Decisão Texto Parcial
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
1. Perante o Tribunal Arbitral, constituído no âmbito da Acção Arbitral “...I”, vieram “A.....” e “A…,Ldª” requerer, nos termos do disposto no art. 2º, da Lei nº 62/2011, de 12 de Dezembro, no art. 338º, nº1, do Código da Propriedade Industrial (CPI) e no art. 381º, do Código de Processo Civil (CPC), contra ”A.....”, “T…, Ldª” e “R…, Ldª”, e como dependência da referida acção, providência cautelar não especificada, com os seguintes fundamentos, em síntese:
A Patente Europeia …., em vigor em Portugal até 28 de Maio de 2017 e de que a ….A é titular, protege uma composição farmacêutica, dirigida ao tratamento de diversas doenças, quer terapêutica quer profilacticamente, para proporcionar a substância farmacêutica activa “Q…” numa forma de libertação sustida.
Por contrato de licença de exploração, celebrado no dia 1 de Fevereiro de 2012, a “A...AB” cedeu à “A…, Ldª” os direitos emergentes de tal Patente Europeia, para o território português:
A comercialização de medicamentos em Portugal está sujeita a diversos condicionalismos administrativos, nomeadamente, a obtenção de uma autorização de introdução no mercado (AIM), a conceder pelo “I…, I.P.” passando pela fixação do preço de venda ao público (PVP).
Em …. de 2012, foram concedidas à Requerida A…,EHP, “A…” para quatro medicamentos contendo como princípio activo a “Q…” na formulação de libertação prolongada, aos quais foram atribuídos também os PVPs; o mesmo sucedeu quanto a quatro medicamentos genéricos “Q…” para cada uma das duas outras Requeridas, T…, Ldª e R…Ldª, cujas A… e PVPs foram concedidos.
As requeridas T… e R… anunciaram o lançamento dos referidos medicamentos genéricos, contendo “Q…” na formulação de libertação prolongada, com início de comercialização previsto para o dia … de …. de 2012;
As requerentes têm, assim, fundado receio que o exclusivo resultante da Patente seja violado, sendo que a comercialização dos genéricos “Q…”, qualquer que seja a forma utilizada, constitui violação dos direitos emergentes da patente acima referida, causadora de danos de difícil ou mesmo impossível reparação, e que descriminam.
Importa, pois, até que seja proferida decisão (definitiva) na acção principal, impedir as requeridas de explorarem os genéricos “Q…”, por qualquer das formas previstas no art. 101, nº2, do CPI
Em conclusão, pedem:
a) A intimação das Requeridas a absterem-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, exportar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender, oferecer directa ou indirectamente, um conjunto de doze medicamentos, que identificam;
b) Ou, sob estas ou quaisquer designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo Q… (H… ou F…) como princípio activo na sua formulação farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, de acordo com quaisquer das reivindicações da EP …, enquanto tal patente se encontrar em vigor e/ou comercializar tais medicamentos;
c) A intimação das Requeridas para se absterem de transmitir a terceiros as autorizações de introdução no mercado desses medicamentos genéricos;
d) Caso os medicamentos genéricos identificados em a) sejam lançados no mercado, operação prevista para … de … de 2012, seja determinada a sua imediata retirada, a expensas das Requeridas;
e) A fixação de uma sanção pecuniária compulsória de montante não inferior a EUR 50.000,00, por cada dia de atraso no cumprimento da intimação que vier a ser determinada.
2. As Requeridas, vieram deduzir oposição, tendo, além do mais, excepcionado a incompetência do tribunal arbitral, bem como impugnado os fundamentos da presente providência. Para a hipótese de ser decretada a providência, pedem que a mesma seja condicionada à prestação de uma caução de montante não inferior a EUR 384.161,88.
3. Seleccionada a matéria assente e organizada a base instrutória, foi realizado o julgamento e, a final, foi proferida decisão que:
a) Indeferiu a providência quanto à requerida “A...EHF”;
b) Decretou a providência quanto às requeridas, T…, Lda. e R…, Lda., nos seguintes termos:
I) A primeira Requerida, T…, Lda. deverá abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, exportar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender, oferecer directa ou indirectamente, os Genéricos Q… T… 50mg, comprimidos de libertação prolongada, Q… T… 200mg, comprimidos de libertação prolongada, Q… T… 300mg, comprimidos de libertação prolongada, Q… T… 400mg, comprimidos de libertação prolongada, o mesmo devendo observar para quaisquer outros medicamentos contendo Q… (H... ou F...) como princípio activo na sua formulação farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, enquanto a EP … estiver vigente;
II) A segunda Requerida, R…, Lda., deverá abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, exportar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender, oferecer directa ou indirectamente, os Genéricos Q… R… 50mg, comprimidos de libertação prolongada, Q… R… 200mg, comprimidos de libertação prolongada, Q… R… 300mg, comprimidos de libertação prolongada, Q… R… 400mg, comprimidos de libertação prolongada, o mesmo devendo observar para quaisquer outros medicamentos contendo Q… (H... ou F...) como princípio activo na sua formulação farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, enquanto a EP … estiver vigente;
III) Ambas as Requeridas devem retirar do mercado português, no prazo de dez (10) dias após a notificação da presente providência, e a suas expensas, os medicamentos acima descritos;
IV) Por cada dia que não cumprirem a intimação que ora se ordena, pagará cada uma das Requeridas uma sanção pecuniária de EUR 10.000,00 a dividir em partes iguais entre as Requerentes e o Estado Português.
