ao lesado - poderá consentir num excessivo retardamento no exercício da acção de regresso pela seguradora, manifestamente inconveniente para os interesses do demandado, que poderá ver-se obrigado a discutir as causas do acidente, de modo a apurar se o estado de alcoolemia verificado contribuiu ou não para o sinistro, muito tempo para além do prazo-regra dos 3 anos a que alude o nº1 do art. 498º do CC (…)».
Por outro lado, acrescenta-se, «a ideia base da unidade da «obrigação de indemnizar» poderá ser temperada pela possível autonomização das indemnizações que correspondam ao ressarcimento de tipos de danos normativamente diferenciados, consoante esteja em causa, nomeadamente:
- a indemnização de danos patrimoniais e não patrimoniais, sendo estes ressarcidos fundamentalmente através de um juízo de equidade, e não da aplicação da referida teoria da diferença;
- a indemnização de danos que correspondam à lesão de bens ou direitos claramente diferenciados ou cindíveis de um ponto de vista normativo, desde logo os que correspondam à lesão da integridade física ou de bens da personalidade e os que decorram da lesão do direito de propriedade sobre coisas.
E tal autonomização ou diferenciação, operada funcionalmente em razão da natureza dos bens lesados, poderá tornar razoável uma consequencial autonomização do início dos prazos de prescrição do direito de regresso: assim, por exemplo, não vemos razão bastante para que, - tendo a seguradora assumido inteiramente perante o lesado o ressarcimento de todos os danos decorrentes da destruição e privação do uso da viatura sinistrada – possa diferir o exercício do direito de regresso quanto a essa parcela autonomizável e integralmente satisfeita da indemnização apenas pela circunstância de, tendo o acidente provocado também lesões físicas determinantes de graves sequelas, ainda não inteiramente avaliadas e consolidadas, estar pendente o apuramento e a liquidação da indemnização pelos danos exclusivamente ligados à violação de bens da personalidade do lesado».
Concluiu-se, então, no aludido Acórdão:
«Em suma: se não parece aceitável a autonomização do início de prazos prescricionais, aplicáveis ao direito de regresso da seguradora, em função de circunstâncias puramente aleatórias, ligadas apenas ao momento em que foi adiantada determinada verba pela seguradora, já poderá ser justificável tal autonomização quando ela tenha subjacente um critério funcional, ligado à natureza da indemnização e ao tipo de bens jurídicos lesados, com o consequente ónus de a seguradora exercitar o direito de regresso referentemente a cada núcleo indemnizatório autónomo e juridicamente diferenciado, de modo a não diferir excessivamente o contraditório com o demandado, relativamente à causalidade e dinâmica do acidente, em função da pendência do apuramento e liquidação de outros núcleos indemnizatórios, claramente cindíveis do primeiro.
E, nesta perspectiva, incumbirá ao R. que suscita a prescrição o ónus de alegar e demonstrar que o conjunto de recibos ou facturas pagas pela seguradora até ao limite do período temporal de 3 anos que precederam a citação na acção de regresso corresponderam a um núcleo indemnizatório, autónomo e bem diferenciado, relativamente aos restantes valores indemnizatórios peticionados na causa – não lhe bastando, consequentemente, alegar, como fundamento da prescrição que invoca, a data constante desses documentos.
Ora, no caso dos autos, para além de tal alegação não ter sido feita (limitando-se, na contestação, o R. a invocar que uma série de facturas, juntas aos autos pela A., datam – e foram pagas – para além do referido período temporal), é manifesto, pela análise dos documentos, que está em causa apenas o ressarcimento antecipado de danos ligados às lesões físicas sofridas pelo sinistrado – reparação dos períodos de incapacidade temporária, despesas médicas e de tratamentos clínicos, custo das deslocações para o estabelecimento em que tais tratamentos se verificavam – pelo que obviamente tais pagamentos parcelares são insusceptíveis de integrar um núcleo indemnizatório, autónomo e juridicamente diferenciado, relativamente ao qual pudesse iniciar-se e correr, de modo também autónomo, um prazo de prescrição do direito de regresso da seguradora/A.».
Adere-se a este entendimento, reiterando-se que a autonomização de núcleos da indemnização, para este efeito de contagem do prazo de prescrição, será admissível apenas em relação a danos autónomos e consolidados, de natureza claramente diferenciada e inteiramente ressarcidos, como é evidenciado pelos exemplos utilizados nos excertos reproduzidos do Acórdão.
