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ECLI:PT:TRP:2017:1671.16.1T8MTS.P1.BC

Relator: NELSON FERNANDES

Descritores: CONTRATO DE TRABALHO RESOLUÇÃO INICIATIVA DO TRABALHADOR ASSÉDIO MORAL SEM JUSTA CAUSA INDEMNIZAÇÃO DA ENTIDADE PATRONAL

Processo: 1671/16.1T8MTS.P1

Nº Convencional: JTRP000

Nº do Documento: RP201711201671/16.1T8MTS.P1

Data do Acordão: 20/11/2017

Votação: UNANIMIDADE

Texto Integral: S

Nível de acesso: 1

Meio Processual: APELAÇÕES EM PROCESSO COMUM E ESPECIAL (2013)

Decisão: PARCIALMENNTE PROVIDO

Indicações eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) (LIVRO DE REGISTOS Nº 264, FLS 261-295)

Área Temática: .

Sumário

I - A omissão pelo recorrente do cumprimento dos ónus estabelecidos no artigo 640.º n.º 1 do CPC implica a rejeição da impugnação da matéria de facto na parte afetada.
II - Não fazendo o recorrente apelo a factos que diga ter alegado nos articulados, enquanto novos, a atendibilidade dos mesmos em sede de recurso pressupõe que o Tribunal de 1.ª instância tenha usado da faculdade prevista no artigo 72.º do CPT.
III - Constituindo a possibilidade de eliminação de factos conclusivos equiparados a questões de direito uma prerrogativa dos tribunais superiores de longa tradição doutrinal e jurisprudencial, deve continuar a entender-se, não obstante a revogação (com a reforma) do anterior artigo 646.º CPC, que mesmo em sede de recurso, no âmbito dos poderes do tribunal da relação no que diz respeito à apreciação da matéria de facto, aquela eliminação pode/deve ser exercida, mesmo que não esteja expressamente prevista na lei processual.
IV - A resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, sem necessidade de aviso prévio e com invocação de justa causa, a que alude o art.º 394.º do CT/2009, pode ser fundada num comportamento ilícito do empregador ou resultante de circunstâncias objetivas, relacionadas com o trabalhador ou com a prática de atos lícitos pelo empregador, dizendo-se no primeiro caso que estamos perante resolução fundada em justa causa subjetiva e, no segundo, por sua vez, fundada em justa causa objetiva.
V - A justa causa subjetiva justificativa do despedimento por parte do trabalhador assente em assédio moral do empregador, estando para além de situações de mero mau relacionamento, implica a verificação de comportamentos real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, passíveis de exercer pressão moral sobre este e tendo em regra associado um objetivo final ilícito ou pelo menos eticamente reprovável, bem como, ainda, enquanto característica essencial do conceito de justa causa, a demonstração de que esse comportamento da entidade patronal, que lhe possa ser imputável a título de culpa, pela sua gravidade e consequências, torne inexigível a manutenção do vínculo laboral;
VI - A indemnização devida pelo trabalhador pela resolução do contrato que operou sem que prove a justa causa e sem o cumprimento do aviso prévio, tendo subjacente a protecção dos interesses da empregadora – com vista, nomeadamente, a que esta possa providenciar, em tempo útil, pela substituição do trabalhador sem prejudicar a atividade da empresa –, opera automaticamente, desde que requerida por aquela, pelo simples facto de o trabalhador ter feito cessar a sua relação laboral sem cumprir - ou cumprindo apenas parcialmente - o prazo de aviso prévio, independentemente de a entidade empregadora ter com isso sofrido ou não quaisquer efetivos danos.

Decisão Texto Parcial

Não disponível.

Decisão Texto Integral

Apelação 1671/16.1T8MTS.P1
Autor: B...
: C..., Lda.
_______
Relator: Nélson Fernandes
1º Adjunto: Des. M. Fernanda Soares
2º Adjunto: Des. Domingos José de Morais

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
1. B... interpôs contra C..., Lda., ação declarativa emergente de contrato de trabalho, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação desta, confirmando-se a existência de justa causa de resolução do contrato de trabalho, na indemnização equivalente a 17.821,69€ ou, pelo menos, não inferior a 11.881,13€, em consequência do previsto no artigo 392.º, n.º 3, ou, pelo menos, do artigo 396.º, n.º 1, ambos do CT em vigor (face à inconveniência de reinserção laboral face aos indicados motivos), tudo acrescido de juros civis legais contados da citação e até efetivo pagamento.

1.1. Frustrada a tentativa de conciliação levada a efeito na audiência de partes, a Ré apresentou contestação, na qual pugna pela total improcedência da ação, deduzindo ainda reconvenção, pedindo a condenação da Autora/reconvinda no pagamento da importância de €1.397,78, acrescida dos juros de mora que, calculados à taxa legal, se vencerem desde a data da notificação àquela do pedido reconvencional e até integral pagamento.

1.2. Por despacho de fls. 124 e 125 foi a Autora convidada a aperfeiçoar o articulado da petição inicial, convite esse a que a mesma acedeu, apresentando nova petição inicial, respondendo no seguimento a Ré a essa petição.

1.3. Posteriormente, admitida a reconvenção, foi proferido despacho saneador, dispensando-se de seguida a enunciação de base instrutória ou temas de prova e fixando-se no final o valor da ação em €19.219,47.

1.4. Realizada a audiência de discussão e julgamento, veio por fim a ser proferida sentença, de cujo dispositivo consta:
“Tudo visto e ponderado, decide-se:
– Julgar totalmente improcedente, por não provada, a presente ação que B... move contra “C..., Lda”, e, em consequência, absolvo esta dos pedidos contra si formulados.
– Julgar parcialmente procedente, por provada, a reconvenção intentada pela R./reconvinte “C..., LDA” contra a A./reconvinda B..., e, em consequência, condeno esta a pagar àquela a quantia de 1.328,10 € (mil trezentos e vinte e oito euros e dez cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido reconvencional e até integral pagamento.
– Custas da ação a cargo da A., B... (art. 527º.º, do Código de Processo Civil).
- Custas da reconvenção a cargo de ambas as partes na proporção do respectivo decaimento (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).”

2. Não se conformando com o assim decidido, apresentou a Autora recurso de apelação, de cujas alegações formula as seguintes conclusões:
“A - DA ERRADA RESPOSTA À MATÉRIA DE FACTO PROVADA E NÃO PROVADA.
I - DOS FACTOS ERRADAMENTE DADOS COMO PROVADOS
1ª – O Tribunal “a quo” optou por transcrever, como factos provados, as cartas da Ré nos factos 10, 12, 14. Porém, de tal transcrição apenas se poderá dar como provado o envio das mesmas e de qual o seu conteúdo, mas não já da validade ou verdade do mesmo, das afirmações, opiniões ou factos que nelas consta de forma textual, exceto quando tais dados possam comprovar factos contrários ao autor de tais cartas, em confissão extrajudicial (e judicial) da parte.
2ª - Porque axial e demonstrado, cumpre completar o facto provado 23 (ou adicionar um novo facto subsequente: 23-A) para que se ateste que a doença que motivou a baixa de 22.5.2015 se tratava de um agravamento de um estado depressivo do qual a trabalhadora se encontrava já recuperada, agravamento esse que ficou a dever-se a fatores laborais adversos, tendo ocorrido quando regressou ao trabalho.
3ª – Tal facto encontra-se demonstrado por um relatório de baixa médica (doc. 40 contestação) e por 2 relatórios médicos, um de 24.7.2015 – doc. de fls. 9 (transcrito no facto provado n.º 58) e outro de 28.12.2015, junto como doc. 8 na Petição inicial (cuja análise foi omitida pelo Tribunal). Tal facto será também adequado a estabelecer o nexo que falta entre os factos 31, 58 e 86 (sendo que o 31 refere que o estado de saúde depressivo da A. se agravou após o regresso ao trabalho passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação e o 86 refere que após a sua desvinculação com a Ré, a A. sentiu novamente recuperação de saúde).
4ª – Quanto ao facto provado 86: que “após a sua desvinculação com a Ré a A. sentiu novamente recuperação de saúde” torna-se mister completar que a duração da nova recuperação foi de um ano ou nunca inferior a 5 meses. É o que o demonstram os já referidos 2 relatórios médicos (sendo que o último, de 28.12.2015 ainda não falava em cura médica) e ainda o depoimento de D... que, transcrevendo passagem em despacho de 23.11.2016,“confirmou que a Autora recorreu à médica de família, que a encaminhou para um psiquiatra, tendo começado a medicação e demorado cerca de um ano para voltar ao estado normal”.
5ª – Porque axial (e alegado – itens 17 a 20 PI) cumpre dar como provado (facto 29-A) que a Autora estava escalada para trabalhar aos fins de semana e, concretamente, no dia 23.5.2015, sábado, precisamente o dia anterior à data da última baixa da A.: 22.5.2015…, tal como resulta cabalmente demonstrado em documento (também ignorado pelo Tribunal) junto como doc. 7 na PI, não impugnado: uma escala de serviço donde resulta que a trabalhadora (n.º 111) estava de facto escalada para trabalhar em tal dia 23.5.2015 (sábado).
6ª – Tal evidência consta ainda demonstrada no facto provado 12 (carta da Ré de 10.4.2015) onde esta atesta que apenas está na “disposição de procurar acordar com Vª Exª e durante o período em que durar a amamentação a folga de 2 sábados por cada mês” ou ainda do depoimento da testemunha E... que tal como referido em despacho de 23.11.2016 “tendo embora admitido que estava escalada para trabalhar em dois sábados, o que não se concretizou por entretanto ter entrado de baixa médica.”
7ª – Sobre o facto 34… verifica-se sua contradição com os factos provados 25 e 61 que atestam que após quase 2 anos de ausência, as mudanças e inovações foram em quase todos os produtos da loja (que inclusivamente foi completamente remodelada), surgindo muitos produtos novos e com especificidades inovadoras.
Assim, apenas se poderá concluir, como facto 34 que, na verdade, “a A. se viu confrontada com artigos e produtos novos e que apresentavam muitas e importantes inovações, tendo a loja sido alvo de completa remodelação durante a ausência da Autora”.
8ª – Mais, cumpre ainda aditar que (Facto 34-A): “A C... é uma conhecida empresa de venda de artigos de puericultura que estão sujeitos a frequentes alterações relacionadas com o funcionalismo dos produtos, as suas características, as normas de segurança, entre outras, e em que o funcionário destacado para os vender deve prestar um atendimento personalizado e deter conhecimentos especializados e conhecer previamente tais dados para esclarecer cabalmente o cliente”.
9ª – Tais factos 34 e 34-A baseiam-se ainda no documento, confessório, de fls. 106 e 107 e também dos depoimentos de testemunhas como F..., supervisora da Ré, que declarou que “ inclusivamente a loja até foi… teve uma restruturação” e que “sim. provavelmente. Não é remodelados mas há muitas novidades”. Ou ainda de G... que declarou que: “a C... tem um apoio por trás que tem a ver com a formação das funcionárias, das vendedoras que é nós precisamos de formação quase mensalmente”;
- Que: “Não vamos pegar no livro de instruções e estar a ler em frente ao cliente porque isso dá muito mau aspeto (…) portanto se ela disser só pelo livro o cliente chega lá, lê o livro de instruções e vai-se embora.
- Ou ainda que: “os produtos estão sempre a ser renovados.” Testª – “sempre. Estão sempre. Até porque a própria homologação o exige.”
E que quando perguntado se “sempre que chegava um produto vocês tinham formação?” respondeu a testª – “exactamente”.
10ª - O verdadeiro facto 35 é de que: “o marido da Autora trabalha às sextas-feiras a noite e aos sábados de manhã” correspondendo tal erro a evidente lapso já que:
a)- o próprio despacho de 23.11.2016 refere, do depoimento de D..., que ”a testemunha chegou a abordar a sua entidade empregadora a fim de aferir da sua dispensa aos sábados, pretensão esta que lhe foi recusada”.
b)- e o doc. anexo à carta de 8.4.2015 (doc. 51 da contestação da Ré) – carta/declaração emitida pela entidade patronal (H..., Lda) do marido da A., D... - atesta que: “Por inerência de funções desempenhadas, todas as sextas-feiras de cada mês o seu horário é prolongado e termina durante a manhã de sábado, previsivelmente entre as 10h00 e as 12h00”.
11ª - É deturpado que o facto 54 se refira apenas a que “a Ré, desde 2011, encerrou vários estabelecimentos” sem que faça também constar (o que se torna mister fazer) que a Ré, nesse período, abriu outras lojas novas de maior dimensão, em especial em Lisboa, por ter sido o que resultou demonstrado do depoimento de G... que refere que “depois de fechar a nossa ainda abriram em Lisboa umas “megalojas”.
12ª – É notória a contradição entre os factos 77 e 79 já que, se a reunião solicitada pela Autora com a supervisora nacional foi agendada mas depois cancelada por parte desta última…, então a Ré não se mostrou sempre disponível para conversar com a Autora e, simultaneamente, assim se provando que a Autora, ao invés do que maliciosamente invocou a Ré, tentou efetivamente falar com a Ré antes de apresentar a sua demissão.
13ª – Que o facto 77 é falso também o demonstram as várias cartas da Ré que sempre teimosamente negavam os pedidos da Autora ou ainda como o confessa a própria supervisora da Ré que, depois de cancelar a reunião que agendara com a Autora, lhe fez transmitir que, “não obstante que – e eu transmiti isto à diretora e sei que lhe foi transmitido, que eu não tinha nada para lhe dizer”. É isto estar disponível para reunir e resolver problemas??
II - DOS FACTOS ERRADAMENTE DADOS COMO NÃO PROVADOS
14ª – os factos a., c. e d. erradamente dados como não provados
(a. “durante todo este período foi notório o desgaste emocional e físico sentido pela A. causado pela negação dos seus direitos de parentalidade por parte da Ré”.
c. “Tal desgastante incerteza causou enorme ansiedade à A. que se via aflita em procurar alternativas urgentes que pudessem salvaguardar os cuidados da sua filha (mesmo que, depois, a marcação do serviço viesse a ser por vezes alterada).”
d. “A falta de tal comunicação por parte da ré causou à A. acrescido desgaste emocional e agravou-lhe ainda mais os sintomas depressivos.”)
… são a conclusão lógica e axial dos factos provados 9, 10, 11, 12, 13, 14, dos factos supra referidos 23, 34 e 23-A, 29-A e 34-A (de cuja inclusão se requer) e ainda dos factos 31, 33, 58, 65, 79 (com a redação supra requerida) e 82 entre outros, não se compreendendo a sua exclusão.
15ª – São especialmente evidentes as consequências psicológicas patentes pelo facto da doença depressiva ter renascido logo após o regresso ao trabalho quando passou a necessitar novamente de cuidados médicos e medicamentosos que exigiam o afastamento do meio laboral para que surtissem algum efeito… (melhoria que, comprovadamente – facto 86 – começou a sentir-se após a desvinculação da Autora como trabalhadora da Ré).
16ª – São também vários os depoimentos que atestam tal realidade:
a) o de D... (marido da A.) o qual, assistindo diariamente aos efeitos psicológicos causados pela falta de resposta ou deferimento da Ré em todas as suas cartas declara que “esta patenteou angústia e nervosismo mercê das respostas da ré, dado não ter existido consenso quanto às pretensões colocadas, pelo que a A. “estava a entrar num ciclo igual” ao verificado há 2 anos atrás. e que, “a A. lhe reportou falta de apoio por parte da ré, sentindo-se completamente à parte”
b) Ou o testemunho de I...: “Notou também que a A. andava mais ansiosa e alterada, tendo-lhe esta referido que era devido a problemas de trabalho e que não conseguia vir mais cedo buscar a bebé”.
c) Ou ainda o testemunho de J... “aconselhou a A. a cessar o contrato de trabalho a fim de não prejudicar a filha”. (facto provado 86)
17ª - Considerando especialmente a contínua troca de cartas e as constantes recusas da Ré e ainda as escalas de serviço marcadas para os sábados, altura em que a A. não tinha ninguém com quem deixar a sua filha recém-nascida – é impensável aceitar que uma mãe (sobretudo com o passado depressivo como tinha) ficasse “impávida e serena” com a necessidade de encontrar alternativas urgentes para salvaguardar os cuidados da sua filha, em virtude da constante incerteza da posição da Ré quanto aos pedidos efetuados pela Autora, sendo que a própria filha da Autora estava também a sofrer, reflexamente, com a ansiedade e angústia da mãe em resolver os seus problemas com a Ré) (tal como relatado pela testemunha I...).
18ª – O facto c. é especificamente demonstrado pelo doc. 7 junto com a PI do qual resulta que a A. deveria trabalhar no sábado, dia 23.5.2015, isto é, precisamente no dia seguinte à sua entrada em baixa médica quando apresentou a recorrência dos sintomas depressivos que estavam já ultrapassados, não nos devendo esquecer que a Ré, nesta altura, confessadamente, não iria alterar qualquer escala de serviço (lembrando as palavras da supervisora da Ré “eu não tinha nada para lhe dizer”)
19ª – Quanto ao facto b., que “A ré ameaçou a A. que a colocaria a trabalhar também em horário noturno a qualquer momento.” resulta diretamente provado pelas cartas que a Ré enviou à Autora que passaram para os factos 10, 12 e 14, p. ex.: “nada é referido quanto à necessidade de dispensa de prestação de trabalho (…) Do exposto resulta que se mantém a possibilidade de V.Exa. de, durante o período que perdurar a amamentação, realizar ambos os turnos praticados no estabelecimento.(…) Perante o exposto, cumpre-nos informar que é nossa intenção recusar o pedido de V.Exa. à dispensa de trabalho noturno”.
20ª – Já o facto “e.” – de que “A A. não estava apta a vender os produtos que apresentavam inovações”, é a consequência lógica dos factos 33, 34, 34-A (requerido) e 61. e ainda do depoimento esclarecedor das testemunhas (cfr. transcrições supra).
E finalmente o facto “m.” que “Antes de enviar a carta de rescisão, em vão procurou falar com a supervisora da Ré” se não provado, estaria em frontal contradição com o facto 79 e deve, por isso, dar-se como provado.
B - DE DIREITO
A ERRADA INTERPRETAÇÃO DOS FACTOS (ALGUNS DOS QUAIS VICIADOS) QUE CONDUZIRAM À ERRADA VERIFICAÇÃO DAS 5 ALUDIDAS CAUSAS DE DEMISSÃO INVOCADAS PELA TRABALHADORA.
21ª - “O rigor com que se aprecia a justa causa invocada pelo empregador não pode ser o mesmo com que se aprecia a justa causa invocada pelo trabalhador” (transcrição de K..., feita na Sentença). Sendo que assim é porque “enquanto o empregador dispõe de sanções intermédias para censurar um determinado comportamento, o trabalhador lesado nos seus direitos não tem modos de reacção alternativos à rescisão”. Em consequência, tal critério - do que seja ou não justa causa de demissão - deve merecer cuidadora análise e não se deve exigir um grau probatório tão elevado quando se trate de uma justa causa invocada pelo trabalhador,…
22ª - “… sobretudo atendendo também, às limitações de meios de prova pois que, p. ex., muitos das possíveis testemunhas são trabalhadores ainda afetos à empresa, os quais certamente não irão (ou muito dificilmente o farão como a experiência demonstra) depor contra a mesma empresa que “lhes dá trabalho”…
23ª - Não ainda poderemos olvidar (como o Tribunal o fez) que a Autora era trabalhadora da Ré há 17 (e bons) anos, que se viu acometida de uma doença específica do foro mental – depressão reactiva – e que, apesar de recuperada, deveria merecer um maior cuidado e sensibilidade por parte da Ré, pelo menos na recetividade no tratamento das questões laborais em causa (numa “discriminação” positiva que se lhe exigiria)
24ª - E isto sem esquecer (como também o Tribunal o fez) que a causa que “justamente” levou a Autora a pedir a demissão é uma causa “composta”, isto é, não se trata de apenas um facto esporádico e/ou isolado, mas sim de 5 sucessivas situações laborais que inelutavelmente (umas com maior, outras com menor peso) condicionaram a liberdade da Autora ao ponto de ter que optar pela sua saúde e pela saúde e sobrevivência da sua filha menor, pedindo a sua demissão.
1º motivo - Da violação dos direitos de proteção à parentalidade
25ª - O facto de não se ter executado serviço noturno ou ao sábado (dispensa concedida por Lei), não justifica nem pode justificar a pressão psicológica infligida pela entidade patronal (Ré) ao trabalhador (Autora) nem se poderá validar a atuação que é tudo menos consentânea com o disposto no artº 127º/3 CT.
26ª – Na verdade, dos factos 9 a 15, 23, 23-A e 58, 86, 29-A, 31, 32, 35 e 82 apenas se poderá extrair a conclusão de que a Ré, efetivamente, violou os direitos parentais da Autora, lançando-a para um natural estado de completa insegurança, ansiedade e de nervos em cada recusa: A trabalhadora vivia no “limbo” de ter que trabalhar à noite e ao sábado, fazendo perigar a sobrevivência da sua filha recém nascida ou, no limite, obrigando a Autora a faltar, gerando uma pressão e insegurança intolerável e completamente incompatível com o texto e espírito da lei laboral de proteção à parentalidade (e que, inclsuivamente, foi a causa do ressurgimento da doença psiquiátrica da Autora.
27ª - A Ré estava consciente de tudo isso e de quais as consequências que tal pressão acabaria por fazer refletir na Autora, sabendo nomeadamente que a Autora seria forçada a desistir do seu contrato caso os pedidos de parentalidade não fossem acedidos, pois que tal lhe tinha sido dito diretamente pela Autora em sua carta de 8.4.2015 (doc. fls. 11 e 12) na qual adverira a Ré de que “a violação deste meu direito constitui uma contraordenação grave, podendo ainda consubstanciar um comportamento culposo que, pela sua gravidade e consquências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”.
28ª – De acordo com a leitura atenta dos factos 16, 17, 18, 19, 20 e 21 cuidadosamente analisados à luz dos n.º 6 e 7 do art 57º CT e contrariamente ao que o Tribunal entendeu: a Autora não tinha qualquer razão para acreditar que o Parecer efetivamente favorável da CITE fosse vinculativo para a entidade patronal… pelo simples mas verdadeiro motivo de que o Parecer da CITE ter sido pedido em 21.5.2015 e a sua resposta ter chegado à Autora em 23.6.2015, isto é volvidos que estavam mais de 30 dias (mais do que o disposto nos 57º/6/7).
29ª – Deveria ter sido a Ré a contactar a Autora: a “bola estava do seu lado” sendo certo que das palavras da Supervisora da Ré, ao dizer à A. que, com o pedido do CITE “não tinha mais nada para lhe dizer”, se depreenderia que a resposta da Ré viria após a emissão de tal parecer (o que não ocorreu). E não se diga que a Ré estava inibida de enviar tal comunicação pelo facto da A. se encontrar de baixa porque tal não a tinha antes impedido de enviar as cartas trocadas desde Março de 2015, meses antes da Autora ter reiniciado o seu trabalho.
2º motivo – Do tratamento discriminatório laboral
30ª – Considerando o erro cometido quanto ao facto 35, sendo verdade que o marido da Autora trabalhava aos sábados de manhã e não apenas na sexta à noite… não existe qualquer diferença na situação entre a Autora e a colaboradora L...:
31ª - Afinal, a Autora também não tinha qualquer apoio do marido para prestar assistência às 2 filhas ao sábado (pelo menos de manhã), não se vislumbrando assim qualquer diferença de circunstâncias entre um marido estar a trabalhar em Angola e o outro a trabalhar em Portugal pois que, além do factor geográfico evidente, em ambos os casos, nenhum dos maridos poderá prestar assistência aos filhos, isto é, se o resultado prático das 2 situações é o mesmo (indisponibilidade para prestar apoio), não poderão as mesmas ser distinguidas.
32ª – A única e verdadeira razão para a não concessão à Autora de igual estatuto que L... beneficiava nada tinha a ver com o facto do marido trabalhar no estrangeiro mas sim, confessadamente, porque L... tinha simplesmente pedido tal estatuto em primeiro lugar… isto é, a Ré estava assim a conceder benefícios a uns trabalhadores em detrimento de outros, apesar destes se encontrarem em igualdade de circunstâncias (violando o artº 23º/1/a) CT), sendo aliás à Ré a quem cumpriria convencer que assim não seria atento o disposto no artº 25º/6 CT, específico para situações como a da A.
3º motivo – Da falta de formação
33ª – Os factos 33, 34, 34-A, 59 e 61 são inequívocos de que a Autora não possuía conhecimentos suficientes sobre produtos vendidos pela Ré e que, assim não poderia executar cabal e adequadamente o seu trabalho, sendo certo que durante a sua ausência de quase 2 anos, surgiram muitos produtos novos e com inovações e a loja foi completamente remodelada.
34ª – De tais factos extrai-se ainda que a própria Ré confessa que a Autora deveria realizar formação de produto face à ausência prolongada da trabalhadora e mesmo considerando que a trabalhadora, como a A., o era há vários anos e até era reconhecida pelas suas capacidades de venda, pois que mesmo o melhor dos vendedores precisa de conhecer o produto que vendE… e a A. não conhecia.
35ª – Logo após um período de ausência (como a baixa e licença maternal da A.), é particularmente importante a formação e atualização do trabalhador para que o mesmo se encontre apto para exercer convenientemente (e sem esforço adicional ou desmesurado) as suas funções e logo no início do seu trabalho, sendo certo que (conclusão que o Tribunal não retirou) tal necessária formação deve ser ministrada antes ou, pelo menos, logo após retomar o serviço, sob pena de não surtir o efeito pretendido pelo legislador (precisamente para evitar casos como o que analisamos…) tal como o ordena o artº 61, não analisado pelo Tribunal.
36ª - Errada está a apreciação que o Tribunal faz de que à Autora não poderia ter sido ministrada qualquer formação atento o pouco período de tempo que trabalhou pois que entre o início do seu trabalho, em 17.4.2015 até ao início da baixa, em 22.5.2015, tinham passado mais de 30 dias (!!) sem que tivesse iniciado ou sequer sido agendada tal formação, não esquecendo que a formação deveria ter-se iniciado urgentemente face às específicas necessidades de atualização da Autora, especialmente quanto a produtos novos e à localização dos artigos em loja (remodelada).
37ª – Em acréscimo, um trabalhador é completamente alheio às opções tomadas pela entidade empregadora se esta, por razões que entender suficientes, não queira dar formação aos seus funcionários (como estranhamente a supervisora da Ré confessa)
Tal comportamento corresponde quando muito à confissão da violação do disposto nos artigos 61º e 127º/d), não cumprindo ao trabalhador alegar e fazer prova de que reclamou formação mas sim ao empregador que deve cumprir o que está legalmente estipulado!
4º motivo – Da falta de condições laborais – a password
38ª – Ainda que se diga (e que o Tribunal nisso tenha acreditado), é evidente que uma password que um qualquer funcionário de uma empresa serve para controlo de produtividade.
39ª – Sendo obrigatório o uso de uma password para efetuar vendas, e não dispondo a Autora de uma password válida e em funcionamento, honestamente entendemos que tal circunstância causa, pelo menos, uma sobrecarga ou dificuldade acrescida na execução do trabalho (a acrescer às já apontadas dificuldades/ impossibilidades resultantes da falta de formação) pois que, pelo menos, deveria a Autora interromper constantemente o seu processo de venda para pedir a uma colega, nem sempre presente no local, para lhe abrir o programa informativo que lhe permitiria registar a venda… (de la palice)
40ª – A falta da password foi assumida como responsabilidade da Ré. Como instrumento de trabalho, seria mister que a empresa soubesse que a mesma, porque não usada durante algum tempo seria desativada por razões de segurança, sendo pelo menos negligente que não tenha cuidado de a atualizar a tempo do início do trabalho da Autora no dia 17.4.2015, ou ainda que tenha demorado mais de 30 dias a ver emitida uma nova password (um problema que é de fácil resolução por se tratar de uma simples ativação informática (ainda que em Espanha), isto é, feita à distância de um “clique”!)
5º motivo – Da falta de condições de saúde no trabalho e para o trabalho
41ª – Como já referido supra, dos factos 9 a 15, 23-A e 58, 86, 29-A, 31, 32 e 82 ou ainda os factos a., b., c., d., e. e m., o desgaste emocional e físico sentido pela Autora com todos os apontados comportamentos da Ré foi até a circunstância que mais sopesou na difícil decisão da Autora de por fim ao seu contrato de trabalho.
42ª – Da análise de toda essa factualidade é notória a existência de um conjunto de comportamentos inaceitáveis por parte da Ré que, conjuntamente (uns com maior e outros com menor peso), exerceram uma pressão psicológica intolerável sobre a trabalhadora – Autora (lactante) assim lhe causando um ressurgimento ou, no mínimo, um agravamento do seu estado de saúde, o qual “estalou” precisamente no dia anterior àquele em que seria forçada a faltar por não ter a quem deixar a sua filha recém-nascida, facto que lhe causara grande ansiedade e stress e que assim despoletou e fez ressurgir a sua Depressão Reactiva antes diagnosticada.
43ª – A Ré sabia perfeitamente da situação de saúde da Autora e saberia que esta iria “quebrar” perante a pressão por si exercida em tantos comportamentos (os 4 vindos de analisar), criando, conscientemente, uma –“falta culposa de condições de … saúde no trabalho” (394º/2/d) CT) sendo certo que a existência de pressão psicológica abusiva é precisamente um caso de violação de condições de saúde no e para o trabalho.
44ª - Em suma, em vez de facilitar a conciliação da atividade profissional com a vida familiar, a Ré conduziu conscientemente à doença psiquiátrica (seu ressurgimento) da Autora, como seria previsível que sucedesse…
C - DA INEXISTÊNCIA DE FUNDAMENTO PARA A INDEMNIZAÇÃO DOS ARTºSº 399º A 401º CT
45ª - Não teve o Tribunal razão em condenar a Autora a pagar a indemnização pela falta de aviso prévio na sua demissão e aqui – salientamos – mesmo que nenhuma razão a Autora tivesse quanto à validade das causas de demissão que invocou em sua carta de demissão.
46ª - É evidente que a indemnização dos artigos 399º a 401º CT existe com um simples e evidente objetivo: o de compensar o empregador pelas contingências de ter que, apressadamente, encontrar um substituto para o trabalhador que “deserta” sem qualquer justificação aparente ou válida.
47ª – Tal indemnização não é automática antes necessitando de uma, ainda que simples, verificação judicial para que se assegure que a aplicação da norma não sai deturpada ou enviesada em relação ao espírito de quem a criou.
48ª – Sendo que, in casu, a situação é diferente da hipótese prevista pelo legislador e que este quis regular pois que a Autora não “desertou” a empresa, mesmo que não validados fossem os seus motivos de demissão: Na verdade, encontrava-se doente, de baixa médica quando enviou a sua carta de demissão de 20.7.2015 (facto 23)
49ª - Atentando para o facto provado 86, a recuperação da Autora, iniciada após a sua desvinculação da Ré, só veio a completar-se passado um ano ou, pelo menos, depois do 2º atestado de 28.12.2015, isto é, a Autora, tendo enviado a carta de demissão em 20.7.2015, não iria voltar a trabalhar na empresa Ré pelo menos antes de Dezembro de 2015, isto é, nunca antes de volvidos 5 meses (pelo menos), ou seja, bem mais do que os 60 dias determinados por Lei para o aviso prévio.
50ª - Falece razão à Ré ao requerer tal indemnização pois que, concretamente, e porque verificados os acontecimentos, não iria mais a Ré voltar ao serviço em 2015, sendo que, bem vistas as coisas, bem a Ré poderia ter até agradecido à atitude da Autora pois que, se esta se mantivesse vinculada à Ré, teria esta que aguardar mais de 5 meses antes de saber se a Autora iria ou não regressar e contratar nova funcionária ou não…
51ª - … existindo ainda um nítido abuso de Direito caso a Ré, depois da atuação vinda de descrever, ainda se locupletasse e enriquecesse à custa da Autora, sem que nos 60 dias após a carta esta pudesse trabalhar em virtude da sua doença.
Assim decidindo, violou o Tribunal “a quo”, entre outros, os artos 23º a 25º, 57º a 61º CT, 127º, 394º, e 399º a 401º do Código de Trabalho
Nestes termos e nos melhores de Direito que Vª/s Exª/s doutamente suprirá/ão, deve este douto Tribunal “ad quem” revogar o despacho de 23.11.2016 e ainda Sentença final, substituindo-os por outros que, pelos motivos supra,:
- deêm completo deferimento ao peticionado pela Autora (validação da sua justa causa de demissão de 20.7.2015, condenando a Ré no pagamento da indemnização correspondente)
- e/ou declare improcedente a pretensão indemnizatória da Ré, anulando-se tal condenação da A.
Tudo, por ser conforme ao Direito e à Justiça!”