4. Inconformadas, apelam as requeridas “T…, Ldª” e “R…, Ldª” e, em conclusão, dizem:
(…)
5. Nas contra alegações, pugna-se pela manutenção da decisão recorrida.
6. Cumpre apreciar e decidir, se procedem, ou não, os invocados fundamentos de anulação da decisão recorrida e/ou se a mesma deve ser revogada.
7. Fundamentação de facto
O Tribunal Arbitral fixou os factos nos seguintes termos (sic):[1]
“ I – Factos Assentes
(…)
8. Enquadramento Jurídico
8.1. Âmbito do recurso
Como é sabido, o objecto do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente, nos termos do art. 684.º, nºs 2 e 4, 684º-B e 685º-A, do CPC.
In casu, uma vez que a parte dispositiva da sentença arbitral contém decisões distintas, as ora recorrentes, nas conclusões do recurso, ao abrigo das referidas disposições legais, restringiram o âmbito do recurso[2], nos seguintes termos:
- O presente recurso vem interposto do acórdão final proferido pelo tribunal arbitral (…) ao abrigo do disposto na Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, que nos seus pontos 1 e 2 in fine determinou às Recorrentes o dever de abstenção “de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, exportar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender, oferecer directa ou indirectamente (…) quaisquer outros medicamentos contendo Q… (H... ou F...) como princípio activo na sua formulação farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, enquanto a EP … estiver vigente (cf. 1ª conclusão).
- A decisão arbitral de condenação proferida, ao abranger na proibição de comercialização quaisquer outros medicamentos Q… de libertação prolongada excede, o âmbito objectivo previsto nesta mesma Lei n.º 62/2011. (cf. 9ª conclusão).
- A publicação pelo I… dos pedidos de AIM, ao identificar o medicamento genérico em causa, no que respeita, entre outros, à sua substância activa, à respectiva dosagem, à data do pedido e à forma farmacêutica do mesmo, tem por consequência excluir do âmbito da arbitragem e, consequentemente, da decisão arbitral que nela venha a ser proferida, quaisquer outros medicamentos, genéricos ou não, que contenham a mesma substância activa constante da publicação, bem como medicamentos genéricos cujos elementos não correspondam, na totalidade aos indicados nessa mesma publicação – nomeadamente os que se referem à data do pedido de autorização de introdução no mercado (adiante, AIM. (cf. 10ª conclusão).
Assim sendo, importa ter em consideração que o presente recurso vem (apenas) interposto do segmento da decisão arbitral que intimou as ora recorrentes a abster-se de praticar determinados actos relativamente a “quaisquer outros medicamentos contendo Q… (HemiF... ou F...) como princípio activo na sua formulação farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, enquanto a EP …. estiver vigente”.
8.2. Da anulabilidade da decisão arbitral
As recorrentes pedem a anulação da decisão arbitral alegando que:
- O Tribunal arbitral, ao abranger na condenação todos e quaisquer medicamentos contendo Q… (H... ou F...) violou o contraditório, pois impediu as recorrentes de se pronunciarem sobre esta matéria;
- O Tribunal arbitral não se pronunciou sobre os argumentos expendidos pelas recorrentes, quanto à extensão do petitório a quaisquer outros medicamentos genéricos contendo “Q…” na sua formulação de libertação prolongada.
- O Tribunal arbitral conheceu de questões de que não deveria conhecer, uma vez que, por força da Lei 62/2011, está limitado a conhecer (apenas) dos litígios que digam respeito aos pedidos de A… publicitados pelo I….
Vejamos, então.
Os fundamentos de anulação da decisão arbitral constam do art. 27º, da LAV (Lei 31/86, de 29 de Agosto[3], aplicável ao caso dos autos conforme deliberação dos árbitros – cf. acta de instalação de fls. 674 destes autos).
De acordo com o nº 3, do art. 27º, da LAV se da sentença couber recurso e ele for interposto, a anulabilidade só poderá ser apreciada no âmbito desse recurso. Isto é: se a parte pretende, não apenas invocar a anulabilidade, mas também requerer a reapreciação do julgamento efectuado pelo TA, deverá interpor recurso da decisão, deduzindo no seu âmbito os fundamentos de anulação que entender justificar-se.