Essa autonomização não pode, como por vezes se vê, cindir danos da mesma natureza, relativos a um mesmo lesado, em função do que parecer razoável ao julgador, sob pena de cairmos numa situação de inaceitável incerteza, absolutamente contrária a uma das razões – a certeza e segurança jurídicas – que está na base da prescrição.
Por outro lado, no que respeita ao problema do ónus da prova, importa atender ao princípio da aquisição processual, consagrado no art. 413º do CPC: o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las.
Preceito que, como é sabido, não vale apenas para as provas, mas também para as alegações das partes (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil (1976), 383).
Assim, adquiridos os factos para o processo, eles devem ser objecto da valoração jurídica que for adequada (cfr. art. 5º, nº 3, do CPC), aí se incluindo, parece-nos, para a questão que aqui se discute, a eventual autonomização de indemnizações parcelares.
No caso dos autos, verifica-se que, no tocante à questão da prescrição, foi considerada provada matéria de facto extremamente exígua, que seria suficiente para a decisão, tendo em conta o critério adoptado no acórdão recorrido (alargamento do prazo de prescrição para 10 anos), mas que é claramente insuficiente se se acolher, como acolhemos, o entendimento de que é aplicável o prazo de três anos, a contar do último pagamento, com a ressalva apontada, de poderem ser autonomizadas parcelas da indemnização global (Desde logo, em função de cada lesado, como se entendeu nos Acórdãos do STJ de 28.10.2004 (P. 04B3385), de 04.11.2010 (P. 2564/08), de 07.04.2011 (P. 329/06) e de 19.05.2016 (P. 645/12)).
Repare-se que, em rigor, estando apenas provado que a ré foi notificada judicialmente da pretensão da autora em Março de 2016 e que os pagamentos foram efectuados desde 2008 a 2013, não poderia concluir-se pelo decurso do prazo de prescrição, mesmo adoptando o critério singelo do último pagamento, por não estar reconhecido como provado que os pagamentos foram efectuados em data anterior a Março de 2013.
Verifica-se, todavia, que a autora alegou matéria de facto pertinente, tendo identificado, concretizado e documentado cada um dos pagamentos efectuados a cada lesado, alegação que foi, em grande medida, impugnada. Essa matéria de facto e respectiva documentação não foram, por isso, consideradas na decisão da 1ª instância (proferida no saneador) e, consequentemente, no acórdão recorrido.
O processo deverá, pois, prosseguir para discussão e prova da factualidade pertinente alegada e será em função desse julgamento que se poderá ponderar juridicamente e concluir sobre a eventual autonomia de indemnizações parcelares satisfeitas pela autora, ficando a conhecer-se também a data do último pagamento destas.
Impõe-se, por isso, o reenvio do processo para a Relação, para que se proceda à ampliação da decisão de facto, nos termos referidos, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito – art. 682º, nº 3, do CPC".
Reenviado o processo à 1ª instância e após realização do julgamento, foi proferida sentença, que a Relação confirmou integralmente, afirmando-se na respectiva fundamentação o seguinte:
"Nesta sequência, resta assim subsumir os factos provados ao direito aplicável e interpretado em conformidade com o mencionado Acórdão nas questões aí apreciadas e decididas.
A este propósito, salienta-se a seguinte factualidade:
- ocorrência do acidente (14/08/2007),
- notificação judicial avulsa da Ré (Março de 2016),
- citação da Ré (08/08/2016).
E quanto aos pagamentos efectuados pela Autora aos lesados:
Aos herdeiros do sinistrado AA a Autora pagou diversas quantias a título de indemnização até 19/02/2009.
Aos herdeiros do sinistrado BB a Autora pagou diversas quantias a título de indemnização até 08/06/2009.
À sinistrada CC a Autora pagou as seguintes quantias a título de indemnização:
- Por força do acidente dos autos, CC sofreu lesões corporais, sendo que a ora Autora suportou despesas com o acompanhamento clínico, médico e de recuperação, para além de estar também a pagar mensalmente uma pensão anual e vitalícia, de Euros 3.468,63, reportada a 8 de Outubro de 2009 [11.º P.I.].