2.1. Contra-alegou a Ré, apresentando as conclusões que se seguem:
“1 – Não tendo a A., ora Recorrente, logrado fazer a prova que lhe competia, da análise crítica e ponderada da globalidade da prova (documental e testemunhal) aliada às regras da experiência comum, necessariamente que se devem manter como provados e nos exactos termos em que o foram, todos os factos que resultaram provados na Sentença Recorrida.
2 – Não tendo a A., ora Recorrente, logrado produzir a prova que lhe competia, da análise crítica e ponderada da globalidade da prova (documental e testemunhal) aliada às regras da experiência comum, devem manter-se como não provados, nos exactos termos em que o foram, todos os factos que resultaram não provados na Decisão ora Recorrida.
3 – Os fundamentos, quer de facto, quer de direito, invocados pelo Meretíssimo Juiz “a quo” na Decisão Recorrida não contém qualquer interpretação errada dos factos e muito menos conduziram a errada não verificação das cinco (?) aludidas causas de demissão alegadas pela trabalhadora.
4 – Os fundamentos, quer de facto, quer de direito, invocados pelo Meretíssimo Juíz “a quo” na Decisão Recorrida constituem fundamento para a indemnização prevista no artigo 399º e 401º do Código do Trabalho.
5 – Ao decidir como fez na Sentença Recorrida o Meretíssimo Juíz “a quo” não violou o disposto nos artigos 23º a 25º, 57º a 61º, 127º, 384º e 399º a 401º do Código do Trabalho.
6 – Inexiste, assim, erro na valoração da prova e/ou contradição entre a matéria de facto que resultou provada na instância e a decisão proferida.
7 – O Meretíssimo Juiz “ a quo” interpretou e aplicou correctamente a lei à factualidade alegada e provada na instância onde sobe o presente Recurso.
8 – Deve, assim, como se impõe e requer, julgar-se improcedente o presente Recurso e, em consequência, manter-se o Despacho de 23-11-2016 e a Sentença Final recorridos, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.”

3. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer (fls. 294/7) no sentido: da rejeição parcial do recurso quanto à matéria de facto, por falta de cumprimento do disposto no artigo 640.º, n.º 1, al. b), e 2, al. a), do CPC, assim quanto aos pontos 86.º, 34.º e 77.º, e alíneas a), b), c), d) e e) dos factos não provados, e da sua improcedência quanto ao mais (de facto e direito).