Por sua vez, por força do disposto no art. 715º, do CPC, se a decisão arbitral vier a ser anulada, deve o tribunal judicial, sempre que possível, proceder ao julgamento do recurso.
Nesta conformidade, tendo sido interposto recurso da sentença arbitral, há que conhecer, em primeiro lugar, dos invocados fundamentos de anulação da decisão arbitral. [4]
· Relativamente à violação do princípio do contraditório dir-se-á:
Nos termos previstos na al. c), do nº1, do art. 27º, da LAV, a sentença arbitral pode ser anulada se tiver havido violação dos princípios referidos no art. 16º, da mesma Lei, com influência decisiva na resolução do litígio.
Um desses princípios fundamentais a observar ao longo de todo o processo é precisamente o da observância do contraditório (art. 16º, al. c), da LAV).
No caso que apreciamos, e com observância das regras processuais aplicáveis, as demandantes apresentaram a petição inicial, na qual formularam com toda a clareza o pedido e expuseram detalhadamente os factos e as razões de direito que lhe servem de fundamento. Por sua vez, as demandadas deduziram oposição, alegando em sua defesa o que tiveram por conveniente, e da qual resulta inequivocamente que interpretaram convenientemente a petição inicial. Além disso, cada uma das partes ofereceu a correspondente prova que foi, oportunamente, produzida e apreciada.
Conclui-se, pois, que, ao longo de todo o processo, foi garantido, em condições de plena igualdade, o exercício do contraditório (ínsito no direito de acesso aos tribunais consagrado no art. 20º, da CRP), pelo que, sem necessidade de outros considerandos, se conclui pela improcedência da pretensão das recorrentes.
· Relativamente à nulidade por omissão de pronúncia:
Nos termos previstos na al. e), do nº1, do art. 27º, da LAV, e em correspondência com o disposto na al. d), do nº1, do art. 668º, do CPC, a sentença arbitral pode ser anulada se o tribunal tiver deixado de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
As recorrentes alegam como fundamento da anulação da decisão que o Tribunal arbitral não se pronunciou sobre os argumentos invocados pelas recorrentes, quanto à extensão do petitório a quaisquer outros medicamentos genéricos contendo “Q…” na sua formulação de libertação prolongada.
Ora, como vem sendo unanimemente afirmado quer na doutrina, quer na jurisprudência, só se verifica a nulidade por omissão de pronúncia quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tal se considerando as pretensões formuladas pelas partes ou os elementos inerentes ao pedido e à causa de pedir.
Isto é: o dever de pronúncia a que o tribunal está adstrito, não abrange os argumentos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, desde logo por ser livre a qualificação jurídica dos factos (art. 664º, do CPC).
Nesta conformidade, a insuficiência ou mediocridade da fundamentação jurídica não constituem omissão ou excesso de pronúncia, podendo, quando muito, traduzir-se em erro de direito a apreciar em sede de mérito.
No caso concreto, a questão invocada como fundamento da anulação foi objecto de ponderação, ainda que de forma lacónica, pelo Tribunal arbitral (cf. v.g. fls. 560 a 562, da decisão recorrida).
Improcede, portanto, a pretensão das recorrentes.
· Relativamente à arbitrabilidade/excesso de pronúncia:
Sustentam as recorrentes que a decisão arbitral, ao abranger na proibição a comercialização de quaisquer outros medicamentos contendo “Q…” de libertação prolongada, excede o âmbito objectivo previsto na Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, o que determina a sua anulação nos termos previstos no art. 27º, nº1, al e), da LAV.
Em abono da sua tese, alegam que:
Nos termos da Lei nº 62/2011, a arbitragem (necessária) tem apenas como objecto os litígios respeitantes aos pedidos de A…, publicados pelo I…, pelo que se devem ter por excluídos do seu âmbito quaisquer outros medicamentos, genéricos ou não, que contenham a mesma substância activa constante da publicação, bem como medicamentos genéricos cujos elementos não correspondam, na totalidade aos indicados nessa mesma publicação.
E defendem que diversa interpretação da Lei estaria ferida de inconstitucionalidade, por violação do direito de acesso ao direito e de defesa previsto no art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, e bem assim por constituir uma restrição infundada do direito de livre iniciativa económica (cfr. arts. 61.º, n.º 1 e 80.º, alínea c) da Constituição da República Portuguesa).
Vejamos, pois.
Se, por hipótese, na notificação de arbitragem o demandante indicar um litígio que não esteja coberto pela arbitragem, o demandado pode até à apresentação da defesa quanto ao fundo da causa ou juntamente com esta, como dispõe o nº3, do art. 21º, da LAV arguir a incompetência perante o próprio tribunal arbitral.
Efectivamente, o julgamento do objecto do litígio envolve em regra o conhecimento da competência dos árbitros, sendo que o legislador reservou aos árbitros a decisão sobre a sua própria competência (cf. art. 21º, nºs 1 e 4, da LAV).[5]
No caso sub judice, a questão foi expressamente invocada pelas demandantes na sua contestação (cf, entre outros, o art. 166º, desse articulado), tendo o tribunal arbitral aceitado a competência para os termos do litígio.