- Foram pagos àquela CC, por conta dos períodos de incapacidade de que padeceu em consequência do evento dos autos, o montante total de €17.147,25, desde a data do acidente à data da alta (14/08/2007 a 18/06/2009) [33.º P.I.].
- A Autora pagou ainda àquela CC, por conta do sinistro objecto dos presentes autos as seguintes despesas [34.º P.I.]:
- No dia 31/12/2007, do Hospital de ..., a quantia de €3.757,64 (doc. 47);
- No dia 20/12/2007, do Centro de Saúde de ..., a quantia de €2,10 (doc. 48);
- No dia 14/01/2008, do Hospital de ..., a quantia de €122,85 (doc. 48);
- No dia 19/01/2008, da Unimed, a quantia de €310,00 (doc. 49);
- No dia 27/03/2008, da ..., Lda., a quantia de €9,54 (doc. 50);
- No dia 01/03/2008, da Unimed, a quantia de €3.562,89 (doc. 51);
- No dia 13/05/2008, dos Hospitais da …, EPE, a quantia de €30.201,02 (doc. 52);
- No dia 17/11/2009, da Unimed, a quantia de €4.195,22 (doc. 54);
- No dia 24/08/2011, despesas judiciais, a quantia de €800,70 (doc. 61).
- Conforme decorre da sentença proferida no atrás identificado processo judicial, a ora Autora pagou já àquela CC, por conta da pensão anual e vitalícia a que foi condenada, com efeitos reportados a 19 de Junho de 2009, data da alta, até 19 de Maio de 2016, a quantia total de Euros 25.243,38 (documentos 73 a 91) [36.º P.I.].
- Encontrando-se ainda constituída uma provisão matemática, actualizável em razão dos pagamentos, na sequência do acidente de trabalho dos presentes autos, destinada a garantir as prestações futuras previstas na sentença judicial que, em 19 de Maio de 2016, era de Euros 52.140,45 [37.º P.I.].
Não ficou provado nem o pagamento nem as datas das demais indemnizações alegadas pela Autora.
Deste modo, na sequência do decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de justiça (em apenso), nessa perspectiva, parece-nos ser possível autonomizar as indemnizações atribuídas a três grupos de lesados:
1- Os herdeiros do sinistrado AA.
2- Os herdeiros do sinistrado BB.
3- A sinistrada CC.
Assim, considerando que as indemnizações pagas aos dois primeiros grupos de lesados ocorreram até 19/02/2009 e até 08/06/2009, respectivamente, é patente que o prazo de prescrição de três anos já decorreu em 20/12/2012 e em 09/06/2012, respectivamente, ou seja, ainda antes da notificação judicial avulsa da Ré (Março de 2016) ou da citação da Ré (08/08/2016).
Por sua vez, ao abrigo do citado art. 308.º, do Código Civil e nos mesmos termos do já mencionado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido nos presentes autos (em apenso), é possível cindir em dois grupos autónomos as indemnizações pagas à lesada CC:
a) Por um lado, a indemnização paga pelos períodos de incapacidade à lesada CC ocorreu até 18/06/2009 e as despesas hospitalares, judiciais e outras foram pagas desde 20/12/2007 até 24/08/2011, por isso, o prazo de prescrição de três anos conta-se desde este último pagamento e por isso já decorreu no dia 25/08/2014, ou seja, ainda antes da notificação judicial avulsa da Ré (Março de 2016) ou da citação da Ré (08/08/2016);
b) Por outro lado, ficou provado que a Autora pagou àquela CC, por conta da pensão anual e vitalícia a que foi condenada, com efeitos reportados a 19 de Junho de 2009, data da alta, até 19 de Maio de 2016, a quantia total de Euros 25.243,38, encontrando-se ainda constituída uma provisão matemática, actualizável em razão dos pagamentos, na sequência do acidente de trabalho dos presentes autos, destinada a garantir as prestações futuras previstas na sentença judicial que, em 19 de Maio de 2016, era de Euros 52.140,45.
Assim, esta configura uma indemnização paga a título de renda periódica (pensão anual e vitalícia), por isso, o prazo de prescrição conta-se, não desde a data final (19/05/2016) mas antes desde a data inicial (19/06/2009), para efeitos do disposto no art. 308.º, do Código Civil, o que significa de igual modo que o prazo de prescrição de três anos já decorreu em 20/06/2012, ou seja, ainda antes da antes da notificação judicial avulsa da Ré (Março de 2016) ou da citação da Ré (08/08/2016).