*
II – Questões prévias:
1. Da pretendida reapreciação da matéria de facto.
Sustenta a Exma. Procuradora-Geral da República, no seu parecer, que o recurso deve ser rejeitado em parte quanto à matéria de facto, assim quanto aos pontos 86.º, 34.º, 54.º, 77.º dos factos provados, e alíneas a), b), c), d) e e) dos factos não provados, por falta de cumprimento do disposto no artigo 640.º, n.º 1, al. b), e 2, al. a), do Código de Processo Civil (CPC), pois que, para além de prova documental, a Recorrente indica apenas excertos dos depoimentos de testemunhas (D..., F..., G..., I... e J...) sem indicar, porém, muito menos com exatidão, as passagens da gravação em que funda a impugnação.
Apreciando:
Dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do CPC, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente.
Nestes casos, deve porém o recorrente observar o ónus de impugnação previsto no artigo 640.º, no qual se dispõe:
“1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.».
Nas palavras de Abrantes Geraldes, “(…) a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”[1]. Contudo, como também sublinha o mesmo autor, “(..) a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”[2].
Tendo por base os supra citados dispositivos legais, teremos de considerar que a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[3] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão dada, exigindo antes da parte que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos, sem limitar porém o segundo grau de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção – não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem pois que no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova, artigo 607.º, nº 5 do CPC[4].
Do exposto resulta, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação que se analisa, não se satisfazendo como se disse com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido, impõe que o mesmo concretize quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especifique quais as provas produzidas que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, sendo que, quando esse for o meio de prova, se torna também necessário que indique “com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição”.
Discorrendo sobre a matéria, escreve-se no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Outubro de 2016[5] que, “Como resulta claro do art. 640º nº 1 do CPCivil, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto.”
Observa-se também no Acórdão do mesmo Tribunal de 7 de julho de 2016[6] o seguinte: “(…) para que a Relação possa apreciar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, tem o recorrente que satisfazer os ónus que lhe são impostos pelo artigo 640º, nº 1 do CPC, tendo assim que indicar: os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, conforme prescreve a alínea a); os concretos meios de prova que impõem decisão diversa, conforme prescrito na alínea b); e qual a decisão a proferir sobre as questões de facto que são impugnadas, conforme lhe impõe a alínea c).”[7].
Aplicando tais critérios ao caso, constata-se, desde logo, quanto à alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º supra citada, que a Recorrente, no que se refere à prova gravada em que faz assentar a sua discordância, para além da referência que faz nas suas conclusões, nem sempre indica com exatidão, sequer no corpo das alegações, por referência aos depoimentos em que suporta a sua pretensão, a localização das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, com ainda, sem prejuízo, procedendo à transcrição dos excertos que considere relevantes, como o exige a alínea a) do n.º 2 do citado artigo 640.º.
Tal ocorre quanto aos seguintes pontos: 86 provado (não identifica por referência ao registo da gravação, quanto à testemunha que indica, qualquer passagem, limitando-se a remeter para o que se referiu no despacho sobre a matéria de facto); 29-A que pretende que seja aditado (não indica, no registo da gravação, a localização de passagens quanto à testemunha, limitando-se a remeter para o que constará do despacho sobre a matéria de facto); 35 provado (não identifica por referência ao registo da gravação, quanto à testemunha que indica, qualquer passagem, limitando-se a remeter para o que se referiu no despacho sobre a matéria de facto); alíneas a), c) e d) dadas como não provadas (apenas indica, no corpo das alegações, localização de passagem da testemunha D..., mas já não das demais testemunhas). Porque assim ocorre, quanto a tais pontos, sem prejuízo de exclusão da sua análise por outra razão – nos termos a analisar infra –, para a sua apreciação não relevarão tais depoimentos em relação aos quais não foi dado cumprimento ao ónus legal estabelecido na alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º.
Mas, para além do que se referiu anteriormente, também se constata que a Recorrente não cumpriu, assim quanto aos factos provados 86, 54, 77 e 79, que impugna, pretendendo a respetiva alteração, o ónus estabelecido na alínea c) do n.º 1 do mesmo normativo, pois que não indicou, como aí se postula sob pena de não admissão do recurso, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Porque assim é rejeita-se a apreciação do recurso quanto a tais pontos.
Pretende ainda a Recorrente (conclusões 5.ª e 6.ª) que seja aditado um novo ponto à factualidade provada, com o n.º 29-A, com a redação seguinte: “A Autora estava escalada para trabalhar aos fins de semana e, concretamente, no dia 23.5.2015, sábado, precisamente o dia anterior à data da última baixa da A.: 22.5.2015.”
Mais, sustenta (conclusões 7.ª a 9.ª), dever ser aditado um novo facto (Facto 34-A), com a redação seguinte: “A C... é uma conhecida empresa de venda de artigos de puericultura que estão sujeitos a frequentes alterações relacionadas com o funcionalismo dos produtos, as suas características, as normas de segurança, entre outras, e em que o funcionário destacado para os vender deve prestar um atendimento personalizado e deter conhecimentos especializados e conhecer previamente tais dados para esclarecer cabalmente o cliente”.
Acontece, porém, que não refere sequer que tal matéria tenha sido por si expressamente alegada, assim nos articulados, sendo que nem nós encontrámos tal alegação.
Porque assim é, debruçando-nos sobre a pretensão da Apelante, há que fazer referência, mesmo face ao regime processual civil, aos poderes atribuídos ao juiz no processo laboral face ao que resulta do artigo 72.º do CPT – que incluem os emergentes da regra geral do aludido artigo 5.º do CPC e permitem ao juiz atender aos factos essenciais ou instrumentais que resultam da discussão da causa, mesmo que não tenham sido articulados.
Dispõe o citado artigo 72.º do CPT, na parte relevante para a apreciação, o seguinte:
“1 - Se no decurso da produção da prova surgirem factos que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória ou, não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto, desde que sobre eles tenha incidido discussão.
2 - Se for ampliada a base instrutória nos termos do número anterior, podem as partes indicar as respectivas provas, respeitando os limites estabelecidos para a prova testemunhal; as provas são requeridas imediatamente ou, em caso de reconhecida impossibilidade, no prazo de cinco dias. (...)”.
Ora, não fazendo a Recorrente apelo como se disse a facto que diga ter alegado nos articulados, enquanto facto novo, para poder ser atendido seria necessário que o Tribunal a quo tivesse usado da faculdade prevista no citado n.º 1 do artigo 72.º do CPT, se porventura os considerasse relevantes para a boa decisão da causa.
E não foi esse o caso, como decorre dos autos, não tendo pois o Tribunal a quo feito uso do citado preceito legal, sendo que, acrescente-se, nem sequer tal questão foi levantada pelas partes, pelo que não compete a este Tribunal, aqui e agora, em sede de recurso, tomar esse facto em consideração, e deste modo, dar o mesmo por provado, sob pena de violação do princípio do contraditório (nº 2 do citado artigo) – só ao Tribunal a quo, no uso do poder/dever conferido pelo aludido artigo 72º do CPT, tendo ocorrido discussão sobre a mesma, se fosse esse o caso, competia considerar provada tal factualidade[8]. O mesmo afirmámos em recente Acórdão, de 16 de Janeiro de 2017, cujo sumário, nesta parte é o seguinte: «Os poderes atribuídos no n.º 1 do artigo 72.º do CPT quanto à consideração dos factos não alegados pelas partes são exclusivos do julgamento em 1.ª instância, tendo ocorrido discussão sobre esses factos, não competindo ao tribunal de recurso tomar esses em consideração, e deste modo, dar os mesmos por provados, sob pena de violação do princípio do contraditório (nº 2 do mesmo artigo).»[9]
Deste modo, não se conhecerá do recurso nesta parte.
Nos termos expostos, o recurso é rejeitado quanto aos pontos 86, 54, 77 e 79, não se conhecendo ainda quanto à pretendida adição dos pontos 29-A e 34-A, sendo que, por sua vez, quanto aos pontos 35 provado, alíneas a), c) e d) dadas como não provadas, na respetiva apreciação não relevarão os depoimentos em relação aos quais não foi dado cumprimento ao ónus legal estabelecido na alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º – quanto a estes últimos, o recurso será pois apreciado com a limitação de não ter sido cumprido o aludido ónus, atendendo-se apenas à demais prova expressamente indicada, com as consequências que daí decorrem para a sua apreciação, nos termos infra afirmados.
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Corridos os vistos legais, nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir.
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III – Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do CPC – aplicável “ex vi” do artigo 87º/1 do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: (1.) Reapreciação da matéria de facto; (2) O Direito do caso: (2.1.1) Enquadramento; (2.1.2) O caso que se aprecia: (2.1.2.1) Da invocada violação dos direitos de proteção à parentalidade e do tratamento discriminatório laboral; (2.1.2.2) Da falta de formação e de condições laborais/a password; (2.1.2.3) Da falta de condições de saúde no trabalho e para o trabalho; (2.2) Da indemnização a que aludem os artigos 399.º a 401.º do CT/do abuso de direito.
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IV – Fundamentação
A. De facto
A.1. Discutida a causa foram considerados como factos provados os seguintes:
1. Por contrato de trabalho de 28.09.1998 a A. foi admitida ao serviço da Ré.
2. A A. sempre manteve relações cordatas com os colegas de trabalho e com a entidade patronal.
3. Durante vários anos a A. foi inclusivamente “vendedora diplomada” com reconhecido valor na área comercial da empresa, tendo desempenhado funções de formadora de outras operadoras de loja em benefício da Ré.
4. Não fosse a resolução do contrato, a A. iria ser recomendada para ser classificada como “vendedora transversal” tal era a sua flexibilidade, motivação e conhecimentos técnicos que possuía.
5. Em virtude de um estado depressivo diagnosticado em Julho/2013 (“reacção depressiva prolongada”), a A. foi forçada a suspender a sua prestação laboral (baixa médica) o que se prolongou com tal motivo pelo menos até 05-10-2014, data em que foi hospitalizada na sequência de complicação de final de parto (sendo que a gravidez da A. era já antes considerada como “de risco”), conforme documentos de fls. 9 e 50 a 60 vº.
6. Depois de tal hospitalização de 17 dias, que culminou no parto da sua filha (M...), em 20.10.2014, a A. esteve depois de licença de maternidade entre 21.Out.2014 e 18.Março.2015, conforme documentos de fls. 61 e 62.
7. Esteve no gozo de férias desde o dia 19-03-2015 a 16-04-2015, conforme documentos de fls. 62.
8. A A. reiniciou o seu trabalho no dia 17.4.2015, depois do período de férias.
9. Antes de voltar para o trabalho, e com vista à conciliação da vida laboral à sua nova vida familiar, a A. enviou em 20 março de 2015 carta à Ré requerendo:
a. dispensa para amamentação, de duas horas, entre as 17h e as 19h.
b. dispensa à dispensa de prestação de trabalho no período noturno (pedindo que a prestação de trabalho ocorresse sempre no turno entre as 10h e as 19h)
c. e ainda um regime de trabalho flexível, designadamente o gozo de folgas ao Sábado e Domingo (ou, pelo menos, uma folga sempre ao Sábado, atento o trabalho inadiável do outro progenitor prestado nesse dia na respetiva empresa), conforme documento de fls. 9 vº e 10.
10. Em data concretamente não determinada, mas que ocorreu, no máximo, até ao dia 07 de Abril de 2015, a R. respondeu à carta da A., referindo que:
- não levanta objeção à dispensa para amamentação, definindo que essa dispensa deveria ser repartida em dois períodos distintos, de uma hora cada, a definir dentro do horário de trabalho que fosse fixado enquanto perdurasse a amamentação.
- no que diz respeito ao pedido de dispensa de trabalho noturno, e uma vez que a A. não juntou qualquer atestado que certificasse que essa dispensa era necessária para a sua saúde ou para a da criança, disse ficar a aguardar o envio do mencionado atestado por forma a poder avaliar da necessidade dessa dispensa.
- quanto às folgas fixas solicitadas, informou não ser possível a sua atribuição porque era colocado em causa o funcionamento regular do próprio estabelecimento considerando, igualmente, que o pedido de folgas fixas não se compreende dentro do pedido de horário flexível que a trabalhadora solicitava.
- por forma a que fosse possível estabelecer um horário de trabalho que fosse compatível com as responsabilidades familiares da A. e com o próprio funcionamento do estabelecimento, a R. solicitou à A. que lhe indicasse quais os períodos para amamentação que pretendia cumprir e, por outro lado, que lhe remetesse atestado médico que certificasse que a dispensa de prestar trabalho entre as 22horas de um dia e as 07horas do dia seguinte era necessária para a sua saúde ou para a da criança, conforme documento de fls. 74 e 75.
11. Por carta de 8.4.2015, a A. enviou novo requerimento à Ré no qual reiterou os pedidos formulados de dispensa de trabalho noturno e da dispensa de trabalho aos sábados, indicando sobre a dispensa de amamentação o horário que pretendia cumprir para a execução da mesma (no horário das 10 às 19h os hiatos entre as 10 e as 11h e entre as 18h e as 19h), conforme documento de fls. 11 e 12.
12. No dia 10 de Abril de 2015, a R. respondeu à A. referindo, além do mais, o seguinte:
Acusamos a recepção da sua carta de 08 de Abril de 2015, que agradecemos, e à qual passamos a responder.
Da declaração médica junta por V.Exa., constata-se que a sua filha já não é alimentada em exclusivo com leite materno, não obstante referir que as refeições ao fim do dia deverão ser o aleitamento materno. Na referida declaração médica nada é referido quanto à necessidade de dispensa de prestação de trabalho noturno por motivos de saúde de V.Exa. ou da sua filha.
Do exposto resulta que se mantém a possibilidade de V.Exa. de, durante o período que perdurar a amamentação, realizar ambos os turnos praticados no estabelecimento. Assim, e no horário das 10h00 às 19h00, não temos qualquer objecção a que cumpra com os períodos de amamentação entre as 10h00 e as 11h00 e entre as 18h00 e as 19h00.
No turno que se inicia às 15h00 deverá acordar com a directora da loja os períodos de amamentação que considerar mais oportunos para a sua filha.
Atendendo a tudo quanto anteriormente se expôs, e à própria documentação apresentada por V.Exa., entendemos não existir qualquer fundamento para que V.Exa. tenha o direito à dispensa da prestação de trabalho no período noturno.
Do pedido de folga de trabalho aos Sábados
Conforme é do conhecimento de V.Exa., no estabelecimento da C... onde presta serviço já existe uma colega de trabalho com horário fixo, que foi elaborado em virtude do marido dessa sua colega se encontrar ausente no estrangeiro por motivos profissionais. A C... procurará acordar um horário de trabalho com V.Exa. que não só salvaguarde os direitos que lhe estão atribuídos por lei mas, também, que assegure o funcionamento do próprio estabelecimento bem como os direitos das restantes trabalhadoras. Tratando-se, como se trata, de um estabelecimento que se encontra instalado num Centro Comercial, é obvio que existe uma manifesta impossibilidade de atribuir a todas as trabalhadoras folgas fixas, sob pena de existirem dias em que no mencionado estabelecimento não estejam os recursos humanos necessários para a execução da actividade comercial da C.... No entanto, e com enorme esforço, a C... está na disposição de procurar acordar com V.Exa., e durante o período em que durar a amamentação, a folga em dois Sábados por cada mês, devendo V.Exa., se assim o entender, procurar que o seu marido consiga, junto da sua entidade patronal, uma idêntica alteração do horário de trabalho.
Salientamos que se trata de um pedido que estamos dispostos a conceder parcialmente, não obstante não existir norma legal que lhe atribua esse direito. Certamente compreenderá que a C... tem inúmeras trabalhadoras que são mães e que, por isso, se vêem confrontadas com os mesmos problemas de V.Exa., socorrendo-se, naturalmente, não só da ajuda do outro progenitor como, de familiares ou até de terceiros.”, conforme documento de fls. 77 vº e 79.
13. Com data de 16 de Abril de 2015, rececionada pela R. em 23 de Abril de 2015, a A. respondeu à anterior missiva da R. (juntando atestado médico) e insistindo para que lhe fosse concedida a dispensa de trabalho noturno e a dispensa aos sábados, informando que iria requerer um parecer à Comissão Para a Igualdade no Trabalho e no Emprego sobre o assunto, conforme documento de fls. 80 e 81.
14. Com data de 04 de Maio de 2015, a R. respondeu à carta da A. datada de 16 de Abril de 2015, na qual a R. informou ser sua intenção recusar o pedido de dispensa de prestação de trabalho noturno, bem como a dispensa de trabalho aos Sábados pelos seguintes motivos e fundamentos:
1 – Pedido de dispensa de trabalho noturno
As declarações médicas subscritas pelo Exmo. Sr. Dr. N..., designadamente datadas de 06 de Abril e 15 de Abril de 2015, em nenhum momento referem a necessidade de dispensa de prestação de trabalho noturno entre as 20h00 de um dia e as 07h00 do dia seguinte, por razões inerentes à sua saúde ou à da sua filha, durante o tempo que perdurar a amamentação.
A primeira dessas declarações refere o seguinte:
“… que a B... faz aleitamento materno à filha M..., nascida a 20 de Outubro de 2014, à excepção de refeição de papa e sopa de legumes no período laboral, por vezes complementada com papa de fruta, no horário do fim da tarde, se a mãe estiver ainda em período laboral, e não tem indicações médicas para usar leite artificial em biberão.
Por tal motivo as refeições ao fim do dia deverão ser o aleitamento materno… “
Por sua vez, a declaração médica datada de 15 de Abril de 2015 refere que “… B... deve aleitar a filha M..., nascida a 20 de Outubro de 2014, uma vez que o aleitamento materno é um bem necessário para a M... e também para a saúde da mãe, B..., enquanto esta estiver galáctia.”
A C... desde logo concedeu a V.Exa. o direito a dois períodos distintos de dispensa diária para amamentação, razão pela qual não impediu nem poderia impedir V.Exa. de amamentar a sua filha.
Nenhuma das declarações médicas atrás referidas refere, sequer, a necessidade de qualquer dispensa de trabalho noturno por parte de V.Exa. por questões da sua saúde ou da sua filha. Pelo contrário, refere, tão só, que o aleitamento materno é um bem necessário para a M... e também para a saúde da mãe, sendo certo que este aleitamento materno está garantido com as dispensas atrás referidas.
2 – No que diz respeito à folga fixa aos Sábados damos aqui por integralmente reproduzido tudo quanto expusemos a V.Exa. sobre essa matéria no ponto 3 da nossa carta datada 10 de Abril de 2015 e onde, já com enorme esforço, a C... se predispôs a acordar com V.Exa., e durante o período em que durasse a amamentação, a folga em dois Sábados por cada mês. Salientamos, aliás, que se trata de um pedido que estamos dispostos a conceder parcialmente, não obstante não existir norma legal que lhe atribua esse direito. Certamente compreenderá que a C... tem inúmeras trabalhadoras que são mães e que, por isso, se vêem confrontadas com os mesmos problemas de V.Exa. socorrendose, naturalmente, não só da ajuda do outro progenitor como, de familiares ou até de terceiros.
Perante o exposto, cumpre-nos informar que é nossa intenção recusar o pedido de V.Exa. à dispensa de trabalho noturno e que concedemos, parcialmente, embora não constitua um direito legal, o direito a duas folgas ao Sábado por mês enquanto perdurar a amamentação.
Mais informamos que aguardamos, no prazo de cinco dias, que V.Exa., caso pretenda, apresente a sua apreciação por escrito.
Por último, comunicamos a V.Exa. que decorrido esse prazo de cinco dias, iremos apresentar todo o processo para apreciação à entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, com cópia do pedido, do fundamento da intenção de o recusar e da apreciação efectuada por V.Exa., caso entenda efectuá-la”, conforme documento de fls. 81 vº e 82.
15. Por carta de 14 de Maio de 2015, rececionada a 19 de Maio de 2015, a A. respondeu à anterior missiva da R., referindo que:
Em relação ao teor da mesma cumpre-me dizer que, com o devido respeito, não concordo com a interpretação de V.Exas. relativamente às duas questões em apreço: a dispensa de trabalho noturno enquanto durar a amamentação e a dispensa de trabalho aos Sábados, agradecendo desde já a aceitação parcial deste meu direito que V.Exas. concedem.
Assim, tendo em conta as posições antagónicas, concordo com a sugestão de V.Exas. em remeter este assunto para apreciação da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, acompanhado de cópias de todas as missivas entre nós trocadas e toda a documentação por mim junta, solicitando a minha audição por essa mesma comissão, por forma a poder explanar o meu ponto de vista…”, conforme documento de fls. 83.
16. No dia 20 de Maio de 2015, o advogado da ré, mandatado para o efeito, solicitou à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego o pedido de parecer nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 57º, nº.5 do Código do Trabalho, conforme documento de fls. 86 a 90.
17. O pedido de parecer foi remetido à referida Comissão através de carta registada com aviso de recepção, e rececionado pela mesma Comissão no dia 21 de Maio de 2015, conforme documentos de fls. 86 vº e 87.
18. Nos termos do mencionado Parecer a CITE deliberou que se deveria considerar o horário aceite nos precisos termos em que foi requerido pela A., emitindo parecer desfavorável quanto à intenção de recusa do pedido de prestação de trabalho em regime de horário flexível pela R., conforme documento de fls. 16 vº a 18.
19. A CITE reconhece no seu Parecer que “… o processo contém outros pedidos da trabalhadora referentes à dispensa para amamentação regulada pelo artigo 47º e a dispensa de trabalho no período noturno (entre as 20 horas de um dia e as 07 horas do dia seguinte) enquanto dura a amamentação, regulado no artigo 60º, ambos do Código do Trabalho, que, evidentemente, estão fora do âmbito do presente processo pedido de parecer prévio à CITE em caso de intenção de recusa de horário flexível, nos termos dos artigos 56º e 57º do Código do Trabalho”, conforme documento de fls. 16 vº a 18.
20. Em 18 de Junho de 2015, a CITE remeteu o Parecer para o advogado da ré e para a A., parecer esse que foi aprovado pela totalidade dos membros presentes na reunião da CITE de 17 de Junho de 2015.
21. Só em 23.06.2015, a A. recebeu o parecer da CITE.
22. A A. esteve de baixa para assistência a filho no período de 28-04-2015 a 10-05-2015, conforme documentos de fls. 63 e 64.
23. E esteve de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2017, conforme documentos de fls. 67 e 68, não mais tendo comparecido ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato).
24. À data em que foi proferido o Parecer da CITE (18-06-2015) e nas datas da sua notificação à A. e R. (respetivamente 23 e 19-06-2015) a A. encontrava-se de baixa.
25. Entre o dia 09-07-2013 a 21-07-2015, a A. apenas prestou a sua actividade para a R. no período de 17-04-2015 a 27-04-2015 e no período de 11-05-2015 a 21-05-2015.
26. No período de 17-04-2015 a 27-04-2015 a A. sempre prestou a sua actividade para a R. no horário das 10h00m às 19h00m, com pausa entre as 15h00m e as 16h00m, mas entrando sempre às 11h00m e saindo às 18h00m, no exercício das dispensas para amamentação/aleitação, conforme documentos de fls. 69.
26-A. Ainda no referido período do mês de Abril de 2015, a A. teve as suas folgas nos dias 18 e 19 de Abril (Sábado e Domingo), 21 de Abril (Terça-Feira), e 25 de Abril (Sábado), conforme documentos de fls. 69.
27. No período de 11-05-2015 a 21-05-2015 a A. sempre prestou a sua actividade para a R. no horário das 10h00m às 19h00m, com intervalo entre as 15h00m e as 16h00m, mas entrando sempre às 11h00m e saindo às 18h00m, no exercício das dispensas para a amamentação que tinha solicitado, conforme documentos de fls. 69 vº.
28. Nesse período de 11-05-2015 a 21-05-2015, a A. teve as suas folgas nos dias 13 e 16 (respetivamente Quarta-Feira e Sábado), conforme documentos de fls. 69 vº.
29. Seja no período em que trabalhou no mês de Abril, seja no período em que trabalhou no mês de Maio, a A. nunca prestou trabalho aos Sábados mas, tão só, nos Domingos de 26 de Abril de 2015 e 17 de Maio de 2015.
30. Desde 09-07-2013 a 21-07-2015 (data em que a R. rececionou a carta de resolução do contrato), a A. apenas prestou para a R. 16 (dezasseis) dias de trabalho efetivo.
31. O estado de saúde depressivo da A. agravou-se após o regresso ao trabalho, passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação.
32. Em virtude de tal agravamento, a A. voltou à baixa médica em 22.5.2015, assim voltando a suspender a sua prestação laboral.
33. Após ter regressado ao serviço não lhe foi ministrada formação de artigos.
34. A A. viu-se confrontada com artigos e produtos que apresentavam algumas inovações.
35. O marido da A. trabalhava às sextas-feiras à noite.
36. Após a notificação do parecer da CITE não mais a A. recebeu qualquer comunicação da Ré sobre o pedido de flexibilidade do horário de trabalho.
37. A R. não apresenta lucros há, pelos menos, cinco anos.
38. A A. era vendedora diplomada na R. uma vez que realizou cursos de vendas ministrados por esta que lhe atribuíram o mencionado diploma.
39. É comum na R. as vendedoras mais antigas, como era o caso da A., darem formação ou prestarem ensinamentos às operadoras de loja mais novas.
40. A A. foi recomendada para ser classificada como vendedora transversal – pessoa capacitada para vender em qualquer departamento – precisamente pelos conhecimentos técnicos que possuía por trabalhar na R. há muitos anos.
41. Em Março de 2013, antes da A. ficar incapacitada temporariamente para o trabalho, a R. prontamente acedeu a um pedido daquela para transferência do local de trabalho do O... para o Centro Comercial P..., pedido esse que fez com fundamento no facto de pretender permanecer mais perto do local onde o seu filho estaria, conforme documentos de fls. 70.
42. No mês de Abril de 2013, a A. anulou o mencionado pedido de transferência e agradeceu à R. a disponibilidade que tinha sido demonstrada ao facilitar o seu pedido, conforme documentos de fls. 71.
43. A Sra. S... não solicitou nem tem nenhum estatuto de horário especial na R..
44. A Sra. S... é encarregada do armazém e tem um horário entre as 9h00m e as 17h00m, de Segunda a Sexta-Feira, dias em que a R. recebe os camiões com mercadoria.
45. A Sra. S... tem como folgas o Sábado e o Domingo por não existirem entregas de mercadorias no fim-de-semana.
46. Em 2014, a trabalhadora L... pediu à C... um horário especial (10h–19h e folgas ao fim de semana) pelo facto do marido se ter visto forçado a ir trabalhar para o estrangeiro, designadamente para Angola, e a mencionada trabalhadora não ter qualquer tipo de apoio para prestar assistência aos seus filhos.
47. Já no ano 2015 a mencionada trabalhadora L... solicitou e foi-lhe concedida uma redução para 30 horas semanais passando a trabalhar em regime de part time, o que permitiu à R. contratar outra trabalhadora para o tempo de trabalho em falta.
48. Quando solicita à empresa um horário especial, a trabalhadora L... apresenta documentos comprovativos em como o seu marido vai trabalhar para Angola.
49. Apenas no período que o marido se encontra ausente é que a mencionada trabalhadora L... dispõe do mencionado horário especial, pelo que, quando o marido se encontra em Portugal, a mencionada trabalhadora faz a escala rotativa normal de horário existente no estabelecimento.
50. A trabalhadora L... não tinha qualquer apoio do marido quando este se encontrava ausente do país.
51. A A. e o marido residem conjuntamente.
52. O sábado é o dia de trabalho mais importante nos estabelecimentos da Ré.
53. A ré tentou acordar com a A. a alternância de folgas ao Sábado com o seu marido.
54. Desde o ano de 2011 a R. encerrou vários estabelecimentos.
55. A R. apresenta prejuízos desde o ano de 2011, tendo vindo a reduzir o número de trabalhadoras que detém no seu quadro para cada estabelecimento.
56. Os estabelecimentos da R. situam-se em centros comerciais que têm períodos de funcionamento alargados, o que implica a existência de três turnos, designadamente das 10h00m às 19h00m, das 12h00 às 21h00m e das 15h00m às 24h00m.
57. No estabelecimento da R. no P..., onde trabalhava a A., existiam 5 (cinco) trabalhadoras em full time (40 horas), 1(uma) trabalhadora em part time (16 horas), 3 (três) trabalhadoras em part time (30 horas) e outras 3(três) trabalhadoras em part time (25 horas).
58. No relatório de psiquiatria datado de 24-07-2015, elaborado pela Dra. Q... é referido que: “… a Sra. D. B... é uma senhora sem antecedentes psiquiátricos prévios até ser cuidadora da mãe com neoplasia, situação que gerou profunda alteração nas suas rotinas diárias para além do impacto psicológico de tal situação. Desenvolve psicopatologia neste contexto apresentando quadro marcado por tristeza, desmotivação, abolia, ideias de desesperança, associados a grande ansiedade. Esteve medicada com fluoxetina 20mg 1+0+0, tendo entretanto engravidado tendo mantido acompanhamento por psiquiatria até ao final da gravidez. Retomou consultas a 22-05- 2015. Nesta altura não estava medicada já que foi suspensa a fluoxetina na fase peri-parto. Nessa consulta em Maio, seis meses após o parto, apresentava recorrência dos sintomas depressivos provavelmente em reacção a eventos da vida adversos, sintomas esses que eram limitantes para o exercício da sua actividade profissional. A doente necessitou de se manter afastada desse ambiente por forma a garantir a boa evolução do quadro clínico. Simultaneamente iniciámos tratamento com sertralina para permitir que se mantivesse a amamentar. Somos de opinião que a doente padece de um quadro clínico compatível com o diagnóstico de reacção depressiva prolongada (ICD-10 F43.21), quadro esse que ainda se encontra em processo de estabilização, factor fundamental para o bem estar da mãe e da lactente”, conforme documento de fls. 9.
59. Quando a A. regressou ao serviço em Maio de 2015, foram acordados entre A. e R. os seguintes objetivos e planos de formação a realizar no ano de 2015:
- Estudar novos produtos e formar a equipa;
- Correcta reposição / pvp;
- Conhecimento da gama e concorrência;
- Acompanhamento semanal dos objectivos;
- Consultar as listagens na intranet;
- Identificar artigos anulados com autocolante em loja e no armazém;
- Estudar os dossiers;
- Formação produto;
- Reuniões mensais.
60.Tal acordo entre A. e R. encontra-se formalizado por escrito, conforme documento de fls. 106 e 107.
61. Ainda no mencionado documento e no ponto “Acordos finais sobre a avaliação efectuada” ficou consignado que “A experiência e vivência da B... são uma mais valia para a equipa mas é necessário actualizar-se face à sua ausência prolongada da C.... Em conjunto traçar metas de formação (reciclagem) e cumpri-las. Não esquecer de consultar o email e intranet”, conforme documento de fls. 106 e 107.
62. Aquando do seu regresso ao serviço a A. teve o apoio da responsável da loja – Sra. E... – bem como das restantes colegas que trabalham naquele estabelecimento.
63. No período em que prestou a sua atividade (Abril e Maio de 2015) não existiram quaisquer reclamações de clientes sobre a atuação da A. nem, tão pouco, alguma vez a R. reclamou de a A. de não estar a exercer convenientemente as suas funções.
64. A password regista informaticamente as vendas e atividade comercial da funcionária.
65. Após o regresso ao serviço da A. verificou-se que a password pessoal que a A. sempre deteve não estava a funcionar corretamente.
66.Tal deveu-se ao longo período de ausência da A..
67.No momento em que se detetou essa situação, a responsável do estabelecimento tentou, juntamente com a A., proceder a uma alteração de password na própria loja.
68. Tal tentativa de alteração de password na própria loja não resultou atento a que toda a gestão das passwords atribuídas às trabalhadoras só pode ser tratada pelo departamento informático da R., em Espanha.
69. Por esse motivo, e logo após ter sido detetada a falha na password da A., a directora do estabelecimento da R. solicitou ao departamento informático da C..., em Espanha, a resolução do problema.
70. Situação essa que ficou resolvida em dia concretamente não apurado do mês de maio de 2015, quando a A. já se encontrava de baixa.
71. A indisponibilidade da password atribuída à A. não a impediu de exercer as suas funções, uma vez que para o registo das operações, e enquanto perdurou esse problema, a A. utilizou a password de outras colegas ou o programa informático aberto pelas colegas.
72. As listas de nascimento são abertas em programas informáticos independentes dos programas de vendas e nem sequer necessitam da password da trabalhadora.
73. Para aceder a tal programa específico de nascimento apenas é necessária a password da loja, programa esse que tem um item onde a trabalhadora coloca o seu número de vendedora.
74. A falha informática que ocorreu com a password da A. não foi intencional, tratando-se de uma situação decorrente do enorme tempo de ausência da A. ao serviço.
75. Nunca a ré responsabilizou a A. por qualquer falha de produtividade ou, sequer, lhe fez qualquer reparo.
76. Durante esse período em que ocorreu a falha na password, algumas colegas da A. no estabelecimento disponibilizaram-lhe a password própria para as operações que aquela teve de realizar.
77.A responsável do estabelecimento e a supervisora nacional estiveram disponíveis para falar com a A..
78. A Sra. F..., como supervisora, tem a seu cargo a supervisão dos 9 (nove) estabelecimentos da R. em Portugal e de 5 (cinco) estabelecimentos da C... em Espanha.
79. A diretora de loja agendou uma reunião com a Autora e a supervisora no decurso do mês de maio de 2015, mas tal reunião veio a ser desmarcada porquanto a supervisora teve de se deslocar a Espanha a fim de diligenciar pelo encerramento dum estabelecimento da ré.
81. Durante o período em que prestou a atividade para a R. a A. foi uma trabalhadora cumpridora dos seus deveres laborais.
82. A A. foi aconselhada por amigos a colocar termo ao contrato de trabalho.
83. A A. resolveu o contrato de trabalho com a R. e com efeitos imediatos, por carta datada de 20 de Julho de 2015, rececionada pela R. em 21 de Julho de 2015, conforme documento de fls. 19 a 21 e cujo teor se dá por reproduzido.
84. Mediante carta datada de 30 de Julho de 2015, a R. respondeu à carta de resolução do contrato de trabalho pela A., conforme documento de fls. 108 a 113.
85. Aquando da cessação do seu contrato de trabalho, a A. auferia o salário base mensal de 698,89€, acrescido de 100,10€ a título de subsídio de refeição.
86. Após a sua desvinculação com a Ré a A. sentiu novamente recuperação de saúde.”
*
Do despacho proferido sobre a matéria de facto fez-se ainda constar o seguinte:
“Não se provaram os seguintes factos:
a. Durante todo este período foi notório o desgaste emocional e físico sentido pela A., causado pela negação dos seus direitos de parentalidade por parte da Ré.
b. A ré ameaçou a A. que a colocaria a trabalhar também em horário noturno a qualquer momento.
c. Tal desgastante incerteza causou enorme ansiedade à A. que se via aflita em procurar alternativas urgentes que pudessem salvaguardar os cuidados da sua filha (mesmo que, depois, a marcação do serviço viesse a ser por vezes alterada).
d. A falta de tal comunicação por parte da ré causou à A. acrescido desgaste emocional e agravou-lhe ainda mais os sintomas depressivos.
e. A A. não estava apta a vender os produtos que apresentavam inovações.
f. Durante o período em que laborou, em abril e maio/2015, por diversas vezes a A. demonstrou ignorância perante clientes sobre produtos, designadamente sobre chassis de carrinhos de bebé (o que ocorreu constantemente entre 17.4.2015 e 22.5.2015) e sobre intercomunicadores (como sucedeu, p. ex., em 27.4.2015).
g. A A. viu-se confrontada com artigos ou produtos ou realidades para as quais não estivesse preparada, fossem eles chassis de carrinhos de bebé, intercomunicadores ou quaisquer outros.
h. A password serve de forma de controle de produtividade do funcionário.
i. Ao não possuir password ficava a A. em situação de inferioridade, vendo-se rebaixada perante a Ré e perante clientes, dando a entender que não estava a produzir nada.
j. A inatividade da password impediu a A. de vender produtos associando o seu nome, tais como listas de nascimento (como sucedeu em 18.5.2015).
k. Nenhuma colega lhe forneceria a sua password em caso de trocas ou devoluções por isso representar uma “perda” de vendas atribuída à/ao titular de tal password.
l. Em 24.4.2015, sem password, a A. não conseguiu efetuar uma troca de um casaco e uns calções, deixando a cliente muito desagradada.
m. Antes de enviar a carta de rescisão, em vão procurou falar com a supervisora da Ré.”
*
B. Discussão
1. Reapreciação da matéria de facto.
1.1. Pontos 10, 12 e 14 da factualidade provada:
Sustenta a Recorrente (conclusão 1.ª) que o Tribunal “a quo” optou por transcrever, como factos provados, as cartas da Ré nos analisados factos mas que de tal transcrição “apenas se poderá dar como provado o envio das mesmas e de qual o seu conteúdo, mas não já da validade ou verdade do mesmo, das afirmações, opiniões ou factos que nelas consta de forma textual, exceto quando tais dados possam comprovar factos contrários ao autor de tais cartas, em confissão extrajudicial (e judicial) da parte.
Apreciando, face ao que consta dos referidos pontos, não se percebe, salvo o devido respeito, como aliás sustenta a Exma. Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer, o fundamento do que se invoca pois que, de resto com facilidade, basta ler o que aí se fez constar para se perceber que o Tribunal a quo se limitou, dentro de uma técnica que não nos merece censura, a dar como provado o envio das cartas enquanto ocorrência da vida real, sendo que, no que se refere ao que consta dessas cartas, ou seja o respetivo conteúdo, este não se assume essa natureza, traduzindo-se apenas na transcrição de uma declaração, com determinado destinatário, independentemente de o seu teor traduzir ou não factos efetivamente verificados.
Carece assim totalmente de fundamento o recurso quanto a esta questão.