Estão, portanto, verificados os pressupostos que permitem a esta Relação reapreciar a questão da arbitrabilidade do litígio, nos termos balizados pelas conclusões do recurso (cf. arts. 21º, nºs 3 e 4 e 27º, nº2, ambos da LAV).
Estabelece-se no art. 1525º, do CPC que se o julgamento arbitral for prescrito por lei especial, atender-se-á ao que nesta estiver determinado.
É o que sucede no caso que analisamos.
Efectivamente, confrontado com estrangulamentos no âmbito do contencioso entre os titulares de patentes farmacêuticas e os titulares de autorizações de introdução no mercado de medicamentos genéricos, o Governo aprovou em Conselho de Ministros de 1/9/2011 a Proposta de Lei nº 13/XII em cuja Exposição de Motivos (além do mais) se pode ler:[6]
Tem vindo, assim, a assistir-se a um vasto conjunto de litígios judiciais a respeito da concessão da autorização de introdução no mercado, da autorização do preço de venda ao público e da autorização da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos relacionados com a subsistência de direitos de propriedade industrial a favor de outrem.
No entanto, a questão de saber se existe, ou não, violação de direitos de propriedade industrial depende de sentença a proferir pelos tribunais.
Através da presente proposta de lei o Governo pretende estabelecer um mecanismo alternativo de composição dos litígios que, num curto espaço de tempo, profira uma decisão de mérito quanto à existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial. Institui-se, por isso, o recurso à arbitragem necessária para essa composição, solução já adoptada, inclusive no âmbito dos conflitos atinentes aos direitos de autor.
Ainda com o objectivo de promover a celeridade, estabelecem-se prazos para a instauração do processo e para a oposição, contados da publicitação pelo I…, I.P., do pedido de autorização de introdução no mercado. Verificando-se o incumprimento do prazo de oposição, o requerente de autorização de introdução no mercado do medicamento genérico não poderá iniciar a sua exploração industrial ou comercial na vigência dos direitos de propriedade industrial.
Adopta-se, ainda, uma tramitação consentânea com a preocupação de celeridade, com garantia pelo devido contraditório das partes, bem como o direito a uma instância de recurso, fixando-se o efeito meramente devolutivo do mesmo, de modo a manter os efeitos da decisão arbitral até à decisão que sobre o mesmo recair.
Por outro lado, e tendo em conta que a jurisprudência nacional vem entendendo que os direitos de propriedade industrial podem ser afectados pela concessão das autorizações de introdução no mercado, do preço de venda ao público e da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, estabelece-se a compatibilização que se considera adequada desses direitos com outros de idêntica relevância, como é o caso do direito à saúde e ao acesso a medicamentos a custos comportáveis, bem como dos direitos dos consumidores. Assim, e indo também ao encontro das recomendações da Comissão Europeia, prevê-se expressamente que a concessão das referidas autorizações não depende da apreciação, pelas entidades administrativas competentes, da eventual existência de direitos de propriedade industrial.
As medidas constantes da presente proposta de Lei visam dar cumprimento aos compromissos assumidos no Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica firmado pelo Governo Português com o Fundo Monetário Internacional (FMI) a Comissão Europeia (CE) e o Banco Central Europeu (BCE), em … de … de 2011, contribuindo para a criação de condições de sustentabilidade do S. N. S… e de acesso dos utentes a medicamentos a custos comportáveis, bem como para o desenvolvimento dos meios alternativos de composição de litígios.
Esta Proposta de Lei deu origem à Lei nº 62/2011, de 12 de Dezembro que criou «um regime de composição de litígios emergentes de direitos de propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos» (v. art. 1º).
No art. 2º, daquela Lei, sob a epígrafe «arbitragem necessária» estabelece-se que «os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os procedimentos cautelares, relacionados com medicamentos de referência (…) e medicamentos genéricos, independentemente de estarem em causa patentes de processo, de produto ou de utilização, ou certificados complementares de protecção, ficam sujeitos a arbitragem necessária, institucionalizada ou não institucionalizada.»
Por sua vez, no art. 3º, da mesma Lei estabelece-se um prazo de 30 dias para instaurar a acção arbitral, a contar da publicitação pelo I… dos pedidos de autorização, ou registo, de introdução no mercado de medicamentos genéricos, a que se refere o art. 15º-A, do DL 176/2006, de 30 de Agosto e definem-se regras de procedimento a observar no decurso da acção arbitral.
A Lei 62/2011 procedeu ainda à alteração[7] dos arts. 19º, 25º e 179º, do DL nº 176/2006, de 30 de Agosto (Estatuto do Medicamento) e ao aditamento do art. 23º-A, ao mesmo DL, determinando que a autorização de introdução no mercado não pode ser indeferida (alterada, suspensa ou revogada) com fundamento na eventual existência de direitos de propriedade industrial, nem o procedimento administrativo da competência do I… tem por objecto a apreciação da existência daqueles direitos.
Em síntese, a referida Lei contém dois tópicos fundamentais:
- Determina que a concessão administrativa de A… e de aprovação de PVPs não pode ser condicionada pela existência de direitos de propriedade industrial, conferindo natureza interpretativa às disposições da nova lei;[8]
- Impõe a arbitragem como mecanismo de resolução de litígios sobre direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos de referência e genéricos, visando imprimir maior celeridade à resolução de litígios relativos à existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial envolvendo os titulares de patentes e as empresas de genéricos, compelindo os interessados a iniciar a arbitragem num curto espaço de tempo.
Ora:
Considerando que «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada» (art. 9º, n.º 1, CC);
Considerando as especificidades do processo arbitral, a sua razão de ser, a sua autonomia, a relevância atribuída à vontade das partes neste domínio;
Considerando que, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, n.º 3, do CC);
É de concluir que o âmbito objectivo da Lei 62/2011 é o estabelecido no art. 2º, ou seja, estão abrangidos na arbitragem quaisquer litígios respeitantes a medicamentos de referência e genéricos, quando esteja em causa a violação dos direitos de propriedade industrial, e não apenas (mas também) os litígios relativos aos pedidos de A…, entretanto publicitados pelo I… (ubi lex non distinguit nec nos distinguire debemus).
Por outras palavras, a publicitação pelo I… dos pedidos de A… marca tão-somente o início da contagem do prazo de caducidade para dar início à arbitragem, não tendo a virtualidade de restringir o âmbito da arbitragem (recorde-se o que a este respeito se escreveu na Exposição de Motivos da Proposta de Lei que deu origem à Lei 62/2011, designadamente a ênfase colocada no que toca ao afastamento da competência do I… para apreciar eventuais violações de propriedade industrial).
De contrário, estaria o legislador a obrigar os interessados a instaurar acções de cada vez que fosse publicitada uma A.., em infracção dos seus direitos de propriedade industrial, emergentes da mesma patente. Acontece que uma interpretação que conduzisse a esta solução não poderia, por ser absurda, merecer o acolhimento do intérprete – art. 9º, nº3, do CC.
Acresce que: tendo em conta a amplitude dos direitos conferidos ao titular da patente (cf. arts. 97º e 101º, do CPI [9]) - e sendo de presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas, tendo em conta designadamente a unidade do sistema jurídico - não faria nenhum sentido que, ao sujeitar a arbitragem necessária os litígios emergentes da invocação dos direitos de propriedade industrial, tivesse em vista restringir o exercício daqueles direitos, isto é deixando fora da arbitragem (despoletada pela publicitação de A…) os outros medicamentos genéricos em infracção de quaisquer das reivindicações da mesma patente. A ser assim, estaria, aliás, encontrada uma forma de “contornar” os objectivos da lei.
Não há também fundamento para questionar a constitucionalidade desta interpretação, que em nada belisca os princípios fundamentais consagrados pela Constituição da República Portuguesa, mormente os invocados pelas recorrentes.
Pelo contrário: como referem as recorridas, nas suas contra alegações, se assim não fosse interpretada a Lei 62/2011, então sim, estaria a ser violada a tutela constitucional dos direitos de propriedade industrial, como direitos fundamentais.
Fixado o sentido e alcance da Lei 62/2011, analisemos agora a questão da (in)determinação do objecto do litígio.
Alegam as recorrentes que a decisão arbitral, no que respeita à abrangência de “quaisquer medicamentos” é também violadora das regras que impõem que o objecto do litígio seja determinado com precisão, dado que não foram identificados quaisquer outros pedidos de A… para um medicamento genérico contendo "Q…" f… e h… na formulação de libertação sustentada.
Concluem, por isso, que tal condenação é ilegal, violando, para além do art. 3º, n.º 2 da Lei n.º 62/2011, os arts. 2º, nº 3 e 11º, nº 3 da LAV e o direito de defesa consagrado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que se mantenha dentro dos limites preceituados naqueles normativos.
Quid juris?
Na arbitragem ad hoc, a instância arbitral inicia-se com a notificação a que se refere o art. 11º, nº1 da LAV [10]. Trata-se de uma declaração de vontade de iniciar a arbitragem, através da qual se inicia a relação contenciosa destinada ao acertamento dos direitos que o demandante pretende invocar.
A notificação deve, por sua vez, precisar o objecto do litígio, sem prejuízo da sua ampliação pela parte contrária (nº3, do art. 11º, da LAV).
A indicação do objecto do litígio assume particular relevância não só para demonstrar indiciariamente que o litígio está abrangido pela arbitragem, como ainda para habilitar a parte contrária com elementos que lhe permitam tomar posição e/ou escolher o árbitro que lhe caiba designar para integrar o tribunal arbitral.
No caso em apreço:
Por carta datada de … de … de 2012, as demandantes, ao abrigo do disposto no art. 11º, da Lei nº 31/86, de 29 de Agosto notificaram as demandadas de que iriam instaurar um processo no Tribunal Arbitral, precisando nestes termos o objecto do litígio:
“The object of these proceedings is the exercise of the rights to which the undersigned are entitled, arising from the European patent nr …, related to the reference medicine S…, notably those under Article 101 of the Industrial Property Code, in relation to generic medicines, including, but not limited, to those indicate below and included in the list published by I… on its websites, on 11 January 2012.”
Constituído o Tribunal Arbitral, reuniram-se os árbitros com os representantes das partes e procederam à instalação deste, tendo definido o Direito aplicável, as regras processuais a observar na arbitragem, [11] bem como o objecto do litígio da seguinte forma:
“O objecto do litígio consiste no exercício do direito que as demandantes possuem, decorrente da Patente Europeia nº …, relativa ao medicamento de referência S…, nomeadamente como resulta do art. 101º, do Código da Propriedade industrial, relativamente a medicamentos genéricos, incluindo, mas não apenas, os indicados na lista publicada pelo I…, no seu website, em … de … de 2012 – respeitantes à substância activa Q…, F... e q…, h..., em formulação de comprimidos de libertação prolongada.”
Em face do exposto, é patente que o objecto do litígio foi definido com precisão, não se tendo limitado a demanda aos medicamentos genéricos cujos A… foram publicitadas pelo I…, mas a todos os que contendo “Q…” (h... ou F...), de libertação prolongada, como princípio activo na sua formulação farmacêutica, infrinjam as reivindicações da patente ….
Improcede, pois, a pretensão das apelantes.
8.3. A questão da relação entre o procedimento cautelar e a acção principal [12]
Alegam as recorrentes que as recorridas não podem por via deste procedimento cautelar obter um efeito superior ao peticionado na acção principal, ou seja, a extensão da proibição a quaisquer medicamentos contendo a substância activa em formulação de libertação prolongada, cujas A… não tivessem sido objecto de publicação à data do início da acção arbitral.
Sustentam, por isso, que a decisão arbitral violou os artigos 381.º n.º 1 e 383.º, do CPC.
Vejamos.
O procedimento cautelar é sempre dependência de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente da acção (art. 383º, nº1, do CPC).
Isto significa que o objecto da providência há-de ser conjugado com o objecto da causa principal.
Ou seja: atenta a função instrumental do procedimento cautelar a identidade entre o direito acautelado e o que se pretende fazer valer no processo definitivo impõe, pelo menos, que o facto que serve de fundamento à providência integre a causa de pedir da acção principal.[13]
Não obstante, embora a tutela pretendida pelo requerente, no procedimento cautelar, e pelo autor, na acção principal, tenha de respeitar (pelo menos parcialmente) ao mesmo direito, os pedidos de ambos os processos são naturalmente diferentes, atentas as diversas finalidades prosseguidas num e noutro processo, pois o procedimento apenas pretende evitar o periculum in mora através de medidas necessariamente provisórias enquanto na acção se profere decisão definitiva sobre o mérito da causa.
In casu:
Na acção principal, de que este procedimento é dependência, as autoras alegam que a patente … de que a A...AB é titular (e cujos direitos para o território português cedeu à “A…, Lda.”, por contrato de licença de exploração celebrado em …/…/2012) lhes confere o direito exclusivo de exploração económica do invento patenteado o que implica a proibição legal de que qualquer terceiro, sem o seu consentimento, explore esse invento, por qualquer das formas definidas no art. 101º, nº2, do CPI (cf. arts. 9º a 48º, da p.i.).
Alegam ainda que as demandadas pretendem lançar no mercado medicamentos genéricos contendo como princípio activo a Q…, (F... e H…) na forma farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, caindo no escopo das reivindicações da …, tendo já pedido ao I… as respectivas autorizações de introdução no mercado (cf. arts. 56º a 71º, da p.i.).
E acrescentam que o fabrico e a comercialização dos genéricos Q… pelas demandadas, no território português, qualquer que seja a forma pela qual tal comercialização se manifeste, violam os direitos das demandantes emergentes da invocada patente, pelo que têm direito a impedir as demandadas de fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no mercado ou utilizar a Q… ou qualquer produto que a contenha, ou de os importar para quaisquer dos fins mencionados (cf. arts. 72º, 73º e 74º, da p.i.).
Em conclusão, formulam o pedido nestes termos:
“ (…) Devem as demandadas ser condenadas a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo Q… (Q… F... e Q… H...) como princípio activo com a forma farmacêutica de “comprimido para libertação prolongada”, em qualquer dosagem, tendo por medicamento de referência o medicamento da marca S…, cujas autorizações de introdução no mercado foram pedidas nas datas referidas nos artigos 56º a 62º, enquanto a patente … se encontrar em vigor, ou seja, até …/…/2017.
Mais devem ser condenadas, com vista a garantir o exercício dos direitos das demandantes, a não transmitir a terceiros os pedidos de A… identificados nos artigos 56º a 62º, desta petição, bem como das A… concedidas, ou que venham a ser concedidas, até à referida data de caducidade dos direitos ora exercidos.”
Ora bem.
Um dos princípios fundamentais do processo civil é o princípio do dispositivo significando que às partes cabe definir o objecto do litigio através da dedução das suas pretensões – ou seja, enunciar o pedido e alegar os factos que integram a causa de pedir.
Quanto ao processo arbitral, porém, é de salientar que não existe norma expressa que imponha o respeito pelo princípio do dispositivo, como também não se refere de forma inequívoca quais as questões de os árbitros devem conhecer.[14]
Ainda assim, embora com as limitações próprias da natureza da arbitragem, parece ser de aplicar ao processo arbitral o princípio consagrado, entre outros, no art. 660º, nº2, do CPC.[15]
O pedido, através do qual o autor indica o efeito jurídico que pretende obter, deve ser congruente com os fundamentos. Isto é: há-de ser o corolário lógico daqueles, funcionando os fundamentos como as premissas dum silogismo e o pedido como conclusão.
Sendo certo que está vedado ao tribunal a alteração qualitativa e/ou quantitativa das pretensões das partes (art. 668º, nº1, al. e, do CPC), também não deve esquecer-se que a petição inicial pode e deve ser interpretada, em conformidade com as regras da declaração negocial. Há-de, assim, ser interpretado o pedido, tendo em conta a causa de pedir e os demais fundamentos de facto invocados.
No caso em apreço, face ao teor do pedido formulado na petição inicial apresentada na acção principal, e atendendo aos fundamentos de facto invocados como seus elementos interpretativos, é de admitir ter sido intenção das partes não restringir a proibição aos medicamentos genéricos cujas autorizações de introdução no mercado tenham já sido pedidas pelas rés, servindo o segmento “cujas autorizações de introdução no mercado foram pedidas nas datas referidas nos artigos 56º a 62º” apenas o propósito de individualizar alguns desses medicamentos, mas não o de excluir do âmbito do pedido outros medicamentos que, em idênticas circunstâncias, as rés pretendem também comercializar.
Consequentemente, sob pena de ser posta em causa a eficácia prática visada pelo presente procedimento cautelar, cujos requisitos[16] não foram sequer impugnados neste recurso, parece-nos que a decisão a proferir sobre a questão de que nos ocupamos não deverá excluir a possibilidade de o tribunal arbitral vir a decidir em sintonia com a amplitude que vislumbramos no pedido formulado na acção principal.
Em face do exposto, o pedido formulado na acção principal deve ser interpretado no sentido de que as demandantes pretendem a condenação das demandadas a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização neste território, importar, exportar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender, oferecer directa ou indirectamente, não só os medicamentos genéricos, que identificam e cujas autorizações de introdução no mercado já tenham sido concedidas, mas também sob aquelas ou outras designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo Q… (H... ou F...) como princípio activo na sua formulação farmacêutica de comprimidos de libertação prolongada, de acordo com quaisquer das reivindicações da …, enquanto tal patente se encontrar em vigor.
É, portanto, de concluir que o efeito jurídico que se pretende alcançar pela via tutelar integra o objecto do processo na acção principal.
9. Nestes termos, negando provimento ao recurso, acorda-se em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelas apelantes.
Lisboa, 19/3/2012
Maria do Rosário Correia de Oliveira Morgado
Rosa Maria Ribeiro Coelho (vencida conforme declaração de voto anexa)
Amélia Ribeiro
Não acompanho, salvo o devido respeito pelo entendimento que obteve vencimento no acórdão, a interpretação que aí é feita do pedido formulado na ação principal.
A meu ver, ainda que combinado com os fundamentos invocados, o pedido em causa, como se vê do teor do seu primeiro parágrafo, apenas tem por objeto a condenação das demandadas a absterem-se de importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo Q… (….) como princípio ativo com a forma farmacêutica de “comprimido para libertação prolongada” (…), cujas autorizações de introdução no mercado foram pedidas nas datas referidas nos artigos 56º a 62º da p. i., enquanto a patente EP 907364 se encontrar em vigor.
Disto se vê que a pretendida abstenção, por parte das demandadas, da prática dos enunciados atos, se reporta apenas aos medicamentos assim devidamente especificados - os genéricos contendo Q… em relação aos quais foram pedidas as autorizações de introdução no mercado nas datas referidas pelas demandantes –, e não a quaisquer outros medicamentos que eventualmente contenham aquela mesma substância ativa em formulação de libertação prolongada.
A pretensão das demandantes, porque os omite em absoluto, não abrange, manifestamente, estes últimos.
Pede-se também a condenação das demandadas a não transmitirem a terceiros os pedidos de AIM identificados nos citados artigos da petição, bem como as AIMs concedidas ou que o venham a ser, até à data da caducidade dos direitos exercidos na ação.
A referência feita, neste âmbito, a autorizações de introdução no mercado que, para além das mencionadas nos arts. 56º a 62º, já tenham sido concedidas ou que o venham a ser futuramente, reporta-se exclusivamente à pretendida proibição de transmissão, pelo que se não pode entender que, quanto a elas, venha também pedida a proibição das condutas enunciadas no primeiro dos referidos pedidos.
É sabido que a providência cautelar, prevenindo o periculum in mora, antecipa, relativamente à ação de que é dependente, um determinado efeito jurídico, antecipação que pode consistir, como acontece no caso dos autos, na obtenção de julgamento de natureza preliminar e provisória sobre a relação litigiosa.[17]
Por isso, o efeito jurídico antecipadamente decretado na providência cautelar não pode ir além daquele que é possível obter na ação principal, de que é dependência – arts. 381º, nº 1 e 383º, nº 1 do CPC.
Na medida em que tal excesso se verificasse, teríamos uma decisão (definitiva, não provisória) com força idêntica à proferida num processo principal, mas obtida em sede cautelar, e, por isso mesmo, sem a revisão assegurada com a tramitação de um processo principal.
Entendo, pois, que a parte da decisão aqui impugnada se não pode manter.
Com este fundamento, julgaria a apelação procedente e revogaria, na parte impugnada, a decisão sob recurso.
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[1] Há que reconhecer que a fundamentação de facto não foi elaborada de harmonia com os ditames mais exigentes da boa técnica jurídico-processual. Em todo o caso, a questão não assume qualquer relevância no plano da decisão deste recurso, como melhor se verá adiante.
[2] Posição que reafirmam a fls. 694 e 695, na sequência das dúvidas suscitadas pelo TA, no despacho de fls. 664-665 que admitiu o recurso.
[3] Com as alterações introduzidas pelo DL nº 38/2003, de 8 de Março.
[4] Neste sentido, Paula Costa Silva, Anulação e Recursos da Decisão Arbitral, ROA, ano 52, pags. 893 e ss.
[5] Sobre a determinação do objecto do litígio, ainda que na vigência da Lei 31/86, na sua versão original, v. Lopes dos Reis, Questões de Arbitragem, ROA ano 59, pags. 263 e ss.
[6] Esta Proposta de Lei está disponível in www.parlamento.pt/
[7] A que se atribuiu expressamente natureza interpretativa – art. 9º, da Lei 62/2011.
[8] Trata-se do corte com o chamado “patent linkage”, tido como causador de atrasos significativos na entrada de medicamentos genéricos no mercado.
[9] Nos termos do art.101º do CPI, a patente confere ao seu titular o direito exclusivo de explorar a invenção (conteúdo positivo) – nº 1; e ainda o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de um produto objecto de patente, ou a importação ou posse do mesmo, para algum dos fins mencionados (conteúdo negativo) – nº 2; além disso, o titular da patente pode opor-se a todos os actos que constituam violação da sua patente (nº3).
[10] Muito embora, se trate de arbitragem necessária, a LAV, como já vimos, tem aqui aplicação atenta a deliberação dos árbitros a que já fizemos referência. Acresce que também o art. 1528º, do CPC dispõe que “em tudo o que não vai especialmente regulado observar-se-á, na parte aplicável, o disposto na lei de arbitragem voluntária.”
[11] Na Acta de Instalação do TA consignou-se ainda que:
- O Tribunal Arbitral julga segundo o direito português constituído aplicável.
- O litígio a dirimir está sujeito a arbitragem necessária, por força do disposto no art. 2º, da Lei 62/2011, sendo ainda aplicáveis as normas imperativas decorrentes da LAV de 1986 e, a título subsidiário, o Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, aprovado nas reuniões do Conselho do Centro de Arbitragem de 18/6 e 29/7 de 2008, nos seus artigos 14º e ss., com as devidas adaptações e a LAV de 1986, quanto às normas não imperativas.
[12] Questão que, aliás, não suscitaram na sua oposição, mas de que iremos conhecer, por se nos afigurar estarmos perante uma «questão de direito».
[13] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, III Vol., 4ª edição, 153.
[14] Paula Costa Silva, Anulação e Recursos da Decisão Arbitral, ROA, ano 52, 942-943.
[15] Embora não aplicável no caso concreto, não podem esquecer-se os amplos poderes conferidos ao tribunal arbitral, em sede de providências cautelares, pela nova Lei da Arbitragem (cf. arts. 20 e ss, da Lei nº 63/2011, de 14 de Dezembro).
[16] Cf. arts. 381º e 387º, nº1, do CPC e 338º, nº1, do CPI.
[17] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, vol. I, 3ª edição, pág. 626 e 627 |