Em síntese:
Considerando ser aplicável o prazo de prescrição de três anos (e não o prazo de 10 anos), de acordo com os diferentes lesados e as diferentes espécies de indemnização, o direito de regresso da Autora sobre a Ré relativamente a todas as quantias mostra-se prescrito".
Com ressalva da conclusão do penúltimo parágrafo e da outra referência ao regime do art. 308º (parece que se terá querido dizer 307º) do CC, subscreve-se esta fundamentação, que concretiza bem o critério exposto no Acórdão do STJ, acima reproduzido.
Critério que continuou a ser o adoptado em ulterior jurisprudência do Supremo (Cfr. Acórdãos de 02.04.2019 (P. 2142/16) e de 04.07.2019 (P. 1977/15)).
Assim, desde logo, devem ser autonomizados, para efeitos de contagem do prazo de prescrição, as indemnizações atribuídas a cada grupo de lesados. Como já se afirmou, "no âmbito da obrigação de indemnização de uma pluralidade de lesados no quadro da responsabilidade civil a situação é de pluralidade de obrigações do sujeito passivo no confronto com cada um dos sujeitos do lado activo" (Acórdão do STJ de 28.10.2004, acima citado; no mesmo sentido, os demais Acórdãos supra referidos).
No caso, as indemnizações atribuídas aos herdeiros do sinistrado AA e do sinistrado BB foram pagas até 19.02.2009 e 08.06.2009, respectivamente.
Daí decorre, portanto, que, à data em que foi efectuada a notificação judicial avulsa (26.04.2016), o correspondente direito de reembolso da autora já se encontrava prescrito.
Relativamente à sinistrada CC:
Concorda-se com o critério seguido na sentença quanto à autonomização de dois grupos de prestações indemnizatórias efectuadas pela autora (Cfr. a concretização de critério idêntico efectuada no citado Acórdão do STJ de 19.05.2016).
Por um lado, as que respeitam às indemnizações pelos períodos de incapacidade temporária e pelas despesas com assistência médica suportadas pela sinistrada nesse período (a alta ocorreu em 18.06.2009).
Surge, ainda aqui, uma outra prestação, desgarrada temporalmente das demais (24.08.2011), respeitante a despesas de outra natureza (despesas judiciais).
Por outro lado, as prestações pagas a título de pensão anual e vitalícia em que a autora foi condenada e que esta suportou desde 19.96.2009 até 19.05.2016, no montante total de € 25.243.38.
Acresce a essa indemnização a reserva matemática que a autora constituiu para garantia das prestações futuras, no montante de € 52.140,45.
Na verdade, pensa-se que o primeiro grupo integra prestações indemnizatórias diferenciadas das do segundo grupo, tendo aquelas sido, desde logo, autónoma e integralmente satisfeitas e estando funcionalmente relacionadas entre si, com referência ao período de recuperação física da sinistrada, mais conexionada com o princípio da restauração natural (Cfr. P. Romano Martinez, Direito do Trabalho, 7ª ed., 866).
Diferente, apenas com uma relação indirecta com as demais, é o caso das "despesas judiciais". Porém, a autonomia desta indemnização parcelar é indiferente para a nossa questão: mesmo que associada às demais despesas, apenas faria diferir o início do prazo de prescrição, quanto a todas, para 24.08.2011.
Assim, no caso desse primeiro grupo de prestações, o prazo de prescrição de três anos completou-se bem antes da data da notificação judicial avulsa requerida pela autora.
No que respeita às prestações pagas a título de pensão anual e vitalícia a situação parece-nos diferente, não se vendo razão para não se adoptar o entendimento reiterado da jurisprudência do Supremo, que é o de atender ao último pagamento.
Foi este também o critério que se enunciou no anterior Acórdão do STJ, proferido nestes autos, ao afirmar-se ser aplicável o prazo de três anos, a contar do último pagamento, com ressalva de poderem ser autonomizados, para esse efeito, parcelas da indemnização global.