1.2. Ponto 23 da factualidade provada:
“23. E esteve de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2017, conforme documentos de fls. 67 e 68, não mais tendo comparecido ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato.”
Sustenta a Recorrente (conclusões 2.ª e 3.ª) que, “porque axial e demonstrado, cumpre completar o facto provado 23 (ou adicionar um novo facto subsequente: 23-A) para que se ateste que a doença que motivou a baixa de 22.5.2015 se tratava de um agravamento de um estado depressivo do qual a trabalhadora se encontrava já recuperada, agravamento esse que ficou a dever-se a fatores laborais adversos, tendo ocorrido quando regressou ao trabalho.
Esclarece-se no corpo das alegações que “seria mister que se dessem como provados os factos alegados nos itens 24 e 25 da petição inicial, os quais se encontram plenamente demonstrados (documentalmente) por um relatório de baixa médica (doc. 40 contestação) e por 2 relatórios médicos, um de 24.7.2015 – doc. de fls. 9 (transcrito no facto provado n.º 58) e outro de 28.12.2015, junto como doc. 8 na Petição inicial e que foi omitido pelo Tribunal.
O aludido ponto 23.º tem a seguinte redação: “23. E esteve de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2017, conforme documentos de fls. 67 e 68, não mais tendo comparecido ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato).”[10]
Por sua vez, dos artigos 24 e 25 da p.i. consta:
“24. Em consequência da pressão, discriminação e da constante e injustificada recusa dos pedidos formulados, o estado de saúde depressivo da A. agravou-se subitamente, logo após o regresso ao trabalho, passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação – doc. 2 e 8
25. Em virtude de tal agravamento, a A. voltou à baixa médica em 22.5.2015, assim voltando a suspender a sua prestação laboral.”
Sustenta ainda na sua conclusão 3.ª que “tal facto será também adequado a estabelecer o nexo que falta entre os factos 31, 58 e 86, sendo que o 31 refere que o estado de saúde depressivo da A. se agravou após o regresso ao trabalho passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação e o 86 refere que após a sua desvinculação com a Ré, a A. sentiu novamente recuperação de saúde.
No seu parecer, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta sustenta que o facto 23.º resulta de acordo das partes, padecendo no entanto de manifesto lapso quanto ao ano (2017) uma vez que, conforme resulta de fls. 67 e 68, o ano em causa é 2015 – cfr art.º 108.º da contestação.
Apreciando, estando em causa o que consta dos artigos 24.º e primeira parte dos artigos 24.º e 25.º da p.i., constata-se que esses comportam, afinal, alegação meramente genérica e conclusiva, não alicerçada em factos, que aí tenham sido alegados, assim particularmente a afirmação de que a invocada agravação decorreu de “pressão, discriminação e da constante e injustificada recusa dos pedidos formulados”.
Por assumir tal natureza, mesmo em sede de recurso, no âmbito dos poderes da Relação no que diz respeito à apreciação da matéria de facto, acentuados com a Reforma de 2013 do CPC (artigo 662.º), não obstante a revogação com a mesma reforma do anterior artigo 646.º, em que se previa que no julgamento da matéria de facto ter-se-ão por não escritas as respostas do tribunal sobre questões de direito – solução que como é entendimento doutrinário e jurisprudencial se aplica, por analogia, às respostas que constituam conclusões de facto, designadamente quando as mesmas têm a virtualidade de, por si só, resolverem questões de direito a que se dirigem[11] –, deve continuar a entender-se, como se afirma entre outros no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Setembro de 2014[12], que, constituindo a possibilidade de eliminação de factos conclusivos equiparados a questões de direito uma prerrogativa dos tribunais superiores de longa tradição doutrinal e jurisprudencial, esta pode ser exercida mesmo que não esteja prevista expressamente na lei processual. Sobre a mesma questão podem ver-se também, de entre outros, os Acórdãos do mesmo Tribunal de 29 de Abril de 2015 e 28 de Janeiro de 2016, como também o recente Acórdão de 15 de setembro de 2016[13], em que se reafirma que, “pese embora não se encontrar no Novo CPC preceito legal que corresponda ao art. 646º, nº 4, do anterior CPC, que impunha, como consequência, para as respostas sobre matéria de direito que as mesmas fossem consideradas “como não escritas”, atualmente o Juiz não fica dispensado de efetuar “o cruzamento entre a matéria de facto e de direito”, evitando formulações genéricas, de cariz conceptual ou de natureza jurídica que definam, por essa via, a aplicação do direito, como acontece quando os referidos conceitos se reportam directamente ao objecto da acção.”
Ao que se referiu acresce, ainda, a circunstância de não podermos deixar de ter presente outros factos provados – assim o 58.º a que alude a Recorrente e que se relaciona com a mesma questão –, para além de que nem sequer encontra, contrariamente ao que se sustenta, real sustentação na prova documental que indica – apenas porque refere ter sido omitido pelo Tribunal a quo, quanto ao doc. 8 junto com a p.i., datado de 28/12/2015, dele apenas consta “agravou o seu estado de doença quando regressou ao trabalho”, não dizendo sequer se foi por causa desse.
Do exposto resulta, pois, concluindo, a improcedência do recurso nesta parte.
Não obstante, como aliás bem sustenta a Exma. Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer, resultando o facto 23.º de acordo das partes – cfr ainda art.º 108.º da contestação –, padece no entanto de manifesto lapso quanto ao ano de “2017” aí indicado, uma vez que, conforme resulta das próprias alegações das partes e ainda claramente de fls. 67 e 68 em que se baseou o Tribunal recorrido, o ano em causa é 2015 – cfr art.º 108.º da contestação.
Daí que, oficiosamente, se altere o analisado ponto, passando o mesmo o ter a redação seguinte:
“23. E esteve de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2015, conforme documentos de fls. 67 e 68, não mais tendo comparecido ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato.”

1.3. Ponto 34 da factualidade provada:
O ponto 24 tem a redação seguinte: “A A. viu-se confrontada com artigos e produtos que apresentavam algumas inovações.”
Invoca a Recorrente (conclusão 7.ª a 9.ª), sobre o facto 34, que o mesmo está em contradição com os factos provados 25 e 61, que atestam que após quase 2 anos de ausência, as mudanças e inovações foram em quase todos os produtos da loja (que inclusivamente foi completamente remodelada), surgindo muitos produtos novos e com especificidades inovadoras, sustentando, assim, apenas poder-se concluir, “como facto 34 que, na verdade, “a A. se viu confrontada com artigos e produtos novos e que apresentavam muitas e importantes inovações, tendo a loja sido alvo de completa remodelação durante a ausência da Autora”.
Quanto a meios de prova para sustentar o que se analisa, refere que tais factos se baseiam no documento, confessório, de fls. 106 e 107 e também dos depoimentos de testemunhas como F..., supervisora da Ré – que declarou que “ inclusivamente a loja até foi… teve uma restruturação” e que “sim. provavelmente. Não é remodelados mas há muitas novidades” –, ou ainda de G... – que declarou que: “a C... tem um apoio por trás que tem a ver com a formação das funcionárias, das vendedoras que é nós precisamos de formação quase mensalmente”- Que: “Não vamos pegar no livro de instruções e estar a ler em frente ao cliente porque isso dá muito mau aspeto (…) portanto se ela disser só pelo livro o cliente chega lá, lê o livro de instruções e vai-se embora. - Ou ainda que: “os produtos estão sempre a ser renovados.” Testª – “sempre. Estão sempre. Até porque a própria homologação o exige. E que quando perguntado se “sempre que chegava um produto vocês tinham formação?” respondeu a testª – “exactamente”.
Cumpre desde já assinalar que sobre tal matéria a Autora alegou apenas na p.i. o seguinte:
“41. Porém, tal formação de artigos não foi ministrada (pese embora as insistências da A.) e, em consequência, a A. viu-se confrontada com artigos, produtos e realidades para as quais deixou de estar preparada.
42. Durante o período em que laborou em Abril e Maio/2015, por diversas vezes demonstrou ignorância perante clientes sobre produtos, designadamente sobre chassis de carrinhos de bébé (o que ocorreu constantemente entre 17.4.2015 e 22.5.2015) e sobre intercomunicadores (como sucedeu, p. ex., em 27.4.2015), sendo que tais produtos eram novos (tinham entrado no mercado após o início da baixa médica).”
Respondendo, nas contra-alegações, a Apelada sustenta inexistir qualquer contradição com os pontos 25 e 61.
Apreciando, concordando nesta parte com a Apelada, não se vislumbra de facto a invocada contradição. É que, como a mesma refere, o que acompanhamos, no facto 34 resultou provado que a A. se viu confrontada com artigos e produtos que apresentavam algumas inovações”, resultando por sua vez do facto 25 “que entre o dia 09-07-2013 a 21-07-2015, a A. apenas prestou a sua actividade para a R. no período de17-04-2015 a 27-04-2015 e no período de 11-05-2015 a 21-05-2015”, sendo que, por último, no facto 61 ficou provado que, no documento, no ponto “Acordos finais sobre a avaliação efectuada” ficou consignado que a experiência e vivência da B... são uma mais valia para a equipa mas é necessário actualizar-se face à sua ausência prolongada da C.... Em conjunto traçar metas de formação (reciclagem) e cumpri-las.” Daí que, salvo o devido respeito, os factos provados em 25 e 61 sejam afinal perfeitamente compatíveis com o facto 34 ao fazer este alusão, precisamente, à circunstância de a Autora se ter visto confrontada com artigos e produtos que apresentavam inovações, como de resto o comprova a prova produzida, assim desde logo as passagens dos depoimentos indicadas quer por Apelante quer por Apelada – depoimentos que, registe-se, ouvimos integralmente –, sendo que, quanto ao mais pretendido na redação proposta, se entende que, para além de não assumir real relevância, a adjetivação pretendida, como ainda a utilizada na resposta dada, precisamente por ter tal natureza, deve ser expurgada, para que a resposta comporte apenas o que é facto.
Deste modo, o analisado ponto passará a ter a seguinte redação:
“34. A A. viu-se confrontada com artigos e produtos que apresentavam inovações.”

1.4. Ponto 35 da factualidade provada:
Tal ponto tem a redação seguinte: “35. O marido da A. trabalhava às sextas-feiras à noite.”
Invoca a Recorrente (conclusão 10.ª) que “O verdadeiro facto 35 é de que: “o marido da Autora trabalha às sextas-feiras a noite e aos sábados de manhã”.
Refere, para tanto, que se trata de evidente lapso já que “o próprio despacho de 23.11.2016 refere, do depoimento de D..., que ”a testemunha chegou a abordar a sua entidade empregadora a fim de aferir da sua dispensa aos sábados, pretensão esta que lhe foi recusada” e que “o doc. anexo à carta de 8.4.2015 (doc. 51 da contestação da Ré) – carta/declaração emitida pela entidade patronal (H..., Lda) do marido da A., D... - atesta que: “Por inerência de funções desempenhadas, todas as sextas-feiras de cada mês o seu horário é prolongado e termina durante a manhã de sábado, previsivelmente entre as 10h00 e as 12h00”.
Na sua resposta, a Apelada refere ser possível que tenha ocorrido um mero lapso de escrita na redação do analisado ponto, mas que, porém, mesmo que tenha ocorrido esse lapso, o facto das funções desempenhadas todas as sextas-feiras de cada mês pelo marido da A. se prolongarem durante a manhã de Sábado, previsivelmente entre as 10h00m e as 12h00m, em nada altera a correta decisão que o Tribunal recorrido tomou sobre a questão em apreço.
Assiste razão à Apelante, face inclusivamente ao que se fez constar do despacho sobre a matéria de facto, o que, como se viu admite a própria Apelada.
Daí que, mas em conformidade com o aludido despacho e elementos de prova que serviram de base à resposta, se imponha que o facto em causa passe a ter a redação seguinte:
“35. O horário do marido da Autora prolonga-se nas sextas-feiras a noite e termina durante a manhã de sábado, entre as 10h00 e as 12h00”.

1.5. Alíneas a), c) e d) dadas como não provadas:
Defende a Recorrente (conclusões 14.ª a 18.ª) que os factos a., c. e d. foram erradamente dados como não provados – (a. “durante todo este período foi notório o desgaste emocional e físico sentido pela A. causado pela negação dos seus direitos de parentalidade por parte da Ré”. c. “Tal desgastante incerteza causou enorme ansiedade à A. que se via aflita em procurar alternativas urgentes que pudessem salvaguardar os cuidados da sua filha (mesmo que, depois, a marcação do serviço viesse a ser por vezes alterada).” d. “A falta de tal comunicação por parte da ré causou à A. acrescido desgaste emocional e agravou-lhe ainda mais os sintomas depressivos.”) – pois que “são a conclusão lógica e axial dos factos provados 9, 10, 11, 12, 13, 14, dos factos 23, 34 e 23-A, 29-A e 34-A (de cuja inclusão se requer) e ainda dos factos 31, 33, 58, 65, 79 (com a redação supra requerida) e 82 entre outros, não se compreendendo a sua exclusão. Mais, diz, “são especialmente evidentes as consequências psicológicas patentes pelo facto da doença depressiva ter renascido logo após o regresso ao trabalho quando passou a necessitar novamente de cuidados médicos e medicamentosos que exigiam o afastamento do meio laboral para que surtissem algum efeito… (melhoria que, comprovadamente – facto 86 – começou a sentir-se após a desvinculação da Autora como trabalhadora da Ré).
Como meios de prova, globalmente para as três alíneas, indica os depoimentos de D... – “marido da A.) o qual, assistindo diariamente aos efeitos psicológicos causados pela falta de resposta ou deferimento da Ré em todas as suas cartas declara que “esta patenteou angústia e nervosismo mercê das respostas da ré, dado não ter existido consenso quanto às pretensões colocadas, pelo que a A. “estava a entrar num ciclo igual” ao verificado há 2 anos atrás e que, “a A. lhe reportou falta de apoio por parte da ré, sentindo-se completamente à parte” –, I... – “Notou também que a A. andava mais ansiosa e alterada, tendo-lhe esta referido que era devido a problemas de trabalho e que não conseguia vir mais cedo buscar a bebé” – e J... –“aconselhou a A. a cessar o contrato de trabalho a fim de não prejudicar a filha”. (facto provado 86)”. Depois, para o facto c), refere que é especificamente demonstrado pelo doc. 7 junto com a PI do qual resulta que a A. deveria trabalhar no sábado, dia 23.5.2015, isto é, precisamente no dia seguinte à sua entrada em baixa médica quando apresentou a recorrência dos sintomas depressivos que estavam já ultrapassados, não nos devendo esquecer que a Ré, nesta altura, confessadamente, não iria alterar qualquer escala de serviço (lembrando as palavras da supervisora da Ré “eu não tinha nada para lhe dizer”).
Indica no corpo das alegações localização, no registo da gravação, de passagem da testemunha D..., não o fazendo porém quanto às demais testemunhas que refere.
Por sua vez, a Apelada sustenta que não assiste razão à Apelante, fazendo apelo ao que, a respeito da relevância (neste caso sua falta) dos depoimentos indicados, fez constar o Tribunal recorrido.
Apreciando, e desde logo, mesmo excluindo o que se fez constar do despacho proferido sobre a matéria de facto a respeito da falta de relevância, em termos de formação de convicção positiva, dos depoimentos indicados pela Apelante – que, de resto, só quanto à testemunha D... cumpriu o ónus de indicar localização no depoimento das passagens –, afirmação que não é afinal infirmada nas alegações e que, diga-se, se nos oferece fundada, o que levaria ao afastamento da pretensão que aqui se analisa, há que ter presente ainda que, afinal, as alíneas indicadas não comportam em geral verdadeiros factos e sim meras referências genéricas, não circunstanciadas em factos expressamente alegados, como ainda conclusões e juízos valorativos, nos termos e com as consequências que, neste âmbito, se afirmaram supra, assim em “1.2.”. De facto, não assumem a natureza de facto, no sentido em que este se impõe que seja considerado, referências genéricas no sentido de que foi “notório o desgaste emocional e físico sentido pela A. causado pela negação dos seus direitos de parentalidade por parte da Ré”, ou que “tal desgastante incerteza causou enorme ansiedade à A. que se via aflita em procurar alternativas urgentes que pudessem salvaguardar os cuidados da sua filha” ou, por último, que “a falta de tal comunicação por parte da ré causou à A. acrescido desgaste emocional e agravou-lhe ainda mais os sintomas depressivos”. Por assumirem pois tal natureza, com as consequências antes afirmadas, sempre se imporia ter por não escritas eventuais respostas do tribunal sobre tais questões.
Improcede, pelo exposto, o recurso nesta parte.

1.6. Alínea b), dada como não provada:
Tal alínea tem a seguinte redação:
“b. A ré ameaçou a A. que a colocaria a trabalhar também em horário noturno a qualquer momento.”
Defende a Recorrente (conclusão 19.ª) que essa alínea “resulta diretamente provado pelas cartas que a Ré enviou à Autora que passaram para os factos 10, 12 e 14, p. ex.: “nada é referido quanto à necessidade de dispensa de prestação de trabalho (…) Do exposto resulta que se mantém a possibilidade de V.Exa. de, durante o período que perdurar a amamentação, realizar ambos os turnos praticados no estabelecimento.(…) Perante o exposto, cumpre-nos informar que é nossa intenção recusar o pedido de V.Exa. à dispensa de trabalho noturno”.
Por sua vez, a Apelada sustenta que não assiste fundamento para o que se pretende.
Pois bem, importando apreciar, e desde logo, constata-se, mais uma vez, que a alínea em causa, ao envolver apenas a questão de saber se o conteúdo das cartas que a Ré enviou à Autora (factos 10, 12 e 14) pode ou não ser considerado como qualquer ameaça da Ré à Autora de que a colocaria a trabalhar também em horário noturno a qualquer momento, assume-se então como mero juízo ou conclusão a retirar dessas cartas, não podendo pois, enquanto tal, ser considerado como facto, pelas razões antes referidas e que não se justifica repetir.
Improcede pois o recurso quanto ao analisado.

1.7. Alíneas e) e m), dadas como não provadas:
Tais alíneas têm a redação seguinte:
“e. A A. não estava apta a vender os produtos que apresentavam inovações.”
“m. Antes de enviar a carta de rescisão, em vão procurou falar com a supervisora da Ré.”
Defende a Recorrente (conclusão 20.ª) que o facto “e.” – de que “A A. não estava apta a vender os produtos que apresentavam inovações” – é a consequência lógica dos factos 33, 34, 34-A (requerido) e 61 e ainda do depoimento esclarecedor das testemunhas (cfr. transcrições supra). E, sobre o facto “m.” – que “Antes de enviar a carta de rescisão, em vão procurou falar com a supervisora da Ré” –, “se não provado, estaria em frontal contradição com o facto 79 e deve, por isso, dar-se como provado”.
Por sua vez, a Apelada sustenta a falta de fundamento do pretendido pela Apelante.
Importando mais uma vez apreciar, não se vendo sequer que a prova indicada permitisse a afirmação que comporta a alínea e), o que se constata quanto a essa é que comporta também uma mera conclusão a retirar de factos, assim porventura os indicados pela Apelante, mas que já constam da factualidade – com exceção do 34-A, cuja adição não foi atendida como se viu anteriormente –, não colhendo assim fundamento, nos termos supra expostos, a sua consideração neste âmbito em que apenas está em causa a matéria de facto.
Por sua vez, agora sobre a alínea “m.”, a verdade é que nem sequer é indicada prova efetiva que suporte a afirmação que essa comporta, não se vendo, dentro da reapreciação que se pede a esta Relação, razão que permita considerá-la como provada, do que decorre, em conformidade, a improcedência da alteração pretendida.

1.8. Por decorrência do anteriormente afirmado, os factos a considerar, limitada a transcrição à parte alterada, passam a ser os seguintes:
“23. E esteve de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2017, conforme documentos de fls. 67 e 68, não mais tendo comparecido ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato.
(…)
34. A A. viu-se confrontada com artigos e produtos que apresentavam inovações.”
35. O horário do marido da Autora prolonga-se nas sextas-feiras a noite e termina durante a manhã de sábado, entre as 10h00 e as 12h00”.

2. O Direito do caso.
2.1. Questão de saber se os factos consubstanciam justa causa para o despedimento por parta da Autora/recorrente.
Para apreciação da questão serão considerados os factos que foram considerados, nesse âmbito, pelo Tribunal a quo, com as alterações decorrentes da reapreciação da matéria de facto, nos termos anteriormente decididos.
A apelante, nas suas conclusões 21.ª a 44.ª, na consideração de que a causa que “justamente” a levou a pedir a demissão é uma causa “composta” (o que diz ter sido esquecido pelo Tribunal a quo), aponta cinco motivos, assim, (1.º) a violação dos direitos de proteção à parentalidade – conclusões 25.ª a 29.ª –, (2.º) o tratamento discriminatório laboral – conclusões 30.ª a 32.ª –, (3.º) a falta de formação – conclusões 33.ª a 37.ª –, (4.º), a falta de condições laborais/a password – conclusões 38.ª a 40.ª – e (5.º) a falta de condições de saúde no trabalho e para o trabalho – conclusões 41.ª a 44.ª.
Nas contra-alegações a Ré sustenta a falência desses argumentos, devendo assim ser mantida a decisão recorrida, no que é acompanhada pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer.

2.1.1. Enquadramento
Não se levantando dúvidas sobre a lei aplicável – assim o regime jurídico estabelecido com a entrada em vigor do Código do Trabalho aprovado pela referida Lei n.º 7/2009 (CT/2009) –, para a análise da questão haverá que fazer-se uma breve abordagem sobre o regime da resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, sem necessidade de aviso prévio com invocação de justa causa, a que alude o artigo 394.º do aludido Código.
Assim, desde logo, partindo do referido preceito legal, a justa causa para a resolução do contrato de trabalho pode ser fundada num comportamento ilícito do empregador ou resultante de circunstâncias objetivas, relacionadas com o trabalhador ou com a prática de atos lícitos pelo empregador (seus n.ºs 2 e 3), dizendo-se no primeiro caso que estamos perante resolução fundada em justa causa subjetiva e, no segundo, por sua vez, fundada em justa causa objetiva.
Por outro lado, tendo de ser comunicada a intenção de resolução ao empregador nos 30 dias subsequentes ao conhecimento pelo trabalhador dos factos que a justificam, a mesma tem de revestir a forma escrita, com a “indicação sucinta dos factos que a justificam” (n.º1 do art.º 395.º, do CT/09) – indicação essa que, afastando-se outra leitura, deve ser entendida no sentido de que o trabalhador não está dispensado de concretizar, com o mínimo de precisão, os factos que estão na base da sua decisão[14] –, sendo que é a partir dessa indicação que se afere a procedência dos motivos invocados para a resolução, pois que “apenas são atendíveis para a justificar” os factos que dela constarem – principio da vinculação temática (n.º 3, do art.º 398.º) –, sem esquecermos, ainda, que é “a justa causa apreciada nos termos do n.º 3, do art.º 351.º, com as necessárias adaptações” (n.º 4 do art.º 394.º), bem como que é sobre o trabalhador que impende o ónus de alegação e prova da existência de justa causa – ou seja, que alegue e prove os factos constitutivos do direito a fazer cessar imediatamente o contrato de trabalho (art.º 342.º n.º 1, do Código Civil).
No caso que se aprecia, por referência às causas supra indicadas para a resolução, importa em particular atender à primeira, ou seja a justa causa subjetiva, que assenta num comportamento do empregador que se reconduza a um ato ilícito, nomeadamente, uma das situações previstas nas alíneas do n.º 2, do art.º 394.º, assim: a) Falta culposa de pagamento pontual da retribuição; b) Violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador; c) Falta culposa de condições de segurança e saúde no trabalho; d) Lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador; e) Ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, punível por lei, praticado pelo empregador ou seu representante.
Por outro lado, não poderemos também deixar de evidenciar que, ainda que se chegue a essa conclusão, sempre será de exigir a verificação da característica essencial do conceito de justa causa, ou seja, a demonstração de que esse comportamento da entidade patronal, que lhe possa ser imputável a título de culpa, pela sua gravidade e consequências, torne inexigível a manutenção do vínculo laboral[15]. Ou seja, tal como ocorre no despedimento por iniciativa do empregador com fundamento em justa causa por facto imputável ao trabalhador, também para o trabalhador a noção de justa causa para resolução do contrato de trabalho assenta na ideia de inexigibilidade do prosseguimento da relação laboral[16]. Daí que, como tem sido reiteradamente entendido pela nossa jurisprudência, em particular do Supremo Tribunal de Justiça, a dimensão normativa da cláusula geral de rescisão exige assim mais do que a mera verificação material de um qualquer dos comportamentos do empregador elencados, sendo ainda necessário que desse comportamento culposo do empregador resultem “efeitos de tal modo graves, em si e nas suas consequências, que seja inexigível ao trabalhador – no contexto da empresa e considerados o grau de lesão dos seus interesses, o caráter das relações entre as partes e as demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes – a continuação da prestação da sua atividade”[17]’[18].
Não obstante, não deixaremos de salientar que a preocupação com a manutenção da relação de trabalho e a diversidade de interesses e de posições das partes devem motivar exigências diversas relativamente ao preenchimento da justa causa de resolução por iniciativa do trabalhador, projetando-se assim a referida preocupação de salvaguarda da relação de trabalho na ponderação do preenchimento daquele conceito. Assim o adverte Maria do Rosário Ramalho[19], depois de referenciar os requisitos acentuados pela jurisprudência para que se configure uma situação de justa causa subjetiva para a resolução do contrato[20], lembrando a necessidade de “não se apreciar os elementos acima referidos em moldes tão estritos e exigentes como no caso da justa causa disciplinar, designadamente no que se refere ao terceiro elemento», o que resultará da «fundamental dissemelhança entre as figuras do despedimento disciplinar e da resolução do contrato por iniciativa do trabalhador”.
O que acabou de dizer-se foi afinal também afirmado pelo Tribunal a quo, nos termos seguintes[21]:
“(…) Como resulta dos autos, o objeto da causa prende-se com a circunstância da trabalhadora ter resolvido o contrato que mantinha com a entidade empregadora, com fundamento em alegada justa causa.
(…)
Não se suscitam dúvidas – e nem é questão que divida as partes – que entre as partes se estabeleceu um contrato de trabalho - art. 1.º do DL 49.408, de 24/11/1969 (LCT), art. 10.º do Código de Trabalho (2003) e art. 11º do Código de Trabalho (2009) -, com início de produção de efeitos a 28 de setembro de 1998 e cuja cessação ocorreu em 21 de julho de 2015, vínculo esse que cessou por iniciativa da trabalhadora, por rescisão com invocação de justa causa pelos fundamentos constantes da carta cuja cópia consta de fls. 19 a 21.
Vejamos, agora, se dos factos provados se pode concluir que, como pretende o trabalhadora, houve “justa causa” para resolver o contrato de trabalho, pois que efetivamente, e como já se disse, operou a resolução do mesmo.
Estabelece o art. 340.º, al. g), que uma das modalidades da cessação do contrato de trabalho é a resolução, que pode ser por iniciativa do trabalhador.
Na verdade, ocorrendo situações anormais e particularmente graves, em que deixe de ser exigível ao trabalhador que permaneça ligado à empresa por mais tempo, a lei faculta-lhe a rescisão do contrato com “justa causa”, com direito a indemnização.
A esse respeito estabelece o artigo 394º, no seu n.º 1, que “ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato”.
Em tais situações de grave infração aos deveres contratuais, por parte do empregador, deixa de ser exigível ao trabalhador que permaneça ligado à empresa por mais tempo, isto é, pelo período fixado para o aviso prévio previsto no artigo 400.º, n.º 1.
No n.º 2 do art. 394º enunciam-se, exemplificativamente, diversos comportamentos culposos do empregador suscetíveis de constituir a dita justa causa (subjetiva) de resolução do contrato pelo trabalhador, com direito a indemnização, tais como:
«a) Falta culposa de pagamento pontual da retribuição;
b) Violação culposa das garantias legais ou convencionais do trabalhador;
c) Aplicação de sanção abusiva;
d) Falta culposa de condições de segurança, higiene e saúde no trabalho;
e) Lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador; f) Ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, punível por lei, praticada pelo empregador ou seu representante legítimo.»
Como escreve o Professor João Leal Amado[22] relativamente à justa causa subjetiva de demissão, elencada nas diversas alíneas do n.º 2 em termos meramente exemplificativos (“nomeadamente”), esta “refere-se a comportamentos ilícitos e culposos do empregador, analisando-se naquilo que muitas vezes se designa de despedimento indirecto, isto é, abrange casos em que a ruptura contratual, conquanto desencadeada pelo trabalhador, tem como verdadeiro e último responsável o empregador, o qual viola culposamente os direitos e garantias daquele, impelindo-o a demitir-se”.
De acordo com o n.º 1 do art. 395º, a declaração de resolução deve ser feita por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, dentro dos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos.
E apenas são atendíveis para justificar judicialmente a resolução os factos indicados na comunicação supra aludida (art. 398º, n.º 3).
Daí que, tendo um trabalhador rescindido o seu contrato de trabalho, por meio de carta, em que menciona os factos pelos quais põe termo à relação laboral, só esses factos – e não outros – podem depois, em ação que, para o efeito, venha a propor, ser por ele invocados, em juízo, para fundamentar um pedido de condenação do empregador numa indemnização por rescisão contratual[23].
A observância pelo trabalhador dos requisitos de natureza procedimental previstos no n.º 1 do art. 395º – forma escrita, indicação sucinta dos factos e observância do prazo – constitui condição de licitude da resolução, na medida em que dela depende a atendibilidade dos factos invocados pelo trabalhador para justificar a cessação imediata do contrato.
Significa isto que, perante a respetiva preterição, tudo se passa como se o trabalhador tivesse feito cessar o contrato invocando uma justa causa não verificada. E porque só a justa causa legitima a cessação imediata do contrato – ao dispensar o trabalhador da obrigação de aviso prévio – a resolução será, em tais casos, ilícita, incorrendo o trabalhador em responsabilidade civil perante o empregador nos termos do art. 399[24].
No n.º 4 do art. 394.º prescreve-se que “a justa causa é apreciada nos termos do n.º 3 do artigo 351.º, com as necessárias adaptações.
Neste normativo (art. 351.º, n.º 3), por sua vez, prevê-se que, “[n]a apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes.
Assim, é necessário que, além da verificação do elemento objetivo e subjetivo, se conclua que se tornou impossível a manutenção da relação laboral.
A verificação de justa causa pressupõe, deste modo, a ocorrência dos seguintes requisitos[25]:
a) um de natureza objetiva - o facto material integrador de algum dos comportamentos referidos nas alíneas do n.º 2 do art. 394º do Código de Trabalho;
b) outro de carácter subjetivo - a existência de nexo de imputação desse comportamento, por ação ou omissão, a culpa exclusiva da entidade patronal;
c) outro de natureza causal - que o comportamento da entidade patronal gere uma situação de imediata impossibilidade[26] de subsistência da relação laboral, tornando inexigível, em concreto e de acordo com as regras de boa fé, que o trabalhador permaneça ligado à empresa por mais tempo, ou seja, pelo período legalmente fixado para o aviso prévio[27].
Não basta, pois, uma qualquer violação por parte do empregador dos direitos e garantias do trabalhador para que este possa resolver o contrato de trabalho com justa causa. Torna-se necessário que a conduta culposa do trabalhador seja de tal modo grave, em si mesma e nas suas consequências, que, à luz do entendimento de um bonnus paterfamilias, torne inexigível a manutenção da relação laboral, por parte do trabalhador[28].
Só que nesta apreciação nunca poderá ser esquecido que, enquanto o empregador dispõe de sanções intermédias para censurar um determinado comportamento, o trabalhador lesado nos seus direitos não tem modos de reação alternativos à rescisão (ou executa o contrato ou rescinde). Neste contexto, o rigor com que se aprecia a justa causa invocada pelo empregador não pode ser o mesmo com que se aprecia a justa causa invocada pelo trabalhador[29].
De referir que, na distribuição do ónus da prova, compete ao trabalhador demonstrar a existência do comportamento da entidade empregadora, nos termos do disposto no art. 342º, n.º 1 do Código Civil, e cabe a esta provar que esse comportamento não procede de culpa sua, nos termos do disposto no art. 799º do mesmo diploma legal[30].
Dito de outro modo, nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, cabe ao trabalhador alegar e provar os factos por si invocados para justificar a resolução do contrato de trabalho, porque constitutivos do direito alegado (o direito de resolver o contrato com justa causa); compete, por outro lado, ao empregador provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua (artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil)[31]. (…)

2.1.2. O caso que se aprecia:
Como bem se refere na mesma sentença, considerando a factualidade invocada pela trabalhadora na carta de resolução do seu contrato de trabalho e os factos provados, importa apreciar a relevância dos fundamentos invocados de modo a concluirmos se, dos invocados, os que se demonstraram são suscetíveis de constituir justa causa (subjetiva) para a resolução do contrato.

2.1.2.1 Da invocada violação dos direitos de proteção à parentalidade e do tratamento discriminatório laboral
Nas suas conclusões 25.ª a 29.ª a Apelante invoca ter ocorrido violação dos direitos de proteção à parentalidade, sustentando seguidamente, nas conclusões 30.ª a 32.ª, ter-se verificado tratamento discriminatório laboral.
Da sentença recorrida consta, apreciando precisamente tais fundamentos:
“(…) Prescreve o art. 126º, sob a epígrafe «Deveres gerais das partes», que o «empregador e o trabalhador devem proceder de boa fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento das respectivas obrigações», sendo que, «na execução do contrato de trabalho, as partes devem colaborar na obtenção da maior produtividade, bem como na promoção humana, profissional e social do trabalhador».
Segundo o n.º 3 do art. 127º, o «empregador deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e pessoal».
Por sua vez, os arts. 23º, 24º e 25º estabelecem que:
(…)
No caso em apreço para melhor apreendermos o fundamento de rescisão em análise importa ter presente que na carta de resolução do contrato (cfr. fls. 19 a 21) a A. explicitou as seguintes considerações (fácticas e jurídicas):
- a entidade empregadora não tem respeitado as normas de proteção da parentalidade, impostas por lei. Tal situação que ainda hoje persiste tem ocorrido desde a carta de 20.03.2015 em que solicitou a colaboração da entidade empregadora para proceder à aplicação de vários procedimentos considerando a sua recente maternidade, tais como:
a. alteração horária (turno entre as 10h e 19h)
b. licença de amamentação
c. usufruir de folgas ao sábado.
- Depois de meses sem lhe terem sido concedidos em pleno tais direitos, diz sentir-se abatida, desgastada com a falta de colaboração da entidade patronal num momento difícil da sua vida em que se vê na obrigação de acudir à filha recém nascida.
- Após várias cartas e pese embora os seus pedidos de reunião com a supervisora, ainda hoje nada recebeu com vista à resolução de tais problemas que ainda hoje se mantêm (nem carta, nem contacto com marcação para reunir para resolver os problemas).
- Em agravamento, existem outras trabalhadoras que estão a beneficiar dos mesmos direitos que requereu (tais como a Srª L... e a Srª S...), tendo-lhes sido concedidos sem problemas, acrescendo-se assim uma violação de discriminação de tratamento laboral.
- No passado dia 23.6.2015, recebeu uma carta da CITE com o parecer de que a Ré lhe está a coarctar os direitos de parentalidade, nomeadamente quanto ao pedido de prestação de trabalho em regime de horário de trabalho flexível.
- Tal parecer exige que a Ré cumpra o que foi por si pedido e que façam o que for necessário para permitir a conciliação da vida profissional da A. com a sua vida familiar.
- Porém, até hoje, ainda não recebeu qualquer contacto da Ré sobre se irá aceitar as conclusões de tal parecer ou não, isto é, se irá ou não continuar a negar os indicados direitos de maternidade quando a baixa findar.
- A falta de tal comunicação tem-lhe causado enorme desgaste psicológico, vivendo sobressaltada perante o pânico de ter de voltar ao serviço mas incapaz de prover pelo bom tratamento e até sobrevivência da bebé.
- O desrespeito por tais obrigações legais (proteção da maternidade) e a espera prolongada em que aguarda pela sua resolução foram a causa para a reincidência e o agravamento do seu estado clínico depressivo que motiva a atual baixa.
- Perante a violação contínua de tais direitos e as delongas na sua resolução, não se sente capaz de voltar a exercer funções na empresa, motivo por que apresentou o seu despedimento com justa causa.
*
Concretizando, de seguida, a matéria de facto provada resulta dos autos que a A. foi admitida ao serviço da ré, mediante contrato de trabalho de 28.09.1998, o qual cessou em 21/07/2015, data em que a ré rececionou a carta da A. invocando justa causa de resolução do contrato.
A A. sempre manteve relações cordatas com os colegas de trabalho e com a entidade patronal.
Durante vários anos a A. foi inclusivamente “vendedora diplomada” com reconhecido valor na área comercial da empresa, tendo desempenhado funções de formadora de outras operadoras de loja em benefício da Ré e, não fosse a resolução do contrato, iria ser recomendada para ser classificada como “vendedora transversal”, tal era a sua flexibilidade, motivação e conhecimentos técnicos que possuía.
Importa ainda destacar, como (bem) refere a ré, que por motivos de baixa médica, gravidez de risco, licença parental, baixa para assistência a filho e gozo das férias, a comparência da A. ao serviço desde 09-07-2013 até 21-07-2015 foi «quase residual».
Com efeito, em virtude de um estado depressivo diagnosticado em Julho/2013 (“reação depressiva prolongada”), a A. foi forçada a suspender a sua prestação laboral (baixa médica), o que se prolongou com tal motivo pelo menos até 05-10-2014, data em que foi hospitalizada na sequência de complicação de final de parto (sendo que a gravidez da A. era já antes considerada como “de risco”).
Depois de tal hospitalização de 17 dias, que culminou no parto da sua filha (M...), em 20.10.2014, a A. esteve depois de licença de maternidade entre 21.Out.2014 e 18.Março.2015 e em gozo de férias desde o dia 19-03-2015 a 16-04-2015, após o que reiniciou o seu trabalho (no dia 17.4.2015).
Posteriormente, a A. esteve de baixa para assistência a filho no período de 28-04-2015 a 10-05-2015 e de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2017, não mais tendo comparecido ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato.
Por conseguinte, entre o dia 09-07-2013 a 21-07-2015, a A. apenas prestou a sua actividade para a R. no período de 17-04-2015 a 27-04-2015 e no período de 11-05-2015 a 21- 05-2015.
Considerando, também, que no período do mês de Abril de 2015, a A. teve as suas folgas nos dias 18, 19, 21 e 25 e que no período de 11-05-2015 a 21-05-2015 teve as suas folgas nos dias 13 e 16, constata-se que, desde 09-07-2013 a 21-07-2015 (data em que a R. rececionou a carta de resolução do contrato), a A. apenas prestou para a R. 16 dias de trabalho efetivo, o que corrobora a conclusão supra enunciada no sentido de ter sido residual a prestação da atividade da A. no apontado período temporal (excedente a dois anos).
Decorre igualmente dos autos que, antes de reiniciado o seu trabalho, e com vista à conciliação da vida laboral à sua nova vida familiar, estribando-se no regime da proteção na parentalidade do trabalhador, a A. reivindicou da Ré três pretensões distintas:
- dispensa para amamentação, de duas horas, entre as 17h e as 19h.
- dispensa da prestação de trabalho no período noturno (pedindo que a prestação de trabalho ocorresse sempre no turno entre as 10h e as 19h).
- regime de trabalho flexível, designadamente o gozo de folgas ao Sábado e Domingo (ou, pelo menos, uma folga sempre ao Sábado, atento o trabalho inadiável do outro progenitor prestado nesse dia na respetiva empresa). - (cfr. item 9 dos factos provados).
A primeira das pretensões da A. foi deferida pela Ré, embora em moldes distintos do peticionado, visto que aquela pretendia a dispensa para amamentação num só período de duas horas, entre as 17h e as 19h, e a empregadora facultou-lhe o gozo desse direito repartido em dois períodos distintos, de uma hora cada – em conformidade, aliás, com o estatuído no n.º 3 do art. 47º -, tendo aceitado o horário indicado pela Autora para a execução da referida dispensa (no horário das 10 às 19h os hiatos entre as 10 e as 11h e entre as 18h e as 19h). - (cfr. itens 10, 11 e 12 dos factos provados).
Quanto ao pedido de dispensa da prestação de trabalho no período noturno, em conformidade com o estabelecido no n.º 4 do art. 60º, exigiu a Ré que a A. apresentasse atestado médico comprovativo (cfr. item 10 dos factos provados).
E, uma vez apresentado o referido atestado, a Ré comunicou à A. que era sua intenção recusar esse pedido da A., por alegadamente não se verificarem os respetivos requisitos legais (cfr. carta de fls. 81 vº e 82 e item 14 dos factos provados).
Constata-se, porém, que a A. não chegou a praticar trabalho no período noturno, pois que nos períodos de 17-04-2015 a 27-04-2015 e de 11-05-2015 a 21-05-2015 prestou sempre a sua actividade no horário das 10h00m às 19h00m, com pausa entre as 15h00m e as 16h00m, mas entrando sempre às 11h00m e saindo às 18h00m, no exercício das dispensas para amamentação que tinha solicitado (cfr. itens 26 e 27 dos factos provados).
Por conseguinte, considerando que a A. observou sempre um horário de trabalho no período diurno, jamais tendo prestado trabalho no período noturno, o referido fundamento é manifestamente inviável para efeitos de aferição da justa causa de resolução do contrato.
A divergência maior entre as partes colocou-se, no entanto, quanto ao pedido de atribuição de um regime de horário de trabalho flexível, designadamente o gozo de folgas (fixas) aos sábados, visto que a Ré comunicou não ser possível a sua atribuição, sob a alegação de ser colocado em causa o funcionamento regular do próprio estabelecimento e por o pedido de folgas fixas não se compreender dentro do pedido de horário flexível que a trabalhadora solicitava, argumentos estes com os quais a A. não se resignou.
Face ao impasse surgido, e após variada troca de correspondência em que as partes foram esgrimindo as respetivos argumentos (cfr. itens 9 a 15 dos factos provados), tendo inclusivamente a ré tentado acordar com a A. a alternância de folgas ao sábado com o seu marido (cfr. itens 12 e 53 dos factos provados), o que se mostrou inviável, a CITE foi chamada a pronunciar-se, nos termos e para os fins do disposto no art. 57º, n.º 5, tendo emitido parecer desfavorável à intenção de recusa pela ré do pedido de prestação de trabalho em regime de horário de trabalho flexível formulado pela A. (cfr. itens 16 a 19 dos factos provados).
Diz a A. que, não obstante a prolação do referido parecer da CITE, não recebeu qualquer contato da ré no sentido de lhe comunicar se irá, ou não, aceitar as conclusões de tal parecer, mais referindo que «a falta de tal comunicação tem-lhe causado enorme desgaste psicológico, vivendo sobressaltada perante o pânico de ter de voltar ao serviço mas incapaz de prover pelo bom tratamento e até sobrevivência da bebé».
Com o devido respeito por opinião contrária, temos para nós que a premissa em que se alicerça o enunciado juízo da A. carece de qualquer fundamento.
Conforme decorre do n.º 6 do art. 57º, compete à CITE a notificação ao empregador e ao trabalhador do seu parecer, o que terá de ser feito no prazo de 30 dias após envio do processo, sob pena de o seu silêncio se considerar favorável à intenção de recusa do empregador.
Acresce que, se o referido parecer for negativo ou desfavorável – como é o caso dos autos -, o empregador só pode recusar o pedido após decisão judicial que reconheça a existência de motivo justificativo (n.º 7).
Considera-se, no entanto, que o empregador aceita o pedido do trabalhador nos seus precisos termos (n.º 8):
a) – Se não comunicar a recusa no prazo de 20 dias após a recepção do pedido;
b) – Se, tendo comunicado a intenção de recusar o pedido, não informar o trabalhador da decisão sobre o mesmo nos 5 dias subsequentes à notificação referida no n.º 6 ou, consoante o caso, ao fim do prazo estabelecido nesse número;
c) – Se não submeter o processo à apreciação da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres dentro do prazo previsto no n.º 5.
Ora, se por um lado não competia à R. notificar a A. do mencionado parecer proferido pela CITE já que essa notificação está atribuída por lei a esta entidade administrativa, por outro lado, uma vez notificado o parecer desfavorável pela CITE, quer ao empregador, quer ao trabalhador, a notificação pelo empregador apenas faria sentido se, porventura, não se conformasse com a deliberação desfavorável do parecer, se bem que nesse caso apenas poderia recusar o pedido após decisão judicial que reconhecesse a existência de motivo justificativo de recusa; todavia, a partir do momento em que o empregador não informou a trabalhadora da decisão sobre o parecer nos cinco dias subsequentes à notificação por parte da CITE o legislador considera que o pedido da trabalhadora é por aquele aceite nos seus precisos termos.
Daí que não se evidencie como é que a falta de notificação do parecer pelo empregador à A. – a que não estava obrigado e cuja omissão se tem como aceitação do pedido da trabalhadora/demandante - possa ter algum reflexo jurídico ao nível da verificação da justa causa de resolução do contrato de trabalho.
Por outro lado, está-nos vedado concluir que o empregador tenha desrespeitado ou incumprido o mencionado parecer, na medida em que à data da sua prolação a A. encontrava- se de baixa médica e assim se manteve até à data da resolução do contrato. Ao não ter retomado o serviço, e mantendo-se o contrato de trabalho suspenso, não é possível concluir que a ré obstou a que a A. gozasse o reclamado regime de horário de trabalho flexível, com folgas as sábados, pois que para tanto teria sido necessário que a trabalhadora estivesse ao serviço e a Ré tivesse obstado ao exercício daquele regime especial, impedindo-a de gozar as folgas aos sábados, o que, como se disse, não se verificou.
E mesmo por referência ao período antecedente do pedido de parecer à CITE em que a efetivamente prestou trabalho, que mediou entre 17.4.2015 a 21.05.2015, resulta dos autos que a trabalhadora nunca prestou trabalho aos sábados, mas tão só nos domingos de 26 de Abril de 2015 e 17 de Maio de 2015.
O que significa que, apesar de ter manifestado a intenção de recusar o pedido de atribuição de regime de horário trabalho flexível com folgas aos sábados, a ré acabou, na prática, por permitir que a A. gozasse folgas aos sábados.
Cumprido que se mostra o gozo das folgas aos sábados, como era pretensão da A. e veio a ser deferido pelo parecer da CITE, não se vislumbra em que termos o horário praticado possa ter obstado ao exercício dos direitos de parentalidade de que a A. se arrogava.
De igual modo, não se pode dizer que os fundamentos de recusa da atribuição de regime de horário especial eram manifestamente injustificados, porquanto foram alegadas pela empregadora razões objetivas de funcionamento do estabelecimento onde a trabalhadora estava inserida, algumas das quais resultaram demonstradas (cfr. itens 46, 52, 56 e 57 dos factos provados)[32].
Num plano distinto, diz a A. ter sido vítima de tratamento discriminatório laboral, porquanto tinha conhecimento de, pelo menos, 2 colegas (funcionárias da Ré) que se encontravam em igual situação à sua e que obtiveram deferimento de pedidos iguais, os quais sempre foram injustificadamente recusados à A..
A propósito, e com relevância, mostra-se provado que a colaboradora S... não solicitou nem tem nenhum estatuto de horário especial na R..
A referida S... é encarregada do armazém e tem um horário entre as 9h00m e as 17h00m, de segunda a sexta-feira, dias em que a R. recebe os camiões com mercadoria, tendo como folgas o sábado e o domingo por não existirem entregas de mercadorias no fim-de-semana. Por sua vez, a trabalhadora L..., em 2014, pediu à Ré um horário especial (10h – 19h e folgas ao fim de semana) pelo facto do marido se ter visto forçado a ir trabalhar para o estrangeiro, designadamente para Angola, e a mencionada trabalhadora não ter qualquer tipo de apoio para prestar assistência aos seus filhos.
Já no ano 2015, a mencionada trabalhadora L... solicitou e foi-lhe concedida uma redução para 30 horas semanais passando a trabalhar em regime de part time, o que permitiu à R. contratar outra trabalhadora para o tempo de trabalho em falta.
Quando solicita à empresa um horário especial, a trabalhadora L... apresenta documentos comprovativos em como o seu marido vai trabalhar para Angola.
Apenas no período que o marido se encontra ausente é que a mencionada trabalhadora L... dispõe do mencionado horário especial, pelo que quando o marido se encontra em Portugal a mencionada trabalhadora faz a escala rotativa normal de horário existente no estabelecimento. A trabalhadora L... não tinha qualquer apoio do marido quando este se encontrava ausente do país.
Tal circunstancialismo fáctico apurado é elucidativo no sentido de que as duas mencionadas colaboradoras não se encontravam numa situação idêntica à da A.. Quanto à colaboradora S..., não beneficiando esta de nenhum estatuto de horário especial na R., nem sequer faz sentido o paralelismo que quanto a ela a A. pretende estabelecer. E, relativamente à colaboradora L..., ressalta desde logo o facto do marido desta se ter visto forçado a ir trabalhar para o estrangeiro, designadamente para Angola, o mesmo não sucedendo com o marido da A., e a mencionada trabalhadora não ter qualquer tipo de apoio para prestar assistência aos seus filhos, sendo apenas nos períodos em que o marido se encontra ausente que a mencionada trabalhadora dispõe do mencionado horário especial, além de que no ano 2015 solicitou e foi-lhe concedida uma redução para 30 horas semanais passando a trabalhar em regime de part time, o que permitiu à R. contratar outra trabalhadora para o tempo de trabalho em falta.
A situação da colaboradora L... não é pois, sequer, similar à da A., pois que residindo esta conjuntamente com o marido não se poderá sem mais concluir que não tinha deste qualquer apoio, sem embargo de se reconhecer que esse facto não colide com a efetiva necessidade da A. beneficiar de um regime de horário de trabalho flexível.
Em suma, relativamente à colaboradora L..., não sendo inteiramente iguais os pressupostos fácticos que estiveram na base do pedido do regime de horário de trabalho flexível, é de julgar improcedente a invocação de tratamento discriminatório laboral arguida pela A..
Por último, não ficou demonstrado[33] que:
- Durante todo este período foi notório o desgaste emocional e físico sentido pela A., causado pela negação dos seus direitos de parentalidade por parte da Ré.
- A ré ameaçou a A. que a colocaria a trabalhar também em horário noturno a qualquer momento.
- Tal desgastante incerteza causou enorme ansiedade à A. que se via aflita em procurar alternativas urgentes que pudessem salvaguardar os cuidados da sua filha (mesmo que, depois, a marcação do serviço viesse a ser por vezes alterada).
- A falta de tal comunicação por parte da ré causou à A. acrescido desgaste emocional e agravou-lhe ainda mais os sintomas depressivos.
Pelo exposto, inexistindo nos autos elementos fácticos que nos permitam inferir a violação dos direitos de proteção à parentalidade e sendo inviável a alegada situação de discriminação de tratamento laboral, forçoso será concluir pela improcedência do concreto fundamento de resolução em análise. (…)”.

Ora, face à citada fundamentação, não poderemos deixar de acompanhá-la, dados os temos expressivos e fundados como trata as questões levantadas, deixando consignadas, de um modo que temos por adequado e suficiente, as razões por que não assiste razão à Autora, razões essas que, acrescente-se, não poderemos deixar de acompanhar.
Desde logo, sendo inegável que como se refere na sentença a Autora não chegou a executar serviço noturno ou ao sábado, contrariamente ao que refere na sua conclusão 25.ª, não se vê em que possa alicerçar-se a “pressão psicológica” que diz ter sido infligida pela Ré, baseando-nos na factualidade provada, assim, não se tendo considerado provados os demais que pretendia em sede de recurso (assim, 23-A e 29-A), o que consta dos pontos 9 a 15 (que apenas dizem respeito ao teor da correspondência trocada, com o conteúdo que dessas consta), 23 (apenas referente a período de baixa da Autora, não mais compareceu ao serviço até à data da receção da carta de resolução do contrato), 31 e 32 (que se relacionam com o estado depressivo da Autora, que se agravou após o regresso ao trabalho, passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação, sendo que, em virtude de tal agravamento, voltou à baixa médica em 22.5.2015, sem que se tenha provado, frise-se, que esse agravamento fosse decorrente de qualquer comportamento concreto da Ré), 35 (relacionado com horário do marido da Autora, que se prolongava nas sextas-feiras a noite e terminava durante a manhã de sábado, entre as 10h00 e as 12h00 – relembre-se que a Autora não trabalhou efetivamente em horário noturno ou ao sábado), 82 (desse apenas consta que a Autora foi aconselhada por amigos a colocar termo ao contrato de trabalho e não já, pois, sequer as razões) e 86 (provando-se que após a sua desvinculação com a Ré a Autora sentiu novamente recuperação de saúde, daí não resultam sequer as razões para essa recuperação). Ou seja, de tais factos não se pode retirar a conclusão, salvo o devido respeito, de que a Ré tenha “violado os direitos parentais da Autora, lançando-a para um natural estado de completa insegurança, ansiedade e de nervos em cada recusa: A trabalhadora vivia no “limbo” de ter que trabalhar à noite e ao sábado, fazendo perigar a sobrevivência da sua filha recém nascida ou, no limite, obrigando a Autora a faltar, gerando uma pressão e insegurança intolerável e completamente incompatível com o texto e espírito da lei laboral de proteção à parentalidade (e que, inclusivamente, foi a causa do ressurgimento da doença psiquiátrica da Autora.” Como não se acompanha a Recorrente, diga-se, nas afirmações que avança nas conclusões 28.ª e 29.ª, respondendo a sentença adequadamente a tais questões, em termos que não justificam, face à sua clareza, outros argumentos.
Deste modo, sem que se justifiquem quaisquer outras considerações – pois que se traduziriam em mera repetição de argumentos –, remetendo-se para a citada fundamentação, não se vê, salvo o devido respeito pela posição da Apelante, como possa afirmar-se que, com base na factualidade provada, e só essa importa, a Ré tenha desrespeitado as normas de proteção da parentalidade, impostas por lei.

O mesmo se conclui, com base na mesma fundamentação, quanto à invocada existência de tratamento discriminatório laboral por parte da Ré/apelada.
Permitimo-nos, não obstante o que fez constar o Tribunal a quo, fazer ainda algumas considerações, no sentido de acompanharmos o decidido.
Em linha com o preceituado no artigo 15.º, segundo o qual o trabalhador goza do direito à respetiva integridade física e moral, e ainda nos artigos 23º, 24.º, 25.º e 129.º, n.º 1, al. c) do CT/2009, e concretizando os comandos constitucionais elencados nos artigos 25.º, n.ºs 1 e 2 da CRP – onde se estabelece, respetivamente, que “a integridade moral e física das pessoas é inviolável” e que “ninguém pode ser submetido a tortura, nem a maus tratos ou penas cruéis, degradantes ou desumanos” – resulta do n.º 1 do artigo 29.º que se entende “por assédio moral o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, humilhante ou desestabilizador”, sendo que, de acordo com o seu n.º 4, consubstancia a comissão de uma contraordenação muito grave.
Apreciando a previsão da norma, acompanha-se aqui, dada a sua relevância, o que a esse respeito, por apelo fundado à Doutrina[34], se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Dezembro de 2014[35]:
“De acordo com o entendimento perfilhado pela generalidade da doutrina, pode dizer-se, numa formulação sintética, que o assédio moral implica comportamentos (em regra oriundos do empregador ou superior hierárquicos do visado) real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador[36], aos quais estão em regra associados mais dois elementos: certa duração; e determinadas consequências.
Ora, é patente que uma abordagem do art. 29.º, n.º 1, do CT, apenas assente no seu elemento literal, se revela demasiado abrangente, pelo que se impõe um esforço adicional para adequadamente delimitar a sua esfera de proteção.
Com efeito, como enfatiza Monteiro Fernandes, “a definição do art. 29º não parece constituir o instrumento de diferenciação que é necessário”, uma vez que “nela cabem, praticamente, todas as situações que o mau relacionamento entre chefes e empregados pode gerar”.[37]
E, como realça Júlio Manuel Vieira Gomes[38], “importa (…) advertir que nem todos os conflitos no local de trabalho são, obviamente, um “mobbing”, sendo (…) importante evitar que a expressão assédio se banalize. Nem sequer todas as modalidades de exercício arbitrário do poder de direção são necessariamente um “mobbing”, quer porque lhes pode faltar um carácter repetitivo e assediante, quer porque não são realizados com tal intenção”.
Ensaiando uma interpretação “capaz de servir as finalidades operatórias” do conceito de assédio, diz-nos Monteiro Fernandes[39]:
“Entrando em conta com o texto da lei e os contributos da jurisprudência, parece possível identificar os seguintes traços estruturais da noção de assédio no trabalho:
a) Um comportamento (não um ato isolado) indesejado, por representar incómodo injusto ou mesmo prejuízo para a vítima (…);
b) Uma intenção imediata de, com esse comportamento, exercer pressão moral sobre o outro (…);
c) Um objetivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, consistente na obtenção de um efeito psicológico na vítima, desejado pelo assediante (…).
A definição do art. 29.º parece, por exemplo, prescindir do elemento intencional que parece essencial à diferenciação da hipótese de assédio, face a outros tipos de comportamento incorreto, abusivo ou prepotente do empregador ou dos superiores hierárquicos do trabalhador. A interpretação do preceito deve, pois, ser feita no sentido indicado.”
A propósito da dimensão volitiva/final do conceito de assédio, a doutrina sempre se mostrou dividida, pois, “enquanto para alguns o mobbing pressupõe uma intenção persecutória ou de chicana (ainda que não necessariamente a intenção de expulsar a vítima da empresa), para outros, o essencial não são tanto as intenções, mas antes o significado objetivo das práticas reiteradas”.[40]
Neste âmbito, havendo que reconhecer a necessidade de uma interpretação prudente da sobredita disposição legal, também importa ter presente que não pode ser considerado pelo intérprete um “pensamento legislativo” que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, devendo ainda presumir-se que o legislador soube expressar o seu pensamento em termos adequados e que consagrou as soluções mais acertadas – art. 9.º, n.ºs 2 e 3, C. Civil.
Incontornavelmente, a lei estipula que no assédio não tem de estar presente o “objetivo” de afetar a vítima, bastando que este resultado seja “efeito” do comportamento adotado pelo “assediante”.
No entanto, quanto aos precisos contornos desta exigência, duas observações se impõem.
Em primeiro lugar, uma vez que a esfera de proteção da norma se circunscreve, como vimos, a comportamentos que intensa e inequivocamente infrinjam os valores protegidos, não pode deixar de notar-se que é dificilmente configurável a existência de (verdadeiras) situações de assédio moral que - no plano da vontade do agente - não imponham concluir que ele, pelo menos, representou as consequências imediatas da sua conduta, conformando-se com elas.
Por outro lado, para referir que a circunstância de o legislador ter prescindido de um elemento volitivo dirigido às consequências imediatas de determinado comportamento não obsta à afirmação de que o assédio moral, em qualquer das suas modalidades, tem em regra[41] associado um objetivo final “ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável” (v.g. a discriminação, a marginalização/ estigmatização ou neutralização do trabalhador, atingir a sua auto-estima ou, no tocante ao “assédio estratégico”, os objetivos específicos supra expostos).»

Pois bem, nas suas conclusões a Apelante apenas faz apelo ao paralelismo que diz existir entre a sua situação e a da trabalhadora L... – já não, pois, da situação da trabalhadora S..., também por si alegada e por essa razão tratada na sentença.
Mas sem razão, na nossa opinião, por não existir, não obstante ser verdade que o marido da Autora trabalhava aos sábados de manhã – facto 35, com a redação dada em sede de recurso –, real paralelismo entre as situações, já que, como é do senso comum, não é certamente indiferente, contrariamente ao que se quer fazer transparecer, ter o marido no estrangeiro ou em Portugal, pois que, sem dúvidas, neste último caso, como é de mediana compreensão, pode sem dúvidas dar muito maior apoio. Querer comparar estas situações é, assim, esquecer diferenças relevantes.
Apenas mais uma nota deixaremos a respeito do assédio moral, assim no sentido de que, ainda que se tenha presente – tal como salienta Maria do Rosário Ramalho[42] – a necessidade de não se apreciarem os elementos exigidos para a configuração de uma situação como tal em moldes tão estritos e exigentes como no caso da justa causa disciplinar, designadamente no que se refere ao juízo sobre se os factos tornam imediata e praticamente impossível para o trabalhador a subsistência do vínculo laboral, não poderemos esquecer, tal como reiteradamente o tem afirmado a jurisprudência, que a dimensão normativa da cláusula geral de rescisão exige mais do que a mera verificação material de um qualquer comportamento do empregador, pressupondo ainda que dessa actuação, culposa do empregador, resultassem “efeitos de tal modo graves, em si e nas suas consequências, que seja inexigível ao trabalhador – no contexto da empresa e considerados o grau de lesão dos seus interesses, o caráter das relações entre as partes e as demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes – a continuação da prestação da sua atividade”[43].
Não assiste pois, sem necessidade de maiores argumentos, neste aspeto, razão à Recorrente.

2.1.2.2 Da falta de formação e de condições laborais/a password
Nas suas conclusões 33.ª a 37.ª invoca a Recorrente ter ocorrido falta de formação, resultando por sua vez das conclusões 38.ª a 40.ª que teria existido falta de condições laborais/a password.
Quanto ao primeiro motivo, fazendo apelo aos factos 33, 34, 59 e 61 (ainda 34-A, mas que não logrou obter a respetiva inclusão em sede de recurso), sustenta que esses são inequívocos no sentido de que não possuía conhecimentos suficientes sobre produtos vendidos pela Ré e que, assim, não poderia executar cabal e adequadamente o seu trabalho, sendo certo que durante a sua ausência de quase 2 anos, surgiram muitos produtos novos e com inovações e a loja foi completamente remodelada.
Mais uma vez, de um modo que temos por adequado, se pronunciou o Tribunal a quo, afirmando o seguinte:
“(…) Do elenco dos deveres específicos que recaem sobre o empregador dispõe o n.º 1 do art. 127º que o «empregador deve, nomeadamente:
(…)
c) Proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral;
d) Contribuir para a elevação da produtividade e empregabilidade do trabalhador, nomeadamente proporcionando-lhe formação profissional adequada a desenvolver a sua qualificação;
(…)».
Na situação versada nos autos mostra-se provado, entre o mais, que:
- Após ter regressado ao serviço não foi ministrada à A. formação de artigos.
- A A. viu-se confrontada com artigos e produtos que apresentavam algumas inovações.
- Quando a A. regressou ao serviço em Maio de 2015, foram acordados entre A. e R. os seguintes objetivos e planos de formação a realizar no ano de 2015:
- Estudar novos produtos e formar a equipa;
- Correcta reposição / pvp;
- Conhecimento da gama e concorrência;
- Acompanhamento semanal dos objectivos;
- Consultar as listagens na intranet;
- Identificar artigos anulados com autocolante em loja e no armazém;
- Estudar os dossiers;
- Formação produto;
- Reuniões mensais.
- No mencionado documento que serviu de formalizado ao referido acordo, no ponto “Acordos finais sobre a avaliação efectuada”, ficou consignado que “A experiência e vivência da S... são uma mais valia para a equipa mas é necessário actualizarse face à sua ausência prolongada da C.... Em conjunto traçar metas de formação (reciclagem) e cumpri-las. Não esquecer de consultar o e-mail e intranet”.
Aquando do seu regresso ao serviço a A. teve o apoio da responsável da loja – Sra. E... – bem como das restantes colegas que trabalham naquele estabelecimento.
No período em que prestou a sua atividade (Abril e Maio de 2015) não existiram quaisquer reclamações de clientes sobre a atuação da A. nem, tão pouco, alguma vez a R. reclamou de a A. de não estar a exercer convenientemente as suas funções.
- A password regista informaticamente as vendas e atividade comercial da funcionária.
- Após o regresso ao serviço da A. verificou-se que a password pessoal que a A. sempre deteve não estava a funcionar corretamente, o que se deveu ao longo período de ausência da A..
- No momento em que se detetou essa situação, a responsável do estabelecimento tentou, juntamente com a A., proceder a uma alteração de password na própria loja, sendo que essa tentativa de alteração de password na própria loja não resultou dado que toda a gestão das passwords atribuídas às trabalhadoras só pode ser tratada pelo departamento informático da R., em Espanha.
- Por esse motivo, e logo após ter sido detetada a falha na password da A., a directora do estabelecimento da R. solicitou ao departamento informático da C..., em Espanha, a resolução do problema.
- A situação ficou resolvida em dia concretamente não apurado do mês de maio de 2015, quando a A. já se encontrava de baixa.
- A indisponibilidade da password atribuída à A. não a impediu de exercer as suas funções, uma vez que para o registo das operações, e enquanto perdurou esse problema, a A. utilizou a password de outras colegas ou o programa informático aberto pelas colegas.
- As listas de nascimento são abertas em programas informáticos independentes dos programas de vendas e nem sequer necessitam da password da trabalhadora.
- Para aceder a tal programa específico de nascimento apenas é necessária a password da loja, programa esse que tem um item onde a trabalhadora coloca o seu número de vendedora.
- A falha informática que ocorreu com a password da A. não foi intencional, tratando-se de uma situação decorrente do enorme tempo de ausência da A. ao serviço.
- Nunca a ré responsabilizou a A. por qualquer falha de produtividade ou, sequer, lhe fez qualquer reparo.
- Durante esse período em que ocorreu a falha na password, algumas colegas da A. no estabelecimento disponibilizaram-lhe a password própria para as operações que aquela teve de realizar.
- A responsável do estabelecimento e a supervisora nacional estiveram disponíveis para falar com a A..
- A Sra. F..., como supervisora, tem a seu cargo a supervisão dos 9 (nove) estabelecimentos da R. em Portugal e de 5 (cinco) estabelecimentos da C... em Espanha.
- A diretora de loja agendou uma reunião com a Autora e a supervisora no decurso do mês de maio de 2015, mas tal reunião veio a ser desmarcada porquanto a supervisora teve de se deslocar a Espanha a fim de diligenciar pelo encerramento dum estabelecimento da ré.
- Durante o período em que prestou a atividade para a R. a A. foi uma trabalhadora cumpridora dos seus deveres laborais.
- Entre o dia 09-07-2013 a 21-07-2015 (data em que a R. rececionou a carta de resolução do contrato), a A. apenas prestou a sua actividade para a R. no período de 17-04-2015 a 27-04- 2015 e no período de 11-05-2015 a 21-05-2015, correspondente a 16 dias de trabalho efetivo.
- O estado de saúde depressivo da A. agravou-se após o regresso ao trabalho, passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação.
- Em virtude de tal agravamento, a A. voltou à baixa médica em 22.5.2015, assim voltando a suspender a sua prestação laboral.
- A A. foi aconselhada por amigos a colocar termo ao contrato de trabalho.
*
No tocante à falta de formação após ter reiniciado a atividade laboral após um longo período de inatividade, importa mais uma vez destacar que foi exíguo ou parco o período em que a A. efetivamente prestou a sua atividade para a ré.
Com efeito, entre 09-07-2013 a 21-07-2015 (data em que a R. rececionou a carta de resolução do contrato), a A. apenas prestou a sua actividade para a R. no período de 17-04- 2015 a 27-04-2015 e no período de 11-05-2015 a 21-05-2015, correspondente a 16 dias de trabalho efetivo, tendo estado de baixa para assistência a filho no período de 28-04-2015 a 10- 05-2015 e de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2017.
Secundando o propugnado pela Ré, tais ausências justificadas da A. ao serviço nos referidos períodos constituíram, por si só, impedimento a que a R. lhe ministrasse qualquer formação.
De qualquer modo, não deixa de registar-se que, quando regressou ao serviço, as partes ajustaram entre si os objetivos e plano de formação a realizar ainda nesse ano de 2015, sendo certo que inexiste qualquer norma legal, nem qualquer situação comprovada nos autos (cfr. itens 62 e 63 dos factos provados) que impusesse à ré, como prioritária, a prestação imediata de formação à Autora. Não é, por conseguinte, de estranhar que que a formação profissional da tenha sido calendarizada para o semestre do ano civil em curso. De resto, se porventura a prestação dessa formação (nomeadamente de produto específico) se tivesse revelado indispensável para que a A. pudesse desempenhar cabalmente as suas funções, mal se compreende que esta não tenha desde logo reportado esse facto às suas superioras hierárquicas, inexistindo então qualquer óbice inibitório de reclamação, tanto mais que as partes já na altura divergiam entre si quer sobre a pretensão de dispensa da prestação de trabalho no período noturno, quer sobre a atribuição dum regime de horário de trabalho flexível. Tendo em consideração a posição reclamatória expressamente por si anteriormente formulada e que à data se mantinha em aberto, não será decerto curial concluir que a A. se coibiu de reclamar a prestação de formação por recear alguma represália por parte da entidade empregadora ou por tal poder colocar em causa subsistência do seu vínculo laboral.
Também não resultou provado que:
- A A. não estava apta a vender os produtos que apresentavam inovações.
- Durante o período em que laborou, em abril e maio/2015, por diversas vezes a A. demonstrou ignorância perante clientes sobre produtos, designadamente sobre chassis de carrinhos de bebé (o que ocorreu constantemente entre 17.4.2015 e 22.5.2015) e sobre intercomunicadores (como sucedeu, p. ex., em 27.4.2015).
- A A. viu-se confrontada com artigos ou produtos ou realidades para as quais não estivesse preparada, fossem eles chassis de carrinhos de bebé, intercomunicadores ou quaisquer outros.
Por outro lado, relativamente ao não funcionamento correto da password pessoal da A. de registo no sistema informático da loja, está comprovado que tal situação não foi intencional, tendo-se tratado de uma situação decorrente do enorme tempo de ausência da A. ao serviço, sendo que a demora na regularização dessa anomalia se ficou a dever ao facto de o seu tratamento competir ao departamento informático da C..., em Espanha, o que demandou algum tempo de espera.
Ora, os factos provados supra enunciados (itens 64 a 77 dos factos provados), pela sua clarividência e objetividade, dispensam que se proceda a um desenvolvido exercício argumentativo, porquanto deles resulta inequivocamente não estamos perante uma conduta ilícita da ré, além de que, contrariamente ao propugnado pela A., a indisponibilidade da sua password pessoal não a impediu de exercer as suas funções, sendo certo que a ré jamais a responsabilizou por qualquer falha de produtividade ou, sequer, lhe fez qualquer reparo[44].
Resulta também dos autos aquando do seu regresso ao serviço a A. teve o apoio da responsável da loja – Sra. E... – bem como das restantes colegas que trabalham naquele estabelecimento (cfr. itens 62, 76 e 77 dos factos provados).

Mais uma vez a discordância da Autora em relação ao decidido não tem, com a relevância que a mesma lhe quer atribuir, efetivo apoio na factualidade provada.
De facto, não pode contrariar-se a objetividade que resulta dessa factualidade, quer quanto ao período de tempo que está em causa – cerca de um mês –, quer ainda, com relevância, como se regista na sentença, que as suas ausências (justificadas é certo) do serviço constituíram, necessariamente, obstáculo que fosse ministrada normal formação, sendo ainda de realçar que, afinal, aquando do regresso ao serviço por parte da Autora – ausência essa que, de acordo com o disposto no artigo 61.º do CT/2009, atribui à Ré o dever de lhe facultar ações de formação e atualização profissional, de modo a promover a sua plena reinserção profissional –, precisamente por ter decorrido apenas cerca de um mês, não se pode dizer que a Ré não tenha comprido esse seu dever, tanto mais que, como bem se refere nessa sentença, no que se acompanha, “as partes ajustaram entre si os objetivos e plano de formação a realizar ainda nesse ano de 2015. Por outro lado, como mais uma vez aí evidenciado, a verdade é que não resultaram provados factos de que resulte que a Autora não estivesse suficientemente apta a vender os produtos que apresentavam inovações, até porque, sendo reconhecido entre as partes, como aliás de compreende face à ausência da Autora, que era necessário que se atualizasse (ponto 61 da factualidade provada), não é menos verdade que, provando-se que aquando do seu regresso ao serviço teve o apoio da responsável da loja bem como das restantes colegas que trabalham naquele estabelecimento (ponto 62 da factualidade), não existiram afinal, no período em que prestou a sua atividade (Abril e Maio de 2015), quaisquer reclamações de clientes sobre a sua atuação nem, tão pouco, alguma vez a Ré reclamou de que não estivesse a exercer convenientemente as suas funções (ponto 63 da factualidade). Do exposto resulta, em conformidade, que não esteja demonstrada a violação pela Ré do citado dever, como ainda, do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 127.º do mesmo Código – dever de “Contribuir para a elevação da produtividade e empregabilidade do trabalhador, nomeadamente proporcionando-lhe formação profissional adequada a desenvolver a sua qualificação.”.
Claudicam pois, por falta de demonstração factual e legal, as conclusões da Recorrente quanto a esta questão.
Como claudicam ainda, do mesmo modo, quanto à questão da password, remetendo-se nesta parte para o que, a esse propósito, consta da sentença, para onde remetemos pois, tanto mais que, salvo o devido respeito, não existem factos provados que permitam alicerçar sequer qualquer atuação negligente da Ré, como ainda as considerações feitas pela Autora sobre período normal para regularizar a situação.

2.1.2.3 Da falta de condições de saúde no trabalho e para o trabalho
Sustenta a Apelante – conclusões 41.ª a 44.ª –, como 5.º motivo para a resolução com justa causa, a falta de condições de saúde no trabalho e para o trabalho.
Assim, diz, dos factos 9 a 15, 23-A e 58, 86, 29-A, 31, 32 e 82 ou ainda os factos a., b., c., d., e. e m., resulta que o desgaste emocional e físico que sentiu com todos os apontados comportamentos da Ré – que tem por inaceitáveis e que, diz, conjuntamente, exerceram sobre si uma pressão psicológica intolerável, assim lhe causando um ressurgimento ou, no mínimo, um agravamento do seu estado de saúde, o qual “estalou” precisamente no dia anterior àquele em que seria forçada a faltar por não ter a quem deixar a sua filha recém-nascida, facto que lhe causara grande ansiedade e stress e que assim despoletou e fez ressurgir a sua Depressão Reactiva antes diagnosticada – foi a circunstância que mais sopesou na sua decisão de por fim ao seu contrato de trabalho. Mais, diz, a Ré sabia perfeitamente da situação de saúde da Autora e saberia que esta iria “quebrar” perante a pressão por si exercida em tantos comportamentos, criando, conscientemente, uma –“falta culposa de condições de … saúde no trabalho” (394º/2/d) CT), sendo certo que a existência de pressão psicológica abusiva é precisamente um caso de violação de condições de saúde no e para o trabalho.
Ora, cumprindo analisar, como bem salienta a Apelada, no que é acompanhada também pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer, esse motivo não foi de facto expressamente invocado pela Autora na sua carta de despedimento. Daí que, nessa perspetiva, colha aqui, quanto a este fundamento, ainda que eventualmente a factualidade provada lhe pudesse dar sustentação, o que se referiu anteriormente sobre a exigida indicação na declaração de despedimento de todos os motivos que fundam a resolução, pois que “apenas são atendíveis para a justificar” os factos que dela constarem – principio da vinculação temática (n.º 3, do art.º 398.º) –, sem esquecermos, ainda, que é sobre o trabalhador que impende o ónus de alegação e prova da existência de justa causa – ou seja, que alegue e prove os factos constitutivos do direito a fazer cessar imediatamente o contrato de trabalho (art.º 342.º n.º 1, do Código Civil).
Não obstante, no entendimento de que possa considerar-se que a referência que é feita na carta de resolução ao estado de saúde psicológica da Autora seria o bastante para considerar invocado o analisado motivo, o que se constata é que, com base nos factos provados, assim não se pode concluir.
Aliás, é a própria sentença que dá resposta também à questão, com a nossa concordância, ao fazer-se constar o seguinte:
“(…) Acresce que o facto de estar provado que o estado de saúde depressivo da A. se agravou após o regresso ao trabalho, passando a necessitar de cuidados de psiquiatria e nova medicação, não permite (por si só) estabelecer qualquer nexo de causalidade com qualquer conduta (ilícita) da Ré empregadora. Não é por essa patologia ter ressurgido com o regresso da A. ao serviço que se poderá imputar à ré qualquer responsabilidade no agravamento do estado de saúde da trabalhadora. Para tanto seria indispensável que a A. tivesse logrado demonstrar o ónus probatório que sobre ela recaía, o que, a nosso ver, não conseguiu.”
*
2.1.2.4. De tudo o que que se referiu anteriormente, cumprindo apreciar, tendo por base necessária a factualidade provada – incluindo com as alterações operadas em sede de recurso –, como avançámos anteriormente, não encontramos razão para não acompanharmos, face à fundamentação supra citada, a bem fundamentada sentença, que responde, sem dúvidas, a todas as questões levantadas pela Apelante nas suas conclusões 21.ª a 40.º, assim pois quanto a todos os motivos que nessas indica: (1.º) a violação dos direitos de proteção à parentalidade – conclusões 25.ª a 29.ª; (2.º) o tratamento discriminatório laboral – conclusões 30.ª a 32.ª; (3.º) a falta de formação – conclusões 33.ª a 37.ª; (4.º), a falta de condições laborais/a password – conclusões 38.ª a 40.ª; a falta de condições de saúde no trabalho e para o trabalho – conclusões 41.ª a 44.ª.
Do exposto resulta, concluindo, que não merece censura a sentença nesta parte, improcedendo assim o recurso quanto às analisadas questões.

2.2 Da indemnização a que aludem os artigos 399.º a 401.º do CT/do abuso de direito
Insurge-se ainda a Apelante (conclusões 45.ª a 50.º) quanto à sua condenação no pagamento de indemnização pela falta de aviso prévio, por entender que, não sendo tal indemnização automática – “antes necessitando de uma, ainda que simples, verificação judicial para que se assegure que a aplicação da norma não sai deturpada ou enviesada em relação ao espírito de quem a criou” –, no caso, dada a situação de baixa médica em que se encontrava quando enviou a carta de resolução, sem que fosse voltar a trabalhar na empresa Ré pelo menos antes de Dezembro de 2015 – bem mais do que os 60 dias determinados por lei para o aviso prévio –, não existe fundamento para a fixação da indemnização.
Pugnando a Apelada pelo acerto do decidido, consta da sentença recorrida, apreciando a questão, o seguinte:
“Na contestação, a R. “C..., LDA” deduziu reconvenção, pedindo a condenação da A./reconvindo no pagamento de uma indemnização correspondente a 60 dias de falta de pré-aviso, no valor de 1.397,78 €, alegando, em síntese, que os factos invocados para a resolução do contrato são infundados.
Nos termos do art. 399º, «não se provando a justa causa de resolução do contrato, o empregador tem direito a indemnização dos prejuízos causados, não inferior ao montante calculado nos termos do artigo 401.º».
E face ao estatuído neste preceito legal, o trabalhador que não cumpra, total ou parcialmente, o prazo de aviso prévio deve pagar ao empregador uma indemnização de valor igual à retribuição base e diuturnidades correspondentes ao período em falta, sem prejuízo de indemnização por danos causados pela inobservância do prazo de aviso prévio ou da obrigação assumida em pacto de permanência.
Como assinala Pedro Furtado Martins[45], «[a]pesar de a letra da lei parecer indicar que há duas indemnizações – uma igual à retribuição-base e diuturnidades e outra equivalente aos danos causados – aplicando-se a primeira «sem prejuízo» da segunda, julgamos ser pacífico que a indemnização devida pelo trabalhador é uma só, cujo valor será, no mínimo e independentemente da ocorrência de danos, igual ao da retribuição-base e diuturnidades, podendo ser mais elevado quando o empregador prove que sofreu danos de montante superior ao valor mínimo da indemnização que o trabalhador está obrigado a pagar».
Na eventualidade de, em tribunal, se não concluir pela existência da justa causa invocada pelo trabalhador, mantém-se a cessação do contrato, já que a falta de justa causa, contrariamente ao que ocorre no despedimento, não invalida a cessação do vínculo, mas como é ilícita determina a responsabilização do trabalhador.
Nessa medida, a única consequência será a obrigação de o trabalhador indemnizar a entidade empregadora como se tivesse rescindido o contrato sem aviso prévio (cfr. arts. 399.º e 401.º).
«A função da justa causa na resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador é, pois, diversa da justa causa de despedimento. Na resolução pelo trabalhador a justa causa tem como efeito essencial dispensar o trabalhador de cumprir o aviso prévio a que normalmente estaria obrigado para promover a extinção do vínculo laboral através da denúncia. E pode ainda ter como consequência a constituição do direito do trabalhador a receber indemnização prevista no artigo 396º, nas situações cobertas pelo artigo 394º, n.º 2»[46].
A indemnização pelos prejuízos causados, nos termos do n.º 1 do art. 400º, nunca poderá ser inferior à retribuição base e diuturnidades correspondentes ao período de:
- 30 dias – caso a antiguidade seja inferior ou igual a 2 anos; ou
- 60 dias – caso a antiguidade seja superior a dois anos. –.
A indemnização devida pelo trabalhador pela resolução do contrato de trabalho por si levada a cabo sem que prove a justa causa e sem o cumprimento do aviso prévio tem subjacente a proteção dos interesses da empregadora, com vista, nomeadamente, a que esta possa providenciar, em tempo útil, pela substituição do trabalhador sem prejudicar a atividade da empresa.
A indemnização em causa funciona automaticamente, desde que requerida pela empregadora, pelo simples facto de o trabalhador ter feito cessar a sua relação laboral sem cumprir - ou cumprindo apenas parcialmente - o prazo de aviso prévio, independentemente de a entidade empregadora ter com isso sofrido ou não quaisquer efetivos danos[47].
Como vimos, foi julgada improcedente a verificação de justa causa de resolução do contrato de trabalho, o mesmo é dizer que, em tal caso, a resolução operada é ilícita[48].
No caso, considerando que a antiguidade do A. se reporta a 28 de setembro 1998 e o contrato cessou em 21 de julho de 2015 – tendo, portanto, mais de dois anos de antiguidade – é pacífico que, face ao que dispõe o artigo 400.º, n.º 1, o prazo de aviso prévio era de 60 dias, o qual não foi respeitado, uma vez que a autora resolveu o contrato de trabalho na data da receção da comunicação pela ré e com efeitos imediatos.
Assim, não oferece contestação que a A./reconvinda se constituiu na obrigação de pagar à Ré/reconvinte uma compensação indemnizatória de valor igual à retribuição base e diuturnidades correspondente ao período de antecedência em falta, ou seja, sessenta dias, o que corresponde à importância de 1.328,10 € (= 698,89 x 2) e que no caso se reduz para 1.328,10 €18, dado estar comprovado nos autos que a A. esteve de baixa médica até 24-07-2017 (cfr. certificado de incapacidade temporária para o trabalho de fls. 68).”

Ora, cumprindo dizer o Direito, há que ter-se presente, conforme tem vindo a entender a doutrina e a Jurisprudência, que a razão ou fundamento para a atribuição do direito indemnizatório por falta de aviso prévio reside na proteção contra cessações súbitas do contrato de trabalho que perturbem e prejudiquem a atividade do empregador.
Daí que se deva indagar se a reivindicação de tal indemnização é ou não lícita, justa, honesta, atentas as circunstâncias de cada caso.
Ora no caso em apreço a Autora encontrava-se de baixa por doença desde o dia 22-05-2015 até 24-07-2015 (ponto 23 da factualidade), pelo que quando comunicou à Ré que resolvia o contrato de trabalho – com efeitos imediatos, por carta datada de 20 de Julho de 2015, rececionada pela Ré em 21 de Julho de 2015 (ponto 83 da factualidade), a prestação laboral encontrava-se suspensa.
Porém, tal não é bastante para termos por paralisado, assim o sustentamos, o direito previsto nos artigos 399.º a 401.º do CT/2009.
De facto, e desde logo, analisados os normativos em causa, não resultando dos mesmos distinção de regime entre a resolução ilícita do contrato e a sua denúncia sem observação do aviso prévio, é entendimento comum que a indemnização correspondente à falta de aviso prévio opera automaticamente.
Isso mesmo resulta do Acórdão desta Relação e Secção de 1 de Junho de 2015[49], em que se afirma que, “não obstante a crítica comum à redacção do preceito,[50] a maioria da jurisprudência vem entendendo, porém, que o regime é idêntico em ambas as situações, sendo acumulável a indemnização por falta de aviso prévio com a que resultar da prova de outros prejuízos resultantes para o empregador[51]” e que, de todo o modo, a todo o modo, “a divergência referida não invalida o entendimento comum de que a indemnização correspondente à falta de aviso prévio opera automaticamente, como se se tratasse de uma cláusula penal, sem necessidade de alegação e prova de eventuais danos, não obstante a necessidade do pedido”, não relevando assim, como bem salienta o Ministério Público no seu parecer, “a circunstância de o contrato se encontrar suspenso (…), por doença do trabalhador, contrariamente ao pretendido pelo recorrente.”
No mesmo sentido, escreve-se no Acórdão de 29 de Junho do mesmo ano[52], também desta Relação e Secção, o seguinte:
“(…) De acordo com o disposto no artigo 399.º do Código do Trabalho, não se provando a justa causa de resolução do contrato o empregador tem direito a indemnização dos prejuízos causados, não inferior ao montante calculado nos termos do artigo 401.º. E face ao estatuído neste preceito legal, o trabalhador que não cumpra, total ou parcialmente, o prazo de aviso prévio deve pagar ao empregador uma indemnização de valor igual à retribuição base e diuturnidades correspondentes ao período em falta, sem prejuízo de indemnização por danos causados pela inobservância do prazo de aviso prévio ou da obrigação assumida em pacto de permanência.
Como assinala Pedro Furtado Martins (Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª Edição, 2012, Principia, pág. 548), «[a]pesar de a letra da lei parecer indicar que há duas indemnizações – uma igual à retribuição-base e diuturnidades e outra equivalente aos danos causados – aplicando-se a primeira «sem prejuízo» da segunda, julgamos ser pacífico que a indemnização devida pelo trabalhador é uma só, cujo valor será, no mínimo e independentemente da ocorrência de danos, igual ao da retribuição-base e diuturnidades, podendo ser mais elevado quando o empregador prove que sofreu danos de montante superior ao valor mínimo da indemnização que o trabalhador está obrigado a pagar».
A norma em causa corresponde, embora com alterações de redacção, ao artigo 448.º do Código do Trabalho de 2003, que por sua vez correspondia, se bem que também com diferente redacção, ao artigo 39.º da LCTT.
No âmbito desta última norma, escreveu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-10-2003 (Recurso n.º 4495/02, disponível em www.dgsi.pt), que a mesma previa «(…) dois tipos de indemnização para a falta de aviso prévio da rescisão do contrato pelo trabalhador. O primeiro, que funciona automaticamente pelo simples facto de ter sido omitido, total ou parcialmente, o aviso prévio, independentemente de que daí tenha ou não emergido qualquer dano para o empregador; o segundo, que só tem lugar quando houver danos que possam ser adequadamente imputados ao não cumprimento do prazo de aviso prévio».
No caso a empregadora peticionou o valor correspondente à retribuição-base.
E tendo a autora sido admitida ao serviço da ré em (…) e cessado o contrato em (…) – tendo, portanto, mais de dois anos de antiguidade – é pacífico que face ao que dispõe o artigo 400.º, n.º 1, do Código do Trabalho, o prazo de aviso prévio era de 60 dias, o qual não foi respeitado, uma vez que a autora resolveu o contrato de trabalho na data da recepção da comunicação pela ré (…) e com efeitos imediatos.
Assim, não parece oferecer contestação que a ser devida indemnização o seu valor é o correspondente a dois meses de retribuição, (…).
E também não parece oferecer contestação que a indemnização em causa funciona automaticamente, pelo simples facto de o trabalhador ter feito cessar a sua relação laboral sem cumprir – ou cumprindo apenas parcialmente – o prazo de aviso prévio, independentemente de a entidade empregadora ter com isso sofrido ou não quaisquer efectivos danos.”
Por fim, definidos os contornos legais da indemnização que se aprecia, importa então perguntar, tal como o Sustenta a Autora, se a Ré agiu em abuso do direito ao peticioná-la.
Ora, cumprindo apreciar, teremos de chamar à discussão o regime previsto no artigo 334.º do Código Civil, de acordo com o qual o abuso do direito se traduz no exercício ilegítimo de um determinado direito, por o seu titular, na sua atuação, exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico ou social desse direito.
Da formulação do instituto resulta, pois, a consideração de que, para que o exercício do direito seja considerado abusivo, não bastará que o mesmo cause prejuízos a outrem, tornando-se ainda necessário que o titular exceda, de modo visível, manifesta e clamorosamente, os limites que lhe cumpre observar, impostos quer pelo princípio da tutela da confiança (boa fé), quer pelos padrões morais de convivência social comummente aceites (bons costumes), quer, ainda, pelo fim económico ou social que justifica a existência desse direito, de tal modo que o excesso, à luz do sentimento jurídico socialmente dominante, conduz a uma situação de flagrante injustiça[53].
Como tem sido afirmado, o nosso sistema jurídico acolheu uma conceção objetiva do abuso de direito, não sendo pois necessário que exista consciência, por parte de quem exerce o direito, de que esse exercício é abusivo.
No caso específico do direito que se aprecia, a jurisprudência tem afirmado, como se referiu anteriormente, que a penalização do trabalhador pela resolução do contrato de trabalho que operou sem cumprimento do aviso prévio tem subjacente a protecção dos interesses da entidade empregadora, tendo em vista, nomeadamente, que essa possa providenciar, em tempo útil, pela substituição do trabalhador sem prejudicar a atividade produtiva da empresa[54].
Daí que se compreenda, por se apresentar como abusivo o seu exercício, que não seja legítima a sua atribuição em casos em que a própria entidade empregadora, por ato, vontade ou no seu interesse, tenha promovido ou criado condições que evidenciem que não pretendia que o trabalhador desenvolvesse a sua atividade, assim, designadamente, se na altura em que o trabalhador resolve o contrato de trabalho aquela não estava em atividade e tinha sugerido aos trabalhadores a resolução do contrato ou a sua suspensão[55], ou se, após o regresso do trabalhador de um período de doença e licença de maternidade de cerca de oito meses, e na sequência de lhe ter proposto a cessação do contrato de trabalho por acordo, o ter colocado, a título provisório e durante dois dias, a «separar e organizar Diários da República, por ordem crescente, desde 1998 até ao mais recente», em gabinete próprio, logo tendo o trabalhador apresentado baixa médica, que se prolongou até à resolução do contrato[56].
É que, afinal, em tais situações o trabalhador não se encontrava a exercer a sua atividade, não estando a empregadora interessada sequer em que o fizesse, o mesmo se devendo entender em casos em que se constate que essa estava já prevenida para o não exercício dessa atividade durante o período de aviso prévio.
Em muitas dessas situações estaremos afinal mesmo perante o chamado abuso de direito na modalidade do venire contra factum proprium, que se caracteriza pelo exercício de uma posição jurídica em contradição com uma conduta antes assumida ou proclamada pelo agente, escreve-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Março de 2016[57], citando por sua vez o Acórdão do mesmo Tribunal de 16/11/2011, que “(...) na sua estrutura, o “venire” pressupõe duas condutas da mesma pessoa, ambas lícitas, mas assumidas em momentos distintos e distanciadas no tempo, em que a primeira (o “factum proprium”) é contraditada pela segunda (o “venire”), de modo que essa relação de oposição entre as duas justifique a invocação do princípio do abuso do direito.” Nestas situações, a paralisação do direito é justificada pela tutela da confiança, resultante da anterior conduta de um sujeito jurídico que, objectivamente considerada, é de molde a despertar noutrem a convicção de que ele no futuro se comportará, coerentemente, de determinada maneira, no dizer de Baptista Machado, acima citado.”
Ora, olhando criticamente o caso, consideramos que esse não assume tais contornos pois que, sendo verdade que a Autora se encontrava de baixa médica no momento em que fez operar a resolução, por um lado não se demonstrou (diversamente do que aquela defende) sequer que para essa situação tenha concorrido atuação da Ré e, por outro, que exista demonstração de que a mesma devesse contar, prevenindo-a, com a ausência da Autora. Dito de outro modo, o simples facto de a Autora se encontrar então de baixa médica, não podendo ainda dizer-se que a Ré estava em condições de prever a sua ausência e em particular a duração desta, não permite concluir que seja abusivo, com base no regime previsto no artigo 399.º do CT, que peça, como o fez, a fixação da indemnização aí prevista.
Daí que, nos termos expostos, exista fundamento para essa indemnização, sem que se possa dizer se trate de um exercício abusivo desse direito, decaindo assim também nesta parte o recurso.
*
Pelo exposto, improcedendo o recurso e mantendo-se assim a decisão recorrida, as custas, por essa razão, são da responsabilidade da Apelante (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
***
V - DECISÃO
Acordam os juízes que integram a Secção social do Tribunal da Relação do Porto, procedendo parcialmente quanto à matéria de facto, em declarar no mais totalmente improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Anexa-se sumário do acórdão, da responsabilidade exclusiva do relator.

Porto, 20 de Novembro de 2017
Nelson Fernandes
Fernanda Soares
Domingos Morais
____________
[1] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, p. 221/222
[2] Op. cit., p. 235/236
[3] cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[4] cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[5] www.dgsi.pt
[6] processo nº 220/13.8TTBCL.G1.S1, disponível igualmente em www.dgsi.pt
[7] no mesmo sentido, o Acórdão do mesmo Tribunal de 27 de Outubro de 2016, processo 110/08.6TTGDM.P2.S1, mais uma vez em www.dgsi.pt
[8] Neste sentido, Ac. desta Relação e Secção de 11 de Junho de 2012, Relatora Fernanda Soares, processo 2/10.9TTMTS.P1.
[9] Apelação 2311/14.9T8MAI.P1, com intervenção do aqui relator e Adjuntos, disponível em www.dgsi.pt.
[10] Estando ainda ligado ao ponto 22.º com a redação seguinte: 22. A A. esteve de baixa para assistência a filho no período de 28-04-2015 a 10-05-2015, conforme documentos de fls. 63 e 64.
[11] Ver Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2°, 605.
[12] Do qual consta, ainda, com relevância, o tratamento da questão de saber qual a distinção entre matéria de facto e de direito, uma das mais controversas da doutrina processualista e que mais problemas de fronteira coloca, escreve-se no citado Acórdão a esse respeito - disponível em www.dgsi.pt.
[13] Todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[14] Cf. Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª Ed., Principia, 2012, pág. 533.
[15] Cfr. Furtado Martins, Op. cit., pág. 534.
[16] Cfr. Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2006, pág. 610.
[17] Cf. Ac. STJ de 11 de maio de 2011, proferido no processo n.º 273/06.5TTABT.S1.
[18] Vejam-se, os Acs. STJ de 28/01/2016, 03-12-2014 e 05/03/2013, bem como, desta Relação e Secção, os Acs. de 17/12/2008, 04/02/2013 e 08/07/2015, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[19] In “Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais”, Almedina, 2ª Ed., págs. 928 e segts.
[20] «i) um requisito objetivo, que é o comportamento do empregador, violador dos direitos e garantias do trabalhador, ii) um requisito subjetivo, que é a atribuição desse comportamento ao empregador a título de culpa (…); iii) um terceiro requisito, que relaciona aquele comportamento com o vínculo laboral, no sentido de tornar imediata e praticamente impossível para o trabalhador a subsistência desse vínculo (…)»
[21] Incluídas notas de roda-pé, cuja numeração é porém alterada, por decorrência da inserção do texto neste acórdão.
[22] Cfr. Contrato de Trabalho, À luz do novo Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2009, p. 442.
[23] Cfr. Ac. RP de 12/2/1996, CJ, Ano XXI - 1996, T. I, pág. 261 e Albino Mendes Baptista, Cessação do Contrato de Trabalho por Iniciativa do Trabalhador no Código de Trabalho, in Estudos Sobre o Código de Trabalho, p. 32. Embora o Código do Trabalho de 2009 (como o de 2003) não contenha norma absolutamente idêntica ao art. 34.º, n.º 3 da LCCT (que se reporta aos factos atendíveis para justificar judicialmente a rescisão), prescreve no n.º 3 do art. 398.º que na acção em que for apreciada a ilicitude da resolução apenas são atendíveis para a justificar os factos constantes da comunicação referida no nº 1 do artigo 395º.
[24] Cfr. Joana Vasconcelos, Pedro Romano Martinez e outros, Código do Trabalho Anotado, 8ª edição, 2009, p. 1023.
[25] Cfr. Ac. da RP. de 29/11/06, CJ, Ano XVI – 2006, T. V, pág. 237 e segs.; Maria do Rosário Palma Ramalho, in Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 3ª ed., 2010, p. 1010 e segs..
[26] Essa impossibilidade prática, por não se tratar de impossibilidade física ou legal, remete-nos, necessariamente, para o campo da inexigibilidade, a determinar através do balanço, em concreto, dos interesses em presença.
[27] Cfr. Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 14ª. edição, pág. 644 e segs.; Abílio Neto, in Despedimentos e Contratação a Termo, 1989, pág. 164; Ac. RP de 25/5/90 e da RC de 24/1/91 e de 21/3/91, in Col. Jur., Anos XV-III, pág. 263, XVI, T I, pág. 107 e XVI, T. II, pág. 127.
[28] Cfr. Ac. do STJ de 27/10/2009 (Relator Sousa Peixoto), disponível in www.dgsi.pt..
[29] Cfr. neste sentido, Albino Mendes Baptista, in Notas Sobre a Cessação do Contrato de Trabalho por Iniciativa do Trabalhador, inserido na reforma do Código de Trabalho, CEJ, pp. 548 e 549, e Cessação do Contrato de Trabalho por Iniciativa do Trabalhador no Código de Trabalho, in Estudos Sobre o Código de Trabalho, pp. 22 e 23.
De igual modo Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, Vol. I, Relações Individuais de Trabalho, 2007, Coimbra Editora, p. 1044 - que propugna pela falta de absoluta simetria ou identidade entre a noção de justa causa enunciada no n.º 1 do art. 396º do Código de Trabalho/2003 (correspondente ao n.º 1 do art. 351º do C.T./2009) invocada pelo empregador e a noção de justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador -, defende que, nalgumas situações, seja defensável que «o limiar da gravidade do incumprimento do empregador possa situar-se abaixo limiar do incumprimento do trabalhador que justifica o despedimento».
Acentuando a necessidade de não apreciar os requisitos supra enunciados em moldes tão estritos exigentes como no caso da justa causa disciplinar, designadamente no que toca ao terceiro elemento, ver Maria do Rosário Palma Ramalho, in obra citada, pág. 1011.
Particulariza a citada Autora que o esforço (do legislador) de aproximação dos regimes não se afigura adequado, não só porque a justa causa tem, no contexto do despedimento disciplinar, uma função totalmente diversa da que desempenha no contexto da cessação do contrato por iniciativa do trabalhador, mas também porque os princípios gerais subjacentes a uma e outra modalidade de cessação e que, naturalmente, inspiraram os respetivos regimes - são opostos; no caso do despedimento disciplinar, o valor fundamental é o da estabilidade de emprego e da proibição de despedimentos arbitrários; no caso de resolução do contrato pelo trabalhador, o valor fundamental é o da liberdade de trabalho e o da liberdade pessoal do trabalhador (cfr. pág. 1008).
Em sentido contrário, Pedro Romano Martinez, in Direito do Trabalho, 7ª ed.-2015, Almedina, p. 1037, defende que a justa causa a que alude o art. 394º, n.º 1, do CT deve ser entendida nos termos da idêntica locução constante do art. 351º, n.º 1 do CT, até porque, como determina o art. 394º, n.º 4 do CT, a justa causa imputável ao empregador é apreciada nos moldes estabelecidos para o despedimento por facto imputável ao trabalhador, remetendo-se para o correspondente preceito.
[30] Cfr. Ac. da RP. de 14/11/2005, CJ, Ano XXX – 2005, T. V, pág. 240, Ac. da RP. de 29/11/2006,CJ, Ano XXXI – 2006, T. V, pág. 237 e segs., Ac. RP de 28/04/2008, in www.dgsi.pt. e Ac. STJ de 28/05/2008 (Relator Pinto Hespanhol), in www.dgsi.pt.
Como decidiu o Ac. da RP de 3-05-2010 (Relator Manuel Joaquim Ferreira da Costa), disponível in www.dgsi.pt., resolvendo o trabalhador o contrato de trabalho, por sua iniciativa, com invocação de justa causa e pretendendo receber a respectiva indemnização de antiguidade, bem como retribuições vencidas, incumbe-lhe o respetivo ónus da prova, tanto dos fundamentos invocados para a resolução, como da vigência e execução do contrato, atento o disposto no art.º 342.º, n.º 1 do Cód. Civil, por se tratar de factos constitutivos do direito alegado (o direito de resolver o contrato com justa causa).
[31] Cfr. Ac. do STJ de 28/05/2008, disponível in www.dgsi.pt..
[32] Não quereremos com isso dizer que tais fundamentos seriam suficientes para legitimar a recusa do pedido do trabalhador em eventual ação judicial tendente ao reconhecimento da existência de motivo justificativo nos termos e para os fins do disposto no art. 57º, nº 7, mas tão só que os mesmos tinham suporte na realidade vivenciada.
[33] Consoante doutrina e jurisprudência correntes, das respostas negativas aos quesitos ou à matéria articulada – e na medida em que o forem, das respostas restritivas também – resulta apenas que tudo se passa como se esses factos (não provados) não tivessem sido sequer alegados (cfr. Ac. Rel. Porto de 14.04.94, CJ, 1994, T. II, pág. 213; António Santos Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, II Vol., 1997, pág. 236 e J. P. Remédio Marques, in Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 2007, pág. 409). Ou, dito de outra forma, a não prova dos quesitos apenas significa isso mesmo: não se terem provados os factos quesitados ou articulados, e não que se tenham demonstrado os factos contrários (Acs. STJ de 8.2.66, 28.5.68, 30.10.70, 11.6.71, 23.6.73, 5.6.73, 23.10.73, 4.6.74, in Bol. M.J., respetivamente, 154-304,177-260, 200-254, 208-159, 218-239, 228-195, 228-239 e 238-211; José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 2001, pág. 630). Ou, dito ainda de outro modo, a resposta negativa a um quesito ou a um facto controvertido, não significa a prova do facto contrário; significa tão-somente que esse facto controvertido não se provou, ou porque nenhuma prova foi produzida, ou porque a prova produzida se mostrou insuficiente para convencer o tribunal da veracidade desse facto (cfr. Ac. Rel. Lisboa, de 13 de Maio de 2009, www.dgsi.pt.).
[34] Que se incluem em notas de rodapé, no correspondente local do texto.
[35] Proferido na revista n.º 712/12.6TTPRT.P1.S1, citado por sua vez no Acórdão do mesmo Tribunal de 26 de Maio de 2015, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[36] Correspondente à nota 12 do Acórdão: Cfr. Pedro Romano Martinez (e outros), Código do Trabalho Anotado, 9ª edição, p. 187, e Bernardo da Gama Lobo Xavier, Direito do Trabalho, 2011, p. 450.
[37] Correspondente à nota 12 do Acórdão: Direito do Trabalho, Almedina, 16ª edição, p. 160.
[38] Correspondente à nota 13 do Acórdão: Ob. cit., p. 436.
[39] Correspondente à nota 14 do Acórdão: Ibidem.
[40] Correspondente à nota 15 do Acórdão: Júlio .Manuel Vieira Gomes, ob. cit., p. 436.
[41] Correspondente à nota 16 do Acórdão: Em regra, mas não necessariamente, sendo – no limite - configuráveis quadros de assédio resultantes de repetidas e graves “descargas emocionais do assediador, sem qualquer intenção [específica] de sujeição da vítima” – cfr. Rita Garcia Pereira, Mobbing ou Assédio Moral no Trabalho, Coimbra Editora, 2009, p. 100.
[42] Nos termos anteriormente mencionados.
[43] Ac. STJ de 11 de maio de 2011, supra citado.
[44] Não resultou provado que:
- A password serve de forma de controle de produtividade do funcionário.
- Ao não possuir password ficava a A. em situação de inferioridade, vendo-se rebaixada perante a Ré e perante clientes, dando a entender que não estava a produzir nada.
- A inatividade da password impediu a A. de vender produtos associando o seu nome, tais como listas de nascimento (como sucedeu em 18.5.2015).
- Nenhuma colega lhe forneceria a sua password em caso de trocas ou devoluções por isso representar uma “perda” de vendas atribuída à/ao titular de tal password.
- Em 24.4.2015, sem password, a A. não conseguiu efetuar uma troca de um casaco e uns calções, deixando a cliente muito desagradada.
- Antes de enviar a carta de rescisão, em vão procurou falar com a supervisora da Ré.
[45] Cfr. Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª Edição, 2012, Principia, pág. 548.
[46] Cfr. neste sentido, Pedro Furtado Martins, obra citada, p. 523.
[47] Cfr. Ac da RP de 29 de Junho de 2015 (Relator João Nunes), in www.dgsi.pt.
[48] Cfr. Joana Vasconcelos, Pedro Romano Martinez e outros, obra citada, p. 1023
[49] Relator Rui Penha, em www.dgsi.pt.
[50] [2] Veja-se, Leal Amado, Contrato de Trabalho, 3ª ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2011, págs. 468-469.
[51] [3] Para além da doutrina e jurisprudência invocadas pela ré, vejam-se os acórdãos do STJ de 8-11-2006, 06S2571, relator Sousa Peixoto, e de 29-10-2014, 1930/05.9TTPRT.P1.S1, relator Fernandes da Silva, ambos acessíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[52] Relator João Nunes, em www.dgsi.pt.
[53] Antunes Varela, das Obrigações em geral, 10.ª edição, pág. 544 e segts.
[54] cfr., por todos, o acórdão do STJ de 11 de Março de 1999, Processo n.º 365/98, disponível em www.dgsi.pt)., citado no acórdão desta Relação, supra citado, de 29 de Junho de 2015.
[55] acórdão do STJ de 11 de Março de 1999, citado.
[56] acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-04-2008 (Proc. n.º 4747/07, disponível em www.dgsi.pt)
[57] www.dgsi.pt
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Sumário – a que alude o artigo 663.º, n.º 7, do CPC:
I- A omissão pelo recorrente do cumprimento dos ónus estabelecidos no artigo 640.º n.º 1 do CPC implica a rejeição da impugnação da matéria de facto na parte afetada.
II- Não fazendo o recorrente apelo a factos que diga ter alegado nos articulados, enquanto novos, a atendibilidade dos mesmos em sede de recurso pressupõe que o Tribunal de 1.ª instância tenha usado da faculdade prevista no artigo 72.º do CPT.
III- Constituindo a possibilidade de eliminação de factos conclusivos equiparados a questões de direito uma prerrogativa dos tribunais superiores de longa tradição doutrinal e jurisprudencial, deve continuar a entender-se, não obstante a revogação (com a reforma) do anterior artigo 646.º CPC, que mesmo em sede de recurso, no âmbito dos poderes do tribunal da relação no que diz respeito à apreciação da matéria de facto, aquela eliminação pode/deve ser exercida, mesmo que não esteja expressamente prevista na lei processual.
IV- A resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, sem necessidade de aviso prévio e com invocação de justa causa, a que alude o art.º 394.º do CT/2009, pode ser fundada num comportamento ilícito do empregador ou resultante de circunstâncias objetivas, relacionadas com o trabalhador ou com a prática de atos lícitos pelo empregador, dizendo-se no primeiro caso que estamos perante resolução fundada em justa causa subjetiva e, no segundo, por sua vez, fundada em justa causa objetiva.
V- A justa causa subjetiva justificativa do despedimento por parte do trabalhador assente em assédio moral do empregador, estando para além de situações de mero mau relacionamento, implica a verificação de comportamentos real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, passíveis de exercer pressão moral sobre este e tendo em regra associado um objetivo final ilícito ou pelo menos eticamente reprovável, bem como, ainda, enquanto característica essencial do conceito de justa causa, a demonstração de que esse comportamento da entidade patronal, que lhe possa ser imputável a título de culpa, pela sua gravidade e consequências, torne inexigível a manutenção do vínculo laboral;
VI- A indemnização devida pelo trabalhador pela resolução do contrato que operou sem que prove a justa causa e sem o cumprimento do aviso prévio, tendo subjacente a protecção dos interesses da empregadora – com vista, nomeadamente, a que esta possa providenciar, em tempo útil, pela substituição do trabalhador sem prejudicar a atividade da empresa –, opera automaticamente, desde que requerida por aquela, pelo simples facto de o trabalhador ter feito cessar a sua relação laboral sem cumprir - ou cumprindo apenas parcialmente - o prazo de aviso prévio, independentemente de a entidade empregadora ter com isso sofrido ou não quaisquer efetivos danos.

Nelson Fernandes

Descritores:
 CONTRATO DE TRABALHO RESOLUÇÃO INICIATIVA DO TRABALHADOR ASSÉDIO MORAL SEM JUSTA CAUSA INDEMNIZAÇÃO DA ENTIDADE PATRONAL