É certo que, tratando-se de uma pensão anual e vitalícia, este critério pode conduzir, em abstracto, a um excessivo retardamento do exercício do direito de reembolso. Na prática, porém, pode bem não ser assim, uma vez que, podendo esse direito abranger outras prestações autónomas, o titular correria o risco de, quanto a estas, se verificar a prescrição, tendo, portanto, interesse em accionar o responsável com a brevidade necessária; nem se vê que o titular tenha vantagem em protelar em demasia o exercício do reembolso do que pagou.
Importa ainda referir que o prazo aplicável, diferentemente do que se entendeu na sentença (e no acórdão recorrido que a confirmou, embora sem referir concretamente a questão), não está sujeito ao regime do art. 307º do CC, não parecendo que esta norma tenha sido aí interpretada da forma mais correcta.
Com efeito, neste regime, o prazo de prescrição do direito unitário do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga, sendo reconhecido que o prazo de prescrição desse direito unitário é o ordinário de 20 anos (art. 309º do CC); porém, cada prestação estará sujeita ao prazo de prescrição de cinco anos, referido no art. 310º (Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed., 278; Ana Filipa Antunes, Prescrição e Caducidade, 2ª ed., 106; Júlio Gomes, Comentário ao Código Civil, Parte geral, 753).
Se bem entendemos a sentença, o critério aí seguido conduziria, aliás, a um resultado que parece inconciliável com o regime da sub-rogação. É que esta só abrange as prestações vencidas que hajam sido efectivamente pagas (Assento do STJ de 09.11.77).
Ora, a considerar-se que deve atender-se à data inicial do pagamento da pensão (19.06.2009) como a do início da contagem do prazo de prescrição, daí decorreria que as prestações pagas posteriormente ao período de três anos prescreveriam antes mesmo de o direito de reembolso poder ser exercitado (uma vez que só poderia sê-lo depois do pagamento).
No nosso caso é, pois, aplicável o prazo específico do art. 498º, nº 2, prazo este que corre desde o pagamento, entendendo-se que deve ser considerado o último pagamento efectuado.
Assim, tendo a autora pagado as prestações da pensão anual e vitalícia até 19.05.2016, no montante de € 25.243,38, conclui-se que o direito de reembolso desta quantia não se encontra prescrito, mesmo considerando apenas a data da citação da ré (08.08.2016).
Tem, por isso, direito a ser reembolsada pela ré desse montante (art. 31º da Lei 100/97, de 13/9, em vigor à data do acidente).
Por fim, no que respeita à reserva matemática, entende-se que a mesma não releva para a questão aqui discutida.
Essa reserva ou provisão destina-se a garantir o pagamento da pensão fixada à sinistrada, não constituindo um pagamento; ora, não ocorrendo este pagamento, não se pode verificar a sub-rogação.
Com efeito, como há pouco se referiu, para haver sub-rogação não basta que o terceiro garanta o cumprimento que se propõe efectuar. A sub-rogação só funciona em relação ao "terceiro que cumpre"; não em relação àquele que (apenas) haja dado garantia do seu próprio cumprimento. "As reservas matemáticas apenas caucionam dívidas, não podendo ser havidas como pagamento delas" (Vaz Serra, RLJ 98-368; no mesmo sentido, os Acórdãos do STJ de 10.12.87, BMJ 372-412 e de 20.05.97 (P. 96A899 - sumário) e, mais recentemente, os Acórdãos da Relação de Coimbra de 03.07.2007 (P. 33/04) e da Relação de Lisboa de 15.12.2016 (P. 1855/16)).
Assim, não se verificando a sub-rogação, não pode a autora pedir o reembolso dessa provisão.
V.
Em face do exposto, concede-se, em parte, a revista, revogando-se parcialmente o acórdão recorrido e, em consequência, na procedência parcial da acção, condena-se a ré a pagar à autora a quantia de € 25.243,38 (vinte cinco mil duzentos e quarenta e três euro e trinta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efectivo pagamento.
Custas do recurso e nas instâncias a cargo da autora e da ré, na proporção do decaimento.
Lisboa, 19 de Maio de 2020
F. Pinto de Almeida – Relator
José Rainho
Graça Amaral
Tem voto de conformidade do 1º Adjunto, Conselheiro José Rainho (art. 15ºA aditado ao DL 10-A/2020, de 13/3, pelo DL 20/2020, de 1/5).
Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